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A federalização das hipóteses de grave violação de direitos humanos e constitucionalidade

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02/07/2007 às 00:00
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6. CONCLUSÃO

Além de relacionar-se com as demais disposições atinentes à temática dos direitos humanos inseridas no texto da Constituição Federal, o incidente sob foco vincula-se às normas previstas em tratados internacionais sobre a matéria, dos quais o Brasil seja signatário. Ao versar sobre a questão da constitucionalidade dos arts. 109, V-A e § 5° da Carta de 88, notou-se que as Emendas Constitucionais são espécies normativas passíveis de controle de constitucionalidade. Conseqüentemente, o IDC é submetido a tais regras.

Com efeito, evidenciou-se que o deslocamento de competência sub oculo está em consonância com a sistemática jurídica internacional, existindo institutos de mesma natureza no direito comparado, ao passo que se rompe com o paradoxo, até então vigente, de ser centralizada a responsabilidade internacional em matéria de direitos humanos na pessoa da União, quando a mesma não dispunha de mecanismos internos mais eficazes para a apuração e julgamento das violações a tais direitos. Ainda, a federalização responde ao cumprimento do dever internacional de persecução criminal, obrigação que passou a ter maior importância em virtude da adesão do Brasil ao Tribunal Penal Internacional (TPI), consagrando-se, dessa forma, o princípio da complementaridade.

No plano do direito doméstico, verificou-se que a proposta da federalização encontra-se em plena harmonia com as sistemáticas constitucional e processual vigentes, ausente qualquer vício formal ou material a eivar o IDC com o crivo da inconstitucionalidade. Destarte, restou patenteado que a "federalização" não viola qualquer princípio constitucional, especialmente, o princípio do juiz natural e do pacto federativo, se considerada como norma de caráter excepcionalíssimo.

A partir da leitura do IDC paradigmático, observou-se que os Ministros do STJ ratificaram a compatibilização da norma do art. 109, § 5° com os demais preceitos basilares previstos também no texto da Carta Magna, indispensáveis à manutenção do Estado Democrático de Direito. Malgrado a improcedência acertada do leading case, tal fato não abala a utilidade do instrumento, especialmente no combate à impunidade dos crimes praticados com grave violação de direitos humanos. Ao revés, a decisão do STJ confirma a necessidade e a importância do incidente sob análise, inferindo-se dela que se estivessem presentes os requisitos do IDC, a "federalização" seria deferida.

Ao término desse estudo, constata-se que o IDC foi inserido num contexto, desde a primeira linha, orientado pelo paradigma da primazia dos direitos humanos e na perspectiva de proteção a esses direitos primordiais da humanidade. Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida (apud HABER; MASSOUD; ROCHA, 2005, p. 30), desembargadora federal do TRF da 3ª Região, em evento realizado no estado do Pará, denominado "Federalização em Debate", sugere que a questão do IDC:

seja vista não sob o ângulo de embate de forças (estadual x federal), uma vez que o resultado esperado – que a federalização pudesse alcançar a justiça – na verdade poderia tornar-se medida inócua, em face do problema estrutural do judiciário como um todo, mas sim que um novo cenário seja delineado com a união de esforços da esfera estadual e federal, possivelmente em litisconsórcio e em uma perspectiva semiológica.

O entendimento logo acima esboçado pela desembargadora deve ser visto como exemplo a ser seguido, o qual concretiza a verdadeira "união indissolúvel" (art. 1º, caput, CF) entre os entes federativos, bem como viabiliza um instrumento relevante para o combate à impunidade e para a garantia de justiça nos casos de graves violações aos direitos humanos. Direitos Humanos, previstos no direito positivo, não faltam. O que há é uma escassez de mecanismos que possam efetivar esses direitos. Nesse diapasão, enfatiza Noberto Bobbio (1992, p. 25-37) que o "problema grave de nosso tempo, com relação aos direitos do homem, não era mais o de fundamentá-los, e sim o de protegê-los", sendo que a real problemática a ser enfrentada "é o das medidas imaginadas e imagináveis para a efetiva proteção desses direitos".

Diante de um mundo globalizado, a necessidade de mecanismos que promovam a defesa dos direitos da pessoa humana, tais como a IDC, torna-se ainda mais imperiosa. Destarte,é preciso ter sempre presente a relevante assertiva do mestre italiano: "A efetivação de uma maior proteção dos direitos humanos está ligada ao desenvolvimento global da civilização humana" (BOBBIO, 1992, p. 45). Imbuídas desse propósito é que as instituições judiciais brasileiras, sejam elas estaduais ou federais, devem se sobrepor a egocentrismos infrutíferos em busca desse fim maior, qual seja, dotar os direitos humanos de real eficácia plena.


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Sobre o autor
Mark Clark Santiago Andrade

pós-graduando em Direito pela Escola Superior da Magistratura de Sergipe, assessor de juiz

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Mark Clark Santiago. A federalização das hipóteses de grave violação de direitos humanos e constitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1461, 2 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10073. Acesso em: 22 dez. 2024.

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