Promoção da dignidade para as mulheres vítimas de violência dentro do processo judicial

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Resumo: A violência contra a mulher é uma problemática no contexto brasileiro, em que as vítimas recorrem aos meios legais em busca de assegurar a sua integridade, porém quando se é analisada a conjuntura da reivindicação na seara processual, encontra-se um obstáculo no judiciário: a revitimização da figura feminina. Em detrimento disso, a legislação nacional busca garantir a dignidade de todos, bem como realiza um compromisso de proteção à mulher. Assim, baseado nessa problemática, a presente pesquisa busca compreender a problemática, além de abordar a falha na maquinaria jurídica quanto à efetivação da dignidade para as mulheres. Com isso, utilizou-se de uma análise documental e exploratória, de cunho metodológico bibliográfico, com análise da legislação vigente, bem como respectiva literatura. A partir da qual foi possível compreender a relevância da dignidade no processo judicial e como esta deve ser garantida em seu interior.

Palavras-chave: Revitimização. Violência. Mulher. Judiciário


INTRODUÇÃO

O processo na contemporaneidade é compreendido dentro do ordenamento jurídico brasileiro como um ato jurídico complexo, exercido a partir da possibilidade de praticar o direito de ação, uma reivindicação subjetiva inerente à pessoa humana, em que este possui um objetivo final.

No contexto atual, o processo está disciplinado no interior da Constituição, em que a referida traça um perfil e as devidas características para o processo e os seus atos, em que este está fundamentado em diversos princípios, no interior do devido processo legal. Assim, elucida-se que o alicerce do ordenamento jurídico nacional se encontra no princípio da dignidade humana, em que este deverá ser assegurado em todos os âmbitos jurídicos.

Assim, insere-se a problemática da violência, considerada como um grande problema social e fator que viola diretamente a dignidade da pessoa, ao atingir a sua integridade física. Dessa forma, é elementar que as vítimas de violência iniciem a reivindicação dos seus direitos, reivindicação esta que ocorre por meio do processo judicial.

Nesse contexto, inclui-se a problemática das mulheres vítimas de violência, em que a violência contra a mulher é uma grande preocupação no contexto nacional, no qual o Estado brasileiro realiza um compromisso de frear e prevenir esse tipo de violência, em que o referido confirma este compromisso no âmbito internacional e nacional, ao aderir a tratados e sancionar legislação específica de proteção da figura feminina, bem como ao passo que assegura na lei maior que não serão realizadas distinções de gênero no país.

Todavia, perante aos processos de revitimização, em sua grande maioria, o Estado vem atuando de forma negativa, visto que são marcados por inúmeras falhas, e que além de dificultar na promoção de justiça, será um meio de as vítimas revivenciarem toda aquela situação constrangedora da qual já passou, e, por consequência, resultando na violação aos direitos humanos e das mulheres. Nessa conjuntura, surge a Lei nº 13.505 de 2017 a fim de reforçar o direito à proteção da vítima nos processos de revitimização, e coibir essa violência institucional.

Há de se falar, também, sobre os principais meios de promover a dignidade da mulher vítima de violência durante os processos jurídicos. Posto que, é necessário descrever as medidas que configuram a aplicabilidade e o cumprimento das leis de proteção à mulher. Isso porque, quando há acesso a um processo probo e eficaz, que visa, especialmente, assegurar dignidade e proteção à mulher, existe uma diminuição do medo e da insegurança na hora da denúncia.

Ao compreender a situação de vulnerabilidade da figura feminina vítima de violência no âmbito processual, bem como a necessidade de preservação da integridade, questiona-se, como é possível garantir a dignidade para estas mulheres no âmbito do processo judicial?

Dessa forma, parte-se de uma pesquisa exploratória, em busca de maior familiaridade com o contexto elucidado, de método documental, associada à uma revisão bibliográfica. A presente pesquisa busca referencial dentro da legislação brasileira, com os devidos ritos processuais disciplinados por esta, além de uma análise de livros e artigos científicos que tratam do tema.

Pretende-se investigar, de forma geral, a situação das mulheres vítimas de violência dentro do processo. Além disso, atua-se em busca de compreender o funcionamento do processo brasileiro em relação à promoção da dignidade para estas mulheres, bem como o delineamento dos meios estatais de proteção.


1. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA COMO PRESSUPOSTO PROCESSUAL

Preliminarmente, é elementar a compreensão da dignidade da pessoa humana dentro da ordem jurídica nacional, em que esta é considerada como um fator basilar. Assim, Sarlet (2006) aponta a dignidade como possuidora de uma condição de princípio normativo fundamental, considerada como princípio e regra ao mesmo tempo, visto que oferta alicerce para a definição e o surgimento dos direitos e garantias fundamentais, além disso, é responsável por conferir ao ordenamento jurídico eficácia e validade.

Portanto, é mister captar o alcance desta como uma qualidade que é inerente à pessoa humana, ou seja, uma ideia de valor intrínseco. Barroso (2014) aponta esta como oriunda da singularidade dos seres humanos, em que esta deverá ser considerada como um valor objetivo, portanto, não é algo ofertado pelo ordenamento jurídico, em que se relaciona com direitos indisponíveis dentro da organização estatal.

Barroso (2014) também realiza o delineamento deste princípio com a ideia de autonomia e valor comunitário, em que o primeiro se manifesta com a possibilidade de realização de ações e tomada de decisões por conta própria, já o segundo está atrelado à uma ideia de fixação de objetivos coletivos e serviço em prol do bem comum.

Dessa forma, entende-se este princípio-norma como o cerne do Estado brasileiro, fator responsável por guiar a legislação vigente, bem como servir de base para o desenvolvimento da seara processual, responsável por buscar a concretização das reivindicações de direitos presentes na lei maior. Assim, em virtude do fator elucidado, é possível entender a dignidade como um pressuposto processual, que está diretamente associado ao referido, capaz de conferir validade aos atos realizados dentro deste.

De forma específica, é possível o entendimento do processo como uma relação jurídica legítima e dinâmica, responsável pela concretização do Direito material que surge a partir de uma lide, e se desenvolve com a atividade jurisdicional. Nessa esteira, é essencial o apontamento de que o processo só será considerado como legítimo se seguir os ajustes do devido processo legal traçado na norma constitucional, desenvolvido por meio de diversos princípios constitucionais.

O devido processo legal é compreendido por Dinamarco, Bandaró e Lopes (2020) como um sistema responsável por limitar o exercício do poder, pois traça a linha lógica a ser percorrida no interior do processo, em que a sua violação seria considerada como uma afronta ao Estado Democrático de Direito, pois o desenvolvimento dos atos processuais deverá seguir o âmbito da tutela constitucional.

Assim, ao compreender o papel da dignidade da pessoa humana e o desenvolvimento do processo, é essencial inserir a situação no âmbito do judiciário, pois é dentro do referido poder que desaguam as questões da sociedade, em que este deverá garantir o devido cumprimento do Direito objetivo. Além disso, dentro do poder em questão são recebidas e compreendidas as situações que tratam de violência contra a mulher, é para o poder em questão que as vítimas devem recorrer em busca das suas devidas reivindicações.

Nesse contexto, é elementar a inserção do judiciário como um protagonista no âmbito das situações supracitadas, em que estas são entendidas como uma grande problemática social, assim, o judiciário deverá desenvolver as suas ações de forma ativa perante a sociedade, em busca de efetivar os princípios constitucionais. (STRECK, 2003)

O judiciário deverá atuar dentro das suas atribuições típicas e atípicas no interior do processo de acordo com o respaldo jurídico ofertado pela constituição, segundo as diretrizes da legalidade e dentro de todos os parâmetros e limitações apresentados pelo ordenamento jurídico nacional.

Dessa forma, é essencial o apontamento realizado por Streck e Motta (2017) de que a dignidade da pessoa humana e o devido processo legal estão diretamente associados, bem como a ideia de que a dignidade deverá ser refletida no interior da seara processual, portanto, as decisões judiciais sempre deverão repousar na integridade jurídico-normativa do Direito. Portanto, as decisões devem ser proferidas com o devido embasamento, de forma coerente, bem como com a devida participação da parte interessada.

Ao compreender o instituto processual como entrelaçado à dignidade, é essencial o entendimento do acesso à justiça como forma de promoção da dignidade, visto que este é considerado como um ambiente no qual os cidadãos serão capazes de submeter dos seus conflitos à figura estatal, portanto, o acesso à justiça deverá ser considerado como o meio garantidor de direitos dentro do ordenamento, portanto, responsável por promover tantos outros pressupostos.

O acesso à justiça é fator de promoção da dignidade, que como este é considerado como um direito natural por Capelletti e Garth (1978), que elucida a necessidade de garantia e preocupação estatal sobre este, como uma forma de garantir o seu desenvolvimento e resolução das questões.

Nesse sentido, é clara a percepção da dignidade da pessoa humana como fonte para as movimentações jurídicas dentro do Estado brasileiro, especialmente como fator de alicerce das reivindicações, que devem ocorrer baseadas na legalidade e com garantias, que devem proteger ambos os polos, especialmente as vítimas, ao passo que o objetivo da ação deverá ser concretizado com o devido respeito aos trâmites legais, cognição e fundamentação.


2. A REVITIMIZAÇÃO DA MULHER VIOLENTADA NO INTERIOR DO PROCESSO

Tratando-se diretamente do processo judicial, é essencial a compreensão de que dentro deste ocorrem inúmeras movimentações, de acordo com as disposições legais, em que há a apuração de fatos e provas, de acordo com os envolvidos na situação, em que uma grande problemática no desenvolvimento dos tramites processuais é a revitimização.

Consoante Oliveira (2014) é possível o entendimento de que a revitimização atua como uma segunda experiência de violência, ou mesmo a relação de continuidade da violência, podendo ocorrer nos casos em que o poder público não garante à mulher proteção contra a violência.

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Com o mesmo entendimento da lide, Vasconcelos e Augusto (2015) asseveram que a revitimização da mulher acontece quando não há uma conformação plena, bem como não é vislumbrada uma estruturação de uma rede de atendimento à mulher vítima de violência, este se refere a estrutura jurídica como um todo.

Nessa perspectiva, a revitimização consiste em determinadas práticas e atitudes, na sua maioria, preconceituosas, que são causadas por instituições e servidores do Estado que na sua inexperiência na atuação acabam por favorecer e perpetuar a violência contra as mulheres, chegando até mesmo a provocar a sentimento de culpa na vítima. Apesar de que, apresentar o relato seja fundamental, a inidoneidade institucional chega a atacar a vítima, intensificando ainda mais a situação.

Assim, Vilela (2005) justifica:

[...] repetição de atos de violência seja pelo próprio agressor ou na peregrinação pelos serviços para receber atendimento, ou pela repetição da lembrança de atos de violência sofridos quando o relato do trauma necessita ser repetido para vários profissionais. Isso pode acarretar prejuízo para a justiça, pois a vítima, por cansaço, pode omitir fatos ou, por considerar que está chamando atenção, pode aumentar os acontecimentos. Outra situação é o atendimento sem privacidade, expondo sua dor diante de terceiros (VILELA, 2005, p. 52).

Em primeira análise, vale destacar a impunidade como um dos fatores que levam ao descaso do Estado, fazendo com que se propague ainda mais essa violência. Nesta toada, Cesare Beccaria (1764), em seu livro “Dos Delitos e das Penas” traz reflexões relevantes acerca da importância da punição, bem como, enfatiza que esta seja uma das melhores formas de prevenir o crime.

Não é o rigor do suplício que previne os crimes com mais segurança, mas a certeza do castigo, o zelo vigilante do magistrado e essa severidade inflexível que só é uma virtude no juiz quando as leis são brandas. A perspectiva de um castigo moderado, mas inevitável causará sempre uma forte impressão mais forte do que o vago temor de um suplício terrível, em relação ao qual se apresenta alguma esperança de impunidade (BECCARIA, 1764, p. 113)

Outrossim, cabe sustentar ainda o quão importante é a capacitação dos profissionais que estão à frente do processo, visto que, são o primeiro contato da mulher vitimizada, tornando-se peças cruciais na efetivação do processo e garantidores para a promoção da justiça. Dado que, a incapacitação dos que estão prestando esses serviços podem levar à dificultar o andamento do processo, tanto por parte daquelas vítimas de um crime no ato da denúncia- sendo colocadas novamente em situação de vulnerabilidade, e sobretudo, fazendo com que as mesmas saiam do seu lugar de vítima e passem a ser culpabilizadas pelo o ocorrido (presença de juízos de valores); como também por parte daquelas que sofrem violência e que são influenciadas a não denunciar.

Num contexto ainda mais amplo é preciso compreender que a atividade pericial possui uma contribuição na luta contra o que se denomina “cultura do estupro”, a qual envolve comportamentos sutis ou explícitos que silenciam ou relativizam a violência sexual contra a mulher, que é a principal vítima desse tipo de crime. (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2017, p. 45).

Ademais, relatos produzidos para a Comissão Parlamentar Mista sobre a Violência contra a Mulher comprovam tais fatos:

Foram relatados constantes desrespeitos a mulheres durante atendimentos em delegacias, como por exemplo, não sendo informado à mulher ofendida, durante o registro da ocorrência, seu direito em requerer medidas protetivas, não orientando as mulheres em situação de violência sexual seus direitos ao tratamento preventivo de DST/AIDS e abortamento legal, nem são encaminhadas em tempo hábil para a perícia do IML. (SENADO FEDERAL, 2013)

Ainda nesse contexto, destaca-se que as instituições que deveriam promover a proteção da vítima tratam aqueles que deveriam ser protegidos de forma violenta. É evidente a conduta antiética dos agentes envolvidos, que ao invés de julgar o agressor, passa a julgar a vítima e sua conduta, colocando assim, a mulher em posição de subordinação e escancarando a seletividade do poder punitivo estatal.

Por conseguinte, vale destacar que, a incapacitação do Judiciário no interior do processo, e, consequentemente, a constância de situações como essa vivenciada por Mariana- em que as mulheres são frequentemente “reviolentadas” pelo Sistema de Justiça, só intensifica a subnotificação de crimes sexuais no país. Nesse sentido, torna-se primordial que o Judiciário possa cessar a violência contra a mulher e possa se capacitar para obter um olhar crítico sobre o gênero.

Em suma, após todas essas questões supracitadas em virtude da revitimização da mulher, vale enfatizar a importância da Lei nº 13.505 de 2017 que veio acrescentar alguns dispositivos na Lei Maria da Penha (11.340/2006), no que tange ao tratamento às vítimas de violência, com instruções próprias para os diversos tipos de situação, a fim de que se possa ter um tratamento especializado com profissionais altamente qualificados e capacitados.

Dessa forma, com a aplicação efetiva dessa lei e das demais legislações em vigor, as mulheres poderão sentir-se amparadas e seguras nas diversas fases do processo, alcançando assim, a promoção da justiça à mulher e fazer jus ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Outro fator preponderante é a Lei nº 13.869/19, que dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade, a violência institucional foi caracterizada como um novo tipo penal doloso e de ação livre. Nesse sentido, trata-se de um tema ligado à necessidade de proteção às vítimas, além de dar a essas pessoas um maior protagonismo durante o processo.

A Lei de Abuso de Autoridade elucida que agente público é "todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em órgão ou entidade" de qualquer dos poderes do Estado

Desse modo, este novo tipo penal visa enfrentar a chamada vitimização secundária, tornando-se um importante avanço no que diz respeito à promoção da dignidade às vítimas de violência processual, como, por exemplo, as mulheres.

Em primeiro plano, são definidos comportamentos de violência institucional os procedimentos desnecessários, repetitivos e invasivos, que estejam contrários às disposições legais que regulam a atuação dos agentes públicos prestadores de serviços. No entanto, é importante frisar que não há crime se mantida a estrita relação com os fatos em apuração, ainda que cause um reavivamento da violência.

Outrossim, o sujeito ativo para a prática desse crime é qualquer autoridade que possa, no atendimento de vítimas e testemunhas, ter comportamentos que se enquadrem como violência institucional. Entretanto, o advogado particular está fora do plexo, pois ele não é agente público. Assim, para contê-lo, é necessária uma intervenção por intermédio do magistrado ou do Ministério Público.

À vista disso, os sujeitos passivos são as vítimas de infrações penais violentas e as testemunhas de crimes violentos. Isso se deve, sobretudo, ao fato de a violência institucional alcançar a vítima direta, pois somente ela poderá reviver a agressão, e às testemunhas que estejam traumatizadas.


3. VIAS DE PROMOÇÃO DA DIGNIDADE

Caracterizada por fortalecer a rede de defesa e de proteção às mulheres, a Lei nº 11.340/2006 – Lei Maria da Penha – dispõe em seu texto sobre os atendimentos e os procedimentos especializados às mulheres vítimas de violência. No entanto, ela enfrenta diversos impasses para promover dignidade às mulheres durante os trâmites judiciais. Isso porque, somente a norma jurídica não foi suficiente para implantar, principalmente, nos municípios, mecanismos que prestassem serviços individualizados à mulher vítima de violência no Brasil.

Nesse contexto, em uma considerável parcela das vezes, as mulheres experienciam situações de violência institucional durante seus processos – desde a denúncia até o julgamento – devido ao fato de não haver profissionais capacitados para lidar com as situações particulares das vítimas, além de não existir punição para os atos omissos e negligente dos agentes públicos. Sabendo disso, é imprescindível que haja ascensão das políticas públicas que visam dar a essas mulheres atendimentos eficientes, que respeitam, principalmente, a dignidade, a qual não deve prevalecer apenas na legislação, mas sim em toda a atividade processual.

Diante o exposto, é válido destacar que, segundo dados selecionados pela Câmara dos Deputados, cerca de 97% dos municípios brasileiros não contam com as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), indicando que a maioria das mulheres vítimas de violência no Brasil não possuem o direito de ter este atendimento especializado resguardado, assim, são expostas a falta de preparo e ao constrangimento nas demais delegacias do País. (BRASIL, 2021)

Paralelo a isso, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2020 cresceu o número de mulheres vítimas de violência doméstica, porém ocorreu uma considerável diminuição no número de denúncias, conforme dados publicados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Isso mostra que, por vezes, a mulher não se sente segura para realizar a queixa e ir adiante com um futuro processo, ao mesmo tempo, também se sente intimidada e envergonhada. Isso se deve, principalmente, à falta de um acompanhamento habilitado para lidar, especificamente, com a situação frágil em que ela se encontra. (FBSP, 2021)

De acordo com estudos da revista “Violência contra a mulher e as práticas institucionais”, feita pelo projeto “Pensando o Direito” da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça e Cidadania, é possível afirmar:

A luta por igualdade de gênero devem entrar nestas instituições para que haja, no mínimo, um olhar mais acolhedor e um tratamento sério para a violência doméstica, vista nos mais diversos setores da sociedade como algo de menor importância, algo de menor relevância ou até motivo de piada. (BRASIL, p.25, 2015)

Por isso, é primordial enfatizar a importância de vias que promovam dignidade a essas vítimas, fazendo com que haja o cumprimento das medidas estabelecidas na Lei Federal e que seus casos não sejam minimizados perante o Estado. Desse modo, entende-se que é de suma importância a implantação de um maior número de DEAMs, responsáveis, principalmente, por emitirem com urgência medidas protetivas, visando a proteção imediata da mulher, além de serem incumbidas de acolherem essas mulheres com responsabilidade e preparação.

E o mesmo deveria acontecer com os Juizados Especializados, uma vez que são responsáveis por dar às mulheres o direito a um processo rápido, eficaz e que não faça com que as vítimas revisitem o trauma. Por conseguinte, o direito a recursos simples, rápidos e em segredo de justiça, configuram uma imprescindível via de promoção da dignidade às mulheres vítimas de violência. Dado que, a vítima se sente insegura quando não há a efetivação desses direitos também previstos na Lei nº 11.340/2006.

Para Santos (1996), a demora na aplicação da Justiça provoca a erosão das provas, a demora na reparação do dano violado, reforça o sentimento de impunidade e agrava os custos econômicos do sistema. Nota-se, portanto, a necessidade de um atendimento diligente, para que, assim, não haja qualquer receio ou insegurança por parte das vítimas.

Outrossim, a Lei nº 13.505/2017, que acrescentou na Lei Maria da Penha o art. 10., deixa no claro no primeiro parágrafo, especialmente, no inciso I, a importância de prevalecer a integridade da mulher durante o atendimento nas instituições jurídicas:

Art. 10 - A. É direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar o atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado por servidores - preferencialmente do sexo feminino - previamente capacitados.

§ 1º A inquirição de mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de testemunha de violência doméstica, quando se tratar de crime contra a mulher, obedecerá às seguintes diretrizes:

I - Salvaguarda da integridade física, psíquica e emocional da depoente, considerada a sua condição peculiar de pessoa em situação de violência doméstica e familiar. (BRASIL, 2017)

Dessa forma, é necessário que durante – e após – os processos de violência contra a mulher, a vítima tenha assistência psicológica, visando garantir a proteção da sua integridade psíquica e emocional. Sob esse viés, sabe-se que o atendimento psicológico deve estar presente em toda a equipe de assistência jurídica e nas DEAMs. Isso porque, de acordo com Hirigoyen (2005) o indivíduo que está em juízo não é mais senhora do que pensa, pois ela está literalmente invadida pelo psiquismo do parceiro e não possui um espaço mental próprio.

Com o fito de velar pela Constituição e pelas Leis brasileiras, é válido destacar o papel do Ministério Público como órgão fiscalizador. Posto que, por meio dele, as vias para promover dignidade às mulheres vítimas de violências serão efetivadas. Dessa forma, é elementar o entendimento apontado por Castilho (2006) sobre a atuação do Ministério Público no âmbito em questão:

O Ministério Público tem a obrigação de intervir nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher; de requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social, entre outros; de fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, bem como de adotar as medidas cabíveis para sanar as irregularidades constatadas (CASTILHO, p. 02, 2006)

Dessa forma, compreende-se que existem inúmeros meios legais de assegurar os direitos das mulheres, especialmente a sua dignidade, evidenciando-se o princípio da isonomia. É essencial, portanto, a utilização dos meios legais necessários para a garantia da dignidade, de forma a preservar os direitos da mulher.

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