O artigo 6º da lei 8.060/90, o ECA – Estatuto da Criança e do adolescente, define a criança ou adolescente como pessoa em desenvolvimento. E a responsabilidade na criação, educação e assistência ao desenvolvimento dessas pessoas é primeiramente dos pais. Essa determinação, inclusive, se faz presente no artigo 229 da Constituição Federal:
"Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade."
Entende-se, portanto que a responsabilidade é de ambos.
Porém, é sabido que, em casos de separação e divórcio dos pais, dificilmente há uma relação de bom senso no tocante aos filhos. Como também é de amplo conhecimento, que, na maioria dos casos, por razões de costume e outros fatores, a permanência dos filhos menores geralmente é com a mãe. No entanto, não há nenhum impedimento legal para que a criança ou adolescente permaneça com o pai. O que existe é a averiguação de quem possui as melhores condições e capacidades para atender aos interesses da criança ou adolescente.
A lei 13.058/14 que alterou os dispositivos 1.583 1.584, 1.585 e 1.634 do Código Civil estabelece inclusive que, por via de regra, a guarda será compartilhada, ou seja, ambos os pais possuem responsabilidades compartilhadas e poderes igualitários em relação à criação dos filhos.
"Art. 1.583: A guarda será unilateral ou compartilhada.
§ 1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
§ 2º Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos."
A questão levada em conta em relação à fixação da residência com o pai ou mãe será a que melhor convir às necessidades da criança ou do adolescente.
Porém, a guarda compartilhada não anula a obrigação de pagar a pensão alimentícia aos filhos. Como já mencionado, a responsabilidade quanto aos deveres de criação é de ambos. Já o valor da prestação alimentícia será avaliado de acordo com a necessidade da criança e do adolescente e da possibilidade econômica de cada um.
Diante desse cenário, nada impede que a criança ou adolescente tenha residência com o pai e a mãe tenha a obrigação de pagar alimentos.
E sobre o dever de pagar alimentos aos filhos menores, deve-se levar em conta que essa não é apenas uma obrigação formal advinda de uma determinação judicial: a pensão alimentícia está ligada ao desenvolvimento da criança ou adolescente, visando a alimentação, o vestuário, o lazer, os remédios, os materiais escolares, etc.
Aquele tem que a obrigação de prestar os alimentos e não o faz, de forma intencional, está cometendo crime de abandono material, conforme leciona o artigo 244 do Código Penal:
“Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo:
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Parágrafo único - Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.”
Reitera-se que o crime se configura quando a pessoa que tem a obrigação de providenciar ajuda financeira para cônjuge, filhos menores ou até pais idosos em necessidade deixa de fazê-lo, de forma injustificada. No entanto, existem três ações ou verbos nucleares em relação ao abandono material, que são: frustrar o pagamento da pensão alimentícia, não socorrer ascendente ou descendente gravemente enfermo ou ainda injustificadamente deixar de prover a subsistência da vítima.
Esse ponto é o crucial, pois na tentativa de furtar-se do adimplemento da obrigação, alguns devedores chegam a largar o emprego para não pagar a pensão. Ou então desaparecem para não pagar, mentem em relação ao salário, aos gastos, apenas para pedir redução ou exoneração da pensão. O que eles esquecem é que a pensão alimentícia é um direito, e não um favor que está sendo prestado. E em relação aos alimentos para a criança ou adolescente, pouco importa se o outro genitor possui ou não condições, não existe a possibilidade de se eximir ao pagamento dos alimentos.
Além do crime de abandono material, o não cumprimento no pagamento da pensão também configura ilícito civil, punível com prisão de até 90 dias, negativação do nome, suspensão da carteira nacional de habilitação, suspensão do passaporte, entre outras medidas.
Portanto, a consciência no que diz respeito às obrigações intrínsecas de pai ou mãe vai dos valores morais de cada um, sendo assim, permitir que um filho passe por qualquer tipo de privação ou necessidade, de qualquer espécie, diz muito mais sobre o caráter da pessoa que age de maneira dolosa voluntariamente contra seu próprio descendente.
FONTES:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13058.htm
https://www.conjur.com.br/2021-ago-26/moretzsohn-burin-pensao-alimenticia-crime-abandono-material