O presente artigo visa demonstrar a equiparação das milhas aéreas aos valores bancários. As milhas aéreas, hoje em dia, possuem as principais funções da moeda na economia, equiparando-se a elas. Desse modo, a falha de segurança da empresa aérea na guarda desses valores resulta na responsabilidade objetiva da empresa em ressarcir seus consumidores.
A moeda desempenha três funções principais na economia: meio de troca, utilidade de conta e reserva de valor. Ela, portanto, serve como meio de troca para adquirirmos bens e serviços, como utilidade de conta para medir o valor de bens e serviços, e como reserva de valor já que podemos guarda-las para uso futuro.
As milhas áreas possuem as três funções principais da moeda. Hoje em dia, nós podemos utilizar as milhas para adquirirmos não só passagens, mas também outros produtos. Ademais, nós podemos troca-las por dinheiro ou guarda-las para utilização futura. Desse modo, encontram-se presentes as 3 funções da moeda.
Assim, em relação às milhas, a companhia aérea deve ser equiparada às instituições financeiras quanto a sua responsabilização. Logo, uma falha interna que acarrete extravio dos pontos (milhas) de um consumidor deve ser analisada igualmente ao sistema bancário.
Vejamos a responsabilização das instituições bancárias pela guarda de bens e valores.
De acordo com a Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Nesse sentido, os bancos têm responsabilidade ativa sobre o prejuízo, de acordo com o entendimento baseado no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Assim, um banco tem responsabilidade total se o consumidor tem problemas com a segurança dos dispositivos de acessos aos serviços bancários.
Quem procura uma instituição financeira e contrata um produto que pode ser acessado pelo celular, deposita sua confiança e boa-fé no banco. Além disso, as instituições financeiras vendem os serviços financeiros digitais como facilidades. Desse modo, elas vendem aos seus consumidores segurança e praticidade como diferenciais. Por isso, uma falha no sistema de segurança da instituição não apenas revela deficiência nos serviços prestados, mas, também, causa transtornos e incômodos ao correntista.
As instituições financeiras exploram a atividade econômica. Logo, elas são responsáveis por garantir a segurança de seus próprios sistemas e, no caso de falhas que possam gerar prejuízos ao consumidor, por garantir o devido ressarcimento. Isso porque o monitoramento das transações bancárias é inerente à atividade bancária. Logo, ela está abarcada nos riscos do negócio. Nesse sentido, cabe aos bancos a guarda e a vigilância dos patrimônios de seus correntistas.
A disponibilização de tecnologias para a realização de transações a distância, como forma de captar cliente, necessita de tecnologias com segurança compatível a essa prática, com o intuito de conferir a idoneidade das transações, sob pena de ineficiência dos serviços.
Não obstante, os artigos 12º e 14º do CDC serem aplicáveis, trazendo a responsabilidade objetiva, o enunciado 479 da Súmula do STJ, nesse sentido, consagra, também, o entendimento de que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos ilícitos de terceiro no campo de sua atividade bancária. As instituições financeiras, portanto, respondem objetivamente pelos danos gerados relativos a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito das operações bancárias. Desse modo, a fornecedora responde por qualquer atividade que esteja vinculada à sua atuação. Trata-se do risco do empreendimento, e a instituição financeira deve arcar com o risco.
Em suma, a instituição bancária é responsável pela segurança das operações realizadas pelos seus clientes.
A natureza objetiva da responsabilidade do banco, atuante no sistema bancário, impõe que ele assume o risco inerente à tal atividade, ou seja, que garanta a segurança das operações realizadas por meios eletrônicos, assim como daquelas efetivadas no interior das agências, postos de atendimento ou caixas eletrônicos, não devendo permitir a livre ação de fraudadores.
Outrossim, bem se sabe que os sistemas eletrônicos das instituições financeiras não são à prova de falhas, devendo elas serem responsabilizadas pelos métodos de pagamentos colocados à disposição dos consumidores.
Ademais, segundo Guilherme Farid Mischi Bou Cheb, Diretor do PROCON, o posicionamento do Procon é o de que o banco tem a obrigação de monitorar o perfil daquele consumidor e não autorizar transações fora do perfil.
O banco, portanto, deve manter o ambiente seguro. Se ele disponibiliza o aplicativo, faturando com isso, ele assume o risco do negócio. Assim, ele deve bloquear as transações suspeitas, como procedimento de segurança. Por isso, mecanismos devem ser criados para proteger os correntistas. O mau controle dos bancos sobre os procedimentos de segurança, em lançamentos na conta bancária e no ressarcimento de débitos indevidos, caracteriza um descaso com o consumidor, demonstrando uma alta desconfiança em relação ao seu cliente (pouca investigação e muita desconfiança).
Ao trocarmos as palavras banco e instituição financeira por companhia aérea, notamos que todo o exposto é aplicável às empresas aéreas quando o assunto é milhas. As empresas aéreas se utilizam das milhagens para fidelizar consumidores e atraí-los para suas empresas. Desse modo, uma falha na segurança desses valores leva à responsabilização objetiva da empresa. Isso porque, também, aplica-se a teoria do risco do negócio, já que ela se vale da emissão de valores (milhagens) e guarda desses para atrair consumidores, ou seja, aufere os ônus, ela deverá, no mesmo sentido, suportar os bônus, que seria o risco de furto/extravio. A empresa aérea não é obrigada a fornecer tais serviços, mas a partir do momento que os disponibiliza, ela deverá tomar todas as cautelas necessárias para seu seguro fornecimento.
Assim, em relação ao extravio dos pontos, a jurisprudência, em especial no TJSP, já vem adotando que uma falha no sistema de segurança da instituição aérea revela deficiência nos serviços prestados. Assim, tal ocorrido se enquadra no fato do produto e do serviço, que é quando eles não entregam a segurança que razoavelmente deles se esperam. Nesse sentido, os artigos 12º e 14º do CDC são aplicáveis, trazendo a responsabilidade objetiva as empresas aéreas, que são fornecedoras de serviço e de produto, e, portanto, devem garantir a segurança das operações realizadas por seus meios eletrônicos, bem como a aplicação análoga da Súmula 479 do STJ.