Artigo Destaque dos editores

A COFINS das instituições financeiras

Exibindo página 5 de 6
Leia nesta página:

VIII. A COFINS DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

111. A tese defendida pelas instituições financeiras implica um reducionismo similar às primeiras controvérsias da COFINS sobre o alcance da expressão faturamento, exclusivo, para alguns, daqueles que expedem faturas. Quem não expedir fatura não tem faturamento, seria a conseqüência lógica de tal visão reduzida.

112. Nessa senda caminham as instituições financeiras. Com efeito, sustentam que somente há faturamento onde houver venda de mercadorias ou de serviços ou de mercadorias e serviços, venda esta remunerada mediante um preço. Afirmam que as instituições financeiras não vendem nem cobram preços, por conseqüência não faturam. E, se não obtêm faturamento, não podem sofrer a incidência da COFINS.

113. Se não fosse a respeitabilidade dos eminentes pareceristas e o alto grau de seriedade acadêmica norteadora de suas brilhantes carreiras, uma tese tão canhestra dispensaria maiores digressões. Sucede, por seu turno, que se trata de ilustrados professores que, nada obstante, fizeram verdadeiro "malabarismo" jurídico em defesa dos interesses das instituições financeiras.

114. A todo custo, mediante um contorcionismo conceitual, procuraram demonstrar que do texto constitucional extrai-se a não incidência da COFINS sobre as instituições financeiras, e o fizeram alegando que a própria Constituição destinou-lhe um capítulo exclusivo (art. 192) e, ainda, que a tributação dos serviços compete ao Município (art. 156, III), nos termos da Lei Complementar n.116, de 31.07.2003.

115. Com as vênias de estilo, a existência de um capítulo destinado ao "Sistema Financeiro" não exime às instituições financeiras de uma interpretação sistemática, posto que elas fazem parte de um todo maior contido no "Sistema Jurídico-Constitucional". Imaginar, só por só, que o fato de merecerem um destaque constitucional as liberta das responsabilidades que outras instituições econômicas estão adscritas, especialmente de natureza contributiva e, de modo mais específicos, da seguridade social, é desprezar o real alcance da idéia de solidariedade e justiça social positivada em uma Constituição de um Estado que ser quer Democrático e de Direito. Em nenhuma parte do texto constitucional encontra-se um tratamento diferenciado – e para melhor – no sentido de redução dos encargos estatais para as instituições financeiras.

116. No tocante à exclusiva tributação dos Municípios sobre os serviços, a tese é insubsistente. Com efeito, a competência dos Municípios é para instituir impostos sobre os serviços de qualquer natureza. A COFINS não é imposto, é contribuição e tem seu suporte constitucional no art. 195, I. O fato de o legislador complementar (LC 116/2003) não tributar os serviços financeiros não os desqualifica como serviço. Do contrário, o inciso III do art. 2º da LC 116/2003 só reforça que os serviços financeiros são serviços, pois houve necessidade de expressa determinação legal estabelecendo a não incidência do ISSQN sobre eles.

117. A mesma linha de raciocínio é usada em relação ao parágrafo único do art. 11 da LC 70/91 que exclui do pagamento da COFINS as instituições financeiras. Entendem que houve por parte do legislador um reconhecimento de que as receitas típicas da atividade financeira não pertencem ao conjunto de hipóteses abrangido pelo conceito de faturamento. Ora, só se exclui o que estava incluso.

118. Concessa venia, se houve a necessidade de expressa disposição legal, assim como na hipótese do ISSQN, excluindo as instituições financeiras do recolhimento da COFINS é porque, em princípio, elas também se sujeitam a esse tributo.

119. A exclusão do parágrafo único do art. 11 da LC 70/91 foi uma opção política do legislador tributário, justificada pelo caput do referido artigo que determinava o aumento da alíquota da CSLL para as instituições financeiras.

120. Vislumbrar uma política fiscal do legislador como reconhecimento de que uma determinada operação ou atividade econômica não se afivela a uma tipologia tributária é distorcer a realidade das coisas. Se assim não fosse, tornar-se-ia imprescindível que o legislador dissesse que as receitas típicas das instituições financeiras não compõem o seu faturamento. O legislador não disse isso. E não o fez porque maltrataria a realidade, seria desarrazoado fazê-lo. O legislador pode até dizer que as receitas financeiras típicas são desoneradas de qualquer tributo, mas se disser que essas receitas típicas não compõem o faturamento estaria cometendo uma violência conceitual.

121. Veja-se que o legislador constituinte, mediante o instituto da imunidade tributária, exclui a venda de livros do pagamento de ICMS. Acaso o livro deixa de ser uma mercadoria? O legislador constituinte também exclui os templos religiosos do pagamento de IPTU, acaso deixam de ser imóveis prediais? Na esteira das teses das instituições financeiras os templos religiosos não são imóveis prediais, pois não pagam o IPTU nem os livros são mercadorias porquanto imunes ao ICMS. Maltrata a lógica do razoável entender que eventuais desonerações tributárias sirvam para alterar a substância das coisas.

122. Esse tema – a COFINS das instituições financeiras -, a despeito de sua novidade, já foi enfrentado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional em Parecer da lavra da dra. Cláudia Regina Gusmão, Coordenadora-Geral de Assuntos Tributários da PGFN.

123. A Receita Federal, mediante a Nota Técnica COSIT n. 21, de 28.08.2006, consultou a PGFN acerca da natureza jurídica das receitas decorrentes das atividades do setor financeiro e de seguros à luz da decisão do STF nos aludidos recursos extraordinários.

124. Em seu Parecer, a PFN Cláudia Regina Gusmão esclarece:

"É preciso deixar claro, em primeiro lugar, que o STF no RE 357.950 examinou os arts. 2º e 3º da Lei n. 9.718/98, considerando inconstitucional apenas o § 1º do art. 3º da referida Lei, o que significa dizer que os artigos citados foram tidos por constitucionais, somente estando em desacordo com a Constituição a expansão da base de cálculo das contribuições em causa, na forma do parágrafo único afinal expurgado do ordenamento. Em assim sendo, cabe perquirir quais as atividades das entidades em causa estavam incluídas no parágrafo e quais se encontravam já contempladas tanto no art. 2º, quanto no caput do art. 3º da referida Lei."

125. Após digressões fundamentais acerca do princípio da solidariedade tributária, inclusive com apoio em jurisprudência do STF, mormente no julgamento do RE n. 230.337, no qual o Supremo entendeu devida a incidência da COFINS sobre o faturamento das empresas distribuidoras de derivados de petróleo, mineradoras, distribuidoras de energia elétrica e executoras de telecomunicações, e de analisar a exclusão do pagamento da COFINS nos termos do art. 11, parágrafo único, LC 70/91, afirma:

"Tal exclusão, levada a efeito pela referida Lei Complementar deixa patente que não fosse a norma do art. 11, as instituições incluídas no § 1º do art. 23 da Lei n. 8.212/91, ficariam submetidas à exação da mesma forma que todas as pessoas jurídicas. Em assim sendo, não há que se discutir relativamente ao alcance da Contribuição e a efetiva sujeição das instituições nessa cobrança, pois não se pode conceber exclusão de quem não estava incluído. A única discussão que pode ser admitida é a relativa à ampliação da base de cálculo trazida pelo §1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98, declarado inconstitucional pelo STF. E nem poderia ser diferente, visto que o legislador, como afirmado alhures, estava obrigado a incluir toda a sociedade, mormente o segmento em destaque, possuidor, a toda evidência, de incontestável capacidade contributiva (§ 1º do art. 145 da CR).

Isto significa dizer que a noção de faturamento a ser considerada é aquela prevista na Lei Complementar n. 70/91, exposta no art. 2º, e mantida e ampliada, em essência, pela Lei n. 9.718/98, que, como vimos, permanece incólume (salvo no que tange à ampliação). Ora, se as instituições em pauta estão incluídas na noção de faturamento (receita bruta) da Lei n. 9.718/98, por força do seu art. 2º, restaria perguntar-se, de forma a espancar qualquer dúvida quanto à hipótese de incidência e base de cálculo discutida, qual a natureza jurídica das receitas auferidas pelas instituições referidas no § 1º do art. 23 da Lei n. 8.212/91."

126. Para responder a essa fundamental questão, a Procuradora da Fazenda Nacional traça considerações acerca do Sistema Financeiro Nacional, conforme o disposto na Constituição da República e na legislação pertinente.

127. Com efeito, o art. 192 da Constituição conecta-se com o art. 170, ao perspectivar o Sistema Financeiro como um instrumento de promoção do desenvolvimento equilibrado do País, a serviço dos interesses da coletividade. A própria FEBRABAN tem como lema: "Um sistema financeiro saudável, ético e eficiente é condição essencial para o desenvolvimento econômico e social do País". A Fazenda Nacional concorda plenamente com essas premissas.

128. A ilustrada Procuradora analisa o conceito legal de instituição financeira disposto no art. 17 da Lei n. 4.595, de 31.12.1964 (Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros) e acolhe o entendimento do dr. Francisco Arnoldo de Assis manifestado no Parecer PGFN/CAF n. 334/2001 acerca do conceito de instituição financeira:

"Sustentada pela maioria dos doutrinadores brasileiros e encontrando guarida na maioria das decisões de nossos Tribunais, a melhor interpretação do conceito de instituição financeira é ainda aquela antiga, segundo a qual há necessidade de conjugação dos três pressupostos do caput do art. 17 da Lei n. 4.595/64 – coleta, intermediação e aplicação de recursos próprios e de terceiros para a caracterização da atividade financeira, atividade privativa das instituições autorizadas a funcionar e fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil.

Sendo este o conceito de Instituição Financeira, do mesmo dispositivo legal é possível extrair-se as atividades desenvolvidas pela mesma: ‘coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros".

129. Em seu cogitado Parecer, a PFN Cláudia Regina Gusmão recorda o estreito relacionamento entre os conceitos de faturamento e receita bruta, a partir da jurisprudência do STF, e acerta com precisão o sentido das inovações legislativas da COFINS:

"O legislador ordinário, por meio da Lei n. 9.718/98, buscou ampliar o conceito de receita bruta (art. 3º, caput) definindo esta como ‘a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas (art. 3º, § 1º).

Em suma: a Lei n. 9.718/98 manteve a equivalência semântica (sinonímia) entre faturamento e receita bruta, para o fim de aferição da base de cálculo da COFINS/PIS, mas ampliou o conceito desta última.

Podemos, assim, dizer que a Lei Complementar n. 70/91 utiliza um conceito restritivo de receita bruta, e a Lei n. 9.718/98 serve-se de um conceito ampliativo (incluindo as receitas não operacionais)".

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

130. Ao nosso sentir, eis o alcance da decisão do STF que julgou inconstitucional o § 1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98: as receitas não operacionais estão fora da base de cálculo da COFINS, pois não integram o seu faturamento; mas as operacionais fazem parte do faturamento, e, conseqüentemente, estão na base de cálculo da COFINS.

131. Os Ministros Cezar Peluso e Carlos Britto partejaram, explicitamente, esse entendimento em seus votos, no que foram acompanhados pelo Ministro Sepúlveda Pertence.

132. Provocados, alguns Ministros do STF têm rechaçado as tentativas das instituições financeiras no sentido de excluírem da base de cálculo da COFINS suas receitas operacionais típicas, com o não acolhimento de suas pretensões (v.g. RE n. 508.386, Relator Ministro Celso de Mello; RE n. 433.077, Relatora Ministra Cármen Lúcia). Até o presente momento, a pretensão das instituições financeiras não tem encontrado eco no STF.

133. No Colendo Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial n. 827.194, o Ministro Teoria Albino Zavascki, em julgamento de uma empresa locadora de mão-de-obra, ferindo o PIS e o art. 1º, itens, da Lei n. 10.637, pontificou:

"Salvo, portanto, se afigurarem entre as deduções previstas no § 3º, todas as receitas auferidas pela empresa compõem a base de incidência da contribuição. Note-se que, mesmo entre as deduções admitidas, nenhuma tem em conta a destinação dos recursos (critério com base no qual a impetrante pretende a exclusão dos valores direcionados ao pagamento dos salários e dos demais encargos trabalhistas). Ora, não há dúvida de que tais valores integram o faturamento das empresas intermediadoras de mão-de-obra, uma vez que lhe são alcançados pelas tomadoras de serviços, caracterizando, assim, tipicamente, ‘receita bruta da venda de bens e serviços’. A peculiar composição dos custos das empresas do ramo de intermediação de mão-de-obra – que determina o direcionamento de grande parte, ou até mesmo da maior parte, de suas receitas à remuneração dos empregados postos à disposição de outras empresas – nenhuma influência tem para fins de determinação do faturamento, uma vez que a lei não considera, para esse fim, a destinação das receitas.

As mesmas considerações são válidas para a COFINS, cuja base de cálculo está fixada em dispositivo de teor praticamente igual ao do acima reproduzido (art. 1º da Lei n. 10.833/03)".

134. Ou seja, a base de cálculo da COFINS, segundo o estabelecido pelo STF, à luz da Lei n. 9.718/98 e da redação originária do inciso I do art. 195, CR, é a receita bruta operacional (faturamento) correspondente à totalidade dos ingressos auferidos mediante a atividade típica da empresa, de acordo com o seu objeto social, independentemente da natureza da atividade ou da empresa.

135. Sendo assim, somente estarão excluídas da base de cálculo aquelas receitas não-operacionais ou aquelas que estejam legal e explicitamente discriminadas. O que não for discriminado por lei está incluso na base de cálculo do tributo respectivo. Prestam-se reverências a regra da estrita legalidade e o princípio da universalidade, próprios das contribuições sociais.

136. Pois bem, retornando ao Parecer da ilustre PFN Cláudia Regina Gusmão, apreende-se que as instituições financeiras são sociedades que trabalham na intermediação de capital, recebendo e repassando numerário. O spread bancário, continua a ilustre parecerista da Fazenda, é a remuneração recebida pela aludida intermediação, ou seja, é a diferença entre o que o banco paga para captar numerário e o valor cobrado quando do empréstimo a quem o procura.

137. Após explicitar a definição de spread bancário do Banco Central, que não discrepa da sua, busca apoio no magistério de Ruy Rosado de Aguiar (Os contratos bancários e a jurisprudência do STJ, CEJ, 2003), que ensina:

"Juro é fruto do dinheiro. É o que o credor recebe do devedor, além da importância da dívida. ‘Entende-se por juros o que o credor pode exigir pelo fato de ter prestado ou não ter recebido o que se lhe devia presta’ (P. de Miranda).

Hoje, porém, não significa apenas o fruto civil do capital, pois passou a ser importante instrumento de política monetária, juntamente com o câmbio, o comércio exterior e a regulação da moeda e do crédito, servindo para controlar o fluxo financeiro.

Para o cálculo dos juros, considera-se o custo de captação do dinheiro, a sobretaxa do banqueiro, a desvalorização da moeda e, por fim, os riscos operacionais, pois, quanto maior a possibilidade de inadimplência, maior o risco. ‘O crédito de juros nasce a determinado momento, periodicamente, como se pingasse da quantia devida, sem a diminuir’ (Pontes, op. loc. cit.). No Brasil de hoje, com as taxas praticadas, o pingo se torna maior que o balde após alguns meses de juros capitalizados. ‘De acordo com o relatório ‘Juros e Spread Bancário no Brasil’, elaborado pelo BC, o spread está composto por: 16% pela inadimplência; 19% por despesas administrativas; 29% por impostos; 36% pela margem líquida do banco. Margens de lucro tão elevadas garantem os lucros astronômicos dos bancos brasileiros, muito acima da média mundial’ (editorial da Folha de São Paulo, 6.2.2003, A/2). Como se vê, a alegação corrente de que o spread é elevado por causa da inadimplência não procede, pois a sua maior parcela, quase o triplo, corresponde ao lucro; reduzido o quantitativo deste, certamente seria o menor o índice de inadimplência. Nos países em que é menor o índice de inadimplência, é significativamente menor o percentual do lucro".

138. Eis o "preço" - ou "remuneração" - cobrado pelas instituições financeiras daqueles que buscam os seus serviços típicos. Eis o principal ingresso componente de seu faturamento. Eis a origem maior de suas receitas operacionais típicas.

139. A PFN Cláudia Regina Gusmão recorda a decisão do STF na ADIN 2.591, na qual a Corte estabeleceu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90) às atividades das instituições financeiras. Nesse julgamento, o Tribunal entendeu que o § 2º do art. 3º do CDC (serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista), deixando claro que a atividade financeira é constituída por serviços que são disponibilizados aos clientes, dentre os quais se inclui a intermediação financeira.

140. Daí preceitua, alicerçada no magistério de Alfredo Augusto Becker e de Aires Fernandino Barreto, que os serviços financeiros são serviços tributáveis, entendidos como "o desempenho de atividade economicamente apreciável, produtiva de utilidade para outrem, porém sem subordinação, sob regime de direito privado, com fito de remuneração".

141. Nesse particular, relativo à remuneração, encontra-se a única diferença entre a prestação de serviços financeiros e os demais serviços prestados pelas instituições financeiras, como perspectivou a eminente PFN Cláudia Regina Gusmão em seu alentado Parecer:

"De fato, a receita auferida pelos serviços de fornecimento de talão de cheques, extratos, compensação de cheques, etc., é proveniente de pagamentos diretos feitos pelos clientes (por meio do débito automático de tarifas correspondentes nas contas de depósito dos mesmos). Por outro lado, as receitas provenientes dos serviços de intermediação ou aplicação de recursos são decorrentes exatamente de tais transações, ou seja, correspondem à diferença apurada entre os valores originariamente aplicados, o seu rendimento, e o valor que contratualmente deve ser devolvido ao aplicador ao final da operação, o que se convencionou chamar de spread, como já demonstrado."

142. Ainda, em sede da prestação de serviços financeiros, o Parecer ancorou-se nas normas internacionais do GATS (Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços), em particular o item 5 do Anexo sobre os Serviços Financeiros.

143. Com acerto, Cláudia Regina Gusmão demonstra que as instituições financeiras são prestadoras de serviços e que, a partir das diretrizes do GATS, e fulcrado no art. 98 do CTN e na jurisprudência do STF (ADIN 1.480), as normas tributárias internacionais são recebidas com a mesma hierarquia das leis tributárias ordinárias. De sorte que, ineludivelmente, não compreender como prestação de serviços a atividade financeira típica das instituições financeiras é solapar todo o sistema jurídico, afinal a jurisprudência do STF (ADIN 2.591), o CDC (arts. 3º, § 2º, e 52), a Lei n. 4.595/64 (art. 17), o GATS e a legislação tributária assim estabelecem, ou seja, que a atividade típica das instituições financeiras é a prestação de serviços.

144. Com rigor doutrinário, Cláudia Regina Gusmão leciona:

"O direito tributário obedece ao primado da oneração da capacidade contributiva. A superada noção de mercadoria e serviço para o direito comercial e bancário não pode servir de fundamento para a desoneração tributária de um segmento empresarial que exerce o comércio e desfruta de absoluta capacidade econômica e financeira para suportar o encargo. O faturamento, sob a perspectiva tributária, e desde a Lei Complementar n. 70/91, apesar da declaração de inconstitucionalidade da base ampliada, corresponde à receita bruta de vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza. Nesse sentido, compreende a totalidade das receitas advindas com as atividades principais ou acessórias que compõem a receita operacional da pessoa jurídica. O resultado da atividade de intermediação financeira, apesar de não sujeita à ação de faturar, constituindo ato de comércio e decorrendo da própria atividade negocial da empresa, integra o seu faturamento para os efeitos fiscais de concretizar o fato gerador da COFINS/PIS.

O relevante para a norma é a identidade entre a receita bruta operacional e a atividade mercantil desenvolvida nos termos do objeto social da pessoa jurídica. A declaração de inconstitucionalidade, pelo STF, do § 1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98, s.m.j., não alterou, nesse particular, o critério definidor da base de incidência da COFINS/PIS como o resultado econômico da atividade empresarial vinculada aos seus objetivos sociais. Ao revés, apenas firmou o entendimento de que não é qualquer receita que pode ser considerada faturamento para fins de incidência da COFINS/PIS (v.g. Receitas de Capital de locadora de veículos), mas apenas aquelas vinculadas à atividade mercantil típica da empresa, como é o caso das operações bancárias das instituições financeiras".

145. Segundo a ilustre Parecerista, o fato de ter havido redução da alíquota da CSLL para as instituições financeiras demonstra o caráter sistêmico do ordenamento jurídico-tributário, pois se essas empresas estiverem eximidas do recolhimento da COFINS, estar-se-ia diante de uma manifesta injustiça tributária, em desacordo com os princípios da isonomia, capacidade contributiva, universalidade e solidariedade. A mencionada redução da alíquota da CSLL está no bojo da inserção das instituições financeiras como contribuintes da COFINS.

146. A PFN Cláudia Regina Gusmão, com pena de ouro, arrematou:

"a) as instituições financeiras e as seguradoras estavam isentas da cobrança da COFINS anteriormente à entrada em vigor da Lei n. 9.718/98 (parágrafo único do art. 11 da Lei Complementar n. 70/91), mas recolhiam a CSLL com alíquota majorada (caput do mesmo art. 11);

b) as instituições financeiras e as seguradoras já recolhiam a contribuição para o PIS, mesmo anteriormente à entrada em vigor da Lei n. 9.718/98 (Lei n. 9.701/98);

c) relativamente ao PIS e a COFINS, a partir da entrada em vigor da Lei n. 9.718/98, as instituições financeiras e as seguradoras passaram a ser tributadas com base no art. 2º da citada Lei, o qual estabelece como base de cálculo dessas contribuições o faturamento, conceituado pelo caput do art. 3º como sendo ‘a receita bruta da pessoa jurídica’;

d) o § 1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98 que ampliou o conceito de receita bruta para abarcar as receitas não operacionais foi considerado inconstitucional pelo STF nos RREE ns. 346.084, 357.950, 358.273 e 390.840;

e) a declaração de inconstitucionalidade citada na letra ‘d’ não tem o condão de modificar a realidade de que para as instituições financeiras e as seguradoras a base de cálculo da COFINS e do PIS continua sendo a receita bruta da pessoa jurídica, com as exclusões contidas nos §§ 5º e 6º do mesmo art. 3º, sem abarcar, todavia, as receitas não operacionais, eis que o art. 2º e o caput do art. 3º não foram declarados inconstitucionais;

f) no caso da COFINS o conceito de receita bruta é o contido no art. 2º da LC 70/91, isto é, as receitas advindas da venda de mercadorias e da prestação de serviços;

g) no caso do PIS o conceito de receita bruta é o contido no art. 1º da Lei n. 9.701/98;

h) serviços para as instituições financeiras abarcam as receitas advindas da cobrança de tarifas (serviços bancários) e das operações bancárias (intermediação financeira);

i) serviços para as seguradoras abarcam as receitas advindas do recebimento dos prêmios;

j) as afirmações contidas nas letras ‘h’ e ‘i’ decorrem: do princípio da universalidade na manutenção da seguridade social (caput do art. 195 da CR/88), do princípio da capacidade contributiva (§ 1º do art. 145 da CR/88), do item 5 do Anexo sobre Serviços Financeiros do GATS e promulgado pelo Decreto n. 1.355, de 30.12.1994 (art. 98 do CTN), do inc. III do art. 2º da LC n. 116/2003 e dos arts. 3º, § 2º e 52 do CDC."

147. Com essas conclusões e partindo da premissa verdadeira de que a natureza das receitas decorrentes das atividades do setor financeiro e de seguros pode ser classificada como serviços para fins tributários, sujeitando-se, portanto, à incidência das contribuições do PIS e da COFINS, exceto no plus contido no § 1º do art. 3º da Lei n. 9.718/98, decretado inconstitucional pelo STF, a ilustre PFN Cláudia Regina Gusmão põe cobro às teses inaceitáveis das instituições financeiras de se verem exoneradas do pagamento do PIS e da COFINS, com um tratamento discriminatório em relação às demais pessoas jurídicas.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Luís Carlos Martins Alves Jr.

Piauiense de Campo Maior; bacharel em Direito, Universidade Federal do Piauí - UFPI; doutor em Direito Constitucional, Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; professor de Direito Constitucional, Centro Universitário do Distrito Federal - UDF; procurador da Fazenda Nacional; e procurador-geral da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico - ANA. Exerceu as seguintes funções públicas: assessor-técnico da procuradora-geral do Estado de Minas Gerais; advogado-geral da União adjunto; assessor especial da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Presidência da República; chefe-de-gabinete do ministro de Estado dos Direitos Humanos; secretário nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; e subchefe-adjunto de Assuntos Parlamentares da Presidência da República. Na iniciativa privada foi advogado-chefe do escritório de Brasília da firma Gaia, Silva, Rolim & Associados – Advocacia e Consultoria Jurídica e consultor jurídico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB. No plano acadêmico, foi professor de direito constitucional do curso de Administração Pública da Escola de Governo do Estado de Minas Gerais na Fundação João Pinheiro e dos cursos de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG, da Universidade Católica de Brasília - UCB do Instituto de Ensino Superior de Brasília - IESB, do Centro Universitário de Anápolis - UNIEVANGÉLICA e do Centro Universitário de Brasília - CEUB. É autor dos livros "O Supremo Tribunal Federal nas Constituições Brasileiras", "Memória Jurisprudencial - Ministro Evandro Lins", "Direitos Constitucionais Fundamentais", "Direito Constitucional Fazendário", "Constituição, Política & Retórica"; "Tributo, Direito & Retórica"; "Lições de Direito Constitucional - Lição 1 A Constituição da República Federativa do Brasil" e "Lições de Direito Constitucional - Lição 2 os princípios fundamentais e os direitos fundamentais" .

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES JR., Luís Carlos Martins. A COFINS das instituições financeiras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1561, 10 out. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10518. Acesso em: 26 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos