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Considerações sobre o procedimento no Júri Popular

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Resumo:


  • O processo penal para crimes de competência do Tribunal do Júri Popular é dividido em duas fases: judicium accusationis e judicium causae.

  • Na fase do judicium accusationis, o procedimento é semelhante ao comum para crimes apenados com reclusão, culminando nas alegações finais.

  • Após as alegações finais, o juiz pode ordenar diligências necessárias para sanar nulidades, e posteriormente decidir entre desclassificação, absolvição sumária, impronúncia ou pronúncia do réu.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

No processo penal, o procedimento para a apuração dos crimes de competência do Tribunal do Júri Popular se divide em duas fases: o judicium accusationis e, em seguida, o judicium causae. O primeiro em nenhum ponto diverge do procedimento comum para os crimes apenados com reclusão, que corre em face do juiz singular, tendo início com o oferecimento da denúncia  (art.394, CPP) e chegando a seu termo na fase das alegações finais  (art.406, CPP). Nas alegações derradeiras, o representante do Ministério Público, o querelante e o assistente, ordinariamente, pedem a pronúncia do acusado, nada impedindo, porém, que seja requerida a impronúncia ou mesmo a absolvição sumária do réu, em face das provas coligidas aos autos. A defesa, por sua vez, manifestar-se-á pela impronúncia, pela desclassificação ou pela absolvição sumária. É nulo o processo em que o defensor pede a pronúncia de seu constituinte, posto que configurado o cerceamento de defesa. Não gera nulidade, no entanto, o fato do defensor postergar, para os debates em plenário, a apresentação de sua tese, o que pode se configurar em estratégia de defesa. A nulidade só ocorre quando a oportunidade de apresentar alegações lhe é vedada.

          Quando o processo, após as alegações finais das partes, encontra-se concluso para o juiz do feito, decorre que o procedimento do Júri Popular adquire feições próprias  (arts.406 a 497, CPP).

          Concluída a fase do art.406 (1), o juiz poderá ordenar as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou suprir qualquer falta que porventura prejudique o esclarecimento da verdade, podendo, inclusive, promover inquirição de testemunhas, referidas ou, embora requeridas pelas partes, ainda não ouvidas   (art.407, CPP).

          Retornando os autos após as diligências, se for o caso, o juiz se depara com quatro alternativas: a desclassificação, a absolvição sumária, a impronúncia e, finalmente, a pronúncia do réu. Analisemo-las pormenorizadamente.


Desclassificação

          A desclassificação ocorre quando o juiz entende, a partir do convencimento formado em face das provas colhidas nos autos, que se trata de um outro crime, desta feita, a escapar à competência do Tribunal do Júri. Diz o art.410 que, quando o juiz se convencer, em discordância com a denúncia ou queixa, da existência de crime diverso dos referidos no art.74, §1°, onde são descriminados os crimes de competência do Júri Popular, e não for ele o competente para julgá-lo, nos termos da lei de organização judiciária local, remeterá o processo para quem o seja. Em qualquer caso, será reaberto ao acusado prazo para defesa e indicação de testemunhas, prosseguindo-se, depois de encerrada a inquirição, de acordo com os artigos 499 e seguintes do Código de Ritos Penais. Não se admitirá, entretanto, que sejam arroladas testemunhas anteriormente ouvidas no mesmo processo.

          Um exemplo corrente na prática forense é o caso do crime de latrocínio, que em muitos aspectos se assemelha ao de homicídio qualificado, tipificado no art.121, §2°, inciso V, do Código Penal (2).

          Por fim, convém ressaltar que a desclassificação poderá ocorrer também em sessão do plenário do Júri, cabendo ao juiz proferir a respectiva sentença, com a posterior remessa dos autos ao juiz competente  (art.492, §2).


Absolvição sumária

          A absolvição sumária deve ser concedida quando o juiz entender que o réu se encontra protegido por uma excludente de ilicitude ou de culpabilidade. Nos termos do art.411, o juiz absolverá desde logo o réu, quando se convencer da existência de circunstância que exclua o crime ou isente de pena o réu, dentre eles, a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento de dever legal e o regular exercício de direito. Ato seguido, cabe ao juiz recorrer ex officio de sua decisão. Tal recurso produzirá efeito suspensivo. Trata-se verdadeiramente de uma sentença, pois o juiz aprecia o meritum causae, ao vislumbrar algum dos indicadores de excludente. Ademais, ensina Júlio Fabrini MIRABETE:

          "Para a absolvição sumária nos crimes de competência do Júri é necessário que haja prova segura, incontroversa, plena, límpida, cumpridamente demonstrada e escoimada de qualquer dúvida pertinente à justificativa ou dirimente, de tal modo que a formulação de um juízo de admissibilidade da acusação representaria uma manifesta injustiça" (3).

          Isto posto, o juiz deverá agir com absoluta cautela e prudência se deseja proferir uma sentença de absolvição sumária, pois daí resulta a exclusão do Júri Popular para apreciar a matéria, porquanto a sentença de absolvição extingue o processo, isentando o réu de responsabilidade sobre o fato criminoso. Decorre, doravante, que a não observância de tais parâmetros eventualmente ensejará uma afronta à disposição constitucional que garante a competência do Tribunal do Júri Popular para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida  (art.5º, inciso XXXVIII, letra "d", CF/88) e, portanto, se não caberia aos jurados decidir, em última instância, a incidência ou não de excludentes no caso em exame.


Impronúncia

          A impronúncia ocorre quando o juiz conclui que não há provas suficientes para incriminar o réu, de modo a submetê-lo ao crivo do Júri Popular. No dizer do art.409, se não se convencer da existência do crime ou de indício suficiente de que seja o réu o seu autor, o juiz julgará improcedente a denúncia ou a queixa.

          Trata-se, como se observa, de um juízo de inadmissibilidade da remessa do caso à apreciação do Júri Popular. A impronúncia tem natureza de sentença terminativa, que não adentra no meritum causae, em face da inconsistência das provas reunidas no processo, incapazes de gerar a convicção no espírito do julgador, no sentido de que este entenda ser o réu o autor do delito ou, ainda, da existência mesma do crime. A expressão "julgará improcedente", utilizada no dispositivo legal em apreço, afigura-se, portanto, inadequada, tendo em vista que o juiz não se atém ao mérito da questão, vale dizer, a licitude ou ilicitude da conduta do acusado. Ao contrário, restringe sua análise aos requisitos expressamente delineados no art.409, vale repetir, a materialidade do crime e a existência de indícios de autoria apontados contra o acusado.

          Enquanto não extinta a punibilidade, poderá, em qualquer tempo, ser instaurado processo contra o réu, se houver novas provas  (art.409, parágrafo único). Tem-se aí um novo processo, cabendo ao Ministério Público apresentar nova denúncia, reunindo, para tanto, provas novas, desde que ainda não ocorrida qualquer causa extintiva da punibilidade. O processo original e suas peças servirão, nesse caso, como instrumentos de informação.

          Da sentença de impronúncia cabe recurso em sentido estrito  (art.581, inciso IV). Todavia, não há previsão na legislação processual penal de recurso ex officio, tal como ocorre com a absolvição sumária, haja vista não tratar-se, nesse caso, de isenção da responsabilidade do acusado.


Pronúncia

          As três opções anteriores oferecidas ao julgador, cada um a seu modo, ensejam o afastamento da causa à apreciação do Tribunal do Júri Popular. A desclassificação remete a matéria para processamento por outro órgão jurisdicional; a absolvição sumária põe termo ao processo, por força das excludentes previstas na legislação penal; e a impronúncia suspende, até que seja a punibilidade alcançada pela prescrição, o normal transcurso do feito, em face da não configuração dos requisitos exigidos para a pronúncia. Em nenhuma dessas hipóteses vê-se quebra do dispositivo constitucional que garante o julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelo Júri Popular  (art.5°, inciso XXXVIII, letra "d", CF/88).

          A pronúncia, por seu turno, ocorre quando o juiz, convencendo-se das circunstâncias materiais do fato criminoso e de que há indícios suficientes de autoria, profere decisão que submete o réu a julgamento perante o Tribunal do Júri. Assim determina o art.408, caput, nos seguintes termos: "Se o juiz se convencer da existência do crime e de o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos de seu convencimento".

          A prolação da pronúncia, pois, é condição sine qua non para o desenvolvimento do processo até final julgamento perante o Júri Popular. Requer a incidência de dois requisitos, albergados pelo convencimento do julgador, a saber: a materialidade da infração e a existência de indícios suficientes de autoria.

          Quando se exige a materialidade do crime, isso não pressupõe a configuração de prova inequívoca de sua existência, mas tão somente que o juiz se convença da sua materialidade, vale dizer, que pela conjectura decorrente das provas reunidas no processo, tenha-se a idéia de que o crime se materializou. Ademais, a pronúncia prescinde também de indícios suficientes de autoria. Citando HERMÍNIO MARQUES PORTO, o professor JÚLIO FABBRINI MIRABETE leciona que indícios suficientes de autoria "são as conexões entre fatos conhecidos no processo e a conduta do agente, na forma descrita pela inicial penal; o indício ‘suficiente’ de autoria oferece uma relativa relação entre um primeiro fato e um seguinte advindo da observação inicial, e devem tais indícios, para que motivem a decisão de pronúncia, apresentar expressivo ‘grau de probabilidade que, sem excluir dúvida, tende a aproximar-se da certeza" (4).

          A sentença de pronúncia deve ser motivada – ou, como o texto legal prefere utilizar, o juiz deverá explicitar "os motivos de seu convencimento". O dispositivo em exame permite entrever, no entanto, que a decisão de pronúncia deve ser concisa e não adentrar com maior profundidade a matéria de fato relativa à causa, a fim de não influenciar posteriormente o ânimo dos jurados quando da apreciação da questão em plenário. Entretanto, exige-se sólida argumentação jurídica na análise das provas que formam o convencimento do julgador e fundamentação do seu convencimento ali expresso, sob pena de desobediência à norma constitucional segundo a qual todas as decisões do Poder Judiciário serão motivadas e fundamentadas  (art.93, inciso IX, CF/88) (5).

          Espera-se do julgador que, com a decisão de pronúncia, mantenha ele a serenidade e prudência suficientes para não interferir na subjetividade dos jurados. Em verdade, o julgador encontrar-se-á numa situação de difícil solução, pois enfrentará diante de si a necessidade de adotar duas condutas que, a princípio, mostram-se contraditórias: primeiro, a exigência de fundamentação e clarificação de seu convencimento, na análise, segundo as provas dos autos, em que aceita a materialidade da infração penal e a existência de indícios suficientes a apontar o réu como autor do crime e, segundo, o dever de não penetrar, ao longo de sua decisão, no mérito da questão, vale dizer, na apreciação subjetiva dos fatos e da conduta do acusado, hipótese em que então achar-se-ia usurpando as atribuições constitucionalmente delegadas ao Tribunal do Júri Popular.

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          A questão que se levanta, portanto, consiste em saber como o julgador haverá de proferir uma decisão que, sem adentrar com maior profundidade no mérito da causa, ainda assim consiga mostrar-se juridicamente fundamentada, tal como exige o texto constitucional e requer o próprio dispositivo inserto no Código de Processo Penal. Com efeito, a desobediência a quaisquer desses requisitos, ainda que isoladamente, enseja a nulidade da manifestação judicial e sua conseqüente reforma pela instância superior.

          Esse aspecto se me afigura da maior relevância, dando margem ainda à discussão doutrinária em torno da natureza jurídica da pronúncia. Em verdade, quero crer que a pronúncia não tem a natureza de sentença, mas de mera decisão interlocutória, porquanto não põe termo ao processo. Poder-se-ia dizer, em argumentação adversa, que há no sistema processual vigente sentenças extintivas que não julgam o mérito ao passo que a impronúncia também o faz, e é considerada sentença. Entretanto, no mesmo diapasão, o certo é que a pronúncia não extingue o feito, tampouco faz coisa julgada, mas sim, gera efeitos de preclusão, tanto que contra ela cabe recurso em sentido estrito, tipicamente destinada às irresignações contra decisões interlocutórias, em vez de apelação  (art.581, inciso IV) (6).

          Consiste a pronúncia, em suma, num juízo de admissibilidade, ainda que tardia, da acusação, o que não implica deixar de considerar as provas até então reunidas no processo. Ao contrário, o juiz deverá tê-las em foco a fim de bem fundamentar sua decisão. Com a pronúncia, decisão de caráter processual, o réu é finalmente submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri Popular.

          Nesse caso, não prevalece o princípio do in dubio pro reo - que só se aplica na análise de mérito da causa, a ser apreciada não pelo juiz do feito, mas pelos sete jurados pertencentes ao conselho de sentença. Tem prevalência aí o princípio do in dubio pro societate. Tal ocorre simplesmente por se tratar de mero juízo de admissibilidade da acusação, pois a decisão da causa, verdadeiramente, caberá aos jurados. À sociedade, em suma, interessa ver o caso submetido a julgamento perante seus representantes, os juízes leigos.

          No que o Código de Processo Penal prefere chamar sentença de pronúncia, o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, recomendá-lo-á na prisão em que se achar, ou expedirá as ordens necessárias para a sua captura. Se o réu for primário e de bons antecedentes, poderá o juiz deixar de decretar-lhe a prisão ou revogá-la, caso já se encontre preso. Assim, permanece ao alvedrio do julgador a decisão de libertar provisoriamente ou não o acusado. Por sua vez, se o crime for afiançável, será, desde logo, arbitrado o valor da fiança. Nesse caso, trata-se de direito do acusado livrar-se sob pagamento de fiança  (art.408, §§1° a 3º) (7).

          O juiz não ficará adstrito à classificação do crime feita na queixa ou na denúncia, segundo o entendimento esposado pelo ofendido ou pelo Ministério Público, embora fique o réu sujeito a pena mais grave, atendido, se for o caso, o disposto no art.410 e seu parágrafo, que trata da desclassificação. Ainda, se dos autos constarem elementos de culpabilidade de outros indivíduos não compreendidos na queixa ou na denúncia, o juiz, ao proferir a sentença de pronúncia ou impronúncia, ordenará que os autos voltem ao Ministério Público, para aditamento da peça inicial do processo e demais diligências do sumário  (art.408, §§4° e 5°).

          Os jurados deverão conhecer, especificadamente, os dispositivos legais nos quais o réu é acusado de incorrer. Se se trata, por exemplo, de um homicídio simples   (art.121, caput, CP), se apresenta alguma qualificadora  (art.121, §2°, CP) ou uma causa de diminuição da pena  (art.121, §1°, CP). Caberá ao juiz declinar tais circunstâncias em sua decisão. Poderá, inclusive, excluir algumas delas, como no exemplo citado, uma qualificadora vislumbrada pelo representante do Ministério Público na peça de denúncia, desde que tal convencimento reste devidamente fundamentado.

          A intimação da decisão de pronúncia, se for o caso de crime inafiançável, deve ser sempre feita pessoalmente ao réu, sob pena de nulidade absoluta  (art.414) (8). Resta excluída, portanto, a possibilidade de citação por edital. Já na hipótese de crime afiançável, a intimação se procederá atendidos os meandros do art.415. Enquanto a intimação do acusado pronunciado não for concretizada, ele não poderá ser levado a julgamento diante do Júri Popular, permanecendo os autos paralisados, sob o efeito da prescrição  (art.413).

          Da pronúncia cabe recurso em sentido estrito  (art.581, inciso IV).


Libelo e contrariedade

          Libelo (9)  (de libellus, diminutivo de liber, que em latim significa livro) consiste na exposição por escrito e articulada no fato criminoso reconhecido na decisão de pronúncia, com a indicação do nome do réu, das circunstâncias agravantes previstas na lei penal e dos fatos e circunstâncias que devam influir na fixação da sanção penal, a indicação da medida de segurança aplicável, se for o caso, encerrando-se a peça com o pedido de procedência da acusação   (art.417). O libelo é útil, outrossim, no sentido de orientar o juiz na formulação dos quesitos, que serão apresentados aos jurados por ocasião do recolhimento à sala secreta. Ressalte-se, por fim, que o representante do Ministério Público poderá apresentar, ainda no libelo, o rol de testemunhas que pretende ver depor em plenário, até o número máximo de 5  (cinco)  (art.417, §2°).

          A peça assim denominada libelo pode ser dividida em três partes: introdução, articulado e pedido. Para a sua apresentação válida, a legislação processual penal apresenta uma série de exigências, figurando como a mais importante delas, sem dúvida, a de que o representante do Ministério Público se atenha, na exposição deduzida por artigos do fato criminoso, àquilo anteriormente reconhecido pelo juiz na decisão de pronúncia  (art.417, inciso II). Em nenhum momento, portanto, poderá o promotor inovar, acrescentando ou deixando de mencionar quaisquer dispositivos em que o juiz tiver julgado incurso o réu. Trata-se, enfim, de um direito do acusado que, com a manifestação judicial, tem conhecimento exato da imputação que lhe é feita.

          Recebido o libelo, o escrivão, dentro de 3  (três) dias, entregará ao réu, mediante recibo de seu punho ou de alguém a seu rogo, a respectiva cópia, com o rol de testemunhas, notificado o defensor para que, no prazo de 5  (cinco) dias, ofereça a contrariedade; se o réu estiver afiançado, o escrivão dará cópia ao seu defensor, exigindo recibo, que se juntará aos autos. Ao oferecer a contrariedade, o defensor poderá apresentar o rol de testemunhas que devam depor no plenário, até o máximo de 5  (cinco), juntar documentos e requerer diligências  (art.421).

          O libelo tem sua importância no cenário de julgamento do Tribunal do Júri porque, no início dos debates, quando a palavra é facultada à acusação, o promotor lerá a referida peça em plenário  (art.471, caput).


Desaforamento

          Quando o processo está pronto para julgamento, pode ocorrer o desaforamento do feito, em face de circunstâncias de fato, como uma grande agitação popular em torno do caso, que trazem perigo a um julgamento do réu sob a égide da lei e mesmo à segurança e a garantia de sua integridade física.

          Dispõe o art.424 que, se o interesse da ordem pública assim reclamar, ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu, a instância superior, a requerimento de quaisquer das partes ou mediante representação do juiz, e ouvido em todo caso o Procurador-Geral, poderá desaforar o julgamento para comarca ou termo próximo, onde não subsistam aqueles motivos, após informação do juiz, se a medida não tiver sido solicitado, de ofício, por ele próprio. O desaforamento também é cabível na hipótese do julgamento não se realizar no prazo de 1  (um) ano, a contar do recebimento do libelo, desde que para tal demora não hajam concorrido de nenhum modo o réu ou a defesa  (art.424, parágrafo único).

          Não raras vezes alguns crimes, por sua atrocidade e violência desmedidas, geram um clima de grande insatisfação e perplexidade na sociedade local. Em comunidades de reduzida dimensão, os efeitos da irresignação popular podem ser sentidas ainda com mais impacto. Tudo isso pode ocasionar um desequilíbrio na indispensável isenção e serenidade dos jurados, além do considerável perigo à própria incolumidade física do acusado. Enfim, a imparcialidade e legalidade do julgamento poderá ver-se de algum modo sob variados influxos externos, a vox populi, a opinião da mídia, que em nada contribuem para o justo deslinde do caso. Ao contrário, tornam mais fácil o caminho que leva à pura vindita, mascarada de julgamento sob a égide da lei. Em tais casos extremos, nada resta ao juiz – ou se este não o fizer, às partes – senão requerer o desaforamento do processo. Trata-se, como se sabe, de um direito fundamental do réu ser submetido a um julgamento justo e na forma da lei. Se sob circunstâncias dessa natureza, a figura de um juiz singular, por si só, já não garante a prevalência desse princípio, em se tratando de juízes leigos, que travam um contato ainda mais direto e contínuo com o meio social, o desrespeito a um direito fundamental do acusado, pode-se dizer, é até esperado.

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Sobre o autor
Marcus Vinícius Amorim de Oliveira

promotor de Justiça no Ceará, professor de Direito Processual Penal na Unifor e de Criminologia na Faculdade Christus, mestre em Direito pela UFC

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Marcus Vinícius Amorim. Considerações sobre o procedimento no Júri Popular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 34, 1 ago. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1066. Acesso em: 23 dez. 2024.

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