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Igualdade salarial e regras de proteção ao salário

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15/11/2007 às 00:00
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O trabalho aborda as questões mais recorrentes no cotidiano do operador do Direito do Trabalho relativas à isonomia salarial.

Sumário: 1. Introdução. 2. Isonomia salarial. 2.1. Evolução histórica. 2.2. Proteção contra discriminações salariais. 2.2.1. Equiparação salarial. 2.2.1.1. Equiparação por identidade. A) Caracterização. B) Fatores excludentes da equiparação. B.1) Readaptação profissional. B.2) Vantagens de caráter personalíssimo. B.3) Profissões que exigem habilitação técnica. B.4) Empregados públicos da administração direta, autárquica e fundacional. B.5) Quadro de carreira. B.6) Encampação ou transferência de serviços de empresas concessionárias de serviços públicos federais. 2.2.1.2. Equiparação por analogia. 2.2.1.3. Equiparação por equivalência. 2.2.2. Outras hipóteses de isonomia. 2.2.2.1. Substituto provisório. 2.2.2.2. Desvio de função. 2.2.2.3. Terceirização. 2.2.2.4. Empresas com quadro de carreira. 3. Regras de proteção ao salário. 3.1. Proteção contra abusos do empregador. 3.1.1. Princípio da irredutibilidade do salário. 3.1.2. Princípio da inalterabilidade prejudicial. 3.1.3. Princípio da integralidade do salário. 3.1.4. Princípio da pontualidade no pagamento. 3.2. Proteção contra a imprevidência e os credores do empregado. 3.2.1. Impenhorabilidade. 3.2.2. Proteção contra familiares do empregado e contra a sua própria imprevidência. 3.3. Proteção contra credores do empregador. 3.3.1. O princípio da intangibilidade do salário. 4. Conclusão. 5. Bibliografia.


1. Introdução

Visamos, no presente trabalho, realizar uma abordagem sintética, porém analítica, das questões mais recorrentes no cotidiano do operador do Direito do Trabalho relativas à isonomia salarial.

Centraremos o nosso estudo no exame da proteção lato sensu do salário conferida pelo nosso ordenamento jurídico. Assim é que analisaremos tanto as regras de proteção diretamente dirigidas ao salário, quanto aquelas direcionadas ao trabalhador, mas tendo em vista o salário por ele percebido.

Esquadrinharemos, inicialmente, as formas de proteção contra discriminações salariais oferecidas pelo nosso ordenamento, dando uma maior ênfase à equiparação salarial por identidade, em virtude de se tratar do método mais comumente utilizado na práxis forense. Ainda nesse caminho, traçaremos breves linhas acerca de outras formas antidiscriminatórias albergadas pela ordem jurídica, a exemplo daquelas ocorridas em situações de substituição de empregados, de adoção de quadro de carreira pelo empregador e de terceirização, dentre outras.

Ao depois, cuidaremos das regras de proteção ao salário de per si, oportunidade em que examinaremos alguns dos princípios juslaboristas aplicáveis nesta seara. Veremos, então, que o salário constitui uma das preocupações centrais do Direito do Trabalho, tanto que as garantias sobre ele estendidas direcionam-se até mesmo contra a imprevidência do próprio empregado beneficiário.


2. Isonomia salarial

Derivado do princípio geral da isonomia, apresenta-se a igualdade salarial como uma garantia de que a todo trabalho igual deve corresponder pagamento igual.

Historicamente, o princípio em tela apareceu pela primeira vez na Carta de 1934, sendo, a partir de então, mantido, com pequenas alterações, nos textos constitucionais que se seguiram. Com efeito, já desde 1934 se proibia diferença de salário para um mesmo trabalho por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil. A Carta de 1946 repetiu a redação do texto de 1934, ao passo que a CF/67 omitiu a proibição de discriminação em razão da idade. A Emenda Constitucional de 1969, por seu turno, dilatou o princípio isonômico para alcançar as admissões de empregados.

A Constituição da República atual assegura a igualdade de forma ampla (art. 5º, XXX e XXXI), estendendo a proibição de diferenças, antes restrita aos salários, também ao exercício de funções e de critério de admissão. Reinclui, ainda, em seu bojo a proibição de discriminação.por motivo de idade, embora deixe de tratar das diferenças em razão da nacionalidade.

No cenário mundial, a primeira vez em que a questão da igualdade recebeu amparo legislativo ocorreu no México, na Constituição de 1917, que garantia salário igual para trabalho igual sem discriminação de sexo ou nacionalidade. Depois disso, o princípio isonômico foi estendido pelo mundo com o Tratado de Versalhes, de 1919, e, com o passar dos anos, a regra da proibição de tratamento desigual repetiu-se em diversos textos, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e em diversas Convenções (n. 82, 100, 111 e 117) e Recomendações (n. 90 e 111) da OIT.

2.2. Proteção contra discriminações salariais

A ordem jurídico-trabalhista oferece proteção contra discriminações gerais, envolvendo, por exemplo, tipos variados de empregados (mulher, menor e portador de deficiência) e de situações contratuais, ao lado da proteção contra discriminações que repercutem diretamente na temática salarial. Disso se conclui que a possibilidade de equiparação vai além dos salários, abarcando condições ínsitas ao contrato de trabalho, a exemplo dos dias de férias, dos valores das diárias, da concessão de prêmios, dentre outras.

Nos interessa, neste estudo, o exame da proteção dirigida contra as discriminações salariais. De acordo com a legislação trabalhista, referida proteção se desdobra em cinco situações mais comuns: as que envolvem a equiparação salarial, que pode ser por identidade, por analogia ou por equivalência; aquelas decorrentes da organização dos trabalhadores em quadro de carreira; as que tratam do empregado substituto provisório; as resultantes de desvio funcional; e as que dizem respeito aos trabalhadores submetidos à terceirização.

2.2.1. Equiparação salarial

Conforme salientado linhas atrás, a equiparação salarial, em nível de legislação consolidada, se apresenta com três feições distintas, quais sejam a equiparação por identidade, por analogia e por equivalência, previstas, respectivamente, nos art. 461, 358 e 460.

Analisaremos, a seguir, cada uma dessas modalidades equiparatórias.

2.2.1.1. Equiparação por identidade

A) Caracterização

Consoante preceituado no art. 461 consolidado, para que possa haver equiparação, cumpre sejam atendidas seis identidades necessárias, a saber: funcional; produtiva; qualitativa; de empregador; de local de trabalho; e de tempo de serviço [01]. Acrescentamos, ainda, a imprescindibilidade de exercício funcional contemporâneo.

Bem de ver que os requisitos elencados no dispositivo legal citado devem se somar, sendo todos indispensáveis à equiparação salarial.

No tocante à identidade funcional, impende distinguir, nessa quadra, os conceitos de tarefa, função e cargo, haja vista que, na equiparação, o que importa é a identidade de função.

Cargo consiste na posição que o empregado ocupa na empresa. Função é o trabalho que a pessoa efetivamente exerce, enquanto tarefas são as atribuições que compõem a função. Disso se dessume que uma função pode englobar uma única tarefa ou um feixe de tarefas reunidas em um todo unitário [02].

A identidade de que cuida a CLT deve ser efetiva, isto é, a lei não se satisfaz com a simples semelhança ou aproximação das funções. Nada obstante, presumem-se idênticas as funções (presunção juris tantum) quando os cargos ocupados possuem a mesma denominação.

Não há óbice à equiparação quando as funções desempenhadas sejam de confiança, ou mesmo quando se trate de trabalho intelectual.

Identidade produtiva não se confunde com identidade de produção. Aquela é relativa e diz respeito à capacidade de produzir, devendo, assim, ser aferida tendo em vista a conjugação dos meios de produção colocados à disposição do empregado, dentre os quais inclui-se o fator tempo. Produção, por seu turno, refere-se ao ato de produzir, sendo, pois, vista em sentido absoluto. É diferencial quantitativo na aferição do trabalho comparado.

A identidade qualitativa pertine ao requisito legal da "mesma perfeição técnica". Deve ser avaliada concretamente, de acordo com as exigências relativas à fabricação do produto ou à execução do serviço. É diferencial qualitativo na aferição do trabalho comparado.

A identidade do empregador somente apresenta dificuldades quando se trata de grupo empresarial, dissentindo a jurisprudência sob tal aspecto [03]. No nosso sentir, a existência do grupo de empregadores urbanos [04] não afasta a possibilidade de equiparação entre empregados vinculados a empresas distintas do grupo, tendo em vista a presença de solidariedade dual (ativa e passiva) entre os seus integrantes.

Ademais, é entendimento pacífico no TST a circunstância de que a cessão de empregados não exclui a equiparação, quando a cedente responde pelos salários do paradigma e do equiparando. Nesse pálio, é o inciso V, da Súmula 6, do TST [05].

A fim de que seja possível a equiparação é necessário, ainda, que equiparando e paradigma prestem serviços na "mesma localidade". Esta expressão tem sido entendida na jurisprudência como mesmo município ou mesma região metropolitana (súmula 6, inciso X, do TST).

O diferença de tempo de serviço na função, e não no emprego, entre equiparando e paradigma, não poderá ser superior a dois anos (Súmula 6, inciso II, do TST). Questão interessante surge quando o paradigma exerce a função em períodos descontínuos. Nesses casos, a jurisprudência tem entendido que os períodos devem ser somados, para se justificar o tratamento diferenciado [06].

Sobremais, é necessário que equiparando e paradigma tenham sido contemporâneos na função, ou seja, que hajam laborado conjuntamente, de forma permanente, em algum momento, encarecendo-se a coincidência temporal no exercício das mesmas funções pelos empregados, em caráter permanente. A simples coincidência eventual não tem o condão de caracterizar a contemporaneidade.

B) Fatores excludentes da equiparação

Nem sempre a equiparação salarial será possível. Subsistem situações nas quais a própria lei, dada especial particularidade a que se submetem equiparando e paradigma, exclui a possibilidade de equiparação salarial. São os casos, por exemplo, da readaptação profissional e da existência de quadro de carreira devidamente homologado.

B.1) Readaptação profissional

Na esteira do §4º, do art. 461, da CLT, em caso de readaptação profissional de empregado incapacitado, não há possibilidade de ação equiparatória. Tal medida, de cunho social, visa com que as empresas mantenham a política de readaptação dos que sofreram doença ou acidente, sem que estejam sujeitas a ameaças de ações judiciais.

B.2) Vantagens de caráter personalíssimo

Não geram direito à isonomia salarial as vantagens de cunho personalíssimo, ainda que decorrentes de sentença judicial. É a hipótese, por exemplo, de um adicional por tempo de serviço.

B.3) Profissões que exigem habilitação técnica

Quando o exercício de determinada profissão exige habilitação técnica especial, isto é, quando a função, por imposição legal, só puder ser desempenhada se o profissional for devidamente habilitado, a exemplo do médico, a inexistência dessa habilitação obsta a isonomia. Nesse sentido a O.J. 296, da SBDI-1, do TST: "EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ATENDENTE E AUXILIAR DE ENFERMAGEM. IMPOSSIBILIDADE. DJ 11.08.03. Sendo regulamentada a profissão de auxiliar de enfermagem, cujo exercício pressupõe habilitação técnica, realizada pelo Conselho Regional de Enfermagem, impossível a equiparação salarial do simples atendente com o auxiliar de enfermagem".

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B.4) Empregados públicos da administração direta, autárquica e fundacional

Em relação aos empregados públicos vinculados à administração direta, autárquica e fundacional, há mandamento constitucional (art. 37, XIII) vedando a possibilidade de equiparação. Veja-se, a propósito, a O.J. n. 297, da SBDI-1, do TST: "EQUIPARAÇÃO SALARIAL. SERVIDOR PÚBLICO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA, AUTÁRQUICA E FUNDACIONAL. ART. 37, XIII, DA CF/1988. DJ 11.08.03. O art. 37, inciso XIII, da CF/1988, veda a equiparação de qualquer natureza para o efeito de remuneração do pessoal do serviço público, sendo juridicamente impossível a aplicação da norma infraconstitucional prevista no art. 461 da CLT quando se pleiteia equiparação salarial entre servidores públicos, independentemente de terem sido contratados pela CLT".

B.5) Quadro de carreira

O quadro de carreira não é obrigatório, mas, uma vez adotado pelo empregador, deverão ser garantidas aos empregados promoções alternadas, por merecimento e antiguidade, dentro de cada categoria profissional (art. 461, §§ 2º e 3º, CLT). A expressão categoria profissional "corresponde às categorias administrativas constitutivas das diversas carreiras do quadro" [07]. Disso decorre que as promoções estão "circunscritas às classes de salários em que se subdivide cada categoria ou cada cargo" [08], não havendo, portanto, possibilidade de promoção para categoria ou cargo diverso. Sem embargo, a transposição de uma categoria para outra, ou de um cargo para outro, constitui reclassificação, a qual, por seu turno, não necessita obedecer aos critérios alternativos de antiguidade e merecimento, podendo o empregador, livremente, estabelecer essa forma de acesso com base apenas no merecimento. As normas para a homologação do quadro de carreira estão dispostas na Portaria n. 08/87, do Ministério do Trabalho.

Em regra, o quadro de carreira exclui a possibilidade de equiparação salarial, haja vista que a própria existência do quadro organizado justifica as eventuais desigualdades, na medida em que permite ao empregado fazer carreira.

Pode ocorrer, contudo, do quadro não elidir a equiparação. São hipóteses de exceções à própria exceção legal. Tal o que sucede, por exemplo, quando o quadro, malgrado existente, não é homologado pelo Ministério do Trabalho ou é homologado irregularmente [09], caso em que o empregador não poderá evitar eventual ação equiparatória. Nessas duas situações, ao empregado fica ainda aberta a via da ação de enquadramento. Gize-se que, no tocante à administração pública direta, autárquica e fundacional, é dispensada a homologação do quadro, bastando a aprovação do ato pela autoridade competente.

Outrossim, o quadro de carreira não elimina a equiparação quando o cargo não está previsto no quadro, quando o paradigma encontra-se enquadrado incorretamente, ou quando o paradigma receba salário superior, embora ocupando o mesmo cargo que o equiparando. Em síntese, pode-se dizer que sempre caberá equiparação salarial quando o quadro não atender os requisitos legais, ou quando não solucionar a desigualdade salarial, quebrando a isonomia.

De todo modo, cumpre esclarecer que, mesmo existindo quadro de carreira devidamente homologado, sempre há a possibilidade de existirem falhas no enquadramento, e, nessas hipóteses, faculta-se ao empregado ajuizar ação de enquadramento, visando a correção das eventuais distorções quanto ao seu posicionamento no quadro. Isso é o que ocorre, por exemplo, com o empregado preterido em promoção.

B.6) Encampação ou transferência de serviços de empresas concessionárias de serviços públicos federais

Na esteira do Decreto-Lei 855/69, "os empregados de emprêsas concessionárias de serviços público federais, estaduais ou municipais, que, por fôrça de encampação ou transferência dêsses serviços tenham, a qualquer tempo, sido absorvidas por emprêsa pública ou sociedade de economia mista, constituirão quadro especial, a ser extinto à medida que se vagarem os cargos ou funções" (art. 1º), e "não servirão de paradigma para aplicação do disposto no artigo 461 e seus parágrafos da Consolidação das Leis do Trabalho" (art. 2º).

Ressalte-se que referido Decreto-Lei aplica-se apenas às hipóteses em que a concessionária é absorvida por empresa estatal, restringindo-se a vedação à possibilidade de equiparação entre os empregados da concessionária e os trabalhadores da estatal.

2.2.1.2. Equiparação por analogia

Equiparação por analogia é aquela inserida no preceptivo do art. 358, da CLT, e refere-se às situações em que se confrontam trabalhadores brasileiros com estrangeiros, exercentes de funções análogas.

Há dissensão doutrinária acerca da constitucionalidade de tal dispositivo.

Entendem alguns que o art. 358, da CLT, não foi recepcionado pela Constituição Federal, em face do disposto no caput do seu art. 5º: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:". Alegam que as únicas restrições que vigoram em relação aos estrangeiros são aquelas previstas na própria Constituição, constantes dos art. 37, I, 176, §1º, e 178, II, sendo que toda e qualquer distinção desbordante dos limites constitucionais, a exemplo dos art. 352, 354 e 358, da CLT, estão revogadas (não recepcionadas). Nesse sentido, Sergio Pinto Martins, Valentin Carrion e Maurício Godinho Delgado.

Por outro lado, há aqueles que defendem a constitucionalidade do cânone em questão argumentando que o escopo da norma do art. 358 reside no intuito de proteger o empregado nacional, e não de discriminar o estrangeiro, ou seja, a norma em exame não traz prejuízo ao direito do estrangeiro, mas apenas aumenta o direito do empregado brasileiro.

Se superada a questão da constitucionalidade do artigo 358, impõe-se, para a equiparação, que as funções desempenhadas por brasileiro e estrangeiro sejam análogas, comparáveis, a juízo do Ministério do Trabalho. Cabe, portanto, a este Órgão definir, em exame prévio, o que sejam funções análogas.

Outrossim diz a lei que a discrepância é permitida quando a remuneração resultar de maior produção, para os que trabalham por comissão ou por tarefa. Vê-se que, nesse tópico, a CLT abandona o conceito de "produtividade", adotando o de "produção". Entendemos, nessa quadra, que a diferença de produção somente será relevante se os meios postos à disposição do equiparando e do modelo foram iguais. Caso contrário, ou seja, se a maior produção derivar dos melhores meios colocados à disposição do estrangeiro, caberá a equiparação.

Ademais, é autorizada a diferença salarial quando o brasileiro contar menos de dois anos de serviço e o estrangeiro mais de dois. Pensamos que esse tempo de serviço, a exemplo do que sucede no art. 461 consolidado, deve ser computado "na função" e não no emprego.

As outras hipóteses em que a lei admite a discriminação salarial ocorrem quando houver na empresa quadro organizado de carreira e quando o brasileiro for aprendiz, ajudante ou servente, e não o for o estrangeiro.

2.2.1.3. Equiparação por equivalência

Equiparação por equivalência consiste naquele preceito ínsito ao art. 460, da CLT, que determina que: "Na falta de estipulação do salário ou não havendo prova sobre a importância ajustada, o empregado terá direito a perceber salário igual ao daquele que, na mesma empresa, fizer serviço equivalente, ou do que for habitualmente pago para o serviço semelhante".

Verifica-se, portanto, que o art. 460, da CLT, embora preveja duas situações (falta de estipulação de salário e ausência de prova da importância ajustada), atribui a ambas a mesma conseqüência, consistente na tarefa conferida ao juiz de fixar o salário do empregado, considerando, o salário pago, na mesma empresa, por trabalho equivalente, ou o salário pago, em outra empresa, por serviço semelhante.

Equivalente é o trabalho que vale igual, que é igual no valor, ao passo que semelhante é o serviço que é análogo, parecido, que se aproxima.

2.2.2. Outras hipóteses de isonomia

De fora a parte a possibilidade de equiparação salarial, seja por identidade, analogia ou equivalência, a ordem jurídica proíbe discriminações salariais ainda em relação a outras circunstâncias especiais, conforme examinadas adiante.

2.2.2.1. Substituto provisório

Como é sabido, são três as hipóteses de substituições possíveis: eventual; temporária; e definitiva ou sucessão. A regra da isonomia somente se aplica na segunda hipótese, ou seja, quando a substituição for temporária. Nesse sentido, a Súmula n. 159, do TST:

"SUBSTITUIÇÃO DE CARÁTER NÃO EVENTUAL E VACÂNCIA DO CARGO. (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 112 da SBDI-1) - Res. 129/2005 - DJ 20.04.2005

I - Enquanto perdurar a substituição que não tenha caráter meramente eventual, inclusive nas férias, o empregado substituto fará jus ao salário contratual do substituído. (ex-Súmula nº 159 - Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)

II - Vago o cargo em definitivo, o empregado que passa a ocupá-lo não tem direito a salário igual ao do antecessor. (ex-OJ nº 112 - Inserida em 01.10.1997)".

2.2.2.2. Desvio de função

Na judiciosa lição de Süssekind:

"O desvio de função se caracteriza, sobretudo, quando há quadro de pessoal organizado em carreira; mas pode ocorrer mesmo quando não exista o quadro. Não se trata, porém, na hipótese, de equiparação salarial, pois o desvio de função, desde que não seja episódico ou eventual, cria o direito a diferenças salariais, ainda que não haja paradigma no mesmo estabelecimento. Como bem acentuou o Ministro Carlos Madeira, ‘não há confundir diferença salarial com equiparação salarial. Para esta é necessária a comparação com o trabalho de outrem, prestado no mesmo local para o mesmo empregador. Para a diferença salarial, basta a prova de que a função existe no quadro do órgão e é exercida por empregado de outra categoria’" [10].

Portanto, o desvio funcional ocorre quando existe na empresa um determinado cargo, cujas funções correspondentes são exercidas por empregado de outra categoria, ou seja, por pessoa ocupante de outro cargo. O desvio ocorre, geralmente, quando há quadro de carreira, mas pode existir mesmo quando não exista o quadro. Desde que o desvio funcional não seja episódico, haverá direito ao recebimento das diferenças salariais pelo empregado.

2.2.2.3. Terceirização

Nas relações de trabalho terceirizado temporário, entabuladas com arrimo na Lei n. 6.019/74, há norma específica determinando que o trabalhador temporário perceba remuneração equivalente à percebida pelos empregados da mesma categoria na empresa tomadora ou cliente (art. 12).

O problema surge na chamada terceirização permanente. Quando a terceirização - realizada por empresas privadas - é considerada ilícita, nenhuma dificuldade se apresenta, uma vez que se reconhece a formação do vínculo diretamente com o tomador.

Entretanto, se a relação jurídica fundada em terceirização ilícita se der com ente da administração pública, na qual não há possibilidade de formação direta do vínculo, em virtude de expressa vedação constitucional, poderão emergir distorções salariais, ofensivas ao Princípio da Isonomia. Também poderá surgir situação discriminatória nas terceirizações lícitas, empreendidas por empresas privadas.

São, pois, duas as situações fáticas em que poderão aparecer discriminações salariais difíceis de solucionar: terceirização ilícita com entes da administração pública direta e indireta; e terceirização lícita em que há tratamento discriminatório entre o trabalhador terceirizado e o trabalhador inserido em categoria ou função equivalentes na empresa tomadora.

Entendemos que, nos dois casos, deve ser afastada a condição discriminatória aplicando-se o art. 5º, caput, da Constituição Federal, em conjunto com o art. 3º, parágrafo único, da CLT. Além disso, sempre se poderá invocar a incidência, por analogia, do art. 12, da Lei n. 6.019/74, pois, se é vedado o tratamento diferenciado quando a terceirização é temporária, com mais razão deve ser obstada a discriminação salarial em hipóteses de terceirização permanente.

2.2.2.4. Empresas com quadro de carreira

A circunstância da empresa possuir quadro de carreira que atenda perfeitamente aos requisitos formal (quadro devidamente homologado) e substancial (sistemática objetiva e geral de promoções alternadas por merecimento e antiguidade), embora impeça pleitos equiparatórios, não inviabiliza litígios derivados da sua incorreta aplicação ou da sua inobservância.

Com efeito, mesmo sob a égide de quadro de carreira regular e devidamente homologado, pode haver preterição do empregado em determinada promoção, ou mesmo o seu correto enquadramento, ou ainda a ausência de reclassificação no contexto do quadro. Em todas estas hipóteses, o empregado poderá pleitear o seu enquadramento ou a sua reclassificação, pela via da ação de enquadramento.

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Sobre a autora
Andréa Presas Rocha

Juíza do Trabalho Auxiliar da 16ª Vara de Salvador/Ba, mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito do Trabalho pela PUC-SP, doutoranda em Direito Social pela Universidad Castilla La Mancha na Espanha e professora universitária.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Andréa Presas. Igualdade salarial e regras de proteção ao salário. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1597, 15 nov. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10660. Acesso em: 17 abr. 2024.

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