Capa da publicação Direitos autorais sobre músicas no meio digital
Capa: Dall-E
Artigo Destaque dos editores

Da tutela aos direitos autorais musicais no meio digital como reflexo dos direitos humanos fundamentais

Exibindo página 2 de 4
21/01/2025 às 08:51
Leia nesta página:

3. DOS DIREITOS AUTORAIS

O Direito Autoral é um campo do direito que protege os interesses dos criadores de obras intelectuais, concedendo-lhes o direito exclusivo de reproduzir, distribuir e explorar comercialmente suas criações. É um aspecto crucial da propriedade intelectual que desempenha um papel fundamental na promoção da inovação e da criatividade em diversas áreas, incluindo literatura, música, artes visuais e audiovisuais.

Tal ramo jurídico, frequentemente chamado de direito de autor em alguns países, é um sistema legal que concede aos criadores de obras intelectuais o controle sobre o uso e a distribuição de suas criações. Segundo Luiz Olavo Baptista (2016, p.29) "o Direito Autoral é um conjunto de normas que visam a proteger as criações do espírito humano, proporcionando aos autores o gozo de direitos exclusivos sobre suas obras". Essas obras incluem textos literários, composições musicais, obras de arte, filmes, programas de computador e muitas outras formas de expressão criativa.

Tal ramo jurídico serve como um incentivo para a criação e disseminação de obras intelectuais, pois permite que os criadores se beneficiem financeiramente de seu trabalho. Como destaca Cláudio Lins de Vasconcelos (2018, p.42) "o sistema de proteção autoral proporciona aos autores a recompensa pelo investimento intelectual que fazem, incentivando-os a criar e compartilhar suas obras com o público".

As origens do Direito Autoral remontam a tempos antigos, mas suas bases modernas foram estabelecidas durante o Renascimento e a Revolução Industrial. A Revolução Francesa, em particular, desempenhou um papel significativo na evolução do Direito Autoral. Foi nessa época que a França promulgou a primeira lei de direitos autorais do mundo, em 1793, conhecida como a Lei de Privilegiados. Essa lei reconheceu a importância de proteger o trabalho criativo dos autores e concedeu-lhes direitos exclusivos sobre suas obras por um período determinado. (VASCONCELOS, 2018)

No Brasil, o Direito Autoral também teve suas origens históricas. Segundo Antonio Chaves (2017, p.12) "a história do Direito Autoral no Brasil remonta ao período colonial, quando as Ordenações Filipinas estabeleceram a necessidade de concessão de privilégios para a publicação de obras". Esses privilégios eram semelhantes aos direitos autorais e eram concedidos pelo governo português para controlar a publicação de obras literárias e científicas.

No entanto, foi apenas em 1847 que o Brasil promulgou sua primeira lei de direitos autorais, conhecida como a Lei dos Autores. Essa lei foi inspirada na legislação francesa e estabeleceu as bases para a proteção dos direitos autorais no país.

O Direito Autoral no Brasil passou por várias transformações ao longo dos anos. Em 1973, foi promulgada a Lei de Direitos Autorais (Lei nº 6.535), que substituiu a Lei dos Autores de 1847. Esta nova legislação trouxe importantes atualizações para o campo, incluindo a extensão do prazo de proteção dos direitos autorais e a incorporação de novas formas de expressão criativa, como programas de computador.

Posteriormente, em 1998, o Brasil aderiu ao Acordo TRIPS (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio) da Organização Mundial do Comércio (OMC). Isso resultou em mudanças significativas na legislação de direitos autorais do país para cumprir as obrigações internacionais.

O mundo digital e a era da internet trouxeram desafios significativos para o Direito Autoral. Com a facilidade de reprodução e distribuição de obras digitais, a proteção dos direitos autorais tornou-se mais complexa. Sérgio Branco argumenta (2019, p. 73) que "a internet transformou completamente o cenário do Direito Autoral, tornando necessárias adaptações nas leis e regulamentos".

Além disso, questões como o equilíbrio entre os direitos dos criadores e o acesso à cultura, bem como a pirataria digital, são tópicos de debate contínuo no contexto do Direito Autoral no Brasil. Autores como Maria Inês Matos Bargas (2015) ressaltam a importância de encontrar soluções que garantam tanto a proteção dos direitos autorais quanto o acesso à cultura.

Desta feita, o Direito Autoral é um campo do direito que desempenha um papel fundamental na proteção e promoção da criatividade e inovação. Suas origens remontam a séculos atrás, com a evolução das leis e regulamentos ao longo do tempo para acompanhar as mudanças na sociedade e na tecnologia. No Brasil, a legislação de direitos autorais tem uma história rica e continua a se adaptar aos desafios contemporâneos, buscando equilibrar os interesses dos criadores, da indústria cultural e do público em geral. A evolução do Direito Autoral reflete a importância da propriedade intelectual na sociedade moderna e a necessidade de encontrar soluções que promovam a criatividade, a inovação e o acesso à cultura.

3.1. Da Natureza Jurídica dos direitos autorais

O universo do Direito Autoral, conforme já mencionado, encontra seu amparo na Lei n° 9.610 de 1998, cujo propósito primordial reside na salvaguarda dos direitos do autor sobre suas criações e obras. Sob essa égide, o criador ostenta a prerrogativa singular e exclusiva de reproduzir ou publicar sua obra, além da faculdade de licenciá-la ou transferir seu conteúdo.

Moraes (2014) destaca a magnitude dos direitos do autor ao afirmar que o Direito Autoral é concebido "do autor e para o autor", cujo horizonte é o parâmetro em torno do qual tudo deve ser delineado. Semelhante ao adágio que proclama que "o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado," o Direito Autoral subsiste em função do autor, e não o inverso.

Numa abordagem dualista adotada neste contexto, divide-se em direito moral e direito patrimonial. O direito moral, conforme Kischelewski (2014), é encarregado de salvaguardar a autoria da obra intelectual, conferindo ao autor o direito pessoal, inalienável e irrenunciável de reconhecer a obra como sua, preservando-a em sua forma original ou mesmo modificando-a antes ou após a publicação.

Em contrapartida, o direito patrimonial, ligado ao potencial econômico da obra para o autor, confere o direito exclusivo de usufruir, dispor e beneficiar-se de sua criação. Sob essa égide, o autor pode autorizar terceiros a reproduzir e utilizar sua obra, seja integralmente ou parcialmente, em caráter perpétuo ou por um período determinado, determinar o local e estipular eventuais custos para essa reprodução, além de assegurar uma remuneração mínima de 5% sobre o aumento do preço de revenda (MENEZES, 2017).

Quando a obra é atribuída a um único criador, após seu falecimento, os direitos patrimoniais são transferidos para seus herdeiros, com vigência por setenta anos, a serem contados a partir do primeiro dia do ano subsequente à data do óbito. Em casos de obras coautorais, em que a obra é indivisível, o prazo se inicia com o falecimento do último coautor.

Duarte e Pereira (2019) esclarecem que o direito do autor visa a assegurar ao criador uma participação tanto financeira quanto moral no uso de sua obra, exceto quando houver uma autorização gratuita. É importante destacar que são as obras que recebem proteção, não os autores em si. Assim, os autores se beneficiam dessa proteção por meio da criação de obras que representam formas de expressão de suas ideias, sendo imprescindível que essas ideias se concretizem em formas físicas, como livros, desenhos, filmes, entre outros.

O âmbito do direito autoral também abarca os direitos dos artistas que interpretam ou executam obras, como músicos, dançarinos, atores, cantores, entre outros, designados como direitos conexos aos direitos autorais, conforme estabelecido no artigo 1º da Lei n° 9.610/1998.

Silva Junior (2016) argumenta que o direito autoral é considerado sui generis, especial e peculiar, evoluindo dos direitos de personalidade individuais, refletindo de maneira clara a psique do criador. Essa perspectiva única confere ao direito autoral um caráter singular no contexto jurídico.

Carlos Alberto Bittar (2018) aborda os direitos autorais como uma forma de proteção de natureza intelectual, que salvaguarda tanto os aspectos pessoais quanto patrimoniais do autor, estabelecendo um vínculo único e especial com sua obra, justificando assim a regulação específica que eles recebem nos sistemas legais em todo o mundo.

A música, uma das formas mais antigas e amplamente difundidas de expressão artística, permeia diversas esferas comerciais e sociais, sendo adotada para proporcionar maior comodidade aos consumidores, atrair público e desempenhar múltiplos papéis, contribuindo para o patrimônio cultural da sociedade em geral. Assim, a música serve como um instrumento linguístico, expressivo e comunicativo (DIAS, 2020).

De acordo com Guerreiros Junior (2015), a música faz parte intrínseca da vida humana e até mesmo da vida de animais e plantas. Ela possui o poder de estimular e emocionar, desempenhando um papel significativo em diversos momentos históricos, desde encontros tribais e familiares até eventos políticos, militares e religiosos. A música tem a capacidade de catalisar emoções e iniciativas, influenciando a guerra e a paz, a ascensão e queda de líderes, evocando prazeres e sofrimentos. Mesmo sendo uma forma de arte abstrata, ela exerce uma influência irresistível sobre os corações e mentes das pessoas, sendo uma companheira constante do ser humano, apesar da observação desdenhosa de Napoleão que a classificou como o "mais tolerável dos ruídos".

No contexto legal, a Lei de Direitos Autorais protege qualquer forma de combinação de sons que constitua uma obra ou composição musical, abrangendo desde composições puramente instrumentais até aquelas que incluem tanto melodia quanto letras sobrepostas e que podem ser executadas por instrumentos musicais ou por vozes humanas, todas qualificadas como obras de arte protegidas (COSTA, 1998).

Isso encontra respaldo no inciso V do artigo 7º da Lei nº 9.610/98:

Art. 7º. São obras intelectuais protegidas as criações de espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: [...] V – as composições musicais, tenham ou não letra (BRASIL, 1998).

Para que uma composição musical seja reconhecida, é essencial que inclua elementos como melodia, harmonia e ritmo, como destacado por Bennet (1986). De acordo com a perspectiva de Chaves (1987), a melodia representa a sequência de sons sucessivos, que se sucedem de maneira harmônica.

Por outro lado, a harmonia resulta da combinação simultânea de várias melodias, enquanto o ritmo está relacionado com a duração de cada som em uma melodia. Portanto, uma obra que contenha apenas esses três elementos é considerada música. Quando acrescida de título e letra, torna-se uma obra lítero-musical, e se for registrada em um suporte físico, é denominada fonograma. É importante ressaltar que, independentemente de sua classificação, todas as formas de música estão protegidas pelas leis brasileiras.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

3.2. Evolução Jurídica e a Tutela dos direitos autorais no Brasil

Conforme já mencionado anteriormente, a primeira alusão a uma regulamentação brasileira voltada à proteção dos direitos autorais surgiu na Constituição Imperial de 1824, conhecida como a Constituição Política do Império do Brasil, datada de 25 de março de 1824, especificamente no artigo 179, XXVI, que possuía a seguinte disposição:

XXVI. Os inventores terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas produções. A Lei lhes assegurará um privilégio exclusivo temporário, ou lhes remunerará em ressarcimento da perda, que hajam de sofrer pela vulgarização (BRASIL, 1824).

O Código Criminal do Império de 1830 (Lei de 16 de dezembro de 1830) dispunha no seu artigo 261:

Art. 261. Imprimir, gravar, lithographar, ou introduzir quaisquer escriptos, ou estampas, que tiverem sido feitos, compostos, ou traduzidos por cidadãos brasileiros, enquanto estes viverem, e dez anos depois da sua morte, se deixarem herdeiros. Penas - de perda de todos os exemplares para o autor, ou tradutor, ou seus herdeiros; ou na falta deles, do seu valor, e outro tanto, e de multa igual ao tresdobro do valor dos exemplares (BRASIL, 1830).

Por sua vez, o Código Penal de 1890 (Decreto nº 847 de 11 de outubro de 1890) trouxe inovações relevantes, dedicando todo um capítulo, o Capítulo V, à análise dos delitos relacionados à propriedade literária, artística, industrial e comercial. Neste contexto, diversos artigos tratam da questão da contrafação, conforme ilustrado abaixo:

Art. 345. Reproduzir, sem consentimento do autor, qualquer obra literária ou artística, por meio da imprensa, gravura, ou lithographia, ou qualquer processo mecânico ou chimico, enquanto viver, ou a pessoa a quem houver transferido a sua propriedade e dez anos mais depois de sua morte, si deixar herdeiros: Penas – de apprehensão e perda de todos os exemplares, e multa igual ao triplo do valor dos mesmos a favor do autor (BRASIL, 1890).

Art. 346. Reproduzir por inteiro em livro, collecção ou publicação avulsa, discursos e orações proferidos em assembleias publicas, em tribunaes, em reuniões politicas, administrativas ou religiosas, ou em conferencias publicas, sem consentimento do autor: Penas – de apprehensão e perda dos exemplares e multa igual ao valor dos mesmos, em favor do autor (BRASIL, 1890).

Art. 347. Traduzir e expor á venda qualquer escripto ou obra, sem licença do seu autor: Penas – as mesmas do artigo antecedente. Esta proibição não importa a de fazer citação parcial de qualquer escripto, com o fim de critica, polemica, ou ensino (BRASIL, 1890).

Art. 348. Executar, ou fazer representar, em theatros ou espetáculos públicos, composição musical, tragedia, drama, comedia ou qualquer outra produção, seja qual for a sua denominação, sem consentimento, para cada vez, do dono ou autor: Pena – de multa de 100$ a 500$ a favor do dono ou do autor (BRASIL, 1890).

Art. 349. Importar, vender, ocultar ou receber, para serem vendidas, obras litterarias ou artísticas, sabendo que são contrafeitas: Penas – as de apprehensão e perda dos exemplares e multa igual ao dobro do valor dos mesmos a favor do dono ou autor (BRASIL, 1890).

Art. 350. Reproduzir qualquer produção artística, sem consentimento do dono, por imitação ou contrafacção: Penas – as do artigo antecedente. Paragrapho unico.

Para este effeito reputar-se-ha contrafacção:

1º A reprodução em pintura, quando um artista, sem consentimento do autor, ou daquelle a quem transferiu a propriedade artística, copiar em um quadro grupos, figuras, cabeças ou detalhes de paisagens, ou os fizer entrar no próprio quadro, conservando as mesmas proporções e os mesmos efeitos de luz que na obra original;

2º A reprodução em escultura, quando o imitador tomar em uma obra original, grupos, figuras, cabeças, ornamentos e os fizer entrar na obra executada por elle;

3º A reprodução em música, quando se arranjar uma composição musical para um instrumento só, tendo sido feita para orchestra, ou para um instrumento differente daquelle para o qual foi composta (BRASIL, 1890).

A Constituição da República de 1891 abordou a proteção dos direitos de autores de obras literárias e artísticas, estendendo esses direitos também aos seus sucessores legais. No entanto, não houve menção aos direitos dos autores de obras científicas, conforme estabelecido no Artigo 72, Parágrafo 28º, do referido documento:

Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

§ 26 - Aos autores de obras literárias e artísticas é garantido o direito exclusivo de reproduzi-Ias, pela imprensa ou por qualquer outro processo mecânico. Os herdeiros dos autores gozarão desse direito pelo tempo que a lei determinar (BRASIL, 1891).

Após a incorporação de diretrizes constitucionais e a promulgação de diversos diplomas legais no campo penal, culminou na promulgação da Lei 496, datada de 1º de agosto de 1898, com o propósito de estabelecer e salvaguardar os direitos autorais de obras produzidas no território brasileiro. Essa legislação era composta por vinte e oito artigos e, logo em seu artigo inaugural, introduziu uma inovadora abordagem ao estender a proteção legal não apenas aos autores de obras literárias e artísticas, mas também aos autores de obras científicas. (TRIDENTE, 2019)

A referida lei assegurava os direitos autorais tanto a cidadãos brasileiros quanto a estrangeiros que residiam no Brasil e estabelecia, como requisito constitutivo, o registro da obra, o qual deveria ser efetuado na Biblioteca Nacional, localizada na cidade do Rio de Janeiro. Em uma posterior emenda, ocorrida em 1912, a Lei 496/1898 foi modificada para incluir a proteção não apenas de obras nacionais, mas também de obras estrangeiras (TRIDENTE, 2019).

O Código Civil de 1916, definido pela Lei 3071, promulgada em 1º de janeiro de 1916, apresenta em seu Título V, que aborda diversas categorias de contratos, o Capítulo IX, composto pelos artigos 1346 a 1358, que delineia os direitos e obrigações dos editores, demonstrando uma abordagem clara em relação ao conceito de copyright. Além disso, o Capítulo X, que abrange os artigos 1359 a 1362, regulariza a representação dramática, bem como os direitos e deveres do autor da obra e de seu representante empresarial. (PIMENTA, 2018)

Em 1973, a Lei 5988 foi promulgada com o propósito de regulamentar os direitos autorais e abordar outras questões pertinentes. O artigo 1º dessa lei define os direitos autorais como englobando tanto os direitos do autor quanto os direitos conexos a estes. A legislação já previa a existência tanto dos direitos morais quanto dos direitos patrimoniais do autor, conforme disposto no artigo 21.

O Título VII, que compreende os artigos 116 a 120, estabelece diretrizes para o órgão de fiscalização dos direitos autorais, o Conselho Nacional de Direito Autoral, o qual foi extinto em 1990.

O artigo 17 trata do registro de obras intelectuais, notando-se que não mais se exigia o registro na Biblioteca Nacional como requisito constitutivo, mas sim recomendava-o para fins de salvaguarda dos direitos; assim, o registro passou a ser possível em diversas instituições, dependendo da natureza da obra, conforme segue:

Art. 17. Para segurança de seus direitos, o autor da obra intelectual poderá registrá-Ia, conforme sua natureza, na Biblioteca Nacional, na Escola de Música, na Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Instituto Nacional do Cinema, ou no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. § 1º Se a obra for de natureza que comporte registro em mais de um desses órgãos, deverá ser registrada naquele com que tiver maior afinidade. § 2º O Poder Executivo, mediante Decreto, poderá, a qualquer tempo, reorganizar os serviços de registro, conferindo a outros Órgãos as atribuições a que se refere este artigo (BRASIL, 1973).

A Lei 5988 perdeu sua vigência com a promulgação da Lei 9610 em 1998, com exceção do artigo 17, mencionado anteriormente, que permanece em efeito.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a proteção dos direitos autorais ficou estabelecida no Título II - Direitos e Garantias Fundamentais, no Capítulo I - Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, especificamente nos artigos 5º (parágrafo inicial) e nos incisos XXVII e XXVIII, conforme descrito a seguir:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;

XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:

a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;

b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas; (BRASIL, 1988).

Além da garantia constitucional, a legislação em vigor que protege os direitos autorais é a Lei 9610 de 19 de fevereiro de 1998, conhecida como LDA. Esta lei foi criada com a finalidade de revisar, atualizar e consolidar as normas relacionadas aos direitos autorais, englobando não apenas os direitos dos autores, mas também os direitos conexos (artigo 1º). Além disso, a lei estabelece que os direitos autorais são considerados "bens móveis" para fins legais (artigo 3º).

A LDA define obras protegidas como "criações do intelecto, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou a ser inventado no futuro" (artigo 7º). Esta definição é abrangente e abarca diversos tipos de criações intelectuais.

Outro aspecto importante é a definição do autor como a pessoa responsável pela criação de uma obra literária, artística ou científica (artigo 11). A lei também permite que, em certos casos, a autoria seja atribuída a pessoas jurídicas. Importante mencionar que, de acordo com o artigo 18 da lei, a proteção dos direitos autorais não depende do registro da obra.

No que diz respeito aos direitos morais, a LDA estabelece que o autor tem o direito de reivindicar a autoria, ter seu nome associado à obra, manter a obra inédita e preservar sua integridade. Esses direitos são transferíveis aos herdeiros após a morte do autor. A lei também enfatiza que cabe ao Estado a responsabilidade de proteger a integridade e autoria das obras em domínio público, e que os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis (TRIDENTE, 2019).

A despeito dos direitos patrimoniais, a LDA atribui exclusivamente ao autor o direito de usar, fruir e dispor de sua obra literária, artística ou científica. Qualquer utilização por terceiros, em diversas modalidades, requer a prévia autorização expressa do autor.

A lei também aborda a questão da coautoria, estabelecendo que, em obras indivisíveis com coautores, nenhum deles pode publicar, autorizar a publicação ou reprodução da obra sem o consentimento dos demais, sob pena de responsabilidade por perdas e danos. No entanto, um coautor pode optar por não contribuir para a publicação da obra, renunciando à sua parte nos lucros e vetando a inclusão de seu nome.

A LDA estabelece ainda que a aquisição de uma obra original ou exemplar não confere ao adquirente nenhum direito patrimonial do autor. Além disso, o autor tem o direito de receber, irrenunciável e inalienável, pelo menos 5% do aumento do preço em cada revenda de obras originais que ele tenha vendido (artigos 37 e 38), conhecido como "Direito de Sequência".

Os direitos patrimoniais do autor são incomunicáveis, exceto os rendimentos provenientes da exploração da obra e casos previstos em pacto antenupcial. No caso de obras anônimas ou pseudônimas, os direitos patrimoniais são garantidos àquele que a publicar.

Sobre o prazo de proteção dos direitos patrimoniais, a LDA estabelece que ele é de setenta anos, a serem contados a partir de 1º de janeiro após o ano de falecimento do autor. No caso de coautores de obras indivisíveis, o prazo é contado a partir da morte do último coautor sobrevivente.

Além disso, a LDA não considera infração aos direitos autorais a reprodução de obras, parcial ou integralmente, desde que o devido crédito seja atribuído ao autor, para fins de reprodução de discursos públicos, obras sem fins lucrativos destinadas a deficientes visuais, reprodução de trechos para uso exclusivo do copista, resumo de lições em instituições de ensino sem fins lucrativos e outras situações similares.

A lei também permite a reprodução, parcial ou integral, de obras preexistentes em novas obras, desde que isso não prejudique o autor reproduzido. Além disso, a imprensa tem o direito de usar obras em suas matérias jornalísticas sem violar os direitos do autor. Paráfrases e paródias que não desacreditam o autor e não constituem reproduções também são permitidas.

Todas essas disposições legais oferecem oportunidades para a utilização de obras protegidas, respeitando os direitos autorais e, ao mesmo tempo, promovendo o acesso à cultura e à informação. De acordo com Pimenta (2018), essas medidas legais atenuam uma das dimensões mais restritivas dos direitos autorais, a dimensão patrimonial, tornando possível o uso criativo e educacional de obras protegidas:

O aproveitamento fixado na legislação, com as limitações demonstram o interesse social, que, fundado na liberdade de aproveitamento para a coletividade, na igualdade para todos de aproveitamento e visando ao desenvolvimento tecnológico e o progresso cultural delineia o princípio cursionador do equilíbrio entre o direito do titular e o interesse coletivo. As limitações, ora versadas, referem-se ao uso da obra intelectual em que não se necessita de autorização e, por conseguinte, são isentas do pagamento de royalties aos titulares de direitos autorais – nascendo o princípio da livre utilização (PIMENTA, 2018, p. 67).

O autor também argumenta que o Estado busca, por meio de tais medidas, atenuar a disparidade na distribuição de renda, a fim de mitigar seu impacto na disseminação da cultura. No contexto de suas atribuições, o Estado desempenha várias funções, intervindo em conflitos sociais, resolvendo disputas e, nesse âmbito, tem a responsabilidade de compensar as comunidades que sofrem com a falta de acesso adequado à educação devido a limitações, prejudicando o desenvolvimento social e intelectual e resultando em exclusão social. A política governamental é uma resposta emergencial à distribuição desigual de renda, introduzindo uma dimensão social na restrição dos direitos autorais. A legislação, com base na proporcionalidade, busca atender a essas necessidades sem prejudicar o detentor dos direitos autorais, estabelecendo limitações nos direitos autorais (PIMENTA, 2018).

É fundamental destacar que o uso que mitiga o direito patrimonial do autor em favor do bem social deve respeitar os limites legais e não pode ser totalmente livre ou irrestrito. A norma deve encontrar um equilíbrio entre a proteção dos interesses do autor e o acesso da sociedade. A mesma lei que, em determinados momentos, restringe os próprios direitos que protege deve também preservar a obra mesmo quando ela entra no domínio público.

Além disso, a Lei de Direitos Autorais (LDA) aborda as sanções civis aplicáveis em caso de violação dos direitos autorais. Um de seus artigos estipula que execuções públicas não autorizadas, ou realizadas em desacordo com a lei, sujeitam os executores ao pagamento de um valor vinte vezes superior ao que originalmente deveria ser pago ao autor.

Em 2010, o Ministério da Cultura (MinC) submeteu um anteprojeto que propunha alterações na LDA à consulta pública. De acordo com informações divulgadas pela Rádio Câmara em 3 de janeiro de 2011, a população contribuiu com mais de oito mil sugestões, que serão consideradas na elaboração da proposta de alteração da lei vigente desde 1998 (PIMENTA, 2018).

As modificações propostas no anteprojeto incluiriam mudanças na gestão dos direitos autorais, permitindo a supervisão estatal do processo. Essas alterações equilibrariam o direito do autor com outros direitos constitucionalmente garantidos, como o direito à informação, deixando claro que o direito patrimonial do autor não é absoluto. Além disso, o anteprojeto apresentaria uma definição de "fair use" em seu artigo 46 (I e II), ampliando as possibilidades de compartilhamento (PIMENTA, 2018).

Portanto, a proposta de revisão da LDA incluiria uma flexibilização dos direitos autorais, bem como a importância de um amplo debate não apenas com a sociedade, mas também com juristas, antes de submeter o projeto para votação no Congresso Nacional.

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Ana Karoline. Da tutela aos direitos autorais musicais no meio digital como reflexo dos direitos humanos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 7874, 21 jan. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/106859. Acesso em: 5 dez. 2025.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos