5. IMPACTO DO WELFARE-STATE NO MODELO DE GERAÇÕES SOBREPOSTAS
Segundo essa perspectiva, as modificações observadas no welfare-state (pós-anos 1970) consistiriam em adaptações funcionais a mudanças no ambiente econômico, social e político.
Entre estas estariam a desindustrialização, a globalização, as novas estruturas de classe e composição das famílias, mudanças demográficas e novas relações de gênero, além de mudanças de regime político, democratização, reformas constitucionais e novos níveis de mobilização política.
Essas circunstâncias se traduziriam em novas estruturas de riscos sociais e, consequentemente, em novas oportunidades para o desenvolvimento do welfare-state.
Fundamentalmente, os riscos sociais relacionados à industrialização, que justificaram a existência do estado de bem-estar do pós-guerra, teriam sido substituídos por um conjunto de novos riscos.
A reestruturação deste decorreria de novos processos exógenos - a crise econômica dos anos 1970 e a globalização a partir dos anos 1980 - que, apesar de terem afetado a margem de manobra para políticas públicas domésticas, criaram novas necessidades em termos de proteção social.
Outro processo econômico transversal ao anterior seria a desindustrialização e a reestruturação do mercado de trabalho que a acompanha. Mudanças tecnológicas limitativas ao crescimento do emprego, proeminência da economia dos serviços e avanço da economia do conhecimento foram fatores que impuseram menor segurança no emprego e relações de trabalho mais precárias, requerimento de maior qualificação do trabalho, desemprego duradouro e dualidade no mercado de trabalho – riscos relativamente desconhecidos do welfare-state industrial e que solicitariam respostas adaptativas de um welfare-state pós-industrial.
Um terceiro subconjunto de novos riscos adviria das mudanças demográficas (destacando-se o já mencionado envelhecimento das populações) e dos novos arranjos familiares (com mais famílias uni parentais, famílias com dois trabalhadores, famílias compostas de apenas um indivíduo), os quais requereriam perfis diferenciados de proteção e crescente individualização do welfare.
Os novos riscos estimulariam adaptações na direção de um novo estado de bem-estar: o discurso segundo o qual estaria havendo uma “redução de benefícios”, referenciado a uma perspectiva dos riscos da industrialização, seria insensível às novas fontes de riscos sociais a requererem proteção sob novas circunstâncias e, portanto, à expansão de benefícios em novas áreas de fato ocorrida. Essas adaptações foram, em geral, qualificadas como “recalibragem” ou “transformação” do estado de bem-estar.
Entre as novas áreas de ação estão as políticas de mercado de trabalho ativo e as políticas de conciliação da vida familiar com o trabalho.
Diante dessa análise dinâmica de welfare-state, teceremos uma revisão literária dos modelos previdenciários, nos trabalhos seminais de Samuelson (1958) e Diamond (1965), o modelo OLG foi desenvolvido para analisar as finanças públicas, a acumulação de capital, as dimensões de bem-estar entre gerações, a dívida pública e as medidas de segurança para a velhice.
A grande extensão do modelo OLG de Diamond (1965) foi o modelo OLG dinâmico com muitas gerações, de Auerbach e Kotlikoff (1987), e é esse modelo que tem sido aplicado com sucesso para analisar as questões que vão desde sistemas de pensões até tributação. Ele é utilizado para mostrar os efeitos dos sistemas de pensões e os impactos de reformas tributárias.
Como apontam Rasmussen e Rutherford (2001) e Kotlikoff, Smetters e Walliser (2002), os modelos OLG tornaram-se uma ferramenta-padrão para a análise da política aplicada desde a contribuição seminal de Auerbach e Kotlikoff (1987).
Este modelo geracional permite não apenas que se faça uma análise do impacto econômico da desoneração, como também sugere quais seriam os impactos sobre as diversas gerações, e por ser uma medida de caráter previdenciário, a análise da desoneração da folha sob o aspecto intergeracional é importante para uma visão mais ampla dos efeitos da medida.
No Brasil a Previdência Social utiliza o sistema de repartição simples (PAYG - PAY AS YOU GO), já a receita anual da Previdência Social é advinda da parte da remuneração dos empregados ponderada pelas horas trabalhadas e pela proxy de capital humano. E o cálculo da variação do bem-estar inicia-se por meio da mensuração da variação da utilidade dos indivíduos sob a nova política tributária, que proporciona o mesmo nível de satisfação que desfrutavam antes da reforma tributária.
Essa variação da parcela de ganho ou perda surge da solução do os níveis de utilidade de estado estacionário.
Em relação a futuras propostas de políticas tributárias, este modelo pode ser útil para análise de reformas previdenciárias mais arrojada, o que representa a condição de vulnerabilidade utilizando a média de três dimensões:
Infraestrutura urbana: nesse caso, são utilizados dados como o abastecimento de água, rede de esgoto sanitário e coleta de lixo;
Capital humano: acesso à educação e condições de saúde; e
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Renda e trabalho: considera a insuficiência de renda das famílias, a desocupação de adultos ou ocupação informal sem ensino fundamental, dependência da renda de pessoas idosas e presença de trabalho infantil.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A política da desoneração da folha, da maneira como foi implementada, promoveu de forma distorcida a alocação de uma quantidade significativa de recursos públicos. A medida foi estendida a vários setores da economia brasileira sem se orientar por critérios técnicos, desviando-se de seus objetivos iniciais. Afinal é uma forma de criar receitas ao governo.
Além disso, careceu de um estudo prévio e aprofundado à sua adoção que norteasse o estabelecimento de critérios objetivos para embasar a escolha dos setores econômicos incluídos, não houve a fixação de metas claras e indicadores de desempenho para a medição de seus resultados.
A desoneração da folha aumentou os custos administrativos, tanto por parte do Fisco, que incorre em custos adicionais para adequar os sistemas de controle e administração dos créditos tributários, quanto por parte dos contribuintes, que agora dispendem mais recurso para apurar e pagar mais um tributo, além de apresentar novas obrigações acessórias.
O desenho da política, ao beneficiar somente alguns setores econômicos, resultou em um impacto negativo na equidade horizontal e na vertical, pois setores semelhantes passaram a ter tratamento tributário diferente; e mesmo dentro de um setor beneficiado, existem empresas que foram desoneradas enquanto que outras tiveram sua carga aumentada.
Além disso, a discriminação de setores também reduziu a eficiência econômica da alocação dos recursos, ao distorcer as decisões de como, onde, quando e o que produzir, e diante da análise dinâmica de welfare-state, e dos modelos literários, o modelo de gerações sobrepostas – OLG, adotado pelo Brasil, utiliza do sistema de repartição simples (PAY AS YOU GO - PAYG), já a receita anual previdenciária é advinda da parte da remuneração dos empregados ponderada pelas horas trabalhadas e pela proxy de capital humano. O cálculo da variação do bem-estar inicia-se por meio da mensuração da variação da utilidade dos indivíduos sob a nova política tributária, que proporciona o mesmo nível de satisfação que desfrutavam antes da reforma tributária. Essa variação da parcela de ganho ou perda surge da solução do os níveis de utilidade de estado estacionário. Em relação à futuras propostas de políticas tributárias, este modelo OLG pode ser útil para análise de reformas previdenciária mais arrojada, devendo considerar a condição de vulnerabilidade em sua tridimensão.
Os estudos retrospectivos que buscaram avaliar o real impacto da Desoneração não apontaram avanços significativos, aliás, os resultados sugerem que a desoneração da folha de pagamentos tem um impacto relevante sobre as principais variáveis macroeconômicas, embora “falseia” algum efeito distributivo, favorecendo as gerações mais jovens em detrimento das gerações mais velhas, o sistema previdenciário tende a contemplar com essas benesses, apenas o pagamento de um valor mínimo a título de aposentadoria pública, uma contribuição previdenciária sobre o valor adicionado, levando todos os segurados a vulnerabilidade social.
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