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Produtos da investigação criminal

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3. PRODUTO DA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL – PIC

3.1. Conceito de PIC

Assim como o insumo corresponde a todo elemento encontrado e coletado, indistintamente do tipo, o produto é o insumo coletado que, depois da análise, tem relação com a infração (indício ou evidência). Ora, se de um lado temos o insumo, o elemento que entra na confecção de algo, de outro temos que esse algo se finaliza ou resulta como produto. Para indicar que esses produtos se referem à persecução penal, chamamos esse grupo de produto da investigação criminal.

Os Produtos da Investigação Criminal (PICs) são, especificamente, os insumos dos tipos dados, informações e materiais que, após analisados, têm ligação indireta ou direta ao fato criminoso, seja às suas circunstâncias ou à sua autoria, e se desdobram em dois gêneros: indício e evidência. De outra maneira não poderia ser, pois os insumos são, meramente, elementos coletados que aguardam análise e que podem ou não ter interesse para a investigação.

3.2. Classificação do PIC

Classificamos os PICs quanto à natureza, ao gênero, à espécie e à forma jurídica.

3.2.1. Classificação quanto à natureza

Quanto à natureza, os PICs são classificados em material e imaterial.

3.2.1.1. Elemento material

O elemento material existe por si no mundo físico, é recolhido e independe de registro.

3.2.1.2. Elemento imaterial

O elemento imaterial é uma representação lógica do mundo físico, é captado ou extraído, não existe por si e está, necessariamente, registrado em suporte.

3.2.2. Classificação quanto ao gênero

Quanto ao gênero, os PICs são classificados em evidência e indício.

3.2.2.1. Evidência

Segundo Plácido e Silva, evidência “do latim evidens (claro, patente), é o vocábulo que designa, na terminologia jurídica, tudo que está demonstrado, que está provado, ou que é convincente, pelo que se entende digno de crédito ou merecedor de fé.”. 5

Para João Henrique Ferreira, apud Maria Rita Ferragut (Presunções do direito tributário. São Paulo: Dialética, 2001), “a prova deverá evidenciar a correspondência entre a proposição e a manifestação do evento. Por isso, não necessita corresponder aos eventos fenomênicos em si, mas à linguagem que se tem sobre eles. Atingis o evento, que é passado, é impossível, bastando para o mundo jurídico construí-lo de forma a provar sua existência ou inexistência.”. 6

A evidência é o juízo de certeza de que o insumo está atrelado diretamente ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria. É a prova direta.

CPP. Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feita antes daquele prazo, o que declararão no auto.

CPP. Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

3.2.2.2. Indício

De acordo com Pácido e Silva, indício “do latim indicium (rastro, sinal, vestígio), na técnica jurídica, em sentido equivalente a presunção, quer significar o fato ou a série de fatos, pelos quais se pode chegar ao conhecimento de outros, em que se funda o esclarecimento da verdade ou do que se deseja saber.”. 7

Segundo João Henrique Ferreira, apud Carl Joseph Anton Mittermaier (Tratado da prova em matéria criminal – 4ª ed. – Campinas: Bookseller, 2024, pág, 421), indício é “a circunstância acessória que se prende ao principal, e, por isto, faz concluir ou que o crime foi praticado ou que um indivíduo determinado, tomou parte dele, ou que teve lugar por esta ou aquela forma. Em uma palavra, os indícios têm relação ou com o fato, ou com o agente, ou com o modo do fato.”. 8

O indício é o juízo de convicção de que o insumo está indiretamente ligado ao fato criminoso, suas circunstâncias e autoria, sendo a comprovação de um fato externo que, por dedução, pode explicá-lo. É a prova indireta.

CPP. Art. 239. Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.

3.2.3. Classificação quanto à espécie

Quando à espécie, identificamos na legislação pátria 09 (nove) tipos de PICs: o vestígio do crime; o instrumento do crime; o produto do crime; o proveito do crime; o objeto circunstancial do crime; o dado do crime; o dado circunstancial do crime, a informação do crime e a informação circunstancial do crime. A expressão “do crime” quer indicar a relação, direta ou indireta, ao fato delitivo, seja às suas circunstâncias ou à sua autoria.

Podemos reuni-los da seguinte maneira quanto ao gênero:

  • Evidências: vestígio do crime, instrumento do crime, produto do crime, dado do crime e informação do crime.

  • Indícios: proveito do crime, objeto circunstancial do crime, dado circunstancial do crime e informação circunstancial do crime.

3.2.3.1. Vestígio do crime

É o elemento material surgido do fato criminoso, isto é, a modificação da matéria provocada pelo delito. Está presente apenas nos crimes materiais e, sendo exclusivamente material, sua a coleta, cuja característica pode ser biológica, física ou química, é feita por recolhimento (pegar, retirar, tocar etc).

CPP. Art. 158. Quando a infração deixar vestígios será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

CPP. Art. 158-A. (...) § 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal.

CPP. Art. 158-B. (...) IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza; (...)

VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;

CPP. Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinado pela natureza do material. (...)

§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de informações sobre seu conteúdo.

O conceito normativo se iguala ao de evidência na doutrina criminalística, ou seja, o vestígio já analisado que possui relação com o delito. Entretanto, como somente pode ser considerado vestígio do crime o insumo tratado que possui relação e foi resultado direto do fato criminoso, está correto o preceito legal.

Atualmente, é necessária a adequação do termo “vestígio” do CPP à LONPC, pois, quando coletado, o elemento material ainda é um insumo e somente após a análise, e tendo relação direta com a infração penal, será classificado como vestígio. Logo, à luz da nova dinâmica investigativa, onde se lê vestígio na cadeia de custódia do CPP, deve-se ler insumo.

Como indica um juízo de certeza da ligação do insumo ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, o vestígio será uma evidência material.

3.2.3.2. Instrumento do crime

Conforme Guilherme de Souza Nucci, “os instrumentos são os objetos que servem de agente mecânico para a prática do crime. Ex.: revólver, faca, pedaço de madeira, estilete, entre outros.” 9. É um PIC exclusivamente material, possui especificação própria no CPP e não se confunde com vestígio.

CPP. Art. 11. Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova, acompanharão os autos do inquérito.

CPP. Art. 175. Serão sujeitos a exame os instrumentos empregados para a prática da infração, a fim de se lhes verificar a natureza e a eficiência.

Um exemplo de diferença entre vestígio e instrumento é uma faca suja de sangue. Após a análise dos insumos materiais e demonstradas as relações ao crime, a faca será o instrumento do crime e o sangue será o vestígio do crime.

Como indica um juízo de certeza da ligação do insumo ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, o instrumento do crime será uma evidência material.

3.2.3.3. Produto do crime

É o bem objetivado pela conduta delitiva. De acordo com Norberto Avena, “trata-se do bem diretamente obtido a partir da prática delituosa, como, por exemplo, o carro furtado, a joia roubada.” 10. Plácido e Silva indica ser bem “a coisa ou o direito incorporado ao patrimônio privado ou pertencente ao patrimônio público” 11. Logo, pode ter natureza material (bem) ou imaterial (valor). Sua análise/avaliação, direta ou indireta, é feita somente se necessária.

CPP. Art. 172. Proceder-se-á, quando necessário, à avaliação de coisas destruídas, deterioradas ou que constituam produto do crime.

Parágrafo único. Se impossível a avaliação direta, os peritos procederão à avaliação por meio dos elementos existentes nos autos e dos que resultarem de diligências.

Como indica um juízo de certeza da ligação do insumo ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, o produto do crime será uma evidência material ou imaterial.

3.2.3.4. Proveito do crime

Proveito ou provento é a especialização do produto do crime, ou seja, o bem (material) ou valor (imaterial) conseguido com sua utilização. A legislação não possui regramento de análise do proveito do crime, mas, por analogia, entendemos salutar a utilização do mesmo para o produto do crime.

CPP. Art. 28-A. (...) II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

Ligado diretamente ao produto do crime, pois fruto de sua especialização, sua relação é indireta ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria e, por isso, será um indício material ou imaterial.

3.2.3.5. Objeto circunstancial do crime

Por ausência de terminologia legal, denominamos objeto circunstancial do crime todo insumo material analisado, indiretamente relacionado à infração e que não tenha conceito próprio.

Segundo Plácido e Silva, a palavra objeto “do latim objectus, de objicere (pôr diante), quer exprimir a realidade, materialidade, a corporeidade das coisas: é, pois, o que existe, que é visível e que se põe diante dos sentidos.”. 12

Ainda para o autor, a palavra circunstância, “no sentido jurídico, derivado do latim circumstantia, de circumstare (rodear, cercar), dá bem a ideia de tudo, seja qualidade, acidente ou atributo, que se acerca ou vem anexo ao fato ou ao direito, para, por vezes, lhe mudar a própria substância ou natureza.”. 13

Para Leonardo Barreto Moreira Alves, o objeto circunstancial, a quem chama de objeto de prova, é aquele que possua “utilidade para demonstrar ao juiz a realidade do ocorrido, como livros contábeis, computadores, carro do indiciado ou da vítima contendo vestígios de violência etc.”. 14

CPP. Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:(...)

II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

CPP. Art. 11. Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova, acompanharão os autos do inquérito.

CPP. Art. 166. (...) Parágrafo único. Em qualquer caso, serão arrecadados e autenticados todos os objetos encontrados, que possam ser úteis para a identificação do cadáver.

CPP. Art. 172. Proceder-se-á, quando necessário, à avaliação de coisas destruídas, deterioradas ou que constituam produto do crime.

CPP. Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: (...)

§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre: (...)

VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;

CPP. Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 1º Proceder-se-á à busca domiciliar, (...), para: (...)

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

LONPC. Art. 6º Compete à polícia civil, (...), especificamente: (...)

V – garantir a adequada coleta, a preservação e a integridade da cadeia de custódia de dados, informações e materiais que constituam insumos, indícios ou provas;

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Citamos como exemplo o carro pessoal utilizado pelo autor de um crime para sua fuga, pois não é vestígio, instrumento, produto ou proveito do crime, mas um objeto indiretamente ligado ao fato e que ajuda a compreender as circunstâncias do evento.

Ligado indiretamente ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, será um indício material.

3.2.3.6. Dado do crime

O dado do crime é um insumo imaterial analisado e diretamente ligado ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria. É o rastro imaterial deixado pelo delito.

Por ser o dado um elemento lógico representativo da realidade, é incorreto chamá-lo de vestígio imaterial, pois, como visto anteriormente, o vestígio é exclusivamente material.

Segundo a Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública (DNISP), dado é “toda e qualquer representação de fato, situação, comunicação, notícia, documento, extrato de documento, imagem estática ou dinâmica, relato, denúncia, etc., ainda não submetida à metodologia de Produção de Conhecimento.”. 15

Para Gomes, Pimenta e Schneider, “é a gravação ou a impressão de caracteres ou símbolos que tenham um significado em algum documento ou suporte físico.” 16

Dado é a representação de um atributo (sinal, símbolo, valor, marca ou impressão) da realidade material, de característica digital ou analógica, registrado em qualquer tipo de meio, suporte ou formato.

Encontramos o conceito formal de dado em várias normas infra legais, todas com o mesmo teor.

Decreto nº 8.777/2016 (Institui a Política de Dados Abertos do Poder Executivo Federal):

Art. 2º Para os fins deste Decreto, entende-se por:

I - dado - sequência de símbolos ou valores, representados em qualquer meio, produzidos como resultado de um processo natural ou artificial;

Sendo o dado um elemento lógico, é necessário um meio ou suporte prévio que possa captá-lo. Portanto, não existe dado sem registro. Assim, o cérebro se enquadra como suporte físico (biológico).

O dado possui duas formas de coleta: captação e extração. Ocorre a captação quando se gera a representação lógica do mundo natural em um meio ou suporte e a extração quando, já previamente captado, “retira-o” do meio ou suporte.

Citamos como exemplos de dados as impressões (digital, pegada, marca etc.); as fotografias; as gravações de áudio e/ou vídeo; os dados eletrônicos; a comunicação verbal (fala) e a não verbal (linguagem corporal) etc.

Vejamos alguns tipos de dados encontrados na legislação:

  1. dado pessoal: informação relacionada à pessoa natural identificada ou identificável. (art. 5º, I, Lei nº 13.709/2018; art. 4º, IV, Lei nº 12.527/2011; art. 3º, V, Decreto nº 7.724/2012);

  2. dado pessoal sensível: dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoal natural. (art. 5º, II, Lei nº 13.709/2018);

  3. dado anomizado: dado relativo a titular que não possa ser identificado, considerando a utilização de meios técnicos razoáveis e disponíveis na ocasião de seu tratamento. (art. 5º, III, Lei nº 13.709/2018);

  4. dado acessível ao público ou ostensivo: qualquer dado gerado ou acumulado pelos entes públicos que não esteja sob sigilo ou sob restrição de acesso nos termos da Lei nº 12.527/2011; (art. 4º, V, Lei n 14.129/2021; art. 4º, III, Lei nº 12.527/2011; art. 2º, II, Decreto nº 8.777/2016; art. 2º, VII,);

  5. dado sigiloso: informação submetida temporariamente à restrição de acesso público em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado, e aquelas abrangidas pelas demais hipóteses legais de sigilo, classificado como sigiloso e requer medidas especiais de acesso; (art. 3º, IV, Decreto nº 7.724/2012);

  6. dado aberto: acessível ao público, representados em meio digital, estruturados em formato aberto, processáveis por máquina, referenciados na internet e disponibilizados sob licença que permita sua livre utilização, consumo ou tratamento por qualquer pessoal, física ou jurídica; (art. 4º, IV, Lei n 14.129/2021;art. 2º, III, Decreto nº 8.777/2016);

  7. dado geoespacial: aquele que se distingue essencialmente pela componente espacial, que associada a cada entidade ou fenômeno uma localização na Terra, traduzida por sistema geodésico de referência, em dado instante ou período de tempo, podendo ser derivado, entre outras fontes, das tecnologias de levantamento, inclusive as associadas a sistemas globais de posicionamento apoiados por satélites, bem como de mapeamento ou sensoriamento remoto; (art. 2º, I, Decreto nº 6.666/2008);

  8. metadado: informação que descreve características de determinado dado, explicando-o em certo contexto de uso; (art. 2º, II, Decreto nº 6.666/2008).

Como exemplos de dados do crime indicamos a impressão digital do suspeito na cena do crime, a gravação direta do delito por meio de uma câmera de segurança, a marca de frenagem como um dos elementos a determinar a velocidade do veículo, a pichação, fotos e vídeos de pornografia infantil, ameaça por meio digital, escritos de ameaça etc.

Diretamente ligado ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, o dado do crime será uma evidência imaterial.

3.2.3.7. Dado circunstancial do crime

Por ausência de terminologia formal, denominamos dado circunstancial do crime todo insumo imaterial bruto analisado, indiretamente relacionado à infração e que não tenha conceito próprio.

CPP. Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: (...)

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

CPP. Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: (...)

§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre: (...)

VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;

LONPC. Art. 6º Compete à polícia civil, (...):

V – garantir a adequada coleta, a preservação e a integridade da cadeia de custódia de dados, informações e materiais que constituam insumos, indícios ou provas;

Citamos como exemplos de dados circunstanciais do crime, pois não demonstra o evento em si, referenciando-o apenas, os depoimentos, os reconhecimentos, o registro de georrefenciamento do suspeito no local do crime etc.

Indiretamente ligado ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, o dado circunstancial do crime será um indício imaterial.

3.2.3.8. Informação do crime

Informação do crime é o conjunto de dados já tratados que faz referência direta ao delito, suas circunstâncias ou sua autoria, e aptos, de pronto, à incorporação no caderno apuratório.

Informações são os documentos ou escritos manuais ou digitais.

LONPC. Art. 6º Compete à polícia civil, (...):

V – garantir a adequada coleta, a preservação e a integridade da cadeia de custódia de dados, informações e materiais que constituam insumos, indícios ou provas;

Indicamos como exemplos de informação do crime a Recognição Visuográfica e o Laudo de Exame Perinecroscópico, pois suas produções são imediatas à cena do crime, não exigindo análise de dado ou vestígio, mas apenas “montagem” do que observado pela fórmula do visum et repertum.

Diretamente ligado ao fato criminoso, suas circunstâncias ou autoria, a informação do crime será uma evidência imaterial.

3.2.3.9. Informação circunstancial do crime

Por ausência de terminologia formal, denominamos informação circunstancial do crime todo conjunto de dados já tratados, indiretamente relacionado à infração, que não tenha termo próprio e apto, de pronto, à incorporação no caderno investigativo.

CPP. Art. 6º Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:(...)

III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;

CPP. Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: (...)

§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre: (...)

VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;

LONPC. Art. 6º Compete à polícia civil, (...):

V – garantir a adequada coleta, a preservação e a integridade da cadeia de custódia de dados, informações e materiais que constituam insumos, indícios ou provas;

Citamos como exemplo de informação circunstancial do crime uma passagem de ônibus interurbano comprada pelo suspeito para fugir da cidade.

Por fazer referência indireta ao fato delitivo, suas circunstâncias ou autoria, será um indício imaterial.

3.2.4. Classificação quanto à forma jurídica

É a relação formal dos PICs com o processo penal. Segundo o CPP, são chamados de elementos informativos (ou elementos de prova, pela doutrina) podendo ser a prova repetível, a prova cautelar, a prova não repetível e a prova antecipada.

CPP. Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

O artigo especifica que todos os elementos da investigação são chamados de informativos, gênero, cujas espécies são, pelo uso da palavra “ressalvadas”, as provas cautelares, as provas não repetíveis e as provas antecipadas. É possível indicar, também, a espécie das provas repetíveis, pois são aqueles elementos informativos cuja decisão não pode o juiz fundamentar exclusivamente.

O exame da norma mostra que todos os elementos colhidos na fase preliminar são, necessariamente, provas, vez que demonstram um fato, mas as repetíveis, por escolha legislativa, podem ser refeitas judicialmente. Atentemos para a expressão “podendo fundamentar”, e não “devendo fundamentar”, vez que ao juiz é facultado prolatar sua decisão nas provas repetíveis em complemento às demais e, por isso, a escolha do refazimento ou não deve ficar a cargo da autoridade judicial e a pedido das partes.

Entretanto, observa-se que o próprio artigo é mal redigido, o que leva a contradições e discussões doutrinárias inúteis sobre o que é válido ou não dentro do processo. Dentre os tipos de elementos informativos, apenas o antecipado pode ser chamado, tecnicamente, de prova, pois sujeito ao contraditório judicial. As provas cautelares e provas não repetíveis nada mais são que elementos informativos irrepetíveis.

3.2.4.1. Prova não repetível

A prova não repetível é o PIC cuja coleta, por não se tratar de reserva de jurisdição das inviolabilidades constitucionais ou, em se tratando, tenha o sujeito consentido livremente, independe de ordem judicial e que não pode de ser refeita por ausência de igualdade de condições do objeto ou do meio. São exemplos a Recognição Visuográfica e o Laudo de local de crime (informação), o Laudo Investigativo (dados) e o Laudo de Exame Pericial (materiais).

3.2.4.2. Prova cautelar

A prova cautelar é o PIC cuja coleta, por se tratar de reserva de jurisdição das inviolabilidades constitucionais, depende de ordem judicial e possui urgência da medida pelo possível perdimento do insumo. São exemplos a busca, a apreensão, o sequestro, a interceptação e as quebras de sigilo.

3.2.4.3. Prova antecipada

A prova antecipada é o PIC cuja coleta é realizada judicialmente durante a fase investigativa, seja por previsão de perda da prova pelo decurso do tempo, a exemplo da prova testemunhal de policiais (RHC 64.086/STJ), seja por imposição legal, a exemplo do depoimento especial quando a criança tiver menos de 07 (sete) anos (Lei nº 13.431/17).

3.2.4.4. Prova repetível

A prova repetível é o PIC que, por não se tratar de reserva de jurisdição das inviolabilidades constitucionais, não depende de ordem judicial para sua coleta e que, por manter as mesmas características no decurso do tempo, pode ser refeita em juízo.

Como exemplos, citamos os Relatórios de Interesse da Atividade Policial de banco de dados oficial sobre endereço ou sobre qualificação ou um Laudo de Exame Pericial em uma arma ou documento falso, cujas análises, estando guardados os objetos, podem ser refeitos na fase judicial, desde que se mantenham as mesmas condições e características.

CPP. Art. 543. (...) II - os exames periciais, quando possível, serão repetidos, e de preferência pelos mesmos peritos;

Erroneamente, indicam-se todas as oitivas e os reconhecimentos como provas repetíveis, o que vai de encontro à ciência da psicologia do testemunho, cujas coletas seguem técnicas de entrevista e não podem ser repetidas sem interferir na memória.

Como bem salientado no caderno Pensando o Direito nº 59, do Ministério da Justiça, “essa classificação não leva em consideração as ultimas décadas de pesquisa em termos de Psicologia do Testemunho. Não apenas o tempo é importante fator de deterioração da memoria, dificultando a possibilidade de evocação de determinadas situações de interesse da justiça, pois, como sabemos, que um testemunho não será rigorosamente igual ao outro. Desta forma, a prova dependente da memoria teria de ser considerada também como irrepetível.”. 17

Segundo Fiorelli e Mangini “a memória e o tempo não convivem em harmonia; daí a importância de se realizarem entrevistas, reconstituições da cena e outras providências que possam estar relacionadas com as lembranças, tão logo quanto possível” 18, pois “para a psicologia, há distinção entre a realidade objetiva e a realidade psíquica de cada indivíduo, e somente as técnicas de entrevistas para evitar que a investigação se transforme em um fator de alteração da realidade relatada.”. 19

Os mesmo autores ainda afirmam que “as entrevistas (com criminosos, vítimas, testemunhas) constituem um momento peculiar, porque existe o fator emocional sempre presente, capaz de proporcionar inúmeros fenômenos, lapsos, bloqueios, modificações de lembranças, confabulações podem estar presentes e somente a habilidade do entrevistador permite eliminar ou reduzir essas possibilidades.” 20, “daí a importância do domínio de técnicas de entrevista, para evitar que esta ferramenta da investigação se transforme em um fator de alteração da realidade relatada” 21,

O caderno Pensando o Direito nº 59 indica três etapas do processo de memorização, a codificação, o armazenamento e a recuperação. A codificação é “a transformação do fato vivenciado (estimulo) em uma forma que possa ser retida pelo nosso cérebro (sistema cognitivo).”. O armazenamento é “a etapa de retenção da informação que foi codificada, se essa lembrança e considerada importante para a pessoa ela e armazenada na memoria de longo prazo, estando disponível para ser recuperada por ela.”. A recuperação é “o processo de busca da informação armazenada.”. 22

A terceira etapa da memorização (recuperação) é o foco da investigação criminal. Ela pode se dar por depoimento (oitiva) ou reconhecimento, ambas através de recordação. E para isso, “a literatura cientifica no campo da Psicologia do Testemunho e uníssona em afirmar que os procedimentos adotados para a coleta de um testemunho são cruciais tanto para a quantidade, como também para a acurácia das informações não obtidas.”. 23

STJ (RHC 64.086/STJ). RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TENTADO. RÉU FORAGIDO. PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS. TESTEMUNHAS POLICIAIS. ART. 366. DO CPP. SÚMULA 455 DO STJ. TEMPERAMENTO. RISCO DE PERECIMENTO DA PROVA. TEMPO E MEMÓRIA. JURISDIÇÃO PENAL E VERDADE. AFETAÇÃO DA MATÉRIA À TERCEIRA SEÇÃO DO STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.

(...)

4. Estudos recentes de Psicologia demonstram a ocorrência frequente do fenômeno psíquico denominado "falsa memória", em razão do qual a pessoa verdadeiramente acredita que viveu determinado fato, frequentemente distorcido, porém, por interpretações subjetivas, convergência de outras memórias e por sugestões externas, de sorte a interferirem no processo de resgate dos fatos testemunhados. 24

Parte da doutrina, aqui representada pelo ilustre professor Aury Lopes Jr., entende não caber à fase pré-processual a coleta de provas, apenas atos de investigação, e que tais provas deveriam ser realizadas em sede judicial, pois “parte da culpa vem dada pela má valoração dos atos realizados, pois, se realmente fossem considerados meros atos de investigação, não haveria justificativa em estender uma atividade que esgota sua eficácia no oferecimento da ação penal” 25. Para ele a perscrutação deve ser sumária e breve.

O mesmo autor ainda afirma que “as provas renováveis, como a testemunhal, acareações, reconhecimentos etc., devem, para ingressarem no mundo dos elementos valoráveis na sentença, necessariamente ser produzidas na fase processual, na presença do juiz, da defesa e da acusação, com plena observância dos critérios de forma que regem a produção da prova no processo penal.”. 26

Essa parte da doutrina parece não levar em consideração a metodologia científica da psicologia a ser utilizada na investigação para coleta de provas.

Como bem pontuado por Samira da Costa Fontes e Luiz Augusto Aloise de Macedo Mendes, “o que se constata é a adoção de uma visão ideológica progressista, praticamente hegemônica nos meios acadêmico e editorial, que se pretende a própria evolução técnico-jurídica, a qual elege o Estado como um vilão autoritário e eleva o réu a uma condição heroica de resistência ao autoritarismo estatal.”. 27

O que se viu, ao final, foi justamente o caráter ideológico apontado pelos autores e uma adequação “à brasileira” da figura do “juizado de instrução” largamente utilizado na Europa, pois “nele, grosso modo, um juiz instrutor, com iniciativa e proeminência, dirige a investigação e, sob o pálio do contraditório, colhe as provas que serão apreciadas, em uma segunda etapa, por outro juiz, que sentenciará. No Brasil, ao contrário, todo o arcabouço legal foi historicamente dirigido, principalmente nas últimas décadas e, mais especificamente a partir da Constituição de 1988 e de reformas no Código de Processo Penal, no sentido de retirar ou reduzir a iniciativa do juiz ao mínimo necessário, relegando o magistrado às figuras de controlador da legalidade e árbitro de questões levadas a ele na fase investigatória, e de espectador e árbitro de um processo desenvolvido em meio a um embate cujo horizonte é ditado pelas partes.”. 28

Os autores há época (2020) tratavam sobre a propositura do “juiz das garantias” pelo Congresso Nacional que incluía no CPP o art. 3º-C, § 3º, cuja pretensão era extirpar o procedimento investigativo da fase de instrução.

CPP. Art. 3º-C. (...) § 3º Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado.

Após ter tido a eficácia suspensa, o julgamento das normas do juiz de garantias pelo STF reafirmou com precisão a importância da investigação criminal para o processo.

STF. ADI 6298/DF: III – ARTIGO 3º-C. MATÉRIAS SUBMETIDAS À NOVA SISTEMÁTICA DO JUÍZO DAS GARANTIAS. NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO, PARA EXCLUSÃO DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS INCOMPATÍVEIS COM O MODELO. MARCO FINAL DA COMPETÊNCIA DO JUIZ DAS GARANTIAS: OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. AUTOS DO INQUÉRITO. PROIBIÇÃO DE REMESSA AO JUIZ DA INSTRUÇÃO. IRRAZOABILIDADE. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO DOS DISPOSITIVOS IMPUGNADOS.

(h) Constata-se a manifesta irrazoabilidade do acautelamento dos autos do inquérito na secretaria do juízo das garantias, porquanto o fundamento da norma reside tão-somente na pressuposição de que o juiz da ação penal, ao tomar conhecimento dos autos da investigação, perderia sua imparcialidade para o julgamento do mérito. Ocorre que, sem tomar conhecimento dos elementos configuradores da justa causa para a ação penal (indícios de autoria e de materialidade), inviabiliza-se a prolação de decisões fundamentadas.

(i) Por conseguinte, declara-se a inconstitucionalidade, com redução de texto, dos §§ 3º e 4º do art. 3º-C do CPP, incluídos pela Lei nº 13.964/2019 e, mediante interpretação conforme, fixar que os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias serão remetidos ao juiz da instrução e julgamento.” 29

A Suprema Corte nada mais fez que respeitar um dos princípios basilares do processo penal, o livre convencimento motivado do juiz, a quem devem ser apresentados todos os elementos arrecadados, independentemente da nomenclatura que se queira dar, para que possa fundamentar adequadamente, de fato e direito, sua decisão.

Além disso, a LONPC deixou cristalino que a investigação policial civil é eminentemente técnica, científica e imparcial.

LONPC. Art. 4º São princípios institucionais básicos (...):

VII - busca da verdade real; (...)

XII - atuação imparcial na condução da atividade investigativa e de polícia judiciária; (...)

XVI - essencialidade da investigação policial para a persecução penal;

XVII - natureza técnica e imparcial das funções de polícia judiciária civil e de apuração de infrações penais, sob a presidência e mediante análise técnico-jurídica do delegado de polícia;

LONPC. Art. 5º São diretrizes a serem observadas pela polícia civil (...):

II - observância de caráter técnico, científico e jurídico na análise criminal da investigação policial;

III - promoção da produção de conhecimento sobre segurança pública com base técnica e científica; (...)

X - utilização dos meios tecnológicos disponíveis e atualização e melhorias permanentes das metodologias de trabalho, para aprimoramento nos processos de investigação;

Por fim, sendo a investigação policial essencialmente técnica e científica, sendo os policiais civis imparciais e sem interesse como parte na busca da verdade real, temos, como consectário lógico, que o momento correto e mais adequado à coleta de provas é a fase investigativa, pois mais próxima ao evento criminoso.

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Sobre os autores
Felipe Gabriel Matos Silva

Delegado de Polícia Civil do Estado do Maranhão, ex-Investigador de Polícia Civil do Estado do Maranhão, graduado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), especialista em Perícia Criminal pelo Instituo Nacional de Perícias e Ciências Forenses/Faculdade de Conchas (INFOR/FACON) e especialista em Psicologia Jurídica e Inteligência Forense pelo Instituo Nacional de Perícias e Ciências Forenses/Faculdade de Conchas (INFOR/FACON).

Pollyanne Souza da Costa

Delegada de Polícia Civil do Estado do Maranhão, ex-Escrivã de Polícia Civil do Estado do Piauí, graduada em Direito pela Faculdade de Ciências Humanas, Saúde, Exatas e Jurídicas de Teresina (CEUT)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Felipe Gabriel Matos ; COSTA, Pollyanne Souza. Produtos da investigação criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 29, n. 7565, 18 mar. 2024. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/108493. Acesso em: 9 mai. 2024.

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