Quando foi criado, o CNJ era o depositário de uma grande esperança. O novo órgão possibilitaria ao Brasil abrir a caixa-preta do Judiciário e moralizar a distribuição de Justiça. Ao menos era isso o que se esperava. Ledo engano. O órgão foi rapidamente capturado pelos juízes e se transformou numa correia de transmissão do conservadorismo. Rápido em punir juízes considerados de esquerda, o CNJ é lentíssimo quando precisa avaliar e julgar casos escandalosos envolvendo magistrados ligados à direita e à extrema direita. Isso para não mencionar as coisas esquisitas que têm ocorrido.
No dia 13/06/2024 o CNJ começou a julgar o PCA 0000416.89.2023.2.00.0000, processo iniciado por mim para proibir o uso do ChatGPT pelos juízes brasileiros. Após anexar nos autos a sustentação oral, descobri que dois dias antes do julgamento o presidente do CNJ havia recebido para um convescote esquisito os representantes da empresa que criou aquela Inteligência Artificial.
Ao que parece o presidente do CNJ resolveu demonstrar publicamente que é mais adepto dos negócios como de costume do que da preservação de sua imparcialidade. Luís Barroso é o que existe de mais deslumbrado em matéria de imoralidade administrativa. Esse eunuco do mercado se ajoelhou aos pés do deus dinheiro para cantarolar hinos de devoção à Big Tech norte-americana que está capturando fatias cada vez maiores do orçamento do Judiciário.
Indignado com a reunião entre o presidente do CNJ e a empresa que criou a ferramenta que ele mesmo deve julgar se poderá ou não ser utilizada pelos juízes brasileiros, imediatamente acionei o PGR. Entendo que Luís Barroso:
"... tem o dever de julgar um caso de interesse da empresa Open AI e recebeu os representantes dela como se isso não fosse inadequado e eventualmente suspeito. Pior... como pode Luís Barroso julgar um processo administrativo sobre o produto da Open AI num dia e contratar os serviços da empresa como presidente do CNJ no outro? O requerente não é especialista, mas isso tem cheiro de irregularidade administrativa. Por fim, o presidente do CNJ está se esforçando demais para preservar a dependência tecnológica do Brasil. O Judiciário não pode usar os recursos PÚBLICOS que administra para estimular o desenvolvimento de tecnologia nacional semelhante? As relações entre soberania, independência, autonomia e computação não existem para o CNJ? O presidente de um órgão público pode atuar como julgador, contratador e lobista da empresa mencionada?"
Ao final da representação requeri ao PGR "...investigar as 'relações perigosas' do presidente do CNJ com a empresa criadora do ChatGPT justamente no período em que ele deve julgar um processo que interessa à empresa e pode afetar os interesses dela no Brasil."
Qualquer interessado pode consultar referida representação cujos dados são:
Número da manifestação: 20240036196
Chave de Consulta: 0190e41ef7e251fee97c26ef24d67adf
Data da manifestação: 13/06/2024
O CNJ é um órgão público e deve observar rigorosamente os princípios constitucionais ao julgar processos administrativos. Luís Barroso não deveria ter elogiado o produto de uma empresa privada que pretende vendê-lo ao Judiciário antes de julgar o PCA 0000416.89.2023.2.00.0000. Ao fazer isso dois dias antes do julgamento, o vaidoso presidente do CNJ comprometeu publicamente sua imparcialidade.
O autor não foi convidado para comparecer à sede do CNJ a fim de defender a tese de que os juízes devem ser proibidos de usar o ChatGPT. Se tivesse sido feito, o convite seria recusado. A proximidade ou intimidade entre uma das partes no processo e a autoridade encarregada de julgá-lo é inadequada. Ela compromete a seriedade do julgamento e levanta um manto de suspeita sobre a decisão que foi proferida.
Os membros do CNJ têm poder/dever suficiente para acolher ou indeferir o pedido que eu fiz. Mas eles deveriam preservar sua autonomia em face da poderosa empresa cujos interesses dependem da rejeição do pedido formulado nos autos do PCA 0000416.89.2023.2.00.0000. O presidente do órgão não pode agir como se fosse um lobista do ChatGPT, porque isso pode eventualmente ser considerado improbidade administrativa. Por fim, não me parece adequado Luís Barroso receber a empresa que pretende vender ao Judiciário com lucro o ChatGPT num dia e julgar que aquele produto poderá ser utilizado pelos juízes no outro.