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O processo administrativo disciplinar como instrumento de concretização dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos e dos acusados

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6. conclusão

Do que se viu, à luz do contexto contemporâneo do Direito Constitucional, no qual a atuação do Estado encontra-se subordinada não mais simplesmente à lei em sentido estrito, mas à juridicidade como um todo, sobretudo às normas constitucionais, o Direito Administrativo, antes visto como "conjunto de métodos e técnicas de governo e de ações do Estado", passou a desempenhar o papel fundamental de instrumentalizar o atendimento das necessidades coletivas e individuais.

Em cumprimento à nova perspectiva constitucional, os serviços públicos se apresentam como instrumentos por excelência na concretização dos direitos fundamentais, cuja execução só se realiza por meio dos agentes públicos. Assim, a forma de atuação desses agentes é fundamental para garantir a regularidade na prestação do serviço público, decorrendo para o Estado o dever de estabelecer regras que fixem os limites desta atuação e as sanções para seus descumprimentos.

O processo disciplinar surge como meio de apuração e aplicação das referidas sanções, apresentando-se, de forma bifronte, como meio de concretização das garantias fundamentais. Isto porque, se por um lado ele realiza a missão de garantir os direitos constitucionais dos cidadãos, relativos ao bom funcionamento e à eficiência do serviço público, por outro, configura-se como responsável pela concretização dos direitos constitucionais do acusado.

Destarte, a atuação do Estado na condução do processo disciplinar deve ser pautada por limites externos - no sentido de ser obrigado a promover a devida apuração de irregularidades ocorridas no âmbito da Administração Pública, com a conseqüente aplicação das sanções pertinentes, sendo-lhe vedado qualquer espécie de omissão – e internos, haja vista que a aplicação da sanção ao servidor acusado da prática de ilícito administrativo deve ser realizada de forma isenta e justa, em observância aos mandamentos constitucionais e infraconstitucionais.

A consecução do objetivo de um serviço público eficiente, sob o enfoque do agente público, se obtém não simplesmente pela aplicação de uma punição ao servidor infrator, mas pela incidência da penalidade justa e proporcional, aplicada em observância aos princípios constitucionais. Somente assim, a penalidade atingirá os fins de repressão e prevenção a que se destina.

Assim, em consideração à necessidade de que a condução e o julgamento do processo disciplinar se realize nos parâmetros já fixados, importantes alterações de ordem legislativa - consistentes no implemento de uma legislação que defina mais objetivamente os deveres do servidor e as sanções relativas ao seu descumprimento e que promova a criação de um órgão isento para o julgamento dos recursos das decisões proferidas nestes processos - e de ordem administrativa, consistente na capacitação daqueles que conduzirão os procedimentos disciplinares e, ainda, na criação de critérios objetivos para definir a configuração de ilícitos disciplinares, são medidas de caráter prático, necessárias para viabilizar os objetivos a ele conferidos.


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Notas

01 PESSOA, Robertônio Santos. Direito Administrativo: um Novo Eixo Central. Revista de Direito Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, ano 3, n. 11, p. 199-212, jan./mar. 2003.

02 BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história. A nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. Revista Forense, Rio de Janeiro, vol. 371, ano 100, p. 176-202, jan./fev. 2004.

03 FINGER, Ana Cláudia. Serviço Público: um Instrumento de Concretização de Direitos Fundamentais. Revista de Direito Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, ano 3, n. 12, p. 141-165, abr./jun. 2003.

04LEAL, Rogério. Considerações Preliminares Sobre o Direito Administrativo Brasileiro Contemporâneo e Seus Pressupostos Informativos. Revista de Direito Administrativo e Constitucional, Belo Horizonte, ano 3, n. 11, p. 43-58, jan./mar. 2003.

05 AMARO, Fernanda pereira. O Serviço Público Sob a Perspectiva da Garantia Constitucional de Direitos Humanos Fundamentais. Revista de Direito Constitucional e Internacional, [S.I.], ano 13, p. 115-138, jan./mar. 2005.

06 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. 500 Anos de Direito Brasileiro Administrativo Brasileiro. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, n. 10, 2002. Disponível em www.direitopúblico.com.br. Acesso em: 20 maio 2007.

07 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações nos Serviços Públicos. In: WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme Costa (org.). Direito Público – Estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 217.

08 PESSOA, Robertônio Santos. Op.cit, p. 202.

09 FINGER, Ana Cláudia. Op. Cit, p. 142.

10ATALIBA, Geraldo. Empresas estatais e regime administrativo: serviço público – inexistência de concessão – delegação – proteção de interesse público. Revista Trimestral de Direito Público, São Paulo, v. 4, p.61, 1963. APUD. FINGER, Ana Cláudia. Op. Cit, p. 162.

11 DUGUIT, Léon. Les Transformations du Droit Public. Paris: Librairie Armand Colin, 1913, p. 33. Apud. KANAYAMA, Rodrigo Luís. A Polêmica Acerca do Regime Jurídico do Serviço Público. In: COSTADELLO, Ângela Cássia (org.). Serviço Público – Direitos Fundamentais, Formas Organizacionais e Cidadania. Curitiba: Juruá, 2005, p. 195.

12 "Direito Administrativo é o conjunto das regras relativas aos serviços públicos", segundo Jèze. In Les príncipes généraux Du droit administratif – III, pags. 1 e ss. Apud. CAVALCANTI, Themístocles Brandão. O funcionário público e o seu regime jurídico. 2 º ed. [SI]. Livraria Editora Freitas Bastos, 1946. p. 12.

13 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 478.

14 DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 628.

15 Ivan Barbosa Rigolin, explica que no início da tramitação da EC nº 19, o princípio da eficiência fora denominado princípio da qualidade do serviço prestado. Em seguida, transformado em princípio da eficiência do serviço prestado. Por fim, ante ao receio da possibilidade de impetração de mandados de segurança em razão da atuação ineficiente na prestação de um serviço, decidiu-se por denominá-lo simplesmente de princípio da Eficiência. (In O servidor público nas reformas constitucionais. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2003. pgs. 24 e 25). Este fato, contudo, não retira do Estado o dever de atuação eficiente na prestação de serviços públicos, ante a princípios outros, situados no artigo 5ª do Texto Constitucional.

16 Celso Antônio Bandeira de Mello acrescenta ao rol apresentado o princípio do dever inescusável do Estado de promover a prestação do serviço público; o da supremacia do interesse público; o da transparência; o da motivação e o do controle. Op. Cit. Pgs. 626 e 627.

17 COSTA, José Armando da. Direito Administrativo Disciplinar. Brasília: Brasília Jurídica, 2004. p. 36

18 idem, p. 483

19 Celso Antônio Bandeira de Mello entende pela inclusão dos funcionários da administração indireta. Ob.cit., p. 232; José dos Santos Carvalho Filho, por sua vez, manifesta-se pela exclusão dos citados funcionários no conceito de servidor público, in Manual de Direito Administrativo. 11ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 488.

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20 COSTA, José Armando da. Ob. Cit., p. 37.

21 Idem, pgs. 26 e 34

22 MEDAUAR, Odete. Processualidade no Direito Administrativo, Revista dos tribunais, 1993, p. 83. Apud. FIGUEIREDO, Nelson. A Eficácia da Ampla Defesa no Processo Administrativo Disciplinar, in WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme Costa (org.). Direito Público – Estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 575.

23 Expressão utilizada por Romeu Felipe Bacellar Filho, in Aspectos Polêmicos do Regime Disciplinar do Servidor Público. WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme Costa (org.). Direito Público – Estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 704.

24 RIBEIRO, Maria Tereza de Melo. O princípio da imparcialidade da Administração pública. Coimbra: Almedina, 1996, p. 162.

25 FIGUEIREDO, Nelson. A Eficácia da Ampla Defesa no Processo Administrativo Disciplinar, in WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme Costa (org.). Direito Público – Estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 584.

26 COUTO E SILVA, Almiro do. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito Público Brasileiro e o Direito da Administração de Anular seus Próprios Atos Administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da lei do processo administrativo da União (Lei nº 9.784/99). Revista Eletrônica de Direito do Estado, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, nº 2, abr./mai./jun. 2005. Disponível na Internet: http://www.direitodoestado.com.br. Acesso em 20 de junho de 2007.

27 RISPOLI, Adriana Barzotto. A Uniformização Das Decisões Pela Súmula Vinculante – A realização dos Valores Constitucionais: Segurança,Liberdade e Igualdade. In Revista AGU, ano VI, n° 58, novembro 2006. Disponível na Internet: https://redeagu.agu.gov.br/UnidadesAGU/CEAGU/revista/Ano_VI_novembro_2006/uniformizacao_adriana.pdf. Acesso em 20 de junho de 2007.

28 FARIÑAS DULCE, María José. La Sociologia Del Derecho de Max Weber. México: Universidad Nacional Autónoma de México, 1989, pgs. 217 e 218. Apud. RISPOLI, Adriana Barzotto. Ob.cit.,

29 WEBER, Max. Economía y sociedad. Tradução José Medina Echavarría. México: Fondo de Cultura Económica, 1992, p. 604 e 606. Apud RISPOLI, Adriana Barzotto. Ob.cit.

30 "Art. 131. As penalidades de advertência e de suspensão terão seus registros cancelados, após o decurso de 3 (três) e 5 (cinco) anos de efetivo exercício, respectivamente, se o servidor não houver, nesse período, praticado nova infração disciplinar."

31 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit., p. 17.

32 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.15ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.75.

33 MS 23299/SP, Min. Relator Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, In DJ 12-04-2002. Ementa: I. Cassação de aposentadoria pela prática, na atividade, de falta disciplinar punível com demissão (L. 8.112/90, art. 134): constitucionalidade, sendo irrelevante que não a preveja a Constituição e improcedente a alegação de ofensa do ato jurídico perfeito. II. Presidente da República: competência para a demissão de servidor de autarquia federal ou a cassação de sua aposentadoria. III. Punição disciplinar: prescrição: a instauração do processo disciplinar interrompe o fluxo da prescrição, que volta a correr por inteiro se não decidido no prazo legal de 140 dias, a partir do termo final desse último. IV. Processo administrativo-disciplinar: congruência entre a indiciação e o fundamento da punição aplicada, que se verifica a partir dos fatos imputados e não de sua capitulação legal.

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Sobre o autor
Giselle Cibilla Silva de Oliveira

Advogada da União, mestranda em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Giselle Cibilla Silva. O processo administrativo disciplinar como instrumento de concretização dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos e dos acusados. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1725, 22 mar. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11072. Acesso em: 19 abr. 2024.

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