Histórico
Instituída no nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 4090/62, a gratificação natalina, mais conhecida como décimo terceiro salário, tornou obrigatório um costume, típico de diversas empresas no país, e que era caracterizado, até então, pela liberalidade dos empregadores.
Salienta o insigne doutrinador José Augusto Rodrigues Pinto [01] que o 13º salário é fruto das antigas relações trabalhistas, de cunho paternalista, em que os empregadores eram, na grande maioria das empresas, parentes ou afins dos empregadores. Havia, nestas relações, uma gratificação para os trabalhadores com uma cesta de alimentos típicos dos festejos natalinos.
Com o passar dos anos, houve uma alteração na maneira de gratificar os trabalhadores, sendo a cesta de alimentos substituída por moeda e com equivalência progressiva ao valor do ganho mensal do beneficiado.
É de se imaginar que este benefício concedido a alguns trabalhadores ocasionaria um anseio por parte daqueles que não o recebiam, bem como expectativa em relação àqueles que dele já usufruíam. Com o intuito de apaziguar as manifestações dos trabalhadores que pleiteavam igualdade de tratamento, surgiu a referida Lei nº 4090/62, que instituiu a gratificação de Natal, que passou a ser compulsória e não mais facultativa.
A referida lei, todavia, estabelecia, em seu artigo 3º, que a gratificação somente seria devida nos casos de rescisão sem justa causa. Desta maneira, o empregado que pedisse a rescisão do seu contrato de trabalho não teria direito ao benefício.
Foi criado, então, o Decreto nº 57.155/65, que regulamentou a supracitada lei de 1962, estabelecendo, em seu artigo 7º, que o 13º salário seria devido, salvo em caso de rescisão com justa causa, ampliando-se, desta forma, as hipóteses de concessão da gratificação natalina.
Nesta trilha de entendimento, o Tribunal Superior do Trabalho pacificou a questão por meio da Súmula nº 157, garantindo a gratificação nos casos de resilição contratual de iniciativa do empregado.
A primeira Constituição Federal a tutelar a matéria objeto de análise do presente trabalho foi a de 1988, atualmente em vigor. A Lei Fundamental, em seu artigo 7º, inciso VIII, estipulou a necessidade de pagamento do 13º salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria, ressaltando que a remuneração integral será a do mês de dezembro, compreendendo salário mais gorjetas.
Acerca das proteções constitucionais, o renomado Sérgio Pinto Martins entende:
"Todo empregado tem direito ao 13º salário. É devido não só ao empregado urbano, como ao rural (S. 34 do TST), ao doméstico (parágrafo único do art. 7º da CF) e ao avulso (art. 7º, XXXIV, da CF)" [02].
Do pagamento em duas parcelas
No que tange ao pagamento do décimo terceiro salário, os empresários reclamavam que no mês de dezembro tinham de realizar dois salários para os empregados faltando, conseqüentemente, recursos para tanto.
A fim de pacificar a situação, a Lei nº 4749/65 parcelou em duas vezes o pagamento do 13º, sendo a primeira entre os meses de fevereiro e novembro, ou seja, até o dia 30/11, e a segunda até o dia 20 de dezembro ou no mês da extinção contratual.
Mister ressaltar uma proteção legal do empregador com relação ao pagamento da primeira parcela do 13º: o empregador, de acordo com o artigo 2º, §1º, da Lei nº 4749/65, não está obrigado a efetuar o pagamento a todos os empregados no mesmo mês, mesmo que estes o exijam.
A primeira parcela poderá ser paga, também, quando o empregado sair em férias, desde que ele a requeira no mês de janeiro do correspondente ano. Frise-se que pela legislação primitiva o valor do pagamento era o da remuneração de dezembro. Atualmente, a primeira parcela deverá ser igual à metade do salário recebido pelo empregado no mês anterior. Já a parcela final, compensará a primeira, paga a título de adiantamento, sem nenhuma correção monetária, incidindo sobre a respectiva remuneração.
Entende Rodrigues Pinto ser criticável a diferença de critério sobre a base do pagamento, de salário para remuneração:
"Só podemos atribuí-la à inadvertência do legislador ou à falta de noção da diferença entre remuneração e salário em nosso direito Individual do Trabalho" [03].
Sérgio Pinto Martins [04] defende que não se pode dividir o 13º salário em mais de duas parcelas, em virtude de um sensível prejuízo ao empregado, podendo-se, entretanto, antecipar o pagamento das duas parcelas, caso assim deseje o trabalhador.
Contudo, caso sejam pagas com atraso as parcelas da gratificação, o empregador deverá sofrer as penalidades do artigo 3º, I, da Lei n º 7855/89, que impõe a aplicação de uma multa de 160 BTN, por trabalhador prejudicado, dobrada em caso de reincidência, se comprovada qualquer infração ao disposto na Lei nº 4090/62.
Da redução e da forma de pagamento
Apesar de existirem doutrinadores defendendo que o 13º salário é irredutível – baseados no artigo 7º, inciso VI, da Magna Carta que fala da irredutibilidade do salário e de o mesmo artigo 7º, no inciso VIII dispor sobre o 13º sem mencionar causas de redução – a orientação que aparenta ser a mais coerente é a de que o 13º salário pode ser reduzido por convenção ou acordo coletivo.
Isto se dá em razão de o décimo terceiro ter natureza salarial, uma vez que, nos moldes do artigo 457, §1º da Consolidação das Leis do Trabalho, integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as gratificações ajustadas.
Com relação ao pagamento do décimo terceiro salário, deverá ser feito em dinheiro. Reza o artigo 463 da Consolidação que o salário deverá ser pago em moeda corrente nacional, e o pagamento que for realizado de outra maneira, será considerado como não feito.
Não obstante, o artigo 462, §2º explica que a empresa não pode exercer qualquer tipo de coação ou induzimento a fim de que o empregado receba parte do salário em mercadorias – o chamado salário in natura, ou seja, em utilidades.
Neste diapasão, o conceituado Sérgio Pinto Martins [05], em sua já mencionada obra, preleciona que:
"O salário tem natureza alimentar e visa comprar os artigos de que o obreiro e sua família necessitam para sobreviver. Não pode, portanto, o trabalhador comer brinquedos ou panela, daí porque o 13º salário deve ser pago em dinheiro e não em utilidades".
Da aquisição ou não da gratificação
Quanto à aquisição do direito ao benefício, Rodrigues Pinto tece elucidativo comentário:
"O empregado o adquire desde a admissão na empresa, por exercício anual, contado de janeiro a dezembro. Essa aquisição, todavia, não se dá por inteiro nem instantaneamente, mas por frações mensais progressivas, correspondendo cada mês efetivamente à disposição do empregador à fração de 1/12 (um doze avos) do direito anual" [06].
Insta salientar que é considerado como um mês integral, para efeito do cálculo do 13º, o trabalho prestado por fração igual ou superior a quinze dias.
Se o empregado, no entanto, for demitido por ter praticado alguma das condutas elencadas no artigo 482 da CLT, ou seja, se for demitido por justa causa, não fará jus à gratificação natalina. Nos casos em que o empregado tenha, antes da demissão por justa causa, recebido a primeira parcela da gratificação, poderá a empresa compensar este valor com qualquer crédito trabalhista, como, por exemplo, as férias vencidas, em razão de não ter o empregado direito ao benefício.
Contrapondo-se à não aquisição da gratificação pelo empregado demitido por justa causa, o ilustre Rodrigues Pinto defende que:
"[...] não há razão jurídica plausível para vincular o direito à gratificação natalina, que é salário, ao aspecto disciplinar da extinção contratual. Subtrair do empregado a fração já adquirida do direito seria o mesmo que puni-lo com a perda de parte do salário, por sua falta disciplinar" [07].
Caso reste configurada a culpa recíproca, ou seja, se a culpa para a rescisão do contrato for tanto do empregado quanto do empregador, o 13º é devido pela metade, conforme entendimento da Súmula nº 14 do TST:
"Reconhecida a culpa recíproca na rescisão do contrato de trabalho (art. 484 da CLT), o empregado tem direito a 50% (cinqüenta por cento) do valor do aviso prévio, do décimo terceiro salário e das férias proporcionais".
Além de ter direito ao 13º proporcional aos meses trabalhados no ano pela despedida indireta, pela despedida sem justa causa, pelo pedido de demissão e pela aposentadoria (artigo 201, §6º da Constituição Federal), terá, ainda, direito ao benefício o empregado se houver extinção da empresa ou quando findar o seu contrato por prazo determinado, como, por exemplo, o contrato de experiência.
Caso o empregado permaneça afastado durante o ano, gozando de benefício previdenciário, a empresa deverá pagar o 13º salário proporcional ao período trabalhado, mais o referente aos 15 primeiros dias do afastamento. O INSS é obrigado a pagar o restante, na forma de abono anual.
A remuneração do serviço suplementar, habitualmente prestado, integra o cálculo da gratificação natalina, ao contrário das faltas decorrentes de acidente de trabalho, que não o integram, conforme Súmulas 45 e 46 do TST. Para efeito de cálculo de indenização, é computada a gratificação (Súmula nº 148 da mesma Corte).
Conclusão
Em apertada síntese, o décimo terceiro salário é uma gratificação compulsória e irredutível, devida pelos empregadores a todos os seus empregados, salvo aos que tenham sido demitidos por justa causa, paga em duas parcelas e em dinheiro, correspondente ao número de meses trabalhados pelo obreiro no ano, segundo o critério de duodécimos.
BIBLIOGRAFIA:
, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 10ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2006.MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 16ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2002.
PAULO, Vicente; e ALEXANDRINO, Marcelo. Direito do Trabalho. 6ª edição. Editora Impetus. Rio de Janeiro, 2005.
PINTO, José Augusto Rodrigues. Direito Individual do Trabalho. 5ª edição. Editora LTr. São Paulo, 2003.
Notas
01 PINTO, José Augusto Rodrigues. Direito Individual do Trabalho. 5ª edição. Editora LTr. São Paulo, 2003.p.351.
02.MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 10ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2006. p.400.
03 PINTO, José Augusto Rodrigues. Op.cit. p.354.
04 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 16ª edição. Editora Atlas. São Paulo, 2002. p. 258.
05 Ibid. p. 256.
06. PINTO, José Augusto Rodrigues. Op.cit. p. 352.
07. Ibid. p. 353.