Na esteira do avanço da Reforma Tributária – a maior mudança, em décadas, no sistema de apuração e recolhimento de impostos no Brasil –, a instituição do Comitê Gestor do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) desempenha um papel decisivo na construção das bases para uma transição mais eficiente rumo às novas regras fiscais que normatizarão o ambiente de negócios do país.
Como já é sabido, o Comitê Gestor tem como principal responsabilidade, conforme delineado na Emenda Constitucional 132/23, centralizar a regulamentação, arrecadação e distribuição das receitas do IBS. Nesse sentido, emerge como peça-chave na operacionalização do modelo que substituirá o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), almejando, assim, cumprir um dos objetivos centrais da nova sistemática: a busca por um “federalismo mais justo”, conforme expresso pelo secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy.
A criação do Comitê Gestor deu um passo importante com a promulgação, em 16 de janeiro, da Lei Complementar nº 214/25, que institui o IBS, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e o Imposto Seletivo, além de formalizar a estrutura do colegiado. Esse novo órgão terá impacto direto sobre a relação do Fisco com estados, municípios e com a própria iniciativa privada.
No que tange aos contribuintes, a centralização da arrecadação e da distribuição pelo Comitê Gestor pode trazer ganhos em eficiência e previsibilidade. No entanto, também exige vigilância constante quanto à transparência dos critérios e aos mecanismos de fiscalização, a fim de evitar assimetrias que possam gerar passivos inesperados.
Além disso, o período de transição para as novas regras da Reforma Tributária — que começam a ser testadas já em 2026, com a aplicação do IBS e da CBS em alíquotas de 0,1% e 0,9%, respectivamente, e a exigência de que as empresas emitam notas fiscais detalhando a incidência desses impostos nos produtos vendidos — impõe desafios adicionais às organizações.
Esse ponto é especialmente relevante ao considerar que a transição se estenderá até 2033, período em que coexistirão as regras atuais e as impostas pela Emenda Constitucional 132/23 e suas respectivas leis complementares. Esse contexto, somado à necessidade de adaptação a uma nova lógica de aproveitamento de créditos tributários com a implementação da não cumulatividade, adiciona complexidade à rotina fiscal das empresas. Dessa forma, a reestruturação da gestão tributária será um passo essencial para mitigar riscos e garantir conformidade com o novo sistema.
Outro aspecto fundamental do Comitê Gestor é a ausência da União em sua composição. Em princípio, essa decisão visa garantir maior autonomia aos entes subnacionais na administração tributária. Entretanto, ela também levanta questionamentos sobre a governança do novo sistema e a representatividade dentro de um país marcado por realidades econômicas heterogêneas e mais de 5,5 mil municípios com necessidades fiscais diversas.
Nesse sentido, a coordenação entre os entes federativos será um desafio significativo, especialmente no que se refere à definição de normas infralegais e à operacionalização dos mecanismos de redistribuição da arrecadação. Assim, o Comitê Gestor nasce com uma grande responsabilidade sobre seus ombros e sob forte expectativa do setor produtivo e das administrações tributárias locais.
A experiência internacional com modelos similares demonstra que a transição para um imposto de valor agregado unificado exige ajustes contínuos e diálogo institucional permanente. Todos esses fatores reforçam a necessidade de um planejamento tributário criterioso por parte das empresas. Ainda que a Lei Complementar nº 214/25 preveja a criação do Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias, vinculado ao Comitê Gestor, para uniformizar a interpretação das normas relativas ao IBS, ainda existem desafios e incertezas quanto à aplicação prática da reforma.
Por essa razão, o planejamento antecipado é a melhor estratégia para evitar impactos negativos e litígios futuros. Empresas que revisarem seus processos contábeis e fiscais desde já estarão mais bem posicionadas para operar com segurança em um ambiente tributário em transformação.
O sucesso da Reforma Tributária dependerá não apenas da eficácia do Comitê Gestor na condução da transição, mas também da capacidade dos contribuintes de se adaptarem proativamente às novas exigências. A busca por segurança jurídica deve ser prioridade, garantindo que a maior mudança no sistema fiscal brasileiro em décadas realmente cumpra seu propósito de simplificação e justiça tributária, sem criar novos entraves à atividade econômica.