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O cumprimento de sentença que determina o pagamento de soma nos termos da Lei nº 11.232/05

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14/10/2008 às 00:00
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5 A MULTA DO ARTIGO 475 – J DO CPC

Prevê o artigo 475 – J, caput, do CPC, incidência de multa de 10% (dez por cento) sobre o valor total de condenação caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não efetue o pagamento no prazo de 15 (quinze) dias.

A aplicação prática da multa de 10% (dez por cento) prevista no aludido artigo vem sendo objeto de muita discussão doutrinária e jurisprudencial sobre vários ângulos de interpretação, tais como: o termo a quo da contagem do referido prazo de 15 (quinze) dias; a necessidade de existir ou não requerimento do credor para o cumprimento voluntário da sentença; a necessidade ou desnecessidade de intimação do devedor, bem como se suficiente a intimação na pessoa do advogado ou se deverá ser feita pessoalmente ao devedor, entre outros.

5.1 NATUREZA JURÍDICA

Inicialmente, para que possamos entender todos esses aspectos que repercutem calorosa discussão sobre o tema, necessário se faz determinar a natureza jurídica da multa do artigo 475 – J, CPC.

Consoante demonstrado em todo o decorrer deste trabalho, não há dúvidas que o principal objetivo da Lei 11.232/05 é conceder maior celeridade e eficácia ao cumprimento das obrigações de pagamento de quantia em dinheiro reconhecidas por sentença judicial imutável.

Para tanto, preferiu o legislador conferir ao devedor primeiramente a possibilidade de cumprir com a obrigação de forma espontânea, ou seja, independentemente de requerimento do credor nesse sentido. Contudo, para tornar realmente eficaz esse desejo de cumprimento voluntário da obrigação, não poderia ter tomado outra providência a não ser vincular o seu não cumprimento a alguma espécie de prejuízo econômico a ser suportado pelo devedor inerte.

O caput do artigo 475 – J assumiu esse encargo, estabelecendo que caso o devedor não cumpra o julgado em 15 (quinze) dias, terá à sua dívida um acréscimo no valor de 10% (dez por cento).

Diante disso, não há dúvidas que trata-se de medida de natureza jurídica coercitiva, tendo em vista que a sua previsão nada mais é que uma forma de compelir o devedor a cumprir a obrigação voluntariamente, sob pena de, automaticamente (por expressa determinação legal), ver sua dívida crescer em 10% (dez por cento). Medida coercitiva semelhante e de tremenda eficácia em nosso ordenamento processual civil é aquela adotada na execução de alimentos, onde o devedor inadimplente com o dever alimentar está sujeito à prisão.

Portanto, considerando a multa de 10% (dez por cento) prevista no caput do artigo 475 – J, do CPC, como medida coercitiva com ímpeto de estimular o devedor a cumprir a obrigação voluntariamente, por ser a ele mais vantajoso agir de tal forma, nada impede que, cumulativamente com a multa coercitiva, seja aplicada também alguma multa pecuniária ao devedor de natureza punitiva (sanção), sendo o que ocorre por exemplo quando constatado que este litiga de má-fé.

5.2 O PROCEDIMENTO PARA CUMPRIMENTO VOLUNTÁRIO DA SENTENÇA

Com o trânsito em julgado da sentença que determina o pagamento de soma, esta se torna um título exigível, completando a formação dos três elementos para a caracterização de um título executivo judicial (liquidez, certeza e exigibilidade), o que o tornará passível de aplicação do procedimento previsto no artigo 475 – J, do CPC.

Dessa forma, transitada em julgado a sentença ao devedor é dado um prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento voluntário da obrigação, sob pena de multa de 10% (dez por cento). Caso não ocorra o cumprimento voluntário, a requerimento do credor, inicia-se a realização da execução propriamente dita.

5.2.1 Da Divergência a Respeito da Necessidade de Intimação Pessoal do Devedor ou de Intimação na Pessoa de seu Advogado

Sobre a necessidade de intimação pessoal do devedor ou de intimação na pessoa de seu advogado para o cumprimento da obrigação, repousam divergências doutrinárias relevantes, que exporemos nesta oportunidade.

Liderando o entendimento de que a intimação para o cumprimento da obrigação deve ser pessoal, tendo em vista tratar-se de ato de interesse da parte (pagamento) e não de seu advogado, os professores Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina, preceituam o seguinte:

Nestas linhas, deixamos entrever que, segundo nosso entendimento, é necessária a intimação do executado para que este cumpra a sentença. Entendemos, além disso, que a intimação para o cumprimento da sentença deve se dar na pessoa do devedor, e não deve ser feita através de seu advogado.

São várias as razões que nos conduzem a esta conclusão.

De acordo com o art. 475-J, caput, ‘caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento [...]’. É importante notar que inexiste, na referida regra jurídica, qualquer disposição no sentido de que basta, para que tenha início o prazo de quinze dias, a intimação do advogado do réu. [20] (grifo nosso)

Expondo entendimento menos formalista, há também forte corrente, liderada pelos professores Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, no sentido de que basta a intimação na pessoa do advogado do devedor. Vejamos:

O devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado, que é o modo determinado pela Reforma da L 11232/05 para a comunicação do devedor na liquidação de sentença e na execução para cumprimento da sentença. [21] (grifo nosso)

Em linha com o nosso entendimento, há uma terceira corrente que entende não haver sequer necessidade de intimação na pessoa do advogado do devedor, decorrendo o dever de cumprir a obrigação da própria sentença com trânsito em julgado, de forma imediata. Vejamos:

O montante da condenação será acrescido de multa de 10%, sempre que o devedor não proceder ao pagamento voluntário nos quinze dias subseqüentes à sentença que fixou o valor da dívida (isto é, a sentença condenatória líquida, ou a sentença de liquidação da condenação genérica). [22] (grifo nosso)

Ora, exigir a intimação pessoal do devedor ou na pessoa de seu advogado, com a devida vênia aos entendimentos em sentido contrário, seria um enorme contra-senso aos objetivos da Lei 11.232/05, tendo em vista que não há ordem de pagamento mais clara e garantista que uma sentença líquida com trânsito em julgado, mostrando-se esta plenamente apta a dar ciência ao devedor de que deve saldar o débito voluntariamente e na forma legalmente prevista (artigo 475 – J, primeira parte, do CPC).

Não há assim, intimação para pagar, devendo, portanto, o devedor cumprir voluntariamente a obrigação em 15 (quinze) dias do momento em que se forma o título executivo judicial em sua plenitude (certeza, liquidez e exigibilidade), ou seja, a partir do trânsito em julgado da sentença.

No mesmo sentido, Guilherme Amaral Rizzo:

Transitada em julgado a sentença (ou acórdão), cremos ser desnecessária a intimação do devedor para cumpri-la, bastando a simples ocorrência do trânsito em julgado para que se inicie o prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento voluntário. [23] (grifo nosso)

Araken de Assis:

Era idéia fixa do legislador dispensar nova citação, na fase de cumprimento, economizando tempo precioso e evitando percalços na sempre trabalhosa localização do devedor. Daí por que qualquer medida tendente a introduzir intimação pessoal, ou providência análoga, harmoniza-se mal com as finalidades da lei. [24] (grifo nosso)

Por outro lado, nunca é demais ressaltar que o objetivo maior da nova sistemática é exatamente excluir desnecessárias intimações e pronunciamentos processuais das partes e do juiz, abolindo a necessidade de nova citação do devedor em processo autônomo para o cumprimento do julgado, zelando assim pela celeridade e eficácia das decisões judiciais, ao passo que o término de uma fase processual inaugura a fase processual subseqüente, formando o processo sincrético.

5.2.2 O Termo a quo para a Contagem do Prazo de 15 dias e a sua Aplicação pelo não Pagamento Voluntário

Sobre o termo inicial para a contagem do prazo de 15 (quinze) dias para a incidência da multa de 10% (dez por cento) prevista no artigo 475 – J, do CPC, há entendimentos doutrinários conflitantes, os quais merecem ser expostos a fim de possibilitar uma conclusão mais farta e compreensível.

Repousa a discussão basicamente sobre se o momento da contagem do prazo de 15 (quinze) dias deve ser realizado apenas e tão-somente quando se verifica o trânsito e julgado da sentença; se a partir da inércia da intimação feita na pessoa do advogado constituído; ou, ainda, se necessário se faz a intimação pessoal do devedor para, somente a partir de então, ter início a contagem do prazo para pagamento.

O entendimento majoritário encontrado é de que o momento adequado para aplicação da penalidade deve ser depois que o devedor, na pessoa de seu advogado, devidamente intimado para tal mister, deixa de efetuar o pagamento do montante devido.

Assim, segundo essa corrente, o início do prazo de 15 (quinze) dias previsto no artigo 475 – J, do CPC, somente se dá após a intimação do devedor na pessoa do seu advogado.

Há, por outro lado, uma segunda corrente mais conservadora, que entende ser imprescindível a intimação pessoal do devedor, dada a natureza personalíssima do pagamento, que se não cumprido, arcará o devedor com o ônus de sua inércia.

Entendem, portanto, que a multa de 10% (dez por cento) não é devida, ainda que haja intimação na pessoa do advogado do devedor, sob o fundamento de que a contagem do prazo de 15 (quinze) dias para o pagamento (artigo 475 – J do CPC) deve se iniciar a partir do momento em que o devedor é intimado pessoalmente para cumprir a obrigação, face a natureza personalíssima do pagamento.

Nessa esteira se posiciona Evaristo Aragão Santos:

[...] Não parece adequado permitir-se a fluência ´automática´ do prazo para cumprimento da obrigação sob pena de multa e penhora, sem prévia intimação do devedor. Tampouco para tanto serve, em nosso sentir, a mera intimação de seu advogado por meio de publicação na imprensa. Afirmamos isso com base na atual jurisprudência do STJ, formada a partir da apreciação de situações semelhantes. Pensamos que para o novo regime de cumprimento de sentença deva ser adotado o mesmo entendimento hoje prevalecente para as obrigações específicas: o devedor precisa ser intimado pessoalmente para cumprir a obrigação, sem o que não se lhe poderá imputar penalidade pelo inadimplemento.

Essa conclusão, respalda-se, como se disse, em jurisprudência de nossos Tribunais, especialmente do STJ, o qual, recentemente decidiu que ‘o cumprimento de sentença pressupõe ordem para fazer, o que arrasta a necessidade de comunicação in faciem, insubstituível pela publicação do diário oficial. É que na forma dos artigos 234 e 238 do CPC, as intimações são pessoais quanto ao destinatário, podendo à semelhança do art. 11 da lei do writ, operar-se pelo correio; tanto mais pela própria citação que consubstancia o contraditório, admite essa modalidade que a receptiva de vontade. (STJ – 1ª Turma – Resp 692386/PB, Relm Min. Luiz Fux, DJ 24/10/2005. [25] (grifo nosso)

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Por derradeiro, há uma terceira corrente, a qual comungamos, onde o entendimento é de que o termo a quo para a contagem do prazo de 15 (quinze) dias para pagamento sob pena de multa de 10% (dez por cento) se dá a partir do trânsito em julgado da sentença, senão vejamos.

Inicialmente, cumpre lembrar que conforme exposto alhures, o artigo 475 – J, do CPC confere natureza híbrida à sentença objeto de cumprimento de sentença, possuindo esta natureza meramente condenatória com relação à realização dos atos executivos e executiva lato sensu com relação ao cumprimento voluntário da obrigação (prevê multa de 10%).

Assim, diferentemente da sistemática superada (onde cabia ao credor o encargo de requerer a execução através de um processo autônomo, provocando inclusive nova citação do devedor), o procedimento criado para cumprimento de sentença possui a clara intenção de evitar pronunciamentos desnecessários do magistrado e das partes, operando-se automaticamente o dever de cumprir a sentença em 15 (dias), a contar do seu trânsito em julgado. Isto tudo porque foi transferido ao devedor o dever de cumprir voluntariamente a sentença líquida, independentemente de execução iniciada pelo credor.

Com o devido respeito aos nobres professores que sustentam a necessidade de intimação prévia, seja na pessoa do advogado ou pessoalmente ao devedor, entendemos que nesse aspecto os mesmos equivocam-se, pois a dicção do artigo 475 – J, do CPC não é das mais difíceis de interpretar. Vejamos:

Art. 475 – J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de 15 (quinze) dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% (dez por cento) e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

Ora, se a intenção do artigo 475 – J ora interpretado é evitar a procrastinação injusta do pagamento, incentivando o adimplemento espontâneo do débito e o fiel cumprimento da sentença, não é admissível que se exija a intimação pessoal do executado ou até mesmo de seu advogado para que se inicie a contagem do prazo de 15 (quinze) dias, já que este prazo é para pagamento. A uma porque a sentença quanto a esse aspecto é executiva lato sensu; a duas porque a lei assim não exige; a três porque não há qualquer prejuízo justificável ao devedor pelo fato de não ser exigido requerimento por parte do credor; a quatro porque se posicionar de forma diversa seria um enorme contra-senso aos objetivos da lei e à forma como tal deve ser interpretada.

Sobre a forma como devem ser interpretadas as normas jurídicas, o doutrinador Franciso Prehn Zavascki preceitua com precisão qual o referencial axiológico da hermenêutica das normas executivas:

[...] as normas executivas têm como referencial axiológico a efetivação do direito do credor, e é com base nesse pressuposto que devemos interpretá-las. Dito referencial só pode ser afastado ou restringido em função de outra norma com igual ou superior conteúdo valorativo. [26]

Diante da imaturidade da lei, inicialmente tivemos entendimentos jurisprudenciais dos mais diversificados. O FONAJE (Fórum Nacional dos Juizados Especiais) em encontro realizado na cidade de Aracaju/SE firmou enunciado exatamente no mesmo sentido defendido neste trabalho. Vejamos:

Enunciado 105 - Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa, não o efetue no prazo de quinze dias, contados do trânsito em julgado, independentemente de nova intimação, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE, grifo nosso)

Em linha com o brilhante entendimento expressado neste enunciado, entendemos que não há necessidade de prévia intimação do devedor para pagar o débito como condição de incidência da multa do artigo 475 – J do CPC, eis que o simples trânsito em julgado da sentença condenatória líquida já é uma ordem de pagamento apta a dar ciência do mesmo de que deve saldar o débito.

Também sobre o termo a quo para incidência da multa de 10% (dez por cento) prevista no artigo 475 – J do CPC, a melhor doutrina tem se manifestado que este se dá a partir do trânsito em julgado da sentença. Vejamos:

O montante da condenação será acrescido de multa de 10%, sempre que o devedor não proceder ao pagamento voluntário nos quinze dias subseqüentes à sentença que fixou o valor da dívida (isto é, a sentença condenatória líquida, ou a sentença de liquidação da condenação genérica).

[...]

Não tem cabimento a multa se o cumprimento da prestação se der dentro dos quinze dias estipulados pela lei. Vê-se, destarte, que o pagamento não estará na dependência de requerimento do credor. Para evitar a multa, tem o devedor que tomar a iniciativa de cumprir a condenação no prazo legal, que flui a partir do momento em que a sentença se torna exeqüível. [27] (grifo nosso)

5.2.2.1 A Primeira Decisão do STJ a Respeito do Tema

O Superior Tribunal de Justiça, em recente decisão que repousa exatamente sobre a multa do artigo 475 – J, CPC (dada sua competência para julgar questões que envolvam a interpretação de leis federais – no caso o Código de Processo Civil), pronunciou-se pela primeira vez sobre o tema, expondo o entendimento no sentido de que independe de citação pessoal ou intimação do advogado para o início da contagem do prazo de 15 (quinze) dias para pagamento de condenação por quantia certa, após o que será acrescida da multa prevista de 10% (dez por cento).

Seguem os termos da decisão, na íntegra:

RECURSO ESPECIAL Nº 954.859 - RS (2007⁄0119225-2)

LEI 11.232⁄2005. ARTIGO 475-J, CPC. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. MULTA. TERMO INICIAL. INTIMAÇÃO DA PARTE VENCIDA. DESNECESSIDADE.

1. A intimação da sentença que condena ao pagamento de quantia certa consuma-se mediante publicação, pelos meios ordinários, a fim de que tenha início o prazo recursal. Desnecessária a intimação pessoal do devedor.

2. Transitada em julgado a sentença condenatória, não é necessário que a parte vencida, pessoalmente ou por seu advogado, seja intimada para cumpri-la.

3. Cabe ao vencido cumprir espontaneamente a obrigação, em quinze dias, sob pena de ver sua dívida automaticamente acrescida de 10%.

VOTO

MINISTRO HUMBERTO GOMES DE BARROS (Relator): A questão é nova e interessantíssima. Merece exame célere do Superior Tribunal de Justiça porque tem suscitado dúvidas e interpretações as mais controversas.

Há algo que não pode ser ignorado: a reforma da Lei teve como escopo imediato tirar o devedor da passividade em relação ao cumprimento da sentença condenatória. Foi-lhe imposto o ônus de tomar a iniciativa de cumprir a sentença de forma voluntária e rapidamente. O objetivo estratégico da inovação é emprestar eficácia às decisões judiciais, tornando a prestação judicial menos onerosa para o vitorioso.

Certamente, a necessidade de dar resposta rápida e efetiva aos interesses do credor não se sobrepõe ao imperativo de garantir ao devedor o devido processo legal.

Mas o devido processo legal visa, exatamente, o cumprimento exato do quanto disposto nas normas procedimentais. Vale dizer: o vencido deve ser executado de acordo com o que prevê o Código. Não é lícito subtrair-lhe garantias. Tampouco é permitido ampliar regalias, além do que concedeu o legislador.

O Art. 475-J do CPC, tem a seguinte redação:

Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

A Lei não explicitou o termo inicial da contagem do prazo de quinze dias. Nem precisava fazê-lo. Tal prazo, evidentemente, inicia-se com a intimação. O Art. 475-J não previu, também, a intimação pessoal do devedor para cumprir a sentença.

A intimação - dirigida ao advogado - foi prevista no § 1º do Art. 475-J do CPC, relativamente ao auto de penhora e avaliação. Nesse momento, não pode haver dúvidas, a multa de 10% já incidiu (se foi necessário penhorar, não houve o cumprimento espontâneo da obrigação em quinze dias).

Alguns doutrinadores enxergam a exigência de intimação pessoal. Louvam-se no argumento de que não se pode presumir que a sentença publicada no Diário tenha chegado ao conhecimento da parte que deverá cumpri-la, pois quem acompanha as publicações é o advogado.

O argumento não convence. Primeiro, porque não há previsão legal para tal intimação, o que já deveria bastar. Os Arts. 236 e 237 do CPC são suficientemente claros neste sentido. Depois, porque o advogado não é, obviamente, um estranho a quem o constituiu. Cabe a ele comunicar seu cliente de que houve a condenação. Em verdade, o bom patrono deve adiantar-se à intimação formal, prevenindo seu constituinte para que se prepare e fique em condições de cumprir a condenação.

Se o causídico, por desleixo omite-se em informar seu constituinte e o expõe à multa, ele deve responder por tal prejuízo.

O excesso de formalidades estranhas à Lei não se compatibiliza com o escopo da reforma do processo de execução. Quem está em juízo sabe que, depois de condenado a pagar, tem quinze dias para cumprir a obrigação e que, se não o fizer tempestivamente, pagará com acréscimo de 10%.

Para espancar dúvidas: não se pode exigir da parte que cumpra a sentença condenatória antes do trânsito em julgado (ou, pelo menos, enquanto houver a possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo).

O termo inicial dos quinze dias previstos no Art. 475-J do CPC, deve ser o trânsito em julgado da sentença. Passado o prazo da lei, independente de nova intimação do advogado ou da parte para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação.

Se o credor precisar pedir ao juízo o cumprimento da sentença, já apresentará o cálculo, acrescido da multa.

Esse o procedimento estabelecido na Lei, em coerência com o escopo de tornar as decisões judiciais mais eficazes e confiáveis. Complicá-lo com filigranas é reduzir à inutilidade a reforma processual.

Nego provimento ao recurso especial ou, na terminologia da Turma, dele não conheço. [28] (grifo nosso)

Concordamos sem ressalvas com o acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, que a nosso ver deverá servir de parâmetro para os julgamentos de casos análogos em todo país, sob pena de estar se espancando conceitos e objetivos inovadores trazidos pelo legislador através da Lei 11232/05 (demonstrados no decorrer deste trabalho), que se utilizados da forma como foram concebidos, certamente ajudarão sobremaneira a tornar mais célere e eficaz a prestação jurisdicional, que, se não possui recursos, material humano, estrutura e consciência para tanto, é mais uma vez salva pela criatividade e intelectualidade dos processualistas brasileiros.

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Sobre o autor
Bruno Januário Pereira

Advogado em São Paulo. Bacharel pela Faculdade de Direito da Alta Paulista. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Instituto LFG e IBDP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Bruno Januário. O cumprimento de sentença que determina o pagamento de soma nos termos da Lei nº 11.232/05. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1931, 14 out. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11833. Acesso em: 28 mar. 2024.

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