O namoro e os esponsais são mesmo um momento muito bonito na vida de um moço e uma moça que pretendem, após mútuo conhecimento e aceitação das virtudes e defeitos de cada qual, subir ao altar.
A propósito da cerimônia de casamento, dispõe com toda convicção o Código Civil brasileiro sobre o ato público do consórcio matrimonial:
Art. 1.534. A solenidade realizar-se-á na sede do cartório, com toda publicidade, a portas abertas, presentes pelo menos duas testemunhas, parentes ou não dos contraentes, ou, querendo as partes e consentindo a autoridade celebrante, noutro edifício público ou particular.
§ 1º Quando o casamento for em edifício particular, ficará este de portas abertas durante o ato.
§ 2º Serão quatro as testemunhas na hipótese do parágrafo anterior e se algum dos contraentes não souber ou não puder escrever.
Não há exceções para o desenvolvimento da "solenidade": o local em que for realizado, se predial, deve estar durante todo o transcurso do cerimonial com as "portas abertas".
Maria Helena Diniz (Código Civil Anotado, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1048) ressalta a não-exceção da regra de "portas abertas" durante o ato, assinalando, ademais:
Publicidade do ato nupcial. É de ordem pública a publicidade da celebração do casamento, uma vez que a lei exige que durante a cerimônia as portas fiquem abertas, sob pena de o casamento sofrer impugnações, permitindo-se, assim, o livre ingresso de qualquer interessado em opor algum impedimento matrimonial.
Artistas brasileiros, segundo a mídia divulga, têm barrado a entrada de pessoas não-convidadas a seus enlaces. Quando o ato se tratar mesmo do "casamento civil", como se diz – pois algumas vezes é somente uma celebração festiva sem condão jurídico –, as portas deverão estar plenamente abertas. Isto serve para artistas ou não.
Recentemente, cantora moça, ao contrair suas primeiras núpcias, planejou grande esquema de segurança, em que, inclusive, deveriam os convidados deixar celulares e câmeras na entrada, para posterior retirada somente quando do término do evento.
Eram muitos os convidados. Ao que se noticiou, um festão.
Diga-se que a família costuma surgir com o casamento, e tanto este quanto aquela, se atendido o Direito Natural e a Constituição, podem ser tidos como direitos da personalidade, pois a vocação humana é o amor; numa lembrança moral, eis a bondade de Deus: Gn 2, 18.
Num parênteses sobre o tema, confira-se o plano do mesmo Codex:
Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
Por aí, ainda que seja um direito eidético da pessoa, não pode ela, sua titular, ainda que livre e autonomamente, tolher-lhe no todo ou em parte.
Afinal, é isto válido, em se tratando do ato solene do casamento? Por outras letras: casar em local com acesso restrito é legal?
A solução, com efeito, será descobrir o que a norma disciplinou a relevância da forma especificadamente para o matrimônio civil, pois muitas das vezes é irregular sua afronta.
Mas o desrespeito à forma importa? Sim. A tradição românica, ainda que perdendo um pouco daquele rigorismo do período formulário, faz significar a forma como uma garantia de validade de um ato. Tanto que o diploma civil, já pluricitado, declinou:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
(...)
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
E o casamento é um "negócio jurídico"? Sim. E o primeiro a dizer isto foi o Direito Canônico, conquanto ainda o considera também um dos sacramentos. Há, no particular sobre a "natureza jurídica do casamento" muita literatura a ser consultada, pelos que se interessarem.
E qual a punição para o desrespeito à forma prescrita em lei? Vejamos assim, pois, haver regra apropriada a redargüição à interrogativa:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
(...)
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
Tem-se, de plano, a "nulidade". Apesar da publicidade do evento de casamento de artistas, inclusive porque muitos e variados são os presentes ao ato, se for realizado de "portas fechadas", vedada a presença de terceiros quiquis de populo, vislumbra-se ser o mesmo, atualmente, nulo.
Maria Helena Diniz, idem, ibidem, p. 193, acerca do art. 166, dirá:
Efeitos da nulidade absoluta. Com a declaração da nulidade absoluta do negócio jurídico, este não produzirá qualquer efeito por ofender princípios de ordem pública, por estar inquinado por vícios essenciais. Por exemplo, (...) se não revestir a forma prescrita em lei ou preterir alguma solenidade imprescindível para sua validade (RT 707:143, 781:195). (...) De modo que um negócio jurídico nulo é como se nunca tivesse existido desde sua formação, pois a declaração de sua invalidade produz efeito ex tunc.
E a nulidade não se convalida. Deverá ser o ato refeito, portanto, caso os contraentes queiram emprestar-lhe figurino válido.
Pode até ser que se possa provar por meios eletrônicos aptos, como gravação (filmagem), fotografia ou outro, ou mesmo pelo bom e velho testemunho, sua ocorrência. Ocorre, porém, que a lei não abriu exceção, caso em que teria dito "... poderá ser realizado a portas fechadas, mediante prévia autorização da autoridade competente" etc.
Talvez a legislação se altere. Quiçá franquear as portas para qualquer um seja, em certos casos, realmente não muito conveniente, ou até perigoso! Porém, atualmente a sanção está robusta, como visto.
Por isso, seria sagaz que os artistas ou qualquer um de nós, pessoas públicas ou não, procurassem se adequar, de modo que, no futuro, não possam sofrer conseqüências não queridas de um ato desejado.