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Município sem SVO.

Quem emite o atestado de óbito?

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MORTE NATURAL SEM ASSISTÊNCIA MÉDICA. QUEM EMITE O ATESTADO DE ÓBITO?

Estamos diante da hipótese da pessoa que falece sem ter tido atendimento médico, ou ainda, sem ter tido acompanhamento médico. Geralmente a pessoa falece em casa.

Ocorrida a morte, referido manual dispõe que cabe emitir o atestado de óbito:

-O médico do SVO, nas localidades que dispõem deste tipo de serviço;

- O médico do serviço público de saúde mais próximo do local onde ocorreu o evento; e na sua ausência, por qualquer médico, nas localidades sem SVO. (grifos nossos)

O artigo 2º da Resolução nº 1.779/05 do CFM trata da hipótese da morte sem assistência médica.

"Art. 2º Os médicos, quando do preenchimento da Declaração de Óbito, obedecerão as seguintes normas:

1) Morte natural:

I. Morte sem assistência médica: (grifos nossos)

a) Nas localidades com Serviço de Verificação de Óbitos (SVO):

A Declaração de Óbito deverá ser fornecida pelos médicos do SVO;

b) Nas localidades sem SVO:

A Declaração de Óbito deverá ser fornecida pelos médicos do serviço público de saúde mais próximo do local onde ocorreu o evento; na sua ausência, por qualquer médico da localidade".

Relembremos também a Portaria nº 20/2003 da Secretaria de Vigilância em Saúde, prevê em seu artigo 14,

§ 1- Nos casos de óbitos naturais, sem assistência médica, a DO deverá ser preenchida pelo Médico do Serviço de Verificação de Óbito - SVO, destinando-se as vias conforme o disposto neste artigo.

§ 2- Onde não existir o SVO, a DO será preenchida por médico da localidade, que deverá dar a destinação indicada neste artigo.


MORTES NATURAIS. NÃO FORNECIMENTO DO ATESTADO DE ÓBITO PELO MÉDICO. CONSEQUÊNCIAS.

O médico que se recusa a fornecer o atestado de óbito alegando que a atividade deve ser realizada pelo SVO, sendo que, no município ainda não está instalado o referido serviço tem consequências penais, civis e administrativas, a seguir mencionadas.


CONSEQUÊNCIAS PENAIS. CRIME DE PREVARIAÇÃO.

Não podemos esquecer que os médicos contratados pelas Prefeituras Municipais para atuarem em Hospitais Públicos, Centros de Saúde, etc, são servidores públicos (funcionários públicos).

Diante dessa constatação, referidos médicos podem incidir nos crimes previstos no título XI, do Código Penal que dispõe "Dos crimes contra a administração pública", onde encontramos no artigo 319 o crime de prevaricação, com a seguinte descrição,

"Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal".

O interesse pessoal encontra-se caracterizado ao não realizar uma atividade, emitindo o atestado de óbito, tendo proveito ou vantagem. Recebe o salário e não atua.


CONSEQUÊNCIAS CIVIS. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

Não podemos esquecer que o artigo 1º da Lei nº 8.429/92, diz que,

"Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei".

E o artigo 2º e 3º da mesma legislação, ainda conceitua quem é agente público com a seguinte redação:

"Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta".

Sobre o quem vem a ser ato de improbidade administrativa devemos recorrer ao disposto no artigo 11, incisos I e II, da Lei nº 8.429/92,

"Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício".

Observamos que o ato do médico do Hospital Público ao negar a emissão do atestado de óbito constitui ato de improbidade administrativa, passível das penalidades previstas na própria legislação, dentre elas,

"... ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos".

E no artigo 21 ainda verificamos que,

"A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:

I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público".


CONSEQUÊNCIAS CIVIS. AÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS.

Em virtude da negativa do médico plantonista em não emitir o atestado de óbito, familiares podem ter de arcar com gastos visando possibilitar a emissão do atestado de óbito por outro médico. Assim como, podem sofrer danos morais em virtude da citada negativa.


CONSEQUÊNCIAS ADMINISTRATIVAS. SINDICÂNCIA.

Não nos esqueçamos que o profissional da área de saúde está vinculado ao Conselho Regional de Medicina de seu Estado, bem como, possui um Código de Ética o qual prevê sanções para o caso de descumprimento de suas normas.


CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

Vejamos diversos dispositivos do Código de Ética Médica que podem ser aplicados no presente estudo,

Art. 14° - O médico deve empenhar-se para melhorar as condições de saúde e os padrões dos serviços médicos e assumir sua parcela de responsabilidade em relação à saúde pública, à educação sanitária e à legislação referente à saúde.

Art. 18° - As relações do médico com os demais profissionais em exercício na área de saúde devem basear-se no respeito mútuo, na liberdade e independência profissional de cada um, buscando sempre o interesse e o bem-estar do paciente.

É vedado ao médico:

Art. 29 - Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência.

Art. 30 - Delegar a outros profissionais atos ou atribuições exclusivos da profissão médica.

Art. 39 - Receitar ou atestar de forma secreta ou ilegível, assim como assinar em branco folhas de receituários, laudos, atestados ou quaisquer outros documentos médicos.

Art. 44 - Deixar de colaborar com as autoridades sanitárias ou infringir a legislação pertinente.

Art. 45 - Deixar de cumprir, sem justificativa, as normas emanadas dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina e de atender às suas requisições administrativas, intimações ou notificações, no prazo determinado.

Art. 55 - Usar da profissão para corromper os costumes, cometer ou favorecer crime.

Art. 69 - Deixar de elaborar prontuário médico para cada paciente.

Art. 110 - Fornecer atestado sem ter praticado o ato profissional que o justifique, ou que não corresponda  à verdade.

Art. 112 - Deixar de atestar atos executados no exercício profissional, quando solicitado pelo paciente ou seu responsável legal.

Parágrafo único: O atestado médico é parte integrante do ato ou tratamento médico, sendo o seu fornecimento direito inquestionável do paciente, não importando em qualquer majoração de honorários.

Art. 114 - Atestar óbito quando não o tenha verificado pessoalmente, ou quando não tenha prestado assistência ao paciente, salvo, no último caso, se o fizer como plantonista, médico substituto, ou em caso de necropsia e verificação médico-legal. (grifos nossos)

Art. 115 - Deixar de atestar óbito de paciente ao qual vinha prestando assistência, exceto quando houver indícios de morte violenta.

Art. 118 - Deixar de atuar com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou auditor, assim como ultrapassar os limites das suas atribuições e competência.

Art. 119 - Assinar laudos periciais ou de verificação médico-legal, quando não o tenha realizado, ou participado pessoalmente do exame.

Já no artigo 142 prevê que o médico está obrigado "a acatar e respeitar os Acórdãos e Resoluções dos Conselhos Federal e Regionais de Medicina".

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Observamos então, que cabe ao médico o cumprimento das normas supracitadas, e caso isso não ocorra estará o mesmo sujeito às sanções administrativas aplicadas pelo próprio Conselho de Medicina.

Caso o médico plantonista encontre indícios de morte violenta deverá, JUSTIFICADAMENTE, apontar as causas que o levaram a essa conclusão e encaminhar o corpo para o Instituto Médico Legal. Observamos que deverá fundamentar sua decisão para que a mesma possa ser passível de análise pelo Médico do IML. Caso o Médico do IML não encontre sinais de morte violenta deverá encaminhar o corpo ao médico plantonista para que então esse emita a declaração de óbito.

Em havendo recusa intransponível do médico plantonista em conceder o atestado o óbito, entendemos deva ser acionado outro médico do serviço público para tanto. Em havendo recusa também, ou ainda, não havendo outro médico, deverá ser fornecido o atestado de óbito por médico particular contratado pela família, ou sendo a família carente de recursos financeiros poderá ser acionado o IML para o fornecimento do atestado de óbito e posterior tomada das medidas criminais, cíveis e administrativas contra o médico plantonista.

Em Mato Grosso do Sul, na cidade de Cassilândia, houve problema semelhante ao narrado no presente estudo, pois constantes eram as recusas por parte dos médicos plantonista do sistema público de saúde em fornecer atestado de óbito, principalmente naqueles casos em que o óbito ocorria em domicílio, ou seja, sem assistência médica.

O Oficial do Cartório Registro Civil de Cassilândia, apresentou pedido de providências ao Poder Judiciário, narrando os fatos. O Dr. Sílvio C. Prado, com a rapidez de sempre e com a constante preocupação com a sociedade, marcas desse magistrado da 2ª Vara da Comarca de Cassilândia, o qual com sua atuação enobrece o Poder Judiciário de qualquer Estado, solucionou o problema, determinando diretrizes a serem seguidas, bem como, apontando a legislação que regulamenta o assunto.

A efetividade do processo somente pode ser alcançada com a rapidez da prestação jurisdicional.

O referido Oficial ainda apresentou pedido de providência junto à Corregedoria-Geral de Justiça do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso do Sul, a qual por sua vez, determinou a alteração de dispositivos do Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul que passa a contar com a seguinte redação no artigo art. 671,

"§ 3º- Na lavratura do óbito nos casos de morte natural com ou sem assistência médica ou que, no atestado, se refira a moléstia mal definida, é imprescindível a declaração de óbito expedida pelo Serviço de Verificação de Óbito".

"§ 4º- No Município onde não houver o Serviço de Verificação de Óbito o atestado será lavrado por médico do setor público e, na impossibilidade, por médico do setor privado".


NOTAS

01Odon Ramos Maranhão. Curso Básico de Medicina Legal. São Paulo: Editora RT, 1991, 4ª ed.

02A. Almeida Jr. e J. B. de O. e Costs Jr. Lições de Medicina Legal. São Paulo: Editora Nacional, 1985, 18ª edição.

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Sobre o autor
Paulo Henrique Rosseto de Souza

Delegado de Polícia do Estado de Mato Grosso do Sul,pós-graduado em Direito

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Paulo Henrique Rosseto. Município sem SVO.: Quem emite o atestado de óbito?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2079, 11 mar. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12438. Acesso em: 18 nov. 2024.

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