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O princípio constitucional da vedação do comportamento contraditório.

Os pressupostos específicos para a caracterização do "venire". A coibição da conduta contraditória e o processo civil brasileiro

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11/05/2009 às 00:00

Resumo:


  • O princípio da vedação do comportamento contraditório relaciona-se à boa-fé objetiva e decorre da dignidade da pessoa humana, atuando como limitador do exercício de posições jurídicas de forma abusiva e protegendo a confiança e expectativas legítimas nos diversos âmbitos do direito.

  • A vedação do comportamento contraditório exige a análise de pressupostos específicos como o "factum proprium", a contradição a esse fato, a legítima expectativa e o dano potencial ou efetivo, sendo sua aplicação necessária para manter a coerência e lealdade nas relações jurídicas.

  • O princípio da vedação do comportamento contraditório tem aplicação também no processo civil brasileiro, onde as partes devem agir em conformidade com os deveres de boa-fé, colaborando para a justiça e evitando atitudes incoerentes que prejudiquem a confiança e a expectativa das demais partes envolvidas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O texto estuda a vedação do comportamento contraditório, como princípio constitucional, relacionando-o com a boa-fé objetiva e a teoria do abuso do direito.

Introdução

O presente estudo pretende elucidar as principais noções relacionadas à vedação do comportamento contraditório, partindo de sua caracterização como princípio constitucional (decorrente da dignidade da pessoa humana), relacionando-o com a boa-fé objetiva e a teoria do abuso do direito, elucidando os seus pressupostos específicos (factum proprium, contradição ao factum proprium, legítima expectativa e potencialidade de dano) e, ao final, relacionando-o ao processo civil brasileiro.

A vedação do comportamento contraditório relacionada às noções de dignidade da pessoa humana, boa-fé objetiva e solidarismo social

O princípio da vedação do comportamento contraditório (ou princípio da tutela da confiança legítima ou, ainda, nemo potest venire contra factum proprium) se relaciona diretamente à boa-fé objetiva e decorre do valor constitucional da dignidade da pessoa humana.

Nos dizeres de Marcelo J. López Mesa (2005), "la teoria de los actos propios es una derivación directa del principio de la buena fe y encuentra fundamento normativo".

Suas origens, contudo, não são recentes, mas sim remontam a história da repugnância à incoerência.

Relaciona-se, indubitavelmente, às noções de solidariedade social, que impõe a necessidade de o Estado intervir para garantir a dignidade da pessoa humana e limitar a atuação privada. Permite, como ensina Anderson Schreiber (2005), uma verdadeira releitura de todo direito privado, empenhada em efetivar os valores da sociedade contemporânea e, consoante Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007), prevalece sobre a legalidade estrita, posto que condiciona a interpretação da norma legal.


Noções básicas acerca da tutela da confiança e da coerência. O conceito de vedação do comportamento contraditório. A proteção da legítima expectativa.

A vedação do comportamento contraditório decorre, em suma, da tutela da confiança e da lealdade, que, invariavelmente, transcende o próprio âmbito da boa-fé, estendendo-se sobre todo o direito. Traduz-se na imposição de balizamentos ao comportamento dos indivíduos, tendo em vista a concretização da solidariedade social.

O reconhecimento da necessidade da tutela da confiança, de acordo com as lições de Anderson Schreiber (2005, p. 88), desloca a atenção do direito que passa a focar, além das condutas, o efeito de tais:

O reconhecimento da necessidade da tutela da confiança desloca a atenção do direito, que deixa de se centrar exclusivamente sobre a fonte das condutas para observar também os efeitos fáticos de sua adoção. Passa-se da obsessão pelo sujeito e pela sua vontade individual, como fonte primordial das obrigações, para uma visão que, solidária, se faz atenta à repercussão externa dos atos individuais sobre os diversos centros de interesses, atribuindo-lhes eficácia obrigacional independentemente da vontade ou da intenção do sujeito que os praticou.

Devem ser analisadas as condutas e os efeitos das condutas praticadas de acordo com a lógica da coerência.

Neste diapasão, a proibição do comportamento contraditório não tem por fim apenas a manutenção da coerência, mas também a proteção da confiança despertada na contraparte ou em terceiros.

Trata-se da proibição da pessoa de praticar uma conduta ou ato contrário àquele que já praticara uma vez sendo este capaz de violar as expectativas legítimas despertadas em outrem ou lhe causar prejuízos.

Sem dúvidas, é de Menezes Cordeiro (1984, p. 742) a definição mais elucidativa acerca da locução:

A locução ‘venire contra factum proprium’ traduz o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente. Esse exercício é tido, sem contestação por parte da doutrina que o conhece, como inadmissível.

O doutrinador ressalta que o venire contra factum proprium constituir-se-ia em um tipo não compreensivo de exercício inadmissível de direitos. Determinaria a vinculabilidade de determinados comportamentos.

E continua (2001, p. 750):

Sociologicamente, o comportamento contraditório configura-se como um atentado contra as expectativas fundamentais de continuidade da auto-representação que respeitam também a identidade do parceiro e a relação bilateral.

A seu turno, Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007, p. 291) perfaz uma tradução literal e comparativa da expressão:

A expressão venire contra factum proprium poderia ser vertida para o vernáculo em tradução que se apresentaria em algo do tipo "vir contra seus próprios atos" ou "comportar-se contra seus próprios atos", pode ser apontada, em uma primeira aproximação, como sendo abrangente das hipóteses nas quais uma mesma pessoa, em momentos distintos, adota dois comportamentos, sendo que o segundo deles surpreende o outro sujeito, por ser completamente diferente daquilo que se poderia razoavelmente esperar, em virtude do primeiro.

Em outras palavras, aquele que aderiu a um determinado comportamento, não poderá se opor às conseqüências jurídicas dele espargidas, em razão da legítima expectativa da outra parte, que, de boa-fé, pressupõe a ocorrência de determinados efeitos.

Por Diez-Picazo (1963), o venire contra factum proprium se relacionaria tanto à fidelidade à palavra dada quanto ao ato praticado.

A seu turno, Ruy Rosado de Aguiar Júnior (1991), preleciona que o venire contra factum proprium se reporta à vedação da atuação contra um fato próprio já praticado que incutira expectativa de efeitos a outrem de boa-fé.

Nas palavras de Marcelo J. López Mesa (2005), não poderia o indivíduo se contradizer com relação aos seus atos anteriores através do exercício de uma conduta incompatível:

Nadie puede ponerse em contradicción con sus propios actos anteriores, a través del ejercicio de una conducta incompatible com uma anterior deliberada, juridicamente relevante y plenamente eficaz.

E continua o mesmo autor (2005), dispondo que o venire contra factum proprium se constituiria como uma limitação ao exercício dos direitos com base na já mencionada legítima expectativa:

Constituye esta una limitación al ejercicio de los derechos que se basa em el rechazo de la sorpresa y la emboscada; el derecho exige uma conducta consonante con la confianza suscitada, requiriendo la coherencia del comportamiento com virtualidad respecto de terceros.

Como se extrai do conceito, seriam necessários dois comportamentos, da mesma pessoa, lícitos e diferidos no tempo. A primeira conduta seria contraria pela segunda e esta traria algum prejuízo a contraparte ou terceiro, sendo, portanto, vedada pelo ordenamento. Isto é, há uma contradição entre duas condutas, posto que a partir da análise da primeira, havia surgido uma legítima expectativa de que outro seria o segundo comportamento.

Nas palavras de Aldemiro Rezende Dantas Júnior, é ressaltada a correlação existente entre a prática do comportamento contraditório e a proteção da boa-fé (2007, p. 291):

(...) Há uma contradição entre os dois comportamentos, pois, a partir da análise do primeiro, havia surgido a legítima expectativa de que outra seria a conduta a ser adotada por ocasião do segundo. (...) Todo comportamento será contrário à boa-fé se for qualificado como contraditório, o que ocorre quando se mostra contrário a um comportamento anterior da mesma pessoa.

E, ademais, o próprio doutrinador ousa elaborar um conceito completo acerca do instituto, ressalvando suas nuances e pressupostos (2007, p. 367-368):

Parece-nos que o venire pode ser conceituado como sendo uma seqüência de dois comportamentos que se mostram contraditórios entre si e que são independentes um do outro, cada um deles podendo ser omissivo ou comissivo e sendo capaz de repercutir na esfera jurídica alheia, de modo tal que o primeiro se mostra suficiente para fazer surgir em uma pessoa mediana a confiança de que uma determinada situação jurídica será concluída ou mantida em certas condições, enquanto o segundo vem frustrar a legítima e razoável expectativa que havia sido criada no outro sujeito, sem que exista justificativa fática ou amparo legal que possa justificar a contradição entre os comportamentos e a conseqüente frustração da expectativa, sem em tal caso irrelevante averiguar se houve dolo ou culpa do que agiu de modo contraditório.

É nítido que, ao se vedar a ocorrência de comportamentos contraditórios, protege-se a confiança, a legítima expectativa, a lealdade, a probidade, a lisura e a honestidade nas relações jurídicas, evidenciando-se a tutela da parte que obrar de acordo com a boa-fé.

Neste sentido, o colendo Superior Tribunal de Justiça, admitindo e aplicando o venire contra factum proprium em nosso ordenamento, já decidira que em "havendo real contradição entre dois comportamentos, significando o segundo quebra injustificada da confiança gerada pela prática do primeiro, em prejuízo da contraparte, não é admissível dar eficácia à conduta anterior". (Resp n° 9553-9 – SP – Min. Ruy Rosado de Aguiar).

O Tribunal do Estado do Mato Grosso do Sul também já endossara tal entendimento dispondo que "a mudança de negociações pautadas por expectativa escudada na boa-fé objetiva importa em venire contra factum proprium devendo ser arrostada pela proteção da confiança da outra parte" (TJMS – 1ª Turma Cível – Apelação Cível – Ordinário – n° 2001.006261-8/0000-00 – Relator Des. Jorde Eustácio da Silva Frias), bem como a Corte paulista que julgou "inadmissível comportamento processual em contradição à conduta de anuência à composição havida" e "aplicável o princípio segundo o qual a ninguém é licito venire contra factum proprium". (TJSP – Apelação Cível – 5ª Turma de Direito Privado – n° 5818044200 - Rel. Des. Oscarlino Moeller).

A precisão terminológica será delimitada a contento.


O fundamento constitucional da vedação do comportamento contraditório

O princípio da vedação do comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium), consoante os ensinamentos de Anderson Schreiber, caracterizar-se-ia como um instrumento de realização da solidariedade social prevista no artigo 3º da Magna Carta. Em suas palavras (2005, p. 101):

O princípio da solidariedade social, protegido como objetivo da República brasileira no artigo 3º da Constituição de 1988, impõe a consideração da posição alheia também na atuação privada. O nemo potest venire contra factum proprium, concebido como uma vedação ao comportamento incoerente dirigida à tutela da confiança, não é outra coisa senão um instrumento de realização deste valor constitucional. Há, em outras palavras, direta vinculação entre a solidariedade social e o princípio de proibição ao comportamento contraditório.

Assim como a boa-fé objetiva, uma de suas facetas, seria a de princípio constitucional implícito, valor norteador de todo o ordenamento jurídico pátrio. Apresentar-se-ia como uma expressão da solidariedade social, relacionada e decorrente da dignidade da pessoa humana, de forma direta ou por quaisquer meios de expressão mais concreta.

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O princípio deve ser analisado de acordo com o novo enfoque de direitos civis pela malha constitucional, que prestigia os ditames da eticidade, sociabilidade e operabilidade.


A teoria do abuso do direito e a necessidade de explicitação dos pressupostos do venire contra factum proprium

O nosso ordenamento jurídico, seguindo as tendências dos sistemas jurídicos em geral, não detém uma regra genérica proibitiva da adoção de comportamentos contraditórios, mas tão somente hipóteses casuísticas em que se pode vislumbrar a configuração do instituto. Muito embora o nemo potest venire contra factum proprium possua assento constitucional, trata-se de um princípio constitucional implícito.

Nesta seara, faz-se imprescindível a compreensão efetiva de seus pressupostos ou requisitos, a fim de que possa se destacar a figura do venire contra factum proprium da boa-fé e da teoria do abuso do direito.

Nos dizeres de Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007, p. 298):

É evidente que nenhuma dessas vinculações com o abuso do direito e com a boa-fé, tem precisão terminológica suficiente para que, a partir delas, possam ser apontadas as características do venire. E é fácil de se chegar à conclusão dessa insuficiência, uma vez que tanto a conduta de boa-fé quanto o abuso do direito são expressões por demais amplas, (...) que comportam diversas hipóteses, cada uma delas com suas próprias e diversas características, e das quais o venire é apenas uma.

Os pressupostos para a caracterização do nemo potest venire contra factum proprium são próprios, peculiares e distintivos dos demais institutos.

É interessante, salientar, todavia, como já feito em outra obra de nossa autoria (2006), que, diante os dizeres de Menezes Cordeiro (1984, p. 759), tais requisitos são necessários, mas não imprescindíveis, sendo que "a falta de algum deles pode ser suprida pela intensidade especial que assumam os restantes".


Os pressupostos ou requisitos para aplicação do nemo potest venire contra factum proprium

Pode se afirmar que são quatro os pressupostos para aplicação do princípio de vedação do comportamento contraditório: a) factum proprium; b) legítima confiança de outrem na conservação do sentido objetivo desta conduta; c) um comportamento contraditório; e d) a existência de um dano ou um potencial de dano a partir da contradição.

A partir dessas considerações iniciais, expor-se-á os aludidos pressupostos detalhadamente.


O factum proprium

O "factum proprium", como primeiro pressuposto da vedação do comportamento contraditório, é a conduta inicial do indivíduo. Esse elemento significa um acontecimento advindo de um ato humano (pode ser uma ação ou uma omissão). Nesse sentido, leciona Diez-Picazo (1963, p. 194-195):

Para que pueda aplicarse la doctrina de los próprios actos, tal y como aqui tratamos de configurarla, se requiere, en primer lugar, que uma persona haya observado uma conducta determinada.(...)

En nuestro caso, lo que se valora es, pues, uma conducta que una persona há observado. Esta conducta puede inducirse de um acto o de vários, pero solo debe tomarse em consideración em cuanto revela una actitud, una postura, um modo general de proceder.

Para Anderson Schreiber, (2005, p. 127) o factum prorpium:

É, por definição, uma conduta não-vinculante. Torna-se vinculante apenas porque e na medida em que, despertando a confiança de outrem, atrai a incidência do princípio de proibição do comportamento contraditório e impõe ao seu praticante a conservação do seu sentido objetivo. O factum proprium não consiste em ato jurídico no sentido tradicional; passa a produzir efeitos jurídicos somente por força da necessidade de tutelar a confiança legítima depositada em outrem. Em síntese, não é jurídico, torna-se jurídico.

Evidente tratar-se de conduta não vinculante, uma vez que referida conduta se torna vinculante somente quando gera uma expectativa legítima na outra parte, atingindo sua confiança e reclamando a aplicação do princípio em questão.

Nos dizeres de Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007, p. 317):

O primeiro comportamento (o factum proprium), se isoladamente considerado, não é vinculante, não vincula o sujeito a um específico e determinado comportamento posterior. A vinculação surgirá apenas porque, no contexto da situação, verificou-se o surgimento da confiança no segundo sujeito, e a proteção dessa confiança é que conduzirá à necessidade de que o segundo comportamento se mostre coerente, rejeitando-se o que seja contraditório (o venire).

Ademais, segundo Anderson Scheiber (2005), não há falar que o "factum proprium" deva ser juridicamente relevante, isto porque este ato somente importará para o mundo jurídico por força da incidência do "venire contra factum proprium". Em suma, necessário apenas que se interferisse na esfera alheia, despertando a confiança de outrem.

Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007, p. 316- 317), todavia, perfaz uma crítica a tal ponderação, acrescentando que, a partir do momento em que o comportamento do sujeito repercute na esfera alheia, passa a ser juridicamente relevante:

Ora, mas, a partir do momento em que o comportamento do sujeito repercute na esfera alheia, passou a ser juridicamente relevante, ou seja, passou a ser um fato jurídico, capaz de provocar conseqüências jurídicas relevantes. Não é demais recordar a clássica lição de Miguel Reale, que, ao falar sobre o fato jurídico, esclarece que se trata de todo e qualquer fato da vida social que venha a corresponder ao modelo de comportamento previsto na norma do direito, ou seja, é o fato capaz de provocar conseqüências jurídicas. Logo, se o factum proprium é aquele que repercute na esfera jurídica alheia, então provoca conseqüências jurídicas, ou seja, é um fato jurídico, é juridicamente relevante. Na verdade, no essencial não há qualquer distinção entre a conclusão alcançada por Anderson Schreiber e a que foi por nós mencionada (...) o factum proprium deverá, necessariamente, repercutir na esfera jurídica alheia.

O factum proprium deve, ainda, ser válido quando individualmente considerado, haja vista que, se não o for, estar-se-á diante do campo da ilegalidade. Neste diapasão, Aldemiro Rezende Dantas Júnior (2007, p. 316) ainda acrescenta que também o ato apresentado com a "aparência de validade" poderá ser considerado como factum proprium:

Também será possível a caracterização do venire contra factum proprium quando o primeiro comportamento, embora não tenha sido válido, tenha sido apresentado com a aparência de validade, ou seja, quando se tratar de situação na qual não havia a possibilidade de se detectar a nulidade.

Por fim, assenta Anderson Schreiber, (2005, p. 130), que pelo fato do nemo potest venire contra factum proprium ter fundamento na confiança e solidariedade social, o factum proprium, deve ser capaz de repercutir na vida das pessoas.


A legítima confiança

Além do "factum proprium", é indispensável que a conduta perpetrada desperte na esfera alheia uma legítima confiança na preservação de seu sentido objetivo.

Assim pondera Anderson Schreiber acerca da necessidade de se analisar o caso concreto para constatar a ocorrência da legítima confiança (2005, p. 134):

A confiança que se perquire aí não é um estado psicológico, subjetivo, daquele sobre quem repercute o comportamento inicial. Trata-se, antes, de uma adesão ao sentido objetivamente extraído do factum proprium. Somente na análise de cada caso concreto será possível verificar a ocorrência ou não desta adesão ao comportamento inicial, mas servem de indícios gerais não-cumulativos: (i) a efetivação de gastos e despesas motivadas pelo factum proprium, (ii) a divulgação pública das expectativas motivadas, (iii) a adoção de medidas ou a abstenção de atos com base no comportamento inicial, (iv) o grau elevado de repercussão exterior, (v) a ausência de qualquer sugestão de uma futura mudança de comportamento, e assim por diante.

Nesse mesmo sentido, Menezes Cordeiro (1984, p. 758), correlacionando os aludidos pressupostos, esclarece ser necessária "a actuação de um fato gerador de confiança, em termos que concitem interesse por parte da ordem jurídica" bem como "a adesão do confiante a este fato".

Para comprovação do estado de confiança não se exige uma demonstração rigorosa. Pode o magistrado presumir a adesão ao factum proprium, a partir dos fatos. A ocorrência de prejuízo nos leva a conclusão que o prejudicado aderiu de algum modo ao comportamento inicial. É preciso, contudo, que esta confiança derive diretamente de referido comportamento.

Importante ressaltar também, que a análise da presença de legítima confiança deve levar em consideração uma pessoa normal. Nos dizeres de Marcelo J. López Mesa (2005), a análise da legítima expectativa deve ser feita "objetivamente".

Menezes Cordeiro (1984) exige, ainda, simultaneamente a um elemento objetivo, a realização de um fato gerador de legítima confiança, a existência de um elemento subjetivo, consubstanciado na adesão do confiante a este fato. E acrescenta que, muito embora possa existir o elemento objetivo, se o confiante não o aderiu, por qualquer razão ao fato gerador, não é cabível qualquer proteção jurídica.

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Sobre a autora
Mariana Pretel e Pretel

advogada, pós-graduada "lato sensu" em Direito Civil e Processual Civil pelas Faculdades Integradas Antônio Eufrásio de Toledo, de Presidente Prudente (SP)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRETEL, Mariana. O princípio constitucional da vedação do comportamento contraditório.: Os pressupostos específicos para a caracterização do "venire". A coibição da conduta contraditória e o processo civil brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2140, 11 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12801. Acesso em: 22 dez. 2024.

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