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O caso Cesare Battisti e a possibilidade de controle judicial sobre a concessão de refúgio

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3 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não se buscou, neste trabalho, avaliar o mérito da concessão de refúgio a Cesare Battisti, mas tão-somente indagar sobre a necessidade e, sobretudo, a possibilidade de controle judicial desse ato, diante das novas tendências doutrinárias e jurisprudenciais quanto à apreciação do mérito administrativo pelo Poder Judiciário.

Conclui-se que a solução dada anteriormente a casos semelhantes não parece adequada ao Caso Battisti. Tivesse o refúgio sido concedido por decisão colegiada do CONARE, ainda que não unânime, os Ministros do Supremo poderiam presumir o atendimento dos pressupostos para sua concessão. No entanto, pairam sérias dúvidas quanto à juridicidade do ato, visto se tratar de decisão singular, tomada por agente político, aparentemente sem a observância das características e pressupostos do instituto e motivada ideologicamente.

É possível que a decisão do Ministro da Justiça tenha sido acertada do ponto de vista jurídico, mas somente uma análise minuciosa dos motivos dessa decisão poderá afastar as dúvidas a respeito da sua legalidade. Faz-se necessário, portanto, verificar a conformidade da concessão de refúgio a Battisti com os ditames da razoabilidade e da proporcionalidade, o que poderá ser feito incidentalmente no processo de extradição.

Embora se tenha arriscado apontar um possível desfecho para o caso, o rumo do processo de extradição de Cesare Battisti é incerto. Poderá a Suprema Corte, como nos precedentes aqui citados, simplesmente conhecer do fato impeditivo do prosseguimento do processo, sem apreciá-lo. No entanto, seria importante, para o amadurecimento da nossa democracia, que os Ministros apreciassem o mérito da concessão do refúgio, qualquer que venha a ser o resultado desse exame.

O Poder Judiciário tem o dever constitucional de impedir que o Executivo se exceda nos seus atos e a sociedade brasileira conta com o cumprimento desse dever. Ainda que venha a ser deferido o pedido de extradição, e o Presidente da República, fazendo prevalecer a tese do Procurador-Geral da República, use do seu poder discricionário, não entregando o súdito ao Governo da Itália, o Supremo Tribunal Federal terá cumprido o seu papel. Caso o Chefe do Executivo pretenda dar uma solução estritamente política ao pedido de extradição de Cesare Battisti, que arque sozinho com o ônus do seu ato.


REFERÊNCIAS

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CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Moção de Apoio ao pedido de Refúgio Político de Cesare Battisti. Aprovada em 3 de setembro de 2008. Disponível em: http://brasil.indymedia.org/media/2008/09//427833.pdf. Acesso em: 15 de março de 2009.

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DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado (Parte Geral). Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2007.

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MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2004.

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ZIMMERMANN, Augusto. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.


Notas

  1. Alguns autores europeus distinguem a função administrativa da função política (ou de governo) do Poder Executivo, afastando desta última a sujeição ao controle jurisdicional. Entretanto, a doutrina pátria, majoritariamente, considera que a função política nada mais é que a função administrativa exercida com maior amplitude de escolha por qualquer dos Poderes, e manifestada por meio de atos administrativos de conteúdo político, sujeitos, como quaisquer outros, ao controle judicial (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 25; e MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 45).
  2. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 2.
  3. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 2004, p. 382.
  4. CARVALHO FILHO, op. cit., p.114.
  5. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 416.
  6. "A norma legal que concede a servidor inativo gratificação de férias correspondente a um terço (1/3) do valor da remuneração mensal, ofende o critério da razoabilidade, que atua, enquanto projeção concretizadora da cláusula do substantive due process of law, como insuperável limitação ao poder normativo do Estado."
    (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ADI nº 1158 MC, Relator: Ministro CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/1994, DJ 26-05-1995)
  7. PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Controle Judicial da Administração Pública – da legalidade estrita à lógica do razoável. Belo Horizonte: Fórum, 2006, p. 51.
  8. RASLAN, Fabiana Duarte. Fundamentos teóricos dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Rio de Janeiro, 11 de junho de 2008. Disponível em: http://www.direitopositivo.com.br/modules.php?name=Artigos&file=display&jid=83. Acesso em: 2 de maio 2009.
  9. RASLAN, op.cit..
  10. CARVALHO FILHO, op. cit., p. 115.
  11. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, RMS nº 24901, Relator: Ministro CARLOS BRITTO, Primeira Turma, julgado em 26/10/2004, DJ 11-02-2005.
  12. RASLAN, op.cit.
  13. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ADI nº 2551 MC-QO, Relator: Ministro CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 02/04/2003, DJ 20-04-2006.
  14. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Estrangeiros. Refúgio – Conare. Diferenças: asilo e refúgio. Disponível em: http://www.mj.gov.br/data/Pages/MJ7605B707ITEMIDCBF557A0019E4760B81DDA1B144E65BFPTBRIE.htm. Acesso em: 15 de abril 2009.
  15. MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, op. cit.
  16. A perseguição, segundo o artigo 1º da Lei nº 9.474 de 1997, pode ser motivada por raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política.
  17. O CONARE é constituído por membros designados pelo Presidente da República, representando os Ministérios da Justiça, das Relações Exteriores, do Trabalho, da Saúde, da Educação e do Desporto, bem como o Departamento de Polícia Federal, e uma organização não-governamental que se dedique a atividades de assistência e proteção a refugiados no País (artigo 14 da Lei nº 9.474/97).
  18. Dada a natureza declaratória do ato, mais apropriado seria falar-se em "reconhecimento de refúgio", porém os Ministros da Suprema Corte vem alternando as expressões indistintamente, o que também ocorrerá neste trabalho.
  19. Quanto à definição de crime político, entende a Corte Suprema que "Hão de ser considerados crimes políticos os praticados pelo extraditando, (...) destinados à contestação da ordem econômica e social. (...) Fatos enquadráveis na lei penal comum e atribuídos aos rebeldes (...), no contexto da rebelião, são absorvidos no direito brasileiro, pelo atentado violento ao regime, tipo qualificado pela ocorrência de lesões graves e de mortes (Lei de Segurança Nacional, art. 17)" (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 694, Relator: Ministro SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 13/02/1997, DJ 22-08-1997).
  20. Artigo 77, §§ 2º e 3º da Lei nº 6.815 de 1980.
  21. Artigos 33 e 34 da Lei nº 9.474 de 1997.
  22. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 232 segunda, Relator: Ministro VICTOR NUNES, Tribunal Pleno, julgado em 09/10/1961, DJ 17-12-1962; e Extradição nº 524, Relator: Ministro CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 31/10/1990, DJ 08-03-1991.
  23. Extradição nº 524, op.cit.
  24. Consoante os artigos 2º, § 3º e 10 do Decreto-Lei nº 394/38, bem assim o artigo 77, inciso VII e §§ 2º e 3º da Lei nº 6.815 de 1980.
  25. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 785 QO-QO, Relator: Ministro NÉRI DA SILVEIRA, Tribunal Pleno, julgado em 13/09/2001, DJ 14-11-2003.
  26. A expressão mais apropriada, após a alteração do artigo 267 do Código de Processo Civil, seria "sem resolução do mérito".
  27. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 1008, Relator: Ministro GILMAR MENDES, Relator para o Acórdão: Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 21/03/2007, DJ 17-08-2007.
  28. Serviu de base ao presente relato a Moção de Apoio ao pedido de refúgio de Cesare Battisti (CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Moção de Apoio ao pedido de Refúgio Político de Cesare Battisti. Aprovada em 3 de setembro de 2008. Disponível em: http://brasil.indymedia.org/media/2008/09//427833.pdf. Acesso em: 15 de março de 2009).
  29. CÂMARA DOS DEPUTADOS, op. cit.
  30. Processo nº 08000.011373/2008-83 – Recurso. Negativa. Condição de Refugiado. Cesare Battisti. Disponível em: http://stat.correioweb.com.br/cbonline/2009_01/battisti.pdf. Acesso em: 15 de março de 2009.
  31. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Parecer nº 5.280-PGR-AF. Procurador Antônio Fernando e Silva de Souza, 26/01/2009. Disponível em: http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias-do-site/pdfs/EXT%201085%20-%20Cesare%20Battisti%20-%20extincao%20do%20processo.pdf. Acesso em: 16 de março de 2009.
  32. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Mandado de Segurança nº 27.875-DF, Relator: Ministro CEZAR PELUSO.
  33. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. Parecer nº 6192-PGR-AF. Procurador Antônio Fernando e Silva de Souza, 04/05/2009. Disponível em: http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias-do-site/pdfs/MS%20_7875_Ext_1085_Cease_Batisti.pdf. Acesso em: 17 de maio de 2009.
  34. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 1114, Relatora: Ministra CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 12/06/2008, publicado em 22-08-2008.
  35. VEJA.COM. Veja entrevista Tarso Genro. Disponível em: http://veja.abril.com.br/videos/veja-entrevista/tarso-genro-parte-1-415120.shtml. Acesso em: 20 de março de 2009.
  36. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradição nº 1008, Relator: Ministro GILMAR MENDES, Relator para o Acórdão: Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 21/03/2007, DJ 17-08-2007.
  37. Artigo 37, caput, da Constituição da República.
  38. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, Extradições nº 785 QO-QO e nº 1008, op. cit.
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Sobre o autor
Antônio Carlos Cura de Oliveira

Professor de Língua Inglesa. Graduado e Pós-Graduado em Língua Inglesa pela UERJ. Bacharelando em Direito pela Universidade Estácio de Sá.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Antônio Carlos Cura. O caso Cesare Battisti e a possibilidade de controle judicial sobre a concessão de refúgio. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2225, 4 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13273. Acesso em: 23 dez. 2024.

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