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A lei n. 12.015/2009 e os reflexos nas anteriores condenações em concurso material dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor

21/08/2009 às 00:00

Resumo:


  • A Lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 redefiniu o crime de estupro, absorvendo a conduta do antigo "atentado violento ao pudor" no novo tipo penal.

  • A nova definição do crime de estupro resulta em um único tipo penal para condutas de constrangimento à conjunção carnal ou ato libidinoso sob violência ou grave ameaça, com pena de 6 a 10 anos de reclusão.

  • A aplicação do princípio da retroatividade da lei penal benéfica aos casos de condenações em concurso material dos antigos crimes de estupro e atentado violento ao pudor é uma questão a ser verificada pelo juízo da execução penal.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em uma primeira análise da nova definição do crime de estupro, nos termos da Lei 12.015 de 07 de agosto de 2009, cabe a discussão acerca da aplicação do princípio da retroatividade da lei penal benéfica aos casos de condenação criminal que tenha aplicado o concurso material de crimes no cometimento dos antigos crimes de atentado violento ao pudor (artigo 214 CP, atualmente revogado) e estupro (213 do CP, com nova redação).

Antes da entrada em vigor na lei citada, os crimes de atentado violento ao pudor e estupro tinham suas figuras típicas previstas nos seguintes termos:

Estupro

Art. 213 - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:

Parágrafo único. (Revogado pela Lei n.º 9.281, de 4.6.1996)

Pena - reclusão, de seis a dez anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

Atentado violento ao pudor

Art. 214 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Parágrafo único.  (Revogado pela Lei n.º 9.281, de 4.6.1996

Pena - reclusão, de seis a dez anos.

Na vigência dos dispositivos transcritos, o entendimento prevalente nos tribunais brasileiros, inclusive no SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, era no sentido do reconhecimento do concurso material entre os crimes, quando ocorrentes, concomitante ou de forma consecutiva, as condutas descritas nos tipos.

Nesse sentido, citem-se os seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: HABEAS CORPUS. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CRIME CONTINUADO. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA. A análise do crime continuado envolve o reexame de fatos e provas, o que, em princípio, é inviável na estreita via do habeas corpus. Precedentes (HC 91.895, rel. min. Menezes Direito, DJe-147 de 08.08.2008; e HC 92.758, rel. min. Eros Grau, DJ de 03.12.2007). Ademais, segundo julgados do Supremo Tribunal Federal (HC 94.714, rel. min. Carmem Lúcia, julgado em 28.10.2008; e HC 89.770, rel. min. Eros Grau, DJ de 06.11.2006, p. 51), não há espaço, no caso, para o afastamento do concurso material e o reconhecimento da continuidade delitiva entre os crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Ordem denegada. (HC 94504, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe-148 DIVULG 06-08-2009 PUBLIC 07-08-2009 EMENT VOL-02368-03 PP-00519)

EMENTA: HABEAS CORPUS. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CONCURSO MATERIAL E NATUREZA HEDIONDA. ORDEM DENEGADA. Na linha da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não há espaço, no caso, para o afastamento do concurso material e o reconhecimento da continuidade delitiva entre os crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Precedentes: HC 94.714, rel. min. Carmem Lúcia, julgado em 28.10.2008; e HC 89.770, rel. min. Eros Grau, DJ de 6.11.2006, p. 51. Tais crimes, ademais, ainda de acordo com precedentes desta Corte (HC 90.706, rel. min. Carmen Lúcia, DJ de 23.3.2007; e HC 89.554, rel. min. Celso de Mello, DJ de 2.3.2007), devem ser considerados hediondos, mesmo que não qualificados e praticados sem violência real. Ordem denegada. (HC 95705, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 31/03/2009, DJe-075 DIVULG 23-04-2009 PUBLIC 24-04-2009 EMENT VOL-02357-03 PP-00522)

O que nos interessa, todavia, são os efeitos da nova tipificação do crime de estupro aos condenados - de acordo com o entendimento do STF - em concurso material pelos antigos crimes de estupro e atentado violento ao pudor.

A Lei 12.015 de 07 de agosto de 2009 define a nova figura típica do estupro da seguinte forma:

Estupro 

Art. 213.  Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: 

Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. 

§ 1º  Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: 

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. 

§ 2º  Se da conduta resulta morte: 

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos." (NR) 

A substancial mudança no tipo penal de estupro foi a absorção do tipo anteriormente denominado "atentado violento ao pudor". Assim, a conduta anteriormente tipificada no artigo 214 do CP foi incorporada ao novo artigo 213 do CP.

Esta absorção do tipo de "atentado violento ao pudor" pela nova redação do artigo 213 do CP reflete imediatamente nos casos de condenação em concurso material dos antigos crimes de estupro e atentado violento ao pudor.

A nova lei penal é benéfica, uma vez que concentra em único tipo penal as condutas de constrangimento à conjunção carnal ou prática de ato libidinoso sob violência ou grave ameaça. Assim, praticada uma das condutas ou ambas, o crime será único, aplicando-se a pena prevista na nova redação do artigo 213 do CP.

Não há mais que se falar em concurso material, com somatório das penas previstas nos antigos tipos penais de estupro ou atentado violento ao pudor, uma vez que as condutas típicas foram deslocadas para único tipo penal, cuja pena prevista é de reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

As condenações fulcradas na anterior redação dos artigos 213 e do 214 do CP, observando-se as penas previstas para o caput, em concurso material, levariam a uma pena mínima hipotética de 12 anos de reclusão.

A partir da nova redação do artigo 213 do CP, mesmo existindo as duas condutas – conjunção carnal e ato libidinoso – haverá crime único, com pena entre 6 (seis) a 10 (dez) anos de reclusão. A norma é extremamente mais benéfica aos condenados.

Obviamente que, observando-se o caso concreto, a realização das duas condutas previstas na nova redação do artigo 213 do CP deverá ser considerada para os efeitos de fixação da pena.

Entretanto, a retroação da lei benéfica aos casos citados parece ser irrefutável, devendo ser verificada pelo juízo da execução penal, quando houver trânsito em julgado da decisão, adequando-se a pena inicial às novas previsões da lei n. 12.015/09.

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Sobre a autora
Sandra Cristina Alves

advogada militante em Cuiabá (MT) e Brasília (DF)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALVES, Sandra Cristina. A lei n. 12.015/2009 e os reflexos nas anteriores condenações em concurso material dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2242, 21 ago. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13351. Acesso em: 23 dez. 2024.

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