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A participação popular do consumidor como instrumento de defesa ambiental.

O caso da rotulagem dos alimentos transgênicos

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30/09/2009 às 00:00
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3 A PARTICIPAÇÃO POPULAR E A ROTULAGEM DOS TRANSGÊNICOS

O direito à vida, saúde e segurança, à informação, bem como o direito de escolha do consumidor e o princípio da precaução legitimam a garantia de proteção do consumidor e da rotulagem como meio de informação que permite a escolha e o exercício da precaução.

Organizações não-governamentais têm trabalhado incentivando os consumidores para que atuem na proteção ambiental na luta que empreendem contra os transgênicos. Assim, incentivam a rotulagem dos transgênicos como meio de, a partir da informação, o consumidor poder escolher e optar por não consumir o produtos derivados de organismos geneticamente modificados, seja em razão de preocupação individual com a sua saúde ou de sua família, seja por um aspecto mais amplo no qual o consumidor age de acordo com as premissas do consumo consciente.

Diante dessas perspectivas e através do seu ato de escolha, o consumidor busca influenciar o mercado, pressionando para cuidados em relação ao cultivo, comercialização e produção de alimentos que contenham organismos geneticamente modificados, ciente e alerta quanto aos riscos que os mesmos oferecem ao meio ambiente.

O consumidor pode adotar, desse modo, uma postura cautelosa e contra transgênicos por considerá-los uma ameaça ao meio ambiente. Neste caso, em nome do princípio da precaução, busca se informar sobre a existência de transgênicos nos alimentos e a atuar a partir desse conhecimento.

Explica Paulo Affonso Leme Machado acerca do papel da informação que ela "serve para o processo de educação de cada pessoa e da comunidade. Mas a informação visa, também, a dar chance à pessoa informada de tomar posição ou pronunciar-se sobre a matéria informada. [143]" Ao mesmo tempo, pontua que:

A informação ambiental não tem o fim exclusivo de formar a opinião pública. Valioso formar a consciência ambiental, mas com canais próprios, administrativos e judiciais, para manifestar-se. O grande destinatário da informação – o povo, em todos os seus segmentos, incluindo o científico não-governamental – tem o que dizer e opinar. [144]

Para auxiliar e orientar os consumidores sobre formas de adquirir conhecimento e agir a partir dele existem ações específicas de organizações não-governamentais voltadas para a proteção dos consumidores e ambiental com base no combate ao uso indiscriminado dos transgênicos no meio ambiente sem a observância do princípio da precaução.

No Brasil, quanto aos transgênicos, existe uma campanha conjunta de diversas organizações sob o título de "Por um Brasil Livre de Transgênicos", iniciada nos final da década de 90. Dela participam: Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, Greenpeace Brasil, Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa, Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Rio de Janeiro, Actionaid Brasil, Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional, Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas, Instituto de Estudos Socioeconômicos, Agora – Segurança Alimentar e Cidadania, Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Instituições de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário. Através da campanha, entre outras atividades, publicam-se cartilhas impressas e boletins eletrônicos, realizam-se eventos e manifestações públicas, assim como são divulgados resultados de testes para a constatação da presença de organismos geneticamente modificados em alimentos. [145]

3.1.1 Greenpeace

O Greenpeace, organização não-governamental de dimensão mundial voltada para a defesa ambiental, sedia na internet, rede mundial de computadores, um site específico para o Brasil, localizado no endereço http://www.greenpeace.org.br, o qual funciona em nome do Greenpeace Brasil, braço da organização neste país.

Esse site traz uma série de informações, tanto locais quanto globais, tais como relatórios técnicos, notícias e dicas. Também disponibiliza uma biblioteca virtual e um setor para tirar dúvidas. O site é diariamente atualizado e a veiculação das notícias acompanha o ritmo dos fatos ocorridos no dia-a-dia.

O Greenpeace Brasil também promove diversas campanhas em prol da proteção ambiental, as quais podem ser conhecidas através das informações presentes no site da organização. No Brasil essas campanhas alcançam sete frentes de atuação: energia, Amazônia, oceanos, tóxicos, clima, nuclear e transgênicos [146].

Quanto aos transgênicos particularmente, também divulga informações, diversas notícias e relatórios técnicos, dentre eles o "Relatório sobre o Registro de Contaminação Transgênica 2005", elaborado pela Dra. Sue Mayer e publicado em março de 2006 [147], bem como o "Relatório Brasileiro de Mercado: a Indústria de Alimentos e os Transgênicos", lançado em 18 de julho de 2006 [148]. Este, entre outras abordagens, trata da situação da rotulagem dos transgênicos no Brasil e no mundo e demonstra que os consumidores brasileiros não são os únicos a rejeitarem alimentos transgênicos, além de tratar da responsabilidade ambiental das empresas e dos reflexos de suas práticas.

Pelas informações divulgadas pela organização, é possível saber tanto o que se discute sobre o assunto, como as ações relacionadas ao tema desenvolvidas pelo Greenpeace e os resultados dessas ações.

Além disso, a campanha sobre os transgênicos desenvolvida pela organização volta-se para os consumidores e intitula-se "Consumidores em Ação" [149]. Seu lema é: "A pressão dos consumidores é a maior ferramenta na luta por um Brasil livre de transgênicos!" [150] Busca-se, assim, aliar a defesa ambiental à ação dos consumidores.

Nessa campanha empreendida contra os transgênicos os consumidores são chamados a agir, por exemplo, através de "ciberações" [151], em que participam de protestos virtualmente endereçados a partes envolvidas com a problemática abordada, tal qual o presidente da Bunge Alimentos, divisão da Bunge Brasil [152].

Igualmente, em suas ações, o Greenpeace produz o Guia do Consumidor, um guia informativo que fornece uma lista dos produtos que contêm ou não ingredientes transgênicos. Denominam lista negra aquela das empresas que omitiram a informação sobre sua política de utilização de transgênicos ou empresas que não adotam nenhuma medida para evitar tal uso. O lado oposto é chamado de lista verde, a qual contém as empresas que garantem uma produção livre de transgênicos. [153] Trata-se de um meio indireto de suprir a falta da aplicação efetiva da rotulagem dos transgênicos. Constitui, então, um instrumento para garantir o acesso à informação que deveria estar no rótulo dos produtos, bem como um meio de atuação dos consumidores a partir de suas escolhas nos seus atos de compra.

Através da informação proporcionada pelo Guia do Consumidor, visa-se auxiliar o consumidor a pressionar as empresas que utilizam os organismos geneticamente modificados em seus produtos ou ingredientes. Tanto assim que "desde o lançamento da primeira edição em maio de 2002, quarenta e oito indústrias de alimentos já se comprometeram a garantir produtos livres de transgênicos no Brasil." [154]

Nesse sentido, o Greenpeace Brasil convida os consumidores a organizarem um evento para distribuírem cópias impressas do Guia do Consumidor em suas cidades, orientando o passo a passo para essa distribuição, desde o processo de preparação até o dia após o evento [155].

Explicam que "uma das melhores formas de participar dessa campanha é divulgando o "Guia do Consumidor – lista de produtos com ou sem transgênicos". Quanto maior o número de pessoas conscientes e atuantes, mais força teremos para vencer esta campanha" [156].

Ademais, além da edição do Guia do Consumidor, quanto à rotulagem dos transgênicos o Greenpeace divulga notícias específicas e ações voltadas para a exigência da sua aplicação. Podem ser citadas as seguintes matérias: "Paraná tem dia de mobilização pela fiscalização da rotulagem de transgênicos" [157]; "Fórum Global da Sociedade Civil faz declaração a favor da identificação explícita de transgênicos" [158]; "Transgênicos: depoimento de ministérios comprova que indústria descumpre a lei" [159]; "Bunge: cem anos desrespeitando o consumidor e o meio ambiente" [160]; "Nova campanha do Greenpeace incentiva consumidores a pressionarem Bunge por produção livre de transgênicos" [161]; "Europa rejeita alimentos transgênicos: Legislação mais rigorosa da União Europeia para rotulagem de transgênicos aumentou rejeição de grandes empresas alimentícias e varejistas a esses produtos" [162].

3.1.2 Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)

O IDEC, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, constitui também uma organização não-governamental. Ele foi fundado em 1987, é brasileiro e visa principalmente aperfeiçoar o mercado de consumo, contribuir para o acesso a bens e serviços essenciais por todos os cidadãos e promover a conscientização e participação dos consumidores [163]. Para alcançar esses objetivos, "procura acompanhar a evolução das regras e leis dos setores que podem afetar a vida do consumidor e dar publicidade a esses temas, mostrando aos consumidores como eles poderão ser afetados" [164].

Assim como o Greenpeace, sedia um site na internet, localizado no endereço http://www.idec.org.br, bem como promove ações, publica uma revista e informa os consumidores sobre diversos assuntos de seu interesse através de notícias constantes e atualizadas. Seu site conta ainda com biblioteca, relato de casos reais e de vitórias alcançadas.

O IDEC atua nas mais diversas frentes para a efetiva defesa dos consumidores. Também desenvolve material e campanhas voltados para a educação e conscientização dos consumidores. Com este fim oferece gratuitamente, inclusive, áudios e vídeos para veiculação em emissoras de rádio e televisão de todo o país [165].

Além disso, a organização busca estimular a participação direta dos consumidores em suas campanhas, proporcionando meios para que eles possam enviar suas manifestações aos órgãos oficiais. Outrossim, o próprio IDEC envia manifestações e posicionamentos aos órgãos oficiais, sejam eles agências reguladoras, ministérios, secretarias, Congresso Nacional, Presidência da República ou o Ministério Público, além de realizar ações judiciais coletivas quando vislumbra graves ofensas aos direitos dos consumidores. [166]

Em relação à rotulagem dos transgênicos, o IDEC veicula em seu site várias notícias, capazes de informar e contextualizar os consumidores sobre o tema. Dentre tais notícias, destaca-se: "Restrição do STF não afetará decisão sobre rotulagem de transgênicos" [167]; "Codex Alimentarius fracassa em aprovar normas gerais para a rotulagem de transgênicos" [168]; "Advogado do Idec defende rotulagem imediata dos transgênicos" [169]; "Brasil defende rotulagem explícita de transgênicos em 4 anos" [170]; Consumidores querem norma mundial de rotulagem dos transgênicos" [171].

3.1.3 Instituto Akatu

O Instituto Akatu é também uma organização não-governamental brasileira. Ela foi criada em 2001 e tem como objetivo "educar, sensibilizar e mobilizar para o consumo consciente" [172]. Atua no desenvolvimento de atividades em comunidades, divulga conceitos e informações através da internet, de publicações, da mídia informativa e de campanhas publicitárias, desenvolve pesquisas, e ainda elabora instrumentos de informação e avaliação sobre o consumo consciente. [173]

Seu site, localizado no endereço <http://www.akatu.org.br>, divulga notícias, inclusive sobre ações de organizações e empresas parceiras, bem como traz uma série de informações, publicações e pesquisas, além de campanhas, a exemplo do "Movimento Cuide", voltado para disseminar o consumo consciente através de campanhas publicitárias e de produtos, a exemplo de sacolas reutilizáveis que trazem mensagens sobre o tema. [174]

Sobre a rotulagem dos alimentos que contêm organismos geneticamente modificados, apresenta em seu site várias notícias e artigos. Cita-se: "Indústria resiste à rotulagem de transgênicos"; "Regulamentação de rótulos para transgênicos entra em vigor"; "Quem escolhe transgênico é o consumidor"; "Rotulagem: o consumidor tem fome de informação"; "As eleições e o consumo consciente". [175]

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A crise ambiental existente, os riscos de desequilíbrio ecológico e o dever intergeracional de preservar o meio ambiente justificam a imprescindibilidade de se encontrar maneiras de interferir ativamente na luta contra a degradação ambiental.

A partir, então, do direito e do dever de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, aparece, ao lado da obrigação do Poder Público, a necessária participação popular da coletividade.

Os cidadãos podem participar de várias maneiras, asseguradas tanto constitucional quanto infraconstitucionalmente. Sua atuação pode acontecer tanto na esfera judicial, como legislativa e administrativa.

Dentro da sociedade civil, as organizações não-governamentais se destacam como uma das formas de interação, organização e participação sociais. Seu papel na defesa ambiental tem sido significativo e de alta importância. Elas funcionam como um canal para dar voz aos indivíduos, os quais, ao saírem do isolamento e coletivamente se organizarem, ganham força para suas reivindicações.

Outrossim, considerando-se o sistema capitalista em que vivemos e o papel do consumo na atual sociedade, aos consumidores atribui-se especial destaque. A participação popular dessa categoria de cidadãos, que são, ao mesmo tempo, sujeitos de direitos de consumo e de direitos ambientais, pode ser vista como um instrumento de intervenção para o exercício da cidadania ambiental. Nesse sentido, o consumo consciente ganha relevo e sua adoção social começa a crescer.

A utilização do consumo como meio de ação política e de defesa ambiental pode ser vislumbrada através do exemplo da rotulagem dos alimentos transgênicos, desenvolvidos a partir de organismos geneticamente modificados. O exemplo auxilia na compreensão do tema e na visualização da conexão entre os interesses ambientais e dos consumidores porque envolve ao mesmo tempo o meio ambiente, saúde, segurança, precaução quanto aos riscos ainda desconhecidos e o direito de escolha dos consumidores decorrente do acesso à informação nos rótulos dos produtos.

Ademais, através da campanha contra os transgênicos e pela rotulagem dos alimentos transgênicos empreendidas por algumas organizações não-governamentais é possível verificar o alcance da mobilização social e das ações desenvolvidas coletivamente ou a partir de atitudes diárias dos consumidores fundadas em um pensamento difuso e consciente, além de inferir perspectivas futuras de influência, inclusive sobre o setor empresarial.

A edição, divulgação e efeitos do Guia do Consumidor, exemplificativamente, ilustram a dimensão e possibilidades da união coletiva, além de demonstrarem a pressão que os consumidores podem exercer perante as empresas. O Guia, produzido pelo Greenpeace há quatro anos para informar os consumidores sobre os produtos que contêm ou não ingredientes transgênicos, já conseguiu que quarenta e oito indústrias de alimentos se comprometessem a produzir alimentos livres de transgênicos no Brasil, o que pode ser considerado uma vitória. Empresas grandes, como a Nestlé, estão entre as que saíram da lista negra para a lista verde, ou seja, da lista de alimentos com para sem ingredientes transgênicos.

A parceria entre organizações não-governamentais e várias empresas, como ocorre no Instituto Akatu, no Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e no Greenpeace, assim como em muitas outras organizações, expressam que o setor empresarial se preocupa com a opinião pública e com sua imagem institucional perante a sociedade e, em especial, perante os consumidores.

Além disso, a quantidade e qualidade de informações fornecidas pelas organizações não-governamentais aos consumidores, inclusive através de relatórios científicos, funcionam como fonte de conhecimento e auxiliam no acesso à informação e na tomada de decisão dos consumidores, os quais podem utilizar o conhecimento adquirido em suas atitudes na vida diária.

Assim, mediante a participação popular do consumidor e da sua organização e suporte dado pelas organizações não-governamentais, bem como do exemplo prático da rotulagem dos alimentos transgênicos, procurou-se destacar uma maneira ativa de cada cidadão participar da luta pela defesa ambiental.

A visualização de efeitos difusos percebida a partir da possibilidade de ação individual e coletiva pelos cidadãos permite uma reperspectivação do papel de cada um na sociedade, de modo a proporcionar o sentimento de pertencimento aos indivíduos e a aproximar as esferas privada e pública.

De acordo com essa percepção, o consumidor, que também é um sujeito com direitos e deveres a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, passa a pensar em suas atitudes como consumidor por uma visão mais ampla, em que busca possibilidades de agir em seus atos de consumo de forma ecologicamente responsável.

O papel do consumidor, então, é ampliado e ultrapassa os limites da vida privada. Sua visão de mundo, simultaneamente, é alterada, pois a ampliação de suas possibilidades habilita perceber e sentir o ser que cada um efetivamente é, ou seja, um ser que é parte de um todo maior, inter-relacionado e interdependente, parte do planeta Terra.

Os imperativos da ética ambiental e da solidariedade podem, diante dessa nova percepção, virar realidade e permitir que se lute com coragem, determinação e inspiração pelo direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de todos.

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Sobre a autora
Elisa Bastos Frota

Bacharela em Direito pela UFS. MBA em Gestão Empresarial pela FGV. Pós-graduação em Direito Ambiental pela PUC-RS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FROTA, Elisa Bastos. A participação popular do consumidor como instrumento de defesa ambiental.: O caso da rotulagem dos alimentos transgênicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2282, 30 set. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13593. Acesso em: 22 nov. 2024.

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