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Comentários à Lei nº 12.015/09

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07/10/2009 às 00:00
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Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual (art. 231-A)

COM A LEI 12.015/09

Tráfico interno de pessoa para fim de exploração sexual Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. § 1o Incorre na mesma pena aquele que agenciar, aliciar, vender ou comprar a pessoa traficada, assim como, tendo conhecimento dessa condição, transportá-la, transferi-la ou alojá-la. § 2o A pena é aumentada da metade se: I - a vítima é menor de 18 (dezoito) anos; II - a vítima, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato; III - se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; ou IV - há emprego de violência, grave ameaça ou fraude. § 3o Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.

ANTES DA LEI

Tráfico interno de pessoas Art. 231-A. Promover, intermediar ou facilitar, no território nacional, o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento da pessoa que venha exercer a prostituição: Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. Parágrafo único. Aplica-se ao crime de que trata este artigo o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 231 deste Decreto-Lei.

1. Tipicidade objetiva e subjetiva

O tráfico interno se diferencia do tráfico internacional retro analisado, porque ocorre dentro do território nacional. As condutas descritas no núcleo do tipo entretanto, são idênticas as previstas no artigo anterior. O §1º deste artigo tem redação quase idêntica ao §1º do tráfico internacional, porém com uma única diferença, aqui se acrescentou o núcleo vender que não constano artigo anterior. Os §2º e 3º têm redação idêntica a do artigo anterior. Assim sendo, face a similitude das descrições constantes do tipo do tráfico interno com o tráfico internacional, deixamos de repetir os mesmos comentários já efetuados no crime anterior, para onde remetemos o leitor, apenas lembrando da única diferença substancial, que neste caso, o tráfico ocorre dentro do território nacional.

2. Consumação e competência

A competência para o processamento e julgamento deste crime, é em princípio da Justiça Estadual, salvo se houver a participação de algum servidor público federal, no exercício da função. Indaga-se, tratando-se do deslocamento de uma pessoa de um local para outro, qual o juízo competente ? O do local da consumação do delito . Pensamos como Greco [24] que este crime a exemplo do tráfico internacional é material, portanto, a consumação se dá com o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual. Estranhamente, Nucci [25] que defendia ser o tráfico interno de pessoas crime material, ao comentar a Lei 12015 [26], passou a defender que se trata de crime formal.

De fato, o art. 231-A sofreu uma pequena alteração na redação do caput, que pode ter levado o autor acima citado a entender que o crime passou a ser formal. Enquanto na redação anterior, era usada a expressão "que venha exercer a prostituição", agora, a expressão é "para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual". Pensamos, contudo, na linha de Greco, que o crime continua sendo material. Afinal, não haveria razão para o legislador tratar de forma diferenciada o tráfico internacional do tráfico interno, de modo a prever o primeiro como crime material e o segundo, como formal.

3. Pena e retroatividade

O crime do tráfico interno de pessoas passou a ser apenado de forma mais branda, pois, ao invés da pena ser de três a oito como antes, agora passou a ser de dois a seis anos. Tratando-se de lei posterior mais benéfica há a retroatividade para alcançar os fatos anteriores, inclusive os processos que já estão em fase de execução. Neste último caso, caberá ao juízo da execução fazer a devida adequação. Assim, quem tinha sido condenado na pena mínima de três anos, deverá agora ser readaptado para dois anos (pena mínima após o advento da L. 12.015/09).

Imaginamos que a redução da pena tenha ocorrido para que a pena desse crime ficasse menor que a referente ao tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual, o que nos parece correto. Afinal, é muito pior para vítima ser explorada sexualmente noutro país, onde não domina a língua, não tem amigos, e não raras vezes, está lá ilegalmente, dificultando o retorno para o país de origem.


Cap. VII. Disposições Gerais (art. 234-A e B)

COM A LEI 12.015/09

Aumento de pena Art. 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada: I – (VETADO); II – (VETADO); III - de metade, se do crime resultar gravidez; e IV - de um sexto até a metade, se o agente transmite à vitima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. Art. 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo de justiça. Art. 234-C. (VETADO).

ANTES DA LEI

Nada havia de semelhante.

Obs: As causas de aumento do art. 226, que continua em vigor, são diferentes das hipóteses acrescentadas nos incisos III e IV, do art. 234-A transcrito no quadro ao lado.

O legislador não unificou as disposições gerais do título VI do Código Penal que trata dos crimes contra a dignidade sexual. Assim, permaneceu neste título, o capítulo IV que trata das disposições gerais (ação penal – art. 225; causas de aumento de pena – art. 226), e acrescentou-se outro capítulo, o VII, que nos arts 234-A (aumento de pena) e 234-B (segredo de justiça) também cuidam de disposições gerais. O mais curioso é que o art. 226 está em vigor com a previsão de duas causas de aumento, e o art. 234-A prevê mais duas causas de aumento, quando o lógico seria ter sistematizado num único capítulo as disposições gerais. Decerto, isso não foi feito, por uma dificuldade lógica. As causas de aumento de pena do art. 226 do CP não se aplicam aos capítulos V (Do lenocínio e do tráfico de pessoa para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual) e VI (Do ultraje público ao pudor). Ao passo que, as disposições gerais do último capítulo acrescido pela L. 12.015 , se aplica a todo o título VI, ou seja, aos seis capítulos que o precede.

Em síntese, as causas de aumento de pena do art. 234-A, III e IV são aplicáveis aos capítulos I, II, V e VI (lembrando que o cap. III foi todo revogado pela lei 11.106 e o cap. IV se refere a outras disposições gerais) do título VI. Por sua vez, as causas de aumento de pena do art. 226 são aplicáveis aos capítulos I e II, do referido título.

Art. 234-A I ( VETADO) | da quarta parte se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas; |

234-A II (VETADO) | de metade, se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, tio, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador da vítima ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; |

O fundamento dos vetos dos incisos acima mencionados é que estas situações já estão previstas no art. 226, I e II, do CP, respectivamente.

A primeira causa de aumento de pena do art. 234-A está prevista no inciso III (os incisos I e II foram vetados, pelas razões acima expostas). O aumento é de metade, se do crime resultar gravidez. Embora, como já dito, essa causa de aumento de pena se aplique aos crimes previstos em qualquer um dos capítulos, é óbvio, que os crimes do cap. VI não podem resultar em gravidez, já que se referem a ato obsceno (art. 233) e escrito ou objeto obsceno (art. 234).

Para incidir a causa de aumento de pena não há necessidade do dolo , ou seja, de que o agente tenha desejado engravidar a vítima. Só a ocorrência da gravidez, em princípio, já justifica o aumento de pena. Basta lembrar, o caso da vítima de estupro vir a engravidar, o que inclusive vai levá-la a ter que decidir se mantém essa gravidez indesejada com um estranho pervertido, ou se aborta. Se abortar, ocasionará além de sofrimento à vítima do estupro, a morte de um ser em formação. Disse porém, em princípio, porque a gravidez pode ser fruto de um relacionamento afetivo com o agente, sobretudo no caso de estupro de vulnerável.

A propósito, no último caso citado, lembra com precisão Nucci [27]: "Porém, se do estupro ocorrido entre pessoas conhecidas ou envolvendo sexo consentido, mas com vulnerável, resultar gravidez, pode-se formar família. Nesse caso, o aumento de metade da pena deixa de ter o caráter sancionador legítimo e passa a representar uma elevação desnecessária e um fardo para nova família que se formou. A aplicação da causa de aumento deveria ter sido fixada em caráter facultativo."

Na hipótese do inciso IV, a pena é aumentada de um sexto até a metade, se o agente transmite à vítima doença sexualmente transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador. Essa situação decerto justifica o acréscimo legal. Todavia, se a vítima contrair uma doença sexualmente transmissível de enorme gravidade, como é a AIDS, o aumento de metade ainda será pouco. Imagine uma vítima de 19 anos ser estuprada, e em função do ato libidinoso a que foi forçada, vier a adquirir AIDS. Deve o Promotor enquadrar o fato no art. 213, c/c o 234-A, IV, do CP ? Ou deveria fazê-lo, no art. 213, §2º, c/c o 14, II, ambos do CP ?

Como se vê, o legislador poderia ter evitado esse problema, prevendo uma pena mais elevada, no caso da DST ser a AIDS. Como não o fez, pensamos que a única solução é o enquadramento no art. 213, c/c o 234-A, IV, e o juiz aumentar a pena no máximo permitido. Afinal, a última opção levaria a uma pena mínima menor, já que 12 (doze) anos, reduzido de um terço (menor redução possível da tentativa) levaria a pena de oito anos. Ademais, a redução da tentativa deve levar em consideração a proximidade da consumação do crime, e em função de anti-virais para combater o vírus do HIV, a vítima pode viver anos, sem sintomas perceptíveis.

Destaque-se porém que, para o agente responder pela causa de aumento do inciso IV, mister se faz que ele saiba ser portador de uma DST, ou pelo menos, se, deveria saber. Essa expressão deveria saber, tem dado margem a discussões doutrinárias e jurisprudencias, o que poderia ter sido evitado pelo legislador. Há quem veja nessa expressão, a possibilidade de se punir na modalidade culposa, outros vislumbram na expressão apenas o dolo eventual, como é o caso de Greco [28].

O art. 234-B do Código Penal é uma novidade no Código Penal que se harmoniza com o art. 201, §6º do CPP, com a redação dada pela L. 11.690/08. A diferença é que o legislador ao invés de facultar essa medida ao julgador, como fez a lei que cuidou das provas no CPP, resolveu tornar obrigatório o segredo de justiça. De fato, essa medida preserva o ofendido, já que somente as partes (Ministério Público, réu), juiz e advogados é que podem ter acesso aos autos.

Art. 234-C. (VETADO) | Para os fins deste Título, ocorre exploração sexual sempre que alguém é vítima dos crimes nele tipificados. |

Razões do veto

"Ao prever que ocorrerá exploração sexual sempre que alguém for vítima dos crimes contra os costumes, o dispositivo confunde os conceitos de ‘violência sexual’ e de ‘exploração sexual’, uma vez que pode haver violência sem a exploração. Diante disso, o dispositivo estabelece modalidade de punição que se aplica independentemente de verificada a efetiva prática de atos de exploração sexual."


Lei dos Crimes Hediondos

COM A LEI 12.015/09

Art. 1º (...) ... V - estupro (art. 213, caput e §§ 1o e 2o); VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1o, 2o, 3o e 4o);

ANTES DA LEI

Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: ... V - estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único); VI - atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único);

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Havia uma controvérsia doutrinária se o estupro e o atentado violento ao pudor, na sua forma simples, eram hediondo ou não. A posição que prevalecia era a da hediondez, mas, não havia consenso. Da mesma forma, também se discutia se em caso de violência ficta, deveria ou não ser considerado hediondo o estupro e o atentado violento ao pudor. Buscando elidir as controvérsias, e também por necessidade de se adaptar o texto da L. 8.072/90 as alterações realizadas no tipo penal de estupro e a criação do estupro de vulnerável, o legislador alterou os incisos V e VI, do art. 1º, da Lei dos Crimes Hediondos, de forma que não há mais dúvida, que o estupro é um crime hediondo, quer na sua forma simples, quer nas qualificadas. Outrossim, é hediondo o estupro de vulnerável em quaisquer de suas formas (217-A, caput, §1º, §3º e §4º). Lembrando que, o §2º foi vetado.


Estatuto da Criança e do Adolescente

COM A LEI 12.015/09

Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. § 1o Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet. § 2o As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990.

ANTES DA LEI

Lei 2.252/54 Art 1º Constitui crime, punido com a pena de reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa de Cr$1.000,00 (mil cruzeiros) a Cr$10.000,00 (dez mil cruzeiros), corromper ou facilitar a corrupção de pessoa menor de 18 (dezoito) anos, com ela praticando, infração penal ou induzindo-a a praticá-la.

A redação do caput do art. 244-B, do ECA, acrescentado pela L. 12.015, manteve as mesmas elementares da revogada L. 2.252/54 que cuidava da corrupção de menores. Ressalte-se que essa corrupção não se confunde com aquela constante do título referente aos crimes contra a dignidade sexual, já que a corrupção aqui, ocorre pela pratica de infração penal com o menor de 18 anso, ou mediante o induzimento para que o mesmo pratique.

O legislador, atento a evolução tecnológica, previu no §1º, uma extensão de pena, para o agente que praticar as condutas do caput, utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, incluindo as salas de bate-papo da internet. De fato, não é incomum que via msn, salas de bate -papo e outros meios eletrônicos, o agente induza o menor a praticar uma infração penal (crime ou contravenção penal).

No §2º, o legislador previu uma causa de aumento de pena de um terço, no caso da infração penal que vier a ser cometida ou que houve o induzimento, esteja no rol dos crimes hediondos do art. 1º, da Lei 8.072/90. De fato, a maior gravidade desses delitos justifica o acréscimo. Todavia, entendemos que o legislador deveria ter mencionado além dos crimes hediondos (art. 1º, da L. 8.072/90), os a eles equiparados, constantes do art. 2º, da L. 8.072, como a tortura, o tráfico de entorpecentes e o terrorismo. Em função dessa omissão legislativa, não se pode aplicar o aumento de pena, se o menor praticou ou foi induzido a praticar um desses delitos equiparados a hediondos.

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Sobre o autor
Yordan Moreira Delgado

Procurador da República e professor universitário. O autor, além de ter enorme experiência profissional na área penal, por ter exercido durante mais de cinco anos o cargo de Promotor de Justiça do Estado da Paraíba, e por estar há quase uma década como membro do Ministério Público Federal, sempre foi um apaixonado pelo estudo do direito penal e processual penal, tanto que exerceu a catédra de direito penal (parte geral, especial e leis penais extravagantes) na Faculdade de Direito de Campos – RJ, onde também defendeu dissertação de mestrado nessa área, e atualmente leciona Penal no Centro Universitário de João Pessoa (Unipê) – PB. Já lecionou também na Escola Superior do Ministério Público da Paraíba e do Rio Grande do Norte. Tem diversos artigos publicados na área penal e processual penal, além da obra já mencionada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DELGADO, Yordan Moreira. Comentários à Lei nº 12.015/09. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2289, 7 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13629. Acesso em: 5 nov. 2024.

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