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Apresentação antecipada de cheque pós-datado.

Fato gerador de danos morais e materiais?

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2. CONFIGURAÇÃO DO INSTITUTO DO DANO MORAL

Com relação ao âmbito do estudo dos danos em sentido amplo, cumpre informar inicialmente que estes estão intimamente ligados à ocorrência de atos ilícitos, os quais ensejarão aqueles quando levar prejuízo a outrem, observando-se sempre o disposto nos artigos 186 a 188 do Código Civil de 2002.

Nesse norte, deve-se conceituar o dano lato sensu como sendo a lesão a um direito que fora suportada por uma pessoa física ou jurídica, a qual fora provocada por uma ação ou omissão de outra pessoa também física ou jurídica, nos moldes do artigo 186 do Código Civil de 2002, que diz: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

Assim, percebe-se o quão intimamente está ligado o cometimento de um ato ilícito à configuração de um respectivo dano a outrem, o qual poderá ocorrer de diversas formas, a saber: patrimonial, extrapatrimonial, contratual, emergente, ex delicto, à imagem, etc.

No entanto, para os fins do presente trabalho, forçoso se faz estudar de forma mais detalhada apenas os danos patrimoniais e extrapatrimoniais, vez que representam as formas mais comuns de ocorrência de danos no cotidiano.

E é nesse sentido que Yussef Cahali faz uma distinção singela entre os danos patrimoniais dos extrapatrimoniais. Segundo o autor, o primeiro seria o verdadeiro e próprio prejuízo econômico (desde que devidamente comprovado) sofrido pela vítima, também comumente denominado de dano material. Já o segundo corresponderia ao sofrimento psíquico, às dores da alma e ao abalo à moral sofrido pela vítima, também comumente denominado de dano moral. [22]

Todavia, por diversas vezes se observará que o dano terá mais de uma natureza, na medida em que são comuns as hipóteses de ocorrência de danos morais e materiais decorrentes do mesmo ato ilícito, sendo que, em tal conjectura, ambos serão indenizáveis.

Os danos patrimoniais e extrapatrimoniais serão detalhadamente estudados mais adiante, no entanto, desde já se percebe a proximidade da relação de ambos com o cometimento de atos ilícitos, haja vista que estes normalmente darão ensejo à reparação, seja por dano patrimonial, seja por dano extrapatrimonial.

2.2. Considerações gerais acerca do dano moral

Inicialmente, cumpre esclarecer que o dano moral, na qualidade de espécie do dano em sentido amplo, encontra guarida no âmbito da responsabilidade civil, instituto regulamentado no Código Civil brasileiro, que há séculos agasalha o princípio geral de direito sobre o qual se funda a obrigação de indenizar, por prejuízos causados por outrem.

A respeito do assunto, Silvio Rodrigues afirma que o princípio geral da teoria da responsabilidade, sem o qual não se concebe a vida social, corresponde àquele que impõe a quem causa qualquer espécie de dano a outrem o dever de indenizar. [23]

Do entendimento acima, extrai-se que o instituto do dano moral também encontra suas raízes no direito da personalidade, haja vista que o dever de indenizar caberá tão somente à pessoa que causou o dano moral a outrem, e, por outro turno, caberá apenas ao ofendido o recebimento de eventual indenização a título reparatório, salvo na hipótese de falecimento da vítima do dano antes do recebimento da indenização, ocasião em que esta será percebida por seus herdeiros. No entanto, via de regra, tal direito é personalíssimo.

Nesse norte, tem-se que os direitos da personalidade são inerentes à própria pessoa humana, estando a ela ligados perpétua e permanentemente. Assim, trata-se de direitos não patrimoniais e, por conseguinte, inalienáveis, intransmissíveis, imprescritíveis e até mesmo irrenunciáveis.

Dessa forma, é notório que a sociedade deve respeito a esses direitos, os quais são oponíveis erga omnes, pois sua violação está a exigir uma sanção, ou seja, uma indenização pelo dano causado à vítima, que terá o direito de ser compensada pelo mal sofrido.

2.3. Conceito de dano moral

A caracterização do dano extrapatrimonial tem sido deduzida na doutrina sob a forma negativa, na sua contraposição ao dano patrimonial, ou seja, sedimentou-se o entendimento de que o dano patrimonial á aquele que atinge direta ou indiretamente o patrimônio do ofendido e, em oposição, o dano extrapatrimonial seria aquele que atinge a vítima apenas como ser humano, não atingindo seu patrimônio material.

De forma a corroborar com o acima exposto, Wilson Melo da Silva afirma objetivamente que os danos morais são lesões sofridas por uma pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, ou seja, os danos morais atingem o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico, inversamente ao que ocorre com os danos materiais. O seu elemento característico é a dor, tomada em seu sentido amplo, abrangendo tanto os sofrimentos meramente físicos, quanto as ofensas à honra, à dignidade, aos sentimentos íntimos, às crenças, ao decoro, etc. [24]

Dessa forma, observa-se que tanto os danos materiais quanto os danos morais correspondem a peculiaridades da categoria dos danos reparáveis, ou seja, dos desequilíbrios ou injustiças verificadas na esfera jurídica geral de qualquer titular de diretos, sendo passíveis de indenização em favor das pessoas prejudicadas, indenização esta que deverá ser arcada personalissimamente pelo causador do dano.

Direcionando momentaneamente o presente estudo apenas aos danos morais, tem-se que, na categoria do referido instituto encontra-se a antinomia a atributos personalíssimos inerentes aos titulares de direitos, revestindo-se, pois, de caráter atenatório à personalidade, uma vez que se configura através de lesões a elementos essenciais da individualidade, não sendo razoável qualquer requerimento de indenização coletiva por danos morais, na medida em que a comprovação dos mesmos seria utópica.

Ressalte-se que, não obstante o caráter personalíssimo dos danos morais, excluindo-se desde já a possibilidade de dano moral coletivo, já se admite atualmente na jurisprudência a caracterização do instituto para as pessoas jurídicas, a saber:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. CADASTROS DE PROTAÇÃO AO CRÉDITO. DANOS MORAIS. PESSOA JURÍDICA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DOS PREJUÍZOS. VALOR RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO. A indevida inscrição do nome de pessoa jurídica em cadastros de inadimplentes gera o direito à indenização por danos morais, sendo desnecessária a comprovação dos prejuízos suportados, pois são óbvios os efeitos nocivos da negativação. (...) Por unanimidade, negou-se provimento ao agravo regimental. [25]

Assim, ante o posicionamento jurisprudencial acima referenciado, é sabido que as pessoas jurídicas também podem sofrer dano moral, em detrimento do entendimento originário de que este seria personalíssimo e configurado apenas através de lesões a elementos da individualidade da pessoa, o que constitui um grande avanço para o ordenamento jurídico brasileiro, na medida em que é cada vez mais constante a possibilidade de uma pessoa jurídica sofrer tal dano.

Logo, tem-se que o direito procura realizar tanto a defesa dos valores básicos da pessoa humana, como dos valores decorrentes do relacionamento social e empresarial em geral. Nesse sentido, os fatos lesivos a certos componentes da personalidade humana ou jurídica produzem danos morais, os quais, na prática, devem ser ressarcidos para que se faça a devida justiça, especialmente em razão da orientação de que todo dano há de justificar uma ação tendente à obtenção da necessária reparação.

Portanto, o dano moral corresponde ao prejuízo que atinge o patrimônio incorpóreo ou imaterial de uma pessoa natural ou jurídica, os direitos da personalidade ou os seis ícones principais, a saber: o direito à vida, o direito à integridade física, o direito ao nome, o direito à honra, o direito à imagem e o direito à intimidade.

2.4. Distinção entre dano moral e mero aborrecimento

Definido o conceito de dano moral, mister se faz esclarecer que jamais tal instituto poderá ser confundido com mero aborrecimento comum do cotidiano, sob pena de desvirtualização do mesmo. Assim, a caracterização dos danos morais deverá ser inequivocamente demonstrada pela vítima, pois não caberá ao acusado arcar com uma indenização por dano moral que o mesmo jamais tenha dado causa, o que caracterizaria uma clara injustiça, que deverá sempre ser evitada.

Nesse mesmo norte é o entendimento de Aguiar Dias, que afirma que não basta o autor mostrar que o fato de que se queixa foi capaz de produzir danos de natureza prejudicial, pois é fundamental a comprovação do dano concreto, para que se tenha a clara realidade do dano que experimentou. [26]

Para que surja o dever de indenizar, não basta a simples alegação de que foram sofridos eventuais constrangimentos, não sendo suficiente a afirmação remota e não demonstrada da possibilidade de ter sofrido supostos danos morais, pois estes jamais poderão ser confundidos com meros aborrecimentos do cotidiano, os quais não são passíveis de qualquer indenização.

O instituto do dano moral, que a partir da Constituição Federal de 1988 tornou-se de grande importância para o ordenamento jurídico brasileiro, não pode ser desvirtuado chegando-se ao ponto da banalização, afinal, se assim não se entender, estar-se-á incentivando o ingresso de ações "aventureiras" e demandas temerárias no judiciário nacional.

Assim, o instituto do dano moral deverá ser sempre preservado, sendo limitado aos casos em que de fato se comprova a existência dos referidos danos, os quais serão perfeitamente indenizáveis pelo causador se devidamente caracterizados, a fim de que se abomine a impunidade em casos de prática de ato lesivo.

2.5. Necessidade de reparação dos danos morais

Da leitura do artigo 186 do Código Civil, percebe-se que é completamente improvável a idéia de ato ilícito sem a presença de um conseqüente dano, vez que este é logicamente decorrente daquele. Ademais, o aludido diploma legal exige a lesão de direitos cumulada com o dano para que haja o dever de indenizar.

Assim, a existência do ato ilícito estará devidamente caracterizada a partir do momento em que houver violação de direito e cometimento de dano, ainda que exclusivamente moral, o que deverá ser ressarcido pelo causador, independentemente de culpa nos termos do artigo 927 do mesmo diploma legal. [27]

Logo, é evidente que, em havendo ocorrência de dano moral, o mesmo deverá ser ressarcido pelo seu causador, como forma de tentar compensar o prejuízo causado à vítima, haja vista que o mesmo é decorrente de ato ilícito cometido por aquele.

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No entanto, para que haja o dever de indenizar, são necessárias as presenças de certos requisitos básicos, pois a caracterização dos danos morais não deve ser realizada de forma descriteriosa e arbitrária.

Sobre o tema, Maria Helena Diniz afirma que, para que haja dano indenizável, será imprescindível a ocorrência dos seguintes requisitos básicos: destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa; efetividade ou certeza do dano, porque a lesão não poderá ser hipotética; relação entre a falta e o prejuízo causado; subsistência do dano no momento da reclamação do lesado; legitimidade, uma vez que a reparação só pode ser pleiteada pelo titular do direito atingido; ausência de causas excludentes de responsabilidade, pois pode ocorrer dano que não resulte dever ressarcitório, como o causado por caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima. [28]

De acordo com o entendimento acima, tem-se que a reação da ordem jurídica a ações lesivas se manifesta através de mecanismos de submissão do agente aos respectivos efeitos causados para que sejam alcançados os objetivos visados, em especial a manutenção do equilíbrio necessário nas relações privadas.

Com a superveniência do resultado danoso, bem como diante da presença do nexo causal, preenche-se assim os pressupostos da ocorrência da responsabilidade civil, surgindo para o lesante a obrigação de indenizar o lesado, devendo aquele suportar, patrimonial ou pessoalmente, de acordo com cada caso concreto, as conseqüências advindas do seu ato lesivo, assumindo os ônus correspondentes na satisfação dos interesses da pessoa lesada material ou moralmente.

Nesse mesmo sentido, consoante os ensinamentos de Carlos Alberto Bittar, a responsabilização do agente é, via de regra, a resposta do direito a ações lesivas, assentando-se, desse modo, a rejeição à idéia de dano injurioso. [29]

Sob o prisma do lesado, funda-se a reação na necessidade de preservação da individualidade, a fim de que se mantenham íntegros os valores individuais da pessoa humana, para que esta possa cumprir fidedignamente os seus respectivos fins na sociedade.

2.6. Formas de reparação dos danos morais

Ao tecer seus comentários a respeito das formas de reparação dos danos morais, Carlos Alberto Bittar ensina que nesse campo se admitem, conforme a natureza da demanda e a repercussão dos fatos ocorridos, várias formas de reparação, algumas expressamente contempladas pela lei, outras implícitas no ordenamento jurídico positivo, tais como: o ajuizamento de uma ação judicial compatível, a retificação da coisa injuriosa, a divulgação imediata de resposta, a republicação de material com a indicação do nome do autor, a contrapropaganda em casos de publicidade enganosa ou abusiva, a publicação gratuita de sentença condenatória do infrator e a divulgação de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e de serviços. [30]

Ora, dada a importância da reparação dos danos morais sofridos pela vítima, percebe-se que existem várias formas de obter tal compensação, a fim de que o objetivo primordial do direito seja sempre cumprido: a justiça.

Assim, caberá à parte lesada apenas comprovar a existência e a extensão dos danos sofridos, pois formas variadas não faltarão para que a mesma busque judicialmente a compensação pelo mal sofrido, que deverá ser arcada pelo infrator, como medida reparatória que sirva de exemplo para que atitudes semelhantes não voltem a ser cometidas pelo mesmo. Ademais, espera-se tal punição também sirva de exemplo para outras pessoas.

Yussef Cahali, ao invocar os ensinamentos de Pontes de Miranda, estabelece que o dano moral ou se repara através de um ato que o apague, como por exemplo a retratação do caluniante, ou pela prestação do que foi considerado como reparador, como na hipótese do arbitramento de uma indenização pecuniária em virtude do mal sofrido. Ainda mais, afirma que a reparação pode ser específica, como por exemplo a retificação ou o reconhecimento de honorabilidade. Já a condenação à retificação ou à retratação, esta é sempre realizada aproximativamente. [31]

Nesse sentido, tem-se que, de um modo geral, na prática, a condenação com que se busca reparar o dano moral é representada principalmente por uma quantia em dinheiro, a ser paga de imediato ou em parcelas pelo infrator em prol da vítima, o que ficará a critério do juiz, sem prejuízo de quaisquer outras cominações secundárias, como nas hipóteses de ofensa à honra e à credibilidade da pessoa.

Assim, o entendimento majoritário da doutrina é de que a forma de reparação por dano moral mais utilizada é o pagamento de uma determinada importância em dinheiro, deixando-se de lado desde já qualquer entendimento em contrário, no sentido de que a dor não se mede em pecúnia ou em indenização material, vez que tal entendimento já é consolidado, conforme será observado mais adiante.

Apenas para corroborar com o parágrafo acima, Luiz Roldão de Freitas Gomes estabelece que, quando se trata de danos morais, a indenização a título compensatório não visa recompor os sentimentos da pessoa lesada, o que seria logicamente impossível, vez que estes sentimentos são insusceptíveis por sua própria natureza. [32]

Ademais, as indenizações pecuniárias também não se prestam a simplesmente compensar uma lesão a bens ofendidos. A indenização busca propiciar ao lesado meios alternativos de aliviar sua mágoa e seus sentimentos agravados pela atitude do lesante, servindo, por outro lado, de imposição de pena ao infrator, que será mais cauteloso antes de praticar novamente um ato semelhante.

2.7. Legitimidade passiva: responsabilidade pela indenização dos danos morais causados

A responsável pela indenização do dano extrapatrimonial é a pessoa que, direta ou indiretamente, nos estritos termos da lei, se relaciona com o fato gerador do respectivo dano. Com efeito, inclui-se inicialmente na responsabilidade a pessoa que praticou eventual ato ilícito, por si ou por outros elementos produtores de danos.

Então, insere-se prontamente nesse contexto a pessoa física ou jurídica da qual flui a energia danificadora ou que está relacionada juridicamente com o causador da lesão. Em princípio, pode estar nesse pólo da relação jurídica qualquer pessoa, seja física ou jurídica, de direito público ou privado, nacional ou estrangeira, incluídos os próprios entes políticos, ou seja, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

Portanto, tem-se que em decorrência de fatos próprios, de outrem ou de coisas sob sua guarda ou titularidade, pode a pessoa ser enredada nas malhas da responsabilidade civil. Quanto aos demais fatos, inserem-se em sua órbita os de pessoas dependentes do agente, de animais sob sua guarda e de coisas de que seja titular, ou de que tenha posse, nas condições descritas na lei.

A respeito do assunto, Maria Helena Diniz afirma que é assentado na jurisprudência o entendimento de que na indenização do dano moral oriundo de restituição indevida de cheque com nota de falta de fundos, quando o havia, não se trata de pecunia doloris, que não se pode avaliar e pagar, mas satisfação de ordem moral, que não ressarce prejuízos e tribulações irressarcíveis, mas representa a consagração e o reconhecimento pelo direito do valor e da importância desse bem, que se deve proteger tanto quanto, senão mais do que os bens materiais e interesses que a lei protege. [33]

2.8. Legitimidade ativa: direito à recepção da indenização pelos danos morais sofridos

A pessoa titular do direito à reparação pelos danos morais é aquela que suportou os efeitos e as conseqüências negativas decorrentes de fatos danosos, devendo a mesma figurar no pólo ativo de uma eventual ação judicial indenizatória, em detrimento do causador do dano que, como já visto, figurará no pólo passivo e arcará com a competente indenização.

No nosso ordenamento, podem se apresentar nessa condição quaisquer dos entes personalizados já indicados no item anterior, desde que individualmente considerados em cada caso concreto, cumprindo lembrar da possibilidade de pessoas jurídicas também receberem indenização por danos morais, haja vista também lhe serem reconhecidos os direitos da personalidade.

A titularidade de direitos, com o devido respeito às pessoas físicas, não exige qualquer requisito ou condição pessoal, pois todas as pessoas naturais, nascidas ou nascituras, capazes ou incapazes, podem incluir-se no pólo ativo de uma ação reparatória por danos morais, representadas, nestes casos, conforme a lei o determina.

Ademais, nos termos do artigo 43 do Código de Processo Civil [34], tem-se que é perfeitamente possível a transmissão do direito à reparação por dano morais, operando-se a substituição processual com a respectiva habilitação incidental, na hipótese de falecimento do lesado durante o curso da ação, ocorrendo como nos demais direitos suscetíveis de translação.

2.9. A fixação do quantum indenizatório

Haja vista que inexistem parâmetros legais para o arbitramento do valor da reparação do dano moral, a sua fixação normalmente se faz mediante arbitramento pelo próprio magistrado, observando-se sempre os artigos 944 [35] e seguintes do Código Civil vigente, a fim de que não exista injustiça para com nenhuma das partes envolvidas.

Pelo que já foi visto nos capítulos anteriores, sabe-se que a indenização a título de dano moral não compensa nem tampouco faz desaparecer a dor que acometeu o ofendido. Por isso mesmo, a reparação não compreende uma avaliação da dor sofrida em dinheiro, pois ela representa apenas uma forma de tutelar um bem não patrimonial que foi violado.

A indenização é feita, então, como maneira de tentar substituir um bem jurídico por outro, o que normalmente é feito em pecúnia, como forma de compensação pelo mal causado pelo infrator em prejuízo da vítima.

Como a dor não se mede monetariamente, a importância a ser paga terá de se submeter a um poder discricionário do Juiz da causa, mas seguindo um prudente arbítrio dos magistrados na fixação do quantum da condenação, arbítrio esse que emana da própria natureza das coisas e dos sentimentos.

Nesse sentido, Carlos Roberto Gonçalves entende que, com relação ao estabelecimento do quantum indenizatório, além da situação patrimonial das partes, deve-se considerar também como agravante o proveito obtido pelo lesante com a prática do ato ilícito lesivo. No entanto, vale frizar que a ausência de eventual vantagem não o isenta da obrigação de reparar o dano causado ao ofendido. [36]

Em contrapartida, Aparecida Amarante entende que a fixação do quantum indenizatório não pode ser influenciada por fatores subjetivos, tais como a condição sócio-econômica das partes envolvidas. [37]

Todavia, percebe-se que esta é uma posição completamente isolada, pois é confrontante com o entendimento majoritário tanto da doutrina como da jurisprudência atual, na medida em que não se pode atribuir uma indenização ínfima a uma empresa de grande porte que causou dano moral a outra pessoa e, da mesma forma, parece injusto aplicar indenização exorbitante a uma pessoa física que causou dano moral a uma pessoa jurídica.

Trazendo à baila o entendimento da doutrina moderna, tem-se que Aguiar Dias leciona que a reparação do dano moral deve seguir um processo idôneo, que busque para o ofendido uma indenização equivalente e em conformidade com a dor sofrida. Mas para tanto, não se pretende que a indenização fundada na dor moral seja descriteriosa e sem limites, o que caracterizaria uma evidente injustiça. [38]

Aliás, a reparação será sempre, sem nenhuma dúvida, inferior ao prejuízo experimentado pelo ofendido, mas, por outro turno, quem atribuísse demasiada importância a esta reparação de ordem inferior, se mostraria mais preocupado com a idéia de lucro do que mesmo com a injúria às suas afeições. Parecia, assim, especular sobre sua própria dor, o que seria evidentemente injusto uma condenação cuja cifra favorecesse tal coisa.

Uma vez que não existe a possibilidade de se medir com dinheiro um sofrimento puramente moral, Caio Mário da Silva Pereira recomenda que se faça um jogo duplo de noções, colocando-se de um lado a idéia de punição do infrator, que não pode ofender em vão a esfera jurídica alheia e, de outro lado, proporcionar à vítima uma compensação pelo dano suportado, determinando que o ofensor efetue o pagamento de uma soma que não é nem jamais poderá ser pretium doloris. [39]

Pelas opiniões acima expendidas, tem-se que, quanto à punição do culpado, a condenação não pode deixar de considerar as condições econômicas e sociais do indivíduo, bem como a gravidade da falta cometida. Já quanto ao ressarcimento, este deve corresponder a um equivalente que a quantia em dinheiro proporciona à vítima, na mesma proporção da lesão sofrida moralmente pela mesma.

Mais do que em qualquer outro tipo de indenização, a reparação pelo dano moral há de ser imposta a partir do mesmo fundamento da responsabilidade civil, que não visa a criação de uma fonte injustificada de lucros e vantagens sem causa, consistindo tão somente a uma compensação pelo abalo à moral sofrido.

Em análise aprofundada a respeito do assunto, Caio Mário fez um balizamento para a fixação do ressarcimento no caso de dano moral, aduzindo que a vítima de uma lesão a algum direito que não seja efetivamente patrimonial, mas ofendida em um bem jurídico que pode inclusive vir a ser mais valioso do que o seu próprio patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva. [40]

Logo, sendo a dor moral insuscetível de uma equivalência com qualquer padrão financeiro, há uma universal recomendação, nos ensinamentos dos mais conceituados juristas brasileiros, bem como nos arrestos dos tribunais, no sentido de que o montante da indenização será fixado equitativamente pelo tribunal julgador, de forma criteriosa, cuidadosamente analisada e que imponha ao infrator uma sanção pela atitude cometida, obviamente sem dar causa a qualquer eventual possibilidade de enriquecimento ilícito. Nesse sentido, veja-se o entendimento jurisprudencial pernambucano:

RESPONSABILIDADE CIVIL. PLANO DE SAÚDE. SEGURADO. NECESSIDADE DE PROCEDIMENTOS MÉDICOS. CIRURGIA. RECUSA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA EM FORNECER AUTORIZAÇÃO. ATO ILÍCITO. DANO MORAL E MATERIAL. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. PROCEDÊNCIA. APELO. REDUÇÃO DO QUANTUM FIXADO. PROVIMENTO PARCIAL. DECISÃO UNÂNIME.

(...) Contudo, apenas de caracterizada a responsabilidade da seguradora pelos constrangimentos causados aos autores, a reparação além de levar em conta as repercussões e a extensão do dano causado, também há de considerar que o quantum indenizatório deve possuir caráter exemplar e não poderá ser elevado ao ponto de ultrapassar os limites da razoabilidade impostos pelas circunstâncias do caso, gerando enriquecimento sem causa, razão pela qual os valores indenizatórios fixados na sentença recorrida devem ser reduzidos a patamares aceitáveis. Recurso parcialmente provido, exclusivamente para reduzir o quantum indenizatório. Sentença mantida em todos os demais aspectos. Decisão unânime. [41]

Assim, para que se aproxime do arbitramento prudente e eqüitativo, a orientação dominante tanto na doutrina quanto na jurisprudência é no sentido de que o arbitramento judicial deve ser feito a partir de dois dados relevantes: o nível econômico do ofendido e o porte econômico do ofensor, ambos cotejados com as condições em que se deu a ofensa.

Portanto, para cumprir a tarefa de um árbitro prudente e eqüitativo, na difícil missão de dar uma reparação por dano moral sem cair na pura arbitrariedade, o juiz, ao fixar o valor da indenização, não procederá como um fantasiador, mas como um homem de responsabilidade e experiência, examinando as circunstâncias particulares do caso e decidindo com fundamento e moderação.

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Sobre o autor
Thiago Luiz Pacheco de Carvalho

Advogado e Assessor Jurídico Municipal Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduando em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera/UNIDERP/LFG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Thiago Luiz Pacheco. Apresentação antecipada de cheque pós-datado.: Fato gerador de danos morais e materiais?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2302, 20 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13675. Acesso em: 29 mar. 2024.

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