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Apresentação antecipada de cheque pós-datado.

Fato gerador de danos morais e materiais?

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3. CONFIGURAÇÃO DO INSTITUTO DO DANO MATERIAL

No mesmo norte em que se enquadram os danos morais, os danos materiais também estão diretamente ligados à teoria da responsabilidade civil do agente causador de dano, seja por dolo ou culpa do mesmo, pois são decorrentes do dever de indenizar que é inerente ao próprio lesante. Nesse sentido, cumpre colacionar abaixo o entendimento de Carlos Alberto Bittar a respeito do assunto:

Esses comportamentos constituem fatos que, em si ou por seus resultados, não se coadunam com os princípios éticos que governam o orbe jurídico, submetendo-se, em conseqüência, o patrimônio ou a pessoa do lesante aos reflexos próprios, traduzidos, fundamentalmente, na noção de reparação de danos produzidos a terceiros, em todos os aspectos protegidos de sua esfera jurídica, sejam patrimoniais ou morais como o atestam também os tratadistas estrangeiros e nacionais. [42]

Dessa forma, tem-se que, na mesma linha em que ocorre com os danos morais, o agente causador de danos materiais a outrem também ficará obrigado a repará-lo, devendo o mesmo arcar com todos os prejuízos que acometeram a vítima dos respectivos danos, lembrando que se faz necessário que o lesado provoque o judiciário e, apresentando todo um conjunto de provas da ocorrência dos danos, requeira a competente indenização.

Trazendo para o campo da responsabilidade civil, tem-se que a ocorrência do dano encontra-se diretamente ligada ao dever de indenizar, como precisamente explicitado por Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho:

O dano é, sem dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em indenização, nem em ressarcimento, se não houvesse dano. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode responsabilidade sem dano. Na responsabilidade objetiva, qualquer que seja a modalidade do risco que lhe sirva de fundamento - risco profissional, risco proveito, risco criado, etc. -, o dano constitui o seu elemento preponderante. Tanto é assim que, sem dano, não haverá o que reparar, ainda que a conduta tenha sido culposa ou até dolosa. [43]

Portanto, o estudo dos danos materiais tem a mesma importância para o direito civil quanto o dos danos morais, pois ambos são decorrentes de condutas culposas ou dolosas que tenham causado prejuízo a outrem, prejuízo este que deverá ser prontamente ressarcido pelo lesante em prol da vítima. No entanto, restará demonstrado a seguir que, assim como os danos morais, os danos materiais também têm suas peculiaridades, bem como requisitos para a configuração do instituto, que não são menos importantes que os dos danos morais.

3.2. Conceito de dano material

Visando conceituar o instituto do dano material da forma mais simples e direta possível, cumpre transcrever o entendimento de Carlos Alberto Bittar a respeito do assunto, para que se faça uma imediata distinção para com os danos morais, haja vista serem institutos notadamente distintos:

Na delimitação prática das categorias, tem-se que: os danos materiais se traduzem através da fórmula tradicional de danos emergentes e lucros cessantes, compreendendo-se todos os prejuízos de ordem pecuniária experimentados pelo lesado como conseqüência efetiva do fato gerador; os danos morais se manifestam na pessoa, através da turbatio animi, ou de alterações de caráter psíquico ou somático, não acompanhadas de modificação funcional orgânica, na expressão de Eugênio Bonvicini. Mas também alcançam as perdas valorativas internas ou externas, ou seja, repercussões negativas na consciência, ou na sociedade ou no mundo fático, ocorridas na posição do lesado. [44]

Assim, o instituto do dano material, da mesma forma que ocorre com o dano moral, está vinculado à devida comprovação do dano sofrido. Ocorre que, para que se configurem os danos materiais, se faz necessária a comprovação de todo o prejuízo patrimonial sofrido pela vítima, haja vista que, nesse caso, a indenização que o lesante estará obrigado a pagar ao lesado será correspondente ao efetivo prejuízo pecuniário sofrido por este, o qual deverá ser devidamente comprovado, diferentemente do dano moral, que corresponde a um dano de ordem pessoal.

Em suma, tem-se que o dano material é uma lesão concreta que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, podendo esta ser uma pessoa física ou jurídica. Nesse norte, a perda de bens materiais deve ser indenizada, de modo que cada desfalque no patrimônio de alguém lesado corresponde a um dano que deve ser reparado civilmente, de forma ampla e satisfatória.

Os danos materiais podem ser configurados por uma despesa que foi indevidamente gerada por uma ação ou omissão cometida por um terceiro envolvido, ou ainda, pelo que deixou de auferir em virtude de tal conduta, restando caracterizada a necessidade de se reparar materialmente pelos chamados lucros cessantes.

Portanto, uma vez devidamente comprovado o prejuízo material sofrido pela vítima, o que normalmente é feito por meio de provas documentais, caberá à mesma o direito a requerer judicialmente do causador do respectivo dano a indenização pecuniária correspondente, a fim de que o instituto seja preservado.

3.3. Necessidade de comprovação do prejuízo material para a comprovação dos danos

Após leitura detalhista do artigo 402 [45] do Código Civil brasileiro, tem-se que o dano material ou patrimonial compreende tanto os danos emergentes (o que efetivamente perdeu) quanto os lucros cessantes (o que razoavelmente deixou de lucrar).

Dessa forma, os danos materiais correspondem a uma conseqüência direta e imediata da conduta do agente lesante, na medida em que a prática do ato lesivo pelo mesmo pode causar à vítima tanto prejuízos materiais imediatos, como por exemplo a perde de um bem ou de uma certa quantia em dinheiro, quanto prejuízos futuros, como na hipótese do lesado passar a auferir lucros notadamente inferiores ou que normalmente apurava em sua empresa, em decorrência direta da atitude do lesante.

Uma vez caracterizada a hipótese de danos patrimoniais causados diretamente pela conduta do agente, desde que os mesmos tenham sido devidamente comprovados, aplicar-se-á ao caso o artigo 403 [46] do Código Civil, sem prejuízo do disposto na lei processual.

Ademais, não obstante as expressas determinações legais, o entendimento jurisprudencial a respeito do assunto é no sentido de que, para que haja o dever de indenizar por danos materiais eventualmente causados, se faz imprescindível a devida comprovação da extensão dos danos, bem como de três elementos essenciais, a saber: o dano, o nexo causal e a ilicitude da atitude do lesante. Veja-se:

DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO ILÍCITO. ACIDENTE DE VEÍCULO. DANO MATERIAL E LUCROS CESSANTES. NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O ATO ILÍCITO E O DANO SOFRIDO. QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL. IMPROVIMENTO. DECISÃO UNÂNIME. Para que haja o dever de indenizar faz-se necessária a comprovação de três elementos essenciais, quais sejam, o dano, o nexo causal e a ilicitude. Demonstrada a ocorrência do dano e do nexo de causalidade, resta inequívoco o dever de indenizar e impor a responsabilidade na empresa ré pelos danos experimentados pelo autor. É por meio da indenização que se busca a reposição do valor perdido, para indenizar o ofendido, levando o seu patrimônio ao estado em que se encontraria antes do fato danoso. O valor da indenização, haverá de ser suficientemente expressivo para compensar o autor pelo prejuízo sofrido, sem chegar ao extremo de caracterizar um enriquecimento sem causa. No que tange aos lucros cessantes arbitrados na sentença, laborou com êxito o Juiz da causa, porquanto restou demonstrado que o automóvel do apelado era seu instrumento de trabalho. À unanimidade de votos, negou-se provimento ao recurso de apelação. [47]

Assim, diante da efetiva ocorrência do dano patrimonial, o causador deste somente estará obrigado a reparar o prejuízo causado ao lesado na medida em que este comprovar inequivocamente em juízo os prejuízos que efetivamente sofreu, bem como os lucros que deixou de auferir em virtude do ato danoso, fazendo-se necessária para tal comprovação a presença dos três elementos acima citados, para que a indenização não seja causa de enriquecimento ilícito da vítima, bem como a fim de se evitar que a indenização percebida por esta não seja em valor tão irrisório que não compense o mal sofrido.

Entre particulares, apurar-se-á se a conduta reprovável e indevida do lesante foi ou não culposa, excetuando-se os casos das relações de consumo, onde a responsabilidade é objetiva, ou seja, não se discute a culpa, mas tão somente a ocorrência do fato gerador e do dano, da mesma forma que ocorre com os danos causados pela atividade lesiva do estado, para os quais prevalecem as mesmas regras.

Por sua própria natureza, é evidente que a demonstração da extensão do dano material deve ser precisa também quanto ao valor da indenização pretendida, haja vista que o que se visa através da competente ação judicial é a recomposição da efetiva situação patrimonial que se tinha antes da ocorrência do dano suportado, e não o enriquecimento indevido do prejudicado.

Portanto, conclui-se que a indenização por danos materiais estará sempre vinculada à comprovação do efetivo prejuízo sofrido pela vítima, bem como de todos os lucros que a mesma deixou de auferir em virtude da atitude lesiva do agente, o que normalmente é feito por intermédio de provas documentais.

3.4. Possibilidade de cumulação de danos morais e danos materiais

Como já visto, tanto os danos morais quanto os materiais correspondem a particularidades da categoria jurídica dos danos reparáveis, ou seja, um vez sofridos pelo indivíduo, os danos serão passíveis de indenização. Nesse sentido, notório é o respaldo dado pela própria Constituição Federal, ao afirmar, em seu artigo 5º, V [48], que é assegurado a todos os indivíduos o direito de resposta, bem como indenização por dano material, moral ou à imagem, a fim de que seja resguardada a igualdade das pessoas.

Ocorre que, prosseguindo-se a leitura do artigo 5º da nossa Carta Magna, percebe-se que o inciso X [49] do mesmo afirma que a violação a certos princípios inerentes às pessoas assegura a estas o direito a indenização pelo dano moral ou material sofrido, o que logicamente leva a crer, em interpretação detalhista, que o recebimento de indenização por dano moral pode excluir a possibilidade de recebimento de indenização por dano material.

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No entanto, tal interpretação literal não parece adequada para a realidade jurídica brasileira, haja vista que inúmeras são as situações em que restam caracterizados tanto os danos materiais quanto os morais, normalmente decorrentes do mesmo fato.

Visando atribuir maior segurança ao ordenamento jurídico brasileiro, diversas decisões passaram a ser proferidas pelos Tribunais de Justiça e Tribunais Superiores, no sentido de possibilitar a cumulação dos danos morais com os danos materiais, mas desde que ambos fossem obviamente decorrentes do mesmo fato, pois o próprio significado da palavra "cumulação" tornaria de todo absurda a exigência de que os fatos geradores da configuração dos danos fossem distintos.

Nesse sentido, na tentativa de pacificar o entendimento jurisprudencial, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 37, a qual afirma o seguinte: "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato.".

Assim, para que se evite a ocorrência de eventuais injustiças, tem-se que é perfeitamente válida e até mesmo necessária em alguns casos a cumulação de danos morais com danos materiais oriundos do mesmo fato, para que a finalidade maior do direito seja sempre cumprida, ou seja, a justiça.

Afinal, é notadamente possível que a prática de um único ato lesivo pelo agente pode provocar tanto um prejuízo patrimonial à vítima quanto um sério abalo à moral da mesma, o que certamente configurará o dever de indenizar do lesante, bem como o direito à percepção da competente indenização por parte do lesado.

Portanto, dúvidas não restam quanto à possibilidade de cumulação de indenização por danos morais e materiais oriundos do mesmo fato, haja vista que o entendimento atualmente consolidado no Superior Tribunal de Justiça, através da súmula 37, é no sentido de admitir a cumulação de ambos os institutos.


4. APRESENTAÇÃO ANTECIPADA DO CHEQUE PÓS-DATADO: FATO GERADOR DE DANOS MORAIS E MATERIAIS?

Conforme amplamente demonstrado no primeiro capítulo deste trabalho, sabe-se que o portador do cheque pós-datado poderá apresentá-lo antes mesmo da data acordada com o emitente, haja vista que para o banco sacado o referido título funciona como uma ordem de pagamento à vista, nos estritos moldes do artigo 32, caput, da lei 7.357/85. [50]

Dessa forma, tem-se que, em relação ao banco sacado, a natureza cambiária do cheque pós-datado permanece íntegra e respeitável, na medida em que a emissão de um cheque com data futura para pagamento não possui o condão de evitar a ordem de pagamento à vista, pois ainda não existe normatização legal que estipule em contrário especificamente para o cheque pós-datado.

Teoricamente, no âmbito cambiário do cheque pós-datado, pode-se concluir que o portador do mesmo terá a faculdade de optar por respeitar ou não a cláusula de pagamento a prazo, representada pela data aposta no título como de emissão, uma vez que o banco sacado sempre interpretará o aludido título de crédito como sendo uma ordem de pagamento à vista.

Nesse norte, é perfeitamente observável que nenhuma atitude ilícita estará cometendo o banco sacado caso proceda ao desconto de um cheque pós-datado apresentado para pagamento pelo portador antes da data aposta no mesmo, vez que a instituição financeira estará obedecendo fidedignamente o disposto na lei 7.357/85, pelo que não poderá ser responsabilizado civilmente pela quebra do contrato firmado.

Estando claro que a atitude do banco sacado em sempre proceder de forma fiel ao disposto na Lei do Cheque jamais constituirá ato ilícito ensejador de qualquer indenização, na medida em que o artigo 32, caput, do referido diploma legal determina expressamente que assim seja procedido, não existindo atualmente qualquer disposição em contrário, está-se diante de um grande dilema: quem será responsabilizado pela quebra do contrato firmado entre emitente e portador?

A resposta para o questionamento acima é simples: o portador que apresentou o cheque antes da data. Afinal, não é difícil perceber que o contrato firmado ocorreu de forma restrita ao emitente e o beneficiário, sendo que em momento algum o banco sacado ingressou em tal transação, motivo pelo qual o mesmo não poderá ser responsabilizado pela apresentação antecipada do cheque pós-datado.

Afinal, deixando-se um pouco de lado a natureza cambiária do cheque pós-datado, que apenas é respeitada pelo banco sacado, tem-se que é decorrente da própria natureza contratual do aludido título a obrigação do beneficiário de não apresentar o cheque antes da data previamente convencionada com o emitente, sob pena de desvirtualização do princípio da liberdade de contratar.

Como já visto, o cheque pós-datado corresponde a um contrato bilateral firmado entre o emitente e o beneficiário, através do qual o primeiro se compromete a ter fundos disponíveis no banco sacado na data avençada para pagamento e o segundo a somente apresentar o título para pagamento na data previamente combinada.

A respeito do assunto, Fábio Ulhoa Coelho, a fim de se demonstrar o acima narrado, afirma que está sendo desenvolvido o entendimento de que o comerciante, ao aceitar um pagamento com cheque pós-datado, assume uma típica obrigação de não fazer, consistente em abster-se de apresentá-lo ao sacado antes da data avençada com o emitente, de modo que o descumprimento dessa obrigação acarretaria o dever de indenizar este. [51]

Assim, dúvidas não restam quanto à obrigação exclusiva do beneficiário infrator do contrato em indenizar o emitente quando da apresentação antecipada do cheque pós-datado para pagamento, na medida em que somente é facultado ao banco sacado a aplicação literal do artigo 32 da Lei do Cheque.

No mesmo sentido, cumpre transcrever o entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a respeito do assunto:

O cheque pré-datado hoje se constitui em verdadeiro contrato comercial, pelo qual o emitente se obriga a ter saldo na data constante no documento, enquanto o credor se obriga a só apresentar na data avençada. O irrestrito apego ao direito cambiário, dentro das circunstâncias hoje vividas no país, seria desconsiderar a realidade e privilegiar o comerciante desonesto. [52]

Outrossim, resta evidente que, na hipótese de apresentação antecipada do cheque pós-datado para pagamento pelo beneficiário, estar-se-á infringindo drasticamente o artigo 1.482 [53] do Código Civil de 2002, na medida em que a quebra do contrato por parte do portador constitui clara má-fé do mesmo, pois a apresentação antecipada normalmente é feita em detrimento do que fora previamente pactuado com o emitente do título, desrespeitando assim o princípio norteador dos contratos (pacta sunt servanda).

Dessa forma, dúvidas não restam de que o emitente de boa-fé jamais poderá ficar desamparado pelo judiciário, à mercê da atitude que poderá tomar o beneficiário, motivo pelo qual este deverá ser completamente responsabilizado por todos os danos causados àquele, mas desde que em decorrência do ato da apresentação do cheque pós-datado antes da data acordada.

Posto isso, a dúvida que surge a partir de agora é no sentido de que, configurado o prejuízo sofrido pelo emitente de um cheque pós-datado, em virtude da apresentação antecipada do mesmo pelo beneficiário, bem como estando ciente de que caberá tão somente a este reparar tal prejuízo, quais danos poderão decorrer de tal prática ilícita: apenas danos morais, apenas danos materiais ou ambas as espécies de danos?

Via de regra, a apresentação antecipada do cheque pós-datado gera para o emitente uma série de prejuízos. Isso ocorre porque normalmente o cheque que foi emitido nessa condição não possui fundos disponíveis no momento da emissão, a fim de que seja pago o seu valor representativo ao portador.

Assim é que, sendo o cheque apresentado ao sacado antes da data aprazada no mesmo para pagamento, este provavelmente será devolvido na compensação bancária, com a provável inclusão do nome do emitente nos serviços nacionais de proteção ao crédito, o que constituirá evidente prejuízo ao mesmo.

Com efeito, essa devolução e inclusão acarretam inúmeros prejuízos ao emitente, dentre os quais se destacam: a impossibilidade do mesmo adquirir qualquer crédito perante as instituições financeiras; dificuldade na efetuação do parcelamento de compras; bloqueio de emissão de talonários de cheques; rejeição mediante consulta em estabelecimentos comerciais de outros cheques que porventura venha a emitir; tarifas e taxas decorrentes de tal devolução do cheque; constrangimentos diversos.

Estando assim notória a ocorrência dos danos, para que se tenha uma visão mais límpida do cabimento ou não de um requerimento de indenização por danos patrimoniais e/ou extrapatrimoniais, na hipótese de apresentação antecipada de cheque pós-datado para pagamento, importante se faz estudar o cabimento de ambos os institutos isoladamente, a começar pelos danos morais, na medida em que estes se configuram de forma mais corriqueira do que os danos materiais.

No que pertine aos danos morais, tem-se que a jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça, como se verá adiante, vem defendendo o entendimento de que a apresentação antecipada do cheque pós-datado para pagamento dá sim ensejo a indenização por danos de ordem moral, aplicando-se os incisos V [54] e X [55], do artigo 5º, da Constituição Federal de 1988.

Afinal, tal entendimento se concretiza na medida em que a atitude de clara má-fé do beneficiário, que apresenta o cheque pós-datado para pagamento antes da data previamente acordada com o emitente, constitui evidente desrespeito ao contrato firmado entre as partes, atitude esta que trará vários prejuízos ao emitente, sem falar no constrangimento que o mesmo poderá passar, como no caso de ter seu nome indevidamente incluído no Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundos, por culpa exclusiva do beneficiário, que não respeitou a data aposta no título.

Já no que concerne aos danos materiais, estes poderão ser caracterizados pelos gastos equivalentes às tarifas bancárias arcadas pelo emitente prejudicado, na medida em que o cheque pós-datado apresentado antes da data acordada for devolvido por insuficiência de fundos no banco sacado.

Ademais, é possível ainda que, ocorrendo a hipótese de apresentação antecipada sem que o emitente tenha fundos na referida data anterior à acordada, seja o nome deste incluído no Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundos, o que certamente constituirá maior prejuízo material ao emitente, que ainda terá que arcar com os valores das taxas para a retirada de seu nome do registro, sem contar no claro dano moral decorrente de tal inclusão indevida, que também deverá ser indenizado pelo beneficiário.

Outrossim, não se pode descartar a hipótese de que, mesmo tendo sido o cheque pós-datado apresentado antes da data pelo beneficiário, é possível que nesta data anterior o emitente disponha de fundo em sua conta corrente, o que também lhe dará o direito de pleitear em juízo uma indenização por danos materiais, vez que os danos materiais decorrem do uso indevido do crédito de sua conta corrente por outrem, na medida em que se sabe que os juros cobrados pelo banco sacado nesse caso são altíssimos.

Por fim, importante também se faz trazer à baila a possibilidade de que a apresentação antecipada de um cheque pós-datado para pagamento ocasione a devolução de outros cheques emitidos posteriormente pelo emitente, o que certamente também lhe dará o direito de percepção de indenização por danos morais e materiais.

Apenas com o intuito de dar maior respaldo jurídico às posições acima expostas, cumpre transcrever o entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito do assunto, no sentido de atribuir ao beneficiário a obrigação de indenizar o emitente pelos danos morais e materiais decorrentes da apresentação antecipada de um cheque pós-datado para pagamento, em desrespeito ao contrato firmado entre as partes:

CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CHEQUE PRÉ - DATADO. APRESENTAÇÃO ANTES DO PRAZO. COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. Não ataca o fundamento do acórdão o recurso especial que discute apenas a natureza jurídica do título cambial emitido e desconsidera o posicionamento do acórdão a respeito da existência de má-fé na conduta de um dos contratantes. A apresentação do cheque pré-datado antes do prazo estipulado gera o dever de indenizar, presente, como no caso, a devolução do título por ausência de provisão de fundos. Recurso Especial não conhecido. [56]

CHEQUE PRÉ-DATADO. APRESENTAÇÃO ANTES DO PRAZO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRECEDENTES DA CORTE. A apresentação do cheque pré-datado antes do prazo avençado gera o dever de indenizar, presente, como no caso, a conseqüência da devolução do mesmo por ausência de provisão de fundos. Recurso Especial conhecido e provido. [57]

CHEQUE PRÉ-DATADO. APRESENTAÇÃO ANTECIPADA. DANO MORAL. DISSÍDIO. PRECEDENTES DA CORTE. Sem dúvida, a apresentação do cheque pré-datado antes da data nele aposta constitui razão capaz de causar abalo moral. Todavia, o precedente apresentado não guarda similitude fática com o presente caso, porque nele há conseqüências efetivas, assim a devolução do cheque por insuficiência de fundos e a inscrição do nome do cliente em cadastro negativo, o que não ocorre neste feito. Recurso Especial não conhecido. [58]

CHEQUE PRÉ - DATADO. APRESENTAÇÃO ANTECIPADA. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRECEDENTES DA CORTE. Como já decidiu a corte, a prática comercial de emissão de cheque com data futura de apresentação, popularmente conhecido como cheque pré-datado, não desnatura a sua qualidade cambiariforme, representando garantia de dívida com a conseqüência de ampliar o prazo de apresentação. A empresa que não cumpre o ajustado deve responder pelos danos causados ao emitente. Recurso Especial não conhecido. [59]

Diante dos julgados acima transcritos, todos proferidos pelo Superior Tribunal de Justiça, resta evidenciado que caberá ao beneficiário infrator indenizar o emitente do cheque pós-datado quando este for apresentado antes da data previamente estipulada para pagamento, sendo direito do emitente o recebimento de indenização tanto pelos danos morais quanto pelos danos materiais sofridos, valendo ressaltar desde já que ambos os institutos deverão ter suas configurações inequivocamente comprovadas.

No mesmo norte, apenas para corroborar com o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, cumpre citar também o que afirma o Tribunal de Justiça de Pernambuco a respeito do tema, nas palavras do atual presidente da casa, o Desembargador Jones Figueiredo, em julgamento recente:

DIREITO CIVIL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO. NEGÓCIO JURÍDICO VÁLIDO E EFICAZ. CESSÃO DE DIREITOS. PRAXE NOS NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS. DESCUMPRIMENTO DA FORMA DE PAGAMENTO AJUSTADA. MÁ-FÉ NA EXECUÇÃO DO CONTRATO. NEGATIVAÇÃO DO NOME DA ADQUIRENTE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DANOS MATERIAIS INCOMPROVADOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) Imóvel que integra o patrimônio do vendedor, diante do pagamento total do preço, a possibilitar alienação a terceiro, por meio de cessão de direito. Má-fé do promitente-vendedor na execução do contrato, pois ajustada a forma de pagamento em várias prestações, por meio de cheques pré-datados, vários foram apresentados concomitantemente e antes do vencimento aprazado, acarretando a devolução dos mesmos e a inclusão do nome da promissária-compradora em cadastro de negativação. Ofensa aos artigos 113 e 442 do Código Civil, ensejando, assim, uma indenização por dano moral em face dos prejuízos suportados. Unanimemente, deu-se provimento parcial ao recurso do autor. [60]

Portanto, seguindo a mesma linha de raciocínio do Superior Tribunal de Justiça, percebe-se que o Tribunal de Justiça de Pernambuco também compartilha com o entendimento de que a apresentação antecipada do cheque pós-datado para pagamento dá ensejo ao recebimento de indenização por danos morais e materiais por parte do emitente, indenização esta que deverá ser arcada unicamente pelo beneficiário que infringiu o contrato.

No mais, apenas para que não restem dúvidas, cumpre deixar claro que a simples apresentação antecipada do cheque, por si só, já constitui um ato de má-fé cometido pelo beneficiário. No entanto, apenas terá o direito à percepção de indenização o emitente que comprovar tanto a existência quanto a extensão dos danos morais e dos materiais, sob pena de ter seu pleito denegado pelo judiciário.

Afinal, os danos morais deverão estar representados pelo constrangimento e/ou pelo abalo à moral do emitente, normalmente configurado com a inclusão do mesmo nos cadastros de proteção ao crédito. Quanto aos danos materiais, estes são um pouco mais difíceis de comprovar, pois estarão ligados diretamente aos gastos indevidos que o emitente teve de arcar em virtude da apresentação antecipada, tais como taxas referentes à devolução do cheque, tarifa para a retirada do seu nome do Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundos, etc.

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Sobre o autor
Thiago Luiz Pacheco de Carvalho

Advogado e Assessor Jurídico Municipal Graduado em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduando em Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera/UNIDERP/LFG

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Thiago Luiz Pacheco. Apresentação antecipada de cheque pós-datado.: Fato gerador de danos morais e materiais?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2302, 20 out. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13675. Acesso em: 23 dez. 2024.

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