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A Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras

01/06/1997 às 00:00
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A aprovação da Emenda Constitucional nº 12, de 16.08.96, é mais um capítulo da comédia de erros protagonizada pelo Governo brasileiro, na busca da redução do déficit em que vivem mergulhadas as suas contas. Como de hábito, optou-se pela criação de tributo novo, solução mais cômoda do que o combate à sonegação dos existentes e a racionalização dos gastos públicos, esta última tão urgente em matéria de saúde, a que se destina a arrecadação deste IPMF redivivo.

Tal como o imposto do cheque que sucede, a CPMF ignora o princípio constitucional da capacidade contributiva, tratando de forma idêntica os variadíssimos fatos da vida subjacentes às operações bancárias que os financiam. A conclusão coincide com censura formulada ao IPMF, em 1993, por comissão integrada, entre outros notáveis, pelo combativo GERALDO ATALIBA: "a previsão de competência tributária federal para criar imposto sobre ‘movimentação’ financeira cria uma competência arbitrária, pois em seu conceito-chave (movimentação) compreendem-se atos sem conteúdo econômico" (1). O argumento foi desconsiderado pelo STF quando do julgamento do antigo imposto, e sua reiteração desta feita não deve ter melhor sorte.

A estruturação da contribuição em forma cumulativa, se é questão superada no plano jurídico, uma vez que a atribuição de competência por meio de emenda constitucional afasta a incidência do art. 154, I, da Constituição, merece críticas veementes do ponto de vista econômico, em face das graves distorções que ocasiona, tais como: (a) distorção no preço dos bens segundo as possibilidades de integração vertical que tenha cada setor (quanto menos transferências de propriedade sofrer o bem, acompanhadas das necessárias transações bancárias, menor o ônus adicionado ao preço pela incidência da CPMF); (b) desestímulo às exportações, certo que não há mecanismo de devolução do tributo incorporado ao preço das mercadorias; (c) estímulo à importação de bens, sobretudo acabados, que, em virtude da regra internacional de exoneração das exportações, não trazem consigo o ônus de tributos pagos no país de origem; (d) aumento nos preços superior à vantagem proporcionada em termos de arrecadação (efeito de piramidação) (2).

Em relação ao tratamento tributário das exportações brasileiras, fator destacado de elevação do chamado Custo Brasil, ressalte-se o caráter esquizofrênico do comportamento do Governo federal, que retira com uma mão os benefícios que concede com a outra. De um lado, propugna pela aprovação da lei complementar que isenta todas as exportações de ICMS e apresenta projeto de reforma constitucional prevendo a concessão de crédito do mesmo imposto nas aquisições de bens para o ativo fixo das empresas, minorando seus efeitos cumulativos. Do outro, faz aprovar a CPMF, contribuição cumulativa, ao mesmo tempo em que, na mesma proposta de reforma constitucional referida, propõe a exclusão do requisito da não-cumulatividade para o exercício da competência residual da União.

Isso tudo enquanto, no plano internacional, nossos parceiros comerciais avançam cada vez mais na desoneração total das exportações. Basta que se considere que a Argentina está em fase final de extinção da tributação cumulativa sobre o consumo em geral (o imposto provincial sobre os ingressos brutos), deixando-nos sozinhos, no âmbito do Mercosul, com as nossas contribuições para o custeio da Seguridade Social (PIS, COFINS e, agora, CPMF).

A par de tudo isso, o tributo, por ter o seu ônus financeiro transferido para os preços, contribui, no plano interno, para o aumento da regressividade do sistema tributário nacional, apoiado fundamentalmente em impostos indiretos que oneram o consumo.

Um último problema, este jurídico, a envolver a contribuição refere-se à sua administração e fiscalização. Segundo o art. 11 do projeto de lei complementar que a institui, as instituições bancárias ficam obrigadas a informar periodicamente à Receita Federal os valores globais das operações financeiras de seus clientes, identificando-os. O dispositivo colide com a jurisprudência consolidada do STF, que faz derivar diretamente do texto constitucional o direito individual ao sigilo bancário, apenas excepcionável por força de decisão judicial.



NOTAS

(1) Conclusões sobre a proposta de emenda constitucional nº 48-A, elaboradas pela Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB, reunida com outros especialistas. Brasília, 16 de fevereiro de 1993, pág. 7
(2) Cf. J. DUE, Indirect Taxation in Developing Economies, apud JUÁN C. GÓMEZ SABAINI, Coordinación de la Imposición General a los Consumos entre Nación y Provincias (Argentina), Serie Política Fiscal, nº 47, Santiago de Chile, CEPAL - GTZ, pp. 24-26
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Sobre o autor
Igor Mauler Santiago

Advogado em São Paulo (SP), sócio do Sacha Calmon – Misabel Derzi Consultores e Advogados. Doutor, Mestre e Especialista em Direito Tributário pela UFMG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTIAGO, Igor Mauler. A Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 2, n. 14, 1 jun. 1997. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1375. Acesso em: 4 nov. 2024.

Mais informações

Texto publicado no boletim Forense Informa, ano III, n. 19, 1996, p. 3

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