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O idoso e o regime de bens no casamento.

Críticas à opção legislativa do Código Civil de 2002

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14/12/2009 às 00:00

Resumo:


  • A imposição do regime de separação obrigatória de bens para pessoas maiores de 60 anos fere direitos constitucionais básicos, como dignidade, igualdade, liberdade e isonomia.

  • A imposição do regime de separação obrigatória para idosos limita a autonomia privada, desrespeitando a capacidade de decisão do indivíduo e ferindo princípios constitucionais.

  • A proibição do idoso de escolher o regime de bens para o casamento baseada apenas na idade é inconstitucional, pois viola a dignidade da pessoa humana, a igualdade e a liberdade de escolha.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Não mais se justifica impor ao idoso o regime da separação de bens, pois não é plausível admitir, com base apenas no fator idade, que a pessoa não tenha capacidade de escolher o regime de bens que melhor lhe atenda.

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A autonomia privada está presente em todos os ramos do Direito Civil e se revela em vários aspectos no Direito de Família. O que interessa ao presente trabalho diz respeito à manifestação da autonomia privada dos cônjuges quando da escolha do regime de bens que vigorará no casamento, que pode ser considerado como o contrato que determina as regras incidentes sobre as questões patrimoniais relacionadas ao casamento.

Serão apresentados breves e concisos apontamentos sobre as principais características que envolvem o instituto jurídico em exame, os princípios que o regem e as modificações apresentadas no Código Civil de 2002. Questões polêmicas serão abordadas, como a vigência da Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, o procedimento de modificação do regime de bens e a ausência de tal imposição na união estável.

Como tema central deste trabalho, está o regime da separação obrigatória de bens, que é imposto a toda pessoa maior de 60 (sessenta) anos que queira realizar casamento.

Serão vistos os possíveis motivos que fundamentaram a opção legislativa de se impor tal regime ao sexagenário. O objetivo deste trabalho é demonstrar que, nos dias atuais, não mais se justifica impor ao idoso o regime da separação de bens, pois não é plausível admitir, com base apenas no fator idade, que a pessoa não tenha capacidade de escolher o regime de bens que melhor lhe atenda.

Em complemento, o estudo objetiva verificar que o artigo 1.641, II, do Código Civil ofende direitos constitucionais básicos, como dignidade, igualdade, liberdade e isonomia, pois retira do idoso a sua possibilidade de autodeterminação quando da realização do casamento. Ou seja, com base em um único fator, a idade, a lei conclui que o idoso não detém discernimento pleno para o exercício de suas atividades. Pode praticar vários atos, mas não pode simplesmente escolher o regime de bens que melhor atenda aos seus interesses.

Será visto que tramitam no Congresso Nacional diversos Projetos de Lei que visam a revogação do citado dispositivo, justamente pela sua flagrante inconstitucionalidade.

Ao final, este trabalho defende que é possível ao idoso pretender a alteração do regime da separação obrigatória após o enlace matrimonial, através de ação judicial proposta por ambos os cônjuges, onde fique provada a plena capacidade de exercícios dos atos da vida civil, tudo com base na regra geral de modificação do regime de bens, presente no artigo 1.639, § 2º do Código Civil.


2. PRINCIPAIS APONTAMENTOS SOBRE O REGIME DE BENS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002

Com a realização do casamento, surge para os cônjuges direitos e deveres de ordem pessoal e patrimonial. Com relação a esta última, que é a que interessa ao presente trabalho, se verifica a necessidade de estipular quais serão as regras que irão regulamentar os aspectos econômicos e patrimoniais da sociedade conjugal.

Em especial, é preciso estabelecer normas para disciplinar, entre outras situações, a eventual partilha de bens decorrente da dissolução da sociedade conjugal, a aquisição de bens na constância do casamento, ainda que fruto de doação ou herança, a alienação desses bens, a necessidade de outorga do cônjuge, entre outras situações envolvendo o patrimônio do casal.

Além disso, é preciso estabelecer se os bens adquiridos na constância da sociedade conjugal irão ou não compor o patrimônio do casal ou se, ao contrário, irão compor apenas o patrimônio individual de cada cônjuge.

Para que todas essas situações possam ser solucionadas, o legislador criou o chamado regime de bens, cuja disciplina está prevista a partir do artigo 1.639 do Código Civil de 2002. Grande parte da doutrina leciona que o regime de bens pode ser entendido como o estatuto ou complexo de normas que regulamentam os interesses patrimoniais dos cônjuges. [01]

Pode-se concluir que não há casamento sem prévia estipulação quanto ao regime de bens, sendo importante registrar que também na união estável o legislador determinou que a relação entre os companheiros, no que diz respeito ao aspecto patrimonial, deve ser disciplinada através do regime de bens, conforme se verifica no artigo 1.725 do Código Civil. Na ausência de contrato de convivência, prevalece o regime da comunhão parcial.

O Código Civil de 2002 apresenta como opção aos nubentes quatro diferentes regimes de bens: comunhão universal, comunhão parcial, separação de bens e participação final dos aquestos. Os cônjuges podem escolher entre um desses regimes, como também podem promover a escolha de regimes mistos, que tenham suporte nas características dos regimes previstos no Código. É o que se extrai, sem nenhuma dificuldade, do artigo 1.639 do C.C/2002, quando estabelece que aos nubentes é lícito estipular, quanto aos bens, o que melhor atender às necessidades do casal, desde que a escolha seja adequada às regras previstas na lei.

Não há dúvidas que mais uma vez o legislador privilegiou a autonomia privada [02] dos cônjuges, quando lhes permite escolher um dos regimes tipificados no Código ou mesclar as regras desses regimes, criando um regime misto, adequado às necessidades e conveniências do casal.

O Código Civil de 1.916 trazia a previsão do regime dotal, que não se verifica mais no Código Civil de 2002. Como novidade, está o regime da participação final dos aquestos. Outra novidade do Código de 2002 em relação ao de 1.916 é a opção legislativa de se adotar o regime da comunhão parcial como o regime legal. No Código de 1.916, prevalecia a comunhão universal.

Regime legal é aquele que prevalece diante da inércia dos nubentes na escolha do regime de bens ou no caso de nulidade ou ineficácia da convenção. Tal conclusão é extraída do caput do artigo 1.640 do C.C/2002, quando determina que "não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial".

O mesmo pode ser dito da união estável, uma vez que o artigo 1.725 estabelece que "na união estável, salvo contrato escrito entre os cônjuges, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens".

Dessa forma, não havendo por parte dos nubentes a escolha quanto ao regime de bens, prevalecerá o regime da comunhão parcial de bens. O parágrafo único do artigo 1.640 estabelece que a opção pelos demais regimes deverá ser precedida de pacto antenupcial, lavrado através de escritura pública.

O pacto antenupcial é disciplinado nos artigos 1.653 a 1.657 do C.C/2002 e pode ser entendido como o contrato solene, já que exige a escritura pública como requisito de validade, que precede o casamento e no qual as partes acertam o regime de bens que vigorará entre elas durante o matrimônio. [03]

O pacto antenupcial deve ser lavrado perante o Cartório de Notas e encaminhado ao Cartório de Registro Civil onde se realizará o casamento. Feito isto, o artigo 1.657 do C.C/2002 determina que é necessária a averbação do pacto junto ao Cartório de Registro de Imóveis para que os efeitos da convenção tenha validade perante terceiros.

Maria Helena Diniz traz interessante abordagem sobre os princípios que norteiam o regime de bens. Segundo a festejada professora, o regime de bens está envolto pelos princípios da variedade de regime de bens, liberdade dos pactos antenupciais e mutabilidade justificada do regime adotado. [04]

Os dois primeiros se fazem bem claros, já que o Código Civil dá quatro opções de regime aos nubentes, possibilitando, ressalvadas as hipóteses do artigo 1.641, a total liberdade de escolha, seja pelos regimes previstos expressamente, seja pela adoção de regimes mistos.

Quanto ao terceiro princípio citado pela doutrinadora, o da mutabilidade motivada do regime adotado, cumpre registrar que se trata de novidade do Código atual em relação ao Diploma de 1.916. Com efeito, o Código Bevilácqua não permitia a alteração do regime de bens, sendo a escolha irrevogável, conforme determinava o artigo 230.

O Código de 1.916 elegeu o princípio da irrevogabilidade do regime de bens com o objetivo de garantir segurança aos interesses dos cônjuges (em especial da mulher, já que por muito tempo prevaleceu a ideia de que a mulher era um ser frágil, que poderia ser ludibriada e prejudicada pelo marido) e também interesses de terceiros. Segundo Carlos Roberto Gonçalves, é uma forma de se evitar que um cônjuge tente fraudar o outro, ou que o casal tente fraudar terceiros. [05]

Maria Helena Diniz e Washington de Barros Monteiro informam que na vigência do Código de 1.916 já se verificavam exceções às regras da imutabilidade. Isso porque o Supremo Tribunal Federal adotava entendimento segundo o qual o princípio da inalterabilidade era preterido na situação em que o casal estipulasse no pacto antenupcial que em caso de nascimento de filhos o regime se convertesse de separação para comunhão. E também porque a Súmula 377 STF admitia a comunicação dos bens adquiridos na vigência do casamento, decorrentes do esforço comum. [06]

Agora, o § 2º do artigo 1.639 do Código de 2002 estabelece que o regime de bens pode ser alterado. Para tanto, exige autorização judicial, precedida de pedido motivado e fundamentado de ambos os cônjuges, ficando ressalvados eventuais direitos de terceiros. Arnaldo Rizzardo também leciona que com o Código Civil de 2002 vigora o princípio da mutabilidade. [07]

Carlos Roberto Gonçalves, por sua vez, defende que a inalterabilidade continua sendo a regra e a mutabilidade a exceção, pois a alteração só pode ser obtida em casos especiais. [08]

Merece elogios a opção do legislador do Código Civil de 2002. Com efeito, os casais nem sempre se sentem à vontade para discutir e escolher o regime de bens, podendo ser adotado um regime que não irá atender às conveniências e interesses dos nubentes. Lado outro, pode haver simplesmente a inércia, o desconhecimento, a falta de informação por parte dos nubentes, que acarretará a adoção automática pelo regime legal da comunhão parcial.

Após algum tempo de convivência conjugal, com o crescimento da afinidade entre o casal e melhor elucidação para os projetos do futuro (até mesmo no que diz respeito ao planejamento sucessório), pode ocorrer que os cônjuges queiram alterar o regime inicialmente eleito.

A possibilidade de alteração privilegia a autonomia privada dos cônjuges e contribui para a preservação da dignidade do casal. Com efeito, é por demais constrangedor se manter vinculado a um regime de bens, quando se sabe que ele não é o que melhor atenderá ao casal e aos filhos, no caso de futura abertura da sucessão. Registre-se ainda que a Constituição da República, em seu artigo 226, § 7º, determina que o planejamento familiar é de livre estipulação do casal, e não se pode desconsiderar que a escolha do regime de bens também está inserido na ideia de planejamento familiar.

Além disso, conforme se verá ao final deste trabalho, a possibilidade de alteração significa uma saída para aqueles que foram obrigados a contrair casamento pelo regime da separação de bens.

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Sílvio Rodrigues, com a clareza que lhe é peculiar, demonstra que a possibilidade de alteração do regime de bens não representa quebra da segurança jurídica, pois o pedido deverá ser motivado, formulando por ambos os cônjuges e não poderá trazer prejuízo ao casal, aos filhos e a terceiros. [09]

Dessa forma, não há outro caminho senão aplaudir e concordar com a possibilidade de alteração do regime de bens.

Questão que vem sendo bastante discutida na doutrina diz respeito à necessidade do pedido de alteração ser feita pela via judicial e também necessitar de motivação (exposição dos fundamentos) por parte dos cônjuges. Contrária à opinião de Sílvio Rodrigues, Érica Verícia de Oliveira Canuto defende que o pedido de alteração deveria se processar extrajudicialmente (da mesma forma que a escolha do regime), cabendo ao juiz tão somente homologar a vontade do casal. [10]

A citada Professora ainda anota que a obrigatoriedade de exposição dos motivos, por parte dos cônjuges, é inconstitucional porque fere os direitos a intimidade e privacidade:

"No entanto, a Lei prevê que o pedido deverá ser submetido à apreciação judicial. Em sendo judicial o pedido, asseguro não deve competir ao Estado a análise ou mesmo o conhecimento dos motivos e das razões por que o casal deseja alterar o regime de bens que rege sua comunhão plena de vida. É questão de foro íntimo, privado, que diz respeito às questões subjetivas da vida daquela família. Embora interpretando de modo diverso de tantos que têm doutrinado a respeito, considero incabível, impertinente, inconstitucional e, ainda, ilegal a intromissão do Estado.

(...)

Interpreto, ainda, como inconstitucional a obrigatoriedade de exposição dos motivos do pedido de alteração de regime de bens no curso do casamento, já que vai de encontro ao fundamento da República de "dignidade da pessoa humana", ferindo assim, os direitos da personalidade, bem como não observando os direitos e as garantias constitucionais de "intimidade" e "privacidade" (art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, de 5 de outubro de 1988)." [11]

A opinião da professora potiguar parece ser extremamente acertada. O procedimento de alteração de regime precisa ser simplificado, a exemplo do que ocorreu com o inventário, partilha e separação judicial através da promulgação da Lei n. 11.441, de 4 de janeiro de 2007. Dessa forma, indo até mais longe, é plausível defender que a alteração do regime se processe pela via extrajudicial (através do Cartório de Notas), surtindo efeitos independentemente de homologação judicial, que se afigura prescindível.

Da mesma forma, não há que se exigir motivação do pedido, pois de fato fere o direito à intimidade e privacidade do casal. Basta que haja pedido de ambos os cônjuges e, ademais, sendo a alteração de regime um negócio jurídico, este poderá ser anulado por qualquer vício de consentimento e também quando objetivar fraudar terceiros.

Dessa forma, verifica-se que a possibilidade de alteração do regime de bens importa em significativo avanço legislativo, mas que poderia ter sido simplificado, autorizando o ato pela via extrajudicial e sem a necessidade da exposição dos motivos.

Convém trazer à discussão, para encerrar esta parte introdutória, a regra de transição do artigo 2.039 do C.C/2002: "o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1.916, é o por ele estabelecido".

A questão que se coloca é se seria possível a mudança de regime para aquelas pessoas que realizaram casamento durante a vigência do Código anterior, quando reinava a regra da imutabilidade do regime.

Uma interpretação afoita do dispositivo leva à conclusão de que o regime escolhido na égide do Código de 1.916 continua sendo imutável. Arnaldo Rizzardo, por exemplo, defende que o artigo 2.039 determina que os casamentos celebrados durante a vigência do Código de 1.916 não são abrangidos pela regra do artigo 1.639, § 2º do C.C/2002. [12]

Washington de Barros, por sua vez, defende a possibilidade de alteração do regime de bens dos casamentos realizados na vigência do Código anterior. Para tanto, se utiliza da regra de transição do artigo 2.045. [13]

Sílvio Rodrigues também admite a alteração do regime para os casamentos realizados antes da entrada em vigor do Novo Código, apesar de se valer de outros fundamentos, quais sejam, o de que o artigo 2.039 é uma regra de caráter geral, e que a alteração interessa unicamente a família, não havendo que se falar em ofensa a ato jurídico perfeito e direito adquirido, se os próprios titulares querem efetivar a mudança. [14]

Não há dúvidas, portanto, que a interpretação mais adequada e que respeita a autonomia privada do casal, sem que isso represente ofensa a direito adquirido, é esta última, vale dizer, que permite a alteração também para os casamentos realizados sob a égide do Código de 1.916.


3. O REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS

Foi visto que o instituto jurídico do regime de bens no casamento é norteado pelos princípios da variedade, mutabilidade motivada e livre escolha. Os cônjuges têm a ampla liberdade para escolher o regime que melhor atenda aos interesses do casal e também podem pretender modificar o regime após a realização do casamento, direito imprescritível e que não está sujeito à verificação de lapso temporal para o seu exercício.

O legislador do Código Civil, portanto, privilegiou a ampla liberdade dos nubentes. Esta é a regra e, como toda regra tem a sua exceção, principalmente no Direito, no caso do regime de bens foi previsto, a exemplo do que já se verificava no Código Civil de 1.916, o regime da separação obrigatória de bens.

Diz-se obrigatória porque estando os nubentes (ou apenas um deles) em determinadas situações previstas em lei, não se permitirá que haja livre escolha do regime de bens. Ao contrário, a lei, taxativamente, determina que vigore, para aquele casal, o regime da separação de bens.

A imposição legal tem como fundamento ou justificativa a proteção que o legislador quis dar ao cônjuge ou a seus familiares. A imposição também se vislumbra como uma punição às pessoas que realizarem casamento contrariando causas suspensivas da celebração, previstas no artigo 1.523 do C.C/2002.

De acordo com Sílvio Rodrigues:

"E evidente o intuito protetivo do legislador, ao promulgar o dispositivo. Trata-se, em cada um dos casos compendiados no texto, de pessoas que, pela posição em que se encontram, poderiam ser conduzidos ao casamento pela atração que sua fortuna exerce. Assim, o legislador, para impedir que o interesse material venha a constituir o elemento principal a mover a vontade do outro consorte, procura, por meio do regime obrigatório da separação, eliminar essa espécie de incentivo." [15]

Maria Berenice Dias reconhece ao menos que parcialmente, alguma justificativa para a imposição legal, excetuada a situação do idoso. Mas afirma que o regime da separação obrigatória de bens se constitui em mera tentativa do legislador em limitar o direito dos nubentes, impondo sanções patrimoniais. [16]

Pois bem. A matéria está disciplinada no artigo 1.641 do Código Civil de 2002:

"Art. 1.641 – É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 60 (sessenta) anos;

III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Houve algumas alterações nas hipóteses de imposição do regime da separação quando se compara o Código de 2002 com o de 1.916. Os incisos do parágrafo único do artigo 258 deste último traziam as seguintes previsões:

"Art. 258 – Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de comunhão parcial.

Parágrafo único. É, porém, obrigatório a separação de bens no casamento:

I – das pessoas que o celebrarem com infração do estatuído no art. 183, XI a XVI (art. 216);

II – do maior de 60 (sessenta) e da maior de 50 (cinqüenta) anos;

III – do órfão de pai e mãe, ou do menor, nos termos dos arts. 394 e 395, embora case, nos termos do art. 183, XI, com o consentimento do tutor;

IV – de todos os que dependerem, para casar, de autorização judicial (arts. 183, XI, 384, II, 426, I, e 453)."

Não há dúvidas que a principal modificação legislativa foi igualar a idade do homem e da mulher para 60 (sessenta) anos, o que segundo alguns privilegia o princípio da plena igualdade. No mais, foi retirada a hipótese do órfão de pai e mãe, que era prevista no inciso III, parágrafo único do art. 258 do Código de 1.916.

No regime da separação de bens os cônjuges preservam no patrimônio individual os bens que possuíam antes do casamento, bem como aqueles adquiridos na constância do casamento. O mesmo se diga das dívidas anteriores e posteriores ao casamento. Existem dois patrimônios distintos, o do marido e o da esposa, havendo total incomunicabilidade em relação aos bens adquiridos antes e após o casamento. O artigo 1.687 do C.C/2002 determina que os bens permaneçam sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, podendo ser livremente alienados ou gravados de ônus. O artigo 1.688, por sua vez, estabelece que os cônjuges devem contribuir para as despesas do casal, na proporção dos respectivos rendimentos, salvo estipulação em contrário no pacto antenupcial.

As principais características do regime da separação de bens são as seguintes: propriedade exclusiva pelos cônjuges em relação aos bens anteriores e posteriores ao casamento; administração exclusiva desses bens; livre disposição desses bens, sem necessidade de outorga do outro cônjuge; responsabilidade patrimonial individual do cônjuge pelas obrigações por ele contraídas, salvo dívidas revertidas em proveito do casal; contribuição de ambos os cônjuges para as despesas da família, de acordo com os rendimentos. [17]

A primeira hipótese que o legislador entende merecedora da "proteção/imposição" do regime da separação de bens está relacionada às pessoas que realizarem casamento com violação das causas suspensivas (art. 1641, I). As causas suspensivas estão previstas no artigo 1.523 do C.C/2002:

"Art. 1523 – Não devem casar:

I – O viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;

II – a viúva ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até 10 (dez) meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;

III – o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;

IV – o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas."

Nos incisos I e III, o legislador quer evitar confusão de patrimônio e prejuízo aos filhos do primeiro leito. Com efeito, se não é realizada a partilha, pode ocorrer confusão entre o patrimônio angariado no primeiro casamento e aquele adquirido na segunda união. O inciso II quer evitar a "confusio sanguinis", em especial para que não haja dúvidas sobre a paternidade do filho nascido no lapso de 10 (dez) meses após o começo da viuvez ou da dissolução da sociedade. Por fim, o inciso IV objetiva proteger as pessoas que se achem em poder de outrem (tutela e curatela).

Como o artigo 1.523 aponta situações fáticas que podem deixar de existir após certo tempo, com muito acerto o legislador (parágrafo único do art. 1523) previu a possibilidade de afastamento, pelo juiz, das causas suspensivas, desde que se prove a ausência de prejuízo para o herdeiro, ex-cônjuge e pessoa tutelada ou curatelada (respectivamente incisos I, III e IV), e no caso do inciso II, seja provada a inexistência de gravidez na fluência do prazo ali indicado.

Quanto à segunda hipótese de imposição do regime da separação de bens, prevista no inciso II do art. 1.641, ou seja, da pessoa maior de 60 (sessenta) anos, que é objeto de questionamento desse trabalho, por ora cumpre dizer que quando um dos nubentes contar com mais de 60 (sessenta) anos, o regime de bens será o da separação obrigatória. Ou seja, o idoso não poder estipular livremente o regime que melhor lhe atenda.

Por fim, o inciso III do art. 1.641 estabelece que todos aqueles que dependerem de suprimento judicial para casar, deverão fazê-lo através do regime da separação de bens.

Portanto, foi visto que o legislador do Código Civil de 2002 optou em manter a imposição do regime da separação obrigatória, sendo que a doutrina apresenta como justificativa a tal imposição a necessidade de proteger o cônjuge e seus herdeiros (nos casos dos incisos I e II do art. 1.641), bem como garantir ao nubente que realize casamento mediante suprimento judicial a possibilidade de escolher, depois de adquirida a maioridade, o regime que melhor lhe aprouver.

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Sobre o autor
Michel Carlos Rocha Santos

Advogado. Especialista em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestrando em Direito Privado pela mesma instituição. Professor da Puc Minas e da Faculdade Pitágoras.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Michel Carlos Rocha. O idoso e o regime de bens no casamento.: Críticas à opção legislativa do Código Civil de 2002. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2357, 14 dez. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14009. Acesso em: 22 dez. 2024.

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