6 CONCLUSÃO: SOBRE A IMPARCIALIDADE DO JUIZ NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Diante do exposto, verificou-se a falência do Estado Social e, por sua vez, restou demonstrada a inadequação do modelo de processo concebido pelos instrumentalistas no também denominado Estado do Bem-Estar Social.
A ideia de um juiz com elevado grau de discricionariedade em busca de uma paz social não parece ser a mais adequada, estando em desacordo com a proposta do Estado Democrático de Direito.
Não seria o caso, no entanto, de se fazer um resgate do requisito de imparcialidade do juiz defendido pelos liberais no século XIX?
A defesa da imparcialidade do juiz nos termos do Liberalismo é incompatível com os ideais do Estado Democrático de Direito. Conceber o juiz como um mero aplicador da lei na atualidade provocaria um retrocesso do Direito Processual.
Não é possível atribuir imparcialidade a um magistrado, na medida em que essa qualidade é entendida como a capacidade do julgador de se desprender de suas pré-compreensões. Trata-se de um conceito pragmaticamente inviável, já que o juiz é um ser social como qualquer outro e é influenciado pelo ambiente em que vive e por suas experiências vividas.
Neste passo, constata-se que o resgate do conceito liberal de imparcialidade do juiz não seria cabível. Por outro lado, conforme já se salientou, a defesa da discricionariedade do julgador também não é a solução.
Talvez, o que se poderia defender é a reconstrução do conceito de imparcialidade do juiz, sendo possível e necessária essa releitura conceitual no contexto do Estado Democrático de Direito.
Tomando como marco teórico a Teoria Neoinstitucionalista do Processo, construída sob o enfoque do Estado Democrático de Direito, percebe-se que é possível a reconstrução desse conceito se o processo for entendido como direito-garantia constitucional.
Segundo a Teoria Neoinstitucionalista, a imparcialidade não é um atributo da pessoa do juiz, mas sim um dever imposto pelo ordenamento jurídico. Exige-se que o julgador se abstenha de atuar no processo caso verifique a impossibilidade de promover o devido processo legal, tendo em vista o surgimento de circunstâncias que afetariam o princípio da isonomia.
Diante disso, verifica-se que a questão da imparcialidade do juiz ainda é um assunto que gera um debate acirrado na doutrina. O que se pretendeu neste trabalho foi contribuir para tal discussão doutrinária tão importante para o Direito. Num Estado Democrático de Direito, em que se propõe o asseguramento dos direitos do cidadão através do processo, o estudo da atuação do juiz é fundamental para a efetivação desse paradigma constitucional previsto na Constituição da República de 1988.
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