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Os juros legais na interpretação do Superior Tribunal de Justiça

30/01/2010 às 00:00

Resumo:


  • O artigo 406 do Código Civil de 2002 gera interpretações divergentes sobre os juros legais devidos quando não há estipulação contratual.

  • Uma corrente defende que a taxa de juros legais é de 1% ao mês, enquanto outra corrente argumenta que os juros legais são calculados com base na taxa SELIC.

  • O Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou o entendimento de que a taxa dos juros moratórios prevista no artigo 406 do Código Civil é a SELIC, excluindo a incidência cumulativa de correção monetária.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Após 7 (sete) anos da entrada em vigor do Código Civil de 2002, o artigo 406[01] do aludido diploma legal ainda produz interpretações díspares, no que concerne ao montante devido a título de juros legais[02], quando não houver estipulação contratual a respeito.

A primeira corrente entende que o percentual dos juros legais estabelecido pelo Art. 406 do novel Código Civil é o de 1% (um por cento) ao mês, uma vez que este diploma legal deve ser interpretado em conjunto com o Art. 161, § 1º, do CTN[03]. Para os seguidores dessa idéia, a taxa de 1% ao mês é a que melhor reflete a segurança jurídica e o equilíbrio nas relações obrigacionais, uma vez que para estes, a taxa SELIC não se apresenta como critério transparente ou de fácil compreensão que possa ser aplicável às obrigações civis. Ainda segundo a primeira corrente, seria incoerente que o Código Civil, ao regular a taxa de juros legais - ou seja, aquela aplicável por determinação de lei - deixasse ao encargo da autoridade administrativa (COPOM) a sua fixação. Na esteira dessa orientação, é o Enunciado nº 20, formulado na I Jornada de Direito Civil, organizado pelo Conselho de Justiça Federal[04] e também diversas decisões judiciais, inclusive emanadas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) [05].

Mas há uma segunda corrente, segundo a qual a taxa de juros legais, atualmente, é calculada pela SELIC, tendo em vista que o citado artigo 406, ao remeter à "taxa que estiver em vigor", expressa a opção do legislador em adotar uma taxa de juros variável, que poderá ser modificada de tempos em tempos. Dentre outros fundamentos defendidos por essa segunda corrente, podemos listar os seguintes:

(a) o CTN, em seu Art. 161, § 1º, dispõe que a taxa de juros será de 1%, "se a lei não dispuser de modo diverso", o que caracteriza uma norma supletiva, que pode ser afastada por lei ordinária como a Lei que instituiu o novo Código Civil;

(b) o Art. 13 da Lei 9.065/95, fazendo referência ao art. 84 da Lei 8.981/95, estabeleceu que nos casos de mora no pagamento de tributos arrecadados pela SRF serão acrescidos juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC;

(c) a utilização da taxa SELIC como juros de mora em matéria tributária foi confirmada em outras normas, tais como os Arts. 39, § 4º, da Lei 9.250/95 (repetição ou compensação de tributos), 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02;

(d) o STJ tem aplicado a SELIC em demandas tributárias, não reputando-a inconstitucional;

(e) conforme o entendimento do STF na ADIn 4-DF, a expressão "juros reais" contida no já revogado art. 192, § 3º, da CF, é de eficácia limitada, não havendo que se falar, portanto, em vedação constitucional à previsão de juros superiores a 12% ao ano;

(f) apesar de a SELIC englobar juros moratórios e correção monetária, não se verifica bis in idem, pois sua aplicação é condicionada à não-incidência de quaisquer outros índices de atualização.

Cumpre ressaltar, por relevante, que a ratio subjacente a essa orientação não apenas encontra apoio em autorizado magistério doutrinário[06], como também na mais recente jurisprudência do STJ, o qual, em recente decisão emanada de sua Corte Especial, pacificou o entendimento de que a taxa dos juros moratórios a que se refere o artigo. 406 do Código Civil de 2002 é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (Arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02[07]).

Cumpre enfatizar, a respeito desse aspecto do tema, que a incidência da taxa SELIC a título de juros moratórios, a partir da entrada em vigor do atual Código Civil, em janeiro de 2003, exclui a incidência cumulativa de correção monetária, sob pena de bis in idem[08].

Nessa ampla moldura, se o Código Civil de 2002 se referisse aos juros aplicados em matéria tributária, seria viável o reconhecimento da aplicação da norma do Código Tributário Nacional, conforme entende a primeira corrente, mas, uma vez que o referido artigo 406 refere-se explicitamente à taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional, temos que a aludida norma estabelece, claramente, que esses juros são devidos na forma da chamada taxa SELIC, tal como decidiu a Corte Especial do STJ.


Bibliografia.

DINIZ, Maria Helena. "Código Civil Anotado". 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 311;

FONSECA, Rodrigo Garcia da. "Os juros e o Novo Código Civil", in Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. Ed. Revista dos Tribunais. ano 7. outubro-dezembro de 2004, p. 67-110;

STUBER, Walter Douglas e MONTEIRO, Manoel Ignácio Torres. "A questão dos juros no âmbito do atual Código Civil", in Revista Jurídica Consulex. Ed. Consulex. ano 8. nº 172. 15 de março de 2004, p. 33.


Notas.

Art. 406 do Código Civil de 2002: Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

2. Os juros, bem como a correção monetária, integram o pedido de forma implícita, sendo desnecessária sua menção expressa nas razões apresentadas em juízo, a teor do que dispõe o Art. 293 do CPC.

3. Art. 161 do Código Tributário Nacional: - O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária.

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§ 1º - Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de 1% (um por cento) ao mês.

4. "A taxa de juros remuneratórios a que se refere o art. 406 é a do art. 161, § 1º, do CTN, ou seja, 1% ao mês".

5. "AGRAVO REGIMENTAL. JUROS DE MORA. NOVO CÓDIGO CIVIL. RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE PARTICULARES. INAPLICABILIDADE DA SELIC. PRETENSÃO DE PÓS-QUESTIONAR. INVIABILIDADE.

1. Até a data da entrada em vigor do novo Código Civil, o juros moratórios são regulados pelo artigo 1.062 do Código Beviláqua.

Depois daquela data, aplica-se a taxa prevista no artigo 406 do atual Código Civil, na razão de 1 % ao mês.

2. A taxa SELIC tem aplicação específica a casos previstos em Lei, tais como restituição ou compensação de tributos federais. Não é a ela que se refere o Art. 406 do novo Código Civil, mas ao percentual previsto no Art. 161, § 1º, do CTN.

3. Em recurso especial não se acolhe a pretensão de pós-questionar dispositivos constitucionais".

(AgRg no REsp 727.842/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/12/2007, DJ 14/12/2007 p. 398). (grifou-se).

6. DINIZ, Maria Helena. "Código Civil Anotado". 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 311; FONSECA, Rodrigo Garcia da. "Os juros e o Novo Código Civil", in Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais. Ed. Revista dos Tribunais. ano 7. outubro-dezembro de 2004, p. 67-110; STUBER, Walter Douglas e MONTEIRO, Manoel Ignácio Torres. "A questão dos juros no âmbito do atual Código Civil", in Revista Jurídica Consulex. Ed. Consulex. ano 8. nº 172. 15 de março de 2004, p. 33.

7. EREsp 727842/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 08/09/2008, DJe 20/11/2008.

8. EDcl no REsp 717.433/PR, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 17/11/2009, DJe 24/11/2009.

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Jar e Silva

Advogado em Recife (PE). Membro do escritório Trigueiro Fontes Advogados. Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Eduardo Jar. Os juros legais na interpretação do Superior Tribunal de Justiça. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2404, 30 jan. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14267. Acesso em: 26 dez. 2024.

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