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O problema da modulação "pro futuro" dos efeitos da decisão no controle de constitucionalidade brasileiro

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03/04/2010 às 00:00
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Considerações Finais

I.Conforme desenvolvido ao longo da presente monografia, entendemos pela possibilidade de, em situações excepcionais, os casos pretéritos serem imunizados pelo STF através da modulação ex nunc dos efeitos da decisão em sede de controle de constitucionalidade, isto a despeito de previsão legal ou constitucional. Pois, não há dúvida de que a norma eivada de inconstitucionalidade, tendo produzido alterações nas ordens jurídica e fática, poderá ter acarretado consequências insuscetíveis de reversibilidade.

II.Quanto à modulação pro futuro dos efeitos da decisão constitucional, entendemos pela sua inaplicabilidade em qualquer hipótese, pois tal possibilidade vai na contramão dos princípios norteadores do Estado Constitucional Democrático, que tem por base a supremacia hierárquica da Constituição em relação às demais normas do ordenamento jurídico. Ademais, entendendo-se que a força normativa da Constituição encontra-se na garantia da sanção da invalidade – através de um controle de constitucionalidade efetivo – a ponderação entre a supremacia constitucional e o "princípio da segurança jurídica" e o "excepcional interesse social" (através da fixação pro futuro dos efeitos da decisão constitucional) anuncia um quadro de crise constitucional.

III.Soma-se a estes argumentos o fato de que os métodos de interpretação constitucional usualmente empregados na jurisprudência do Supremo ainda não atingiram graus satisfatórios de clareza e objetividade, pelo que as motivações do Tribunal, em algumas decisões, permanecem obscuras. É dada aos ministros uma ampla margem de atuação, estabelecendo-se um meio propício ao desenvolvimento de voluntarismos.

IV.Ademais, critica-se a postura "estatalista" do Supremo, que, fazendo uso do princípio da proporcionalidade, em algumas decisões, privilegia os "planos políticos" e se omite no seu poder-dever de controle de constitucionalidade das normas. Esta circunstância agrava-se em face da previsão legal da modulação pro futuro dos efeitos da decisão jurisdicional, na medida em que concebe instrumentos formais para que o STF justifique suas decisões políticas.

V.Finalmente, os argumentos utilizados pelo Supremo na modulação pro futuro não convencem. Não há dúvida da necessidade de se atribuir efetividade ao "princípio da segurança jurídica", ao "princípio da continuidade da prestação do serviço público", ao "princípio da continuidade do Estado", ao "acesso à jurisdição",..., todavia, todos estes preceitos devem ser assegurados sob o pálio da Constituição, e não à margem do ordenamento.


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Notas

  1. Monografia final apresentada como requisito parcial para a conclusão do curso de Bacharelado em Direito da Universidade Católica de Pernambuco. Área de Conhecimento: Direito Constitucional. Orientador: Professor Dr. Gustavo Ferreira Santos.
  2. Observa-se, todavia, que a jurisprudência da Suprema Corte já indicava, por ocasião de algumas decisões em controle abstrato de constitucionalidade, posicionamentos minoritários em favor da restrição dos efeitos da declaração de nulidade da norma inconstitucional. Vide votos do ministro relator Maurício Corrêa nas ADIs nº 1.108-1/DF, nº ADI1116/DF e nº 1.102-2; e do ministro relator Leitão de Abreu no RE 79.343/BA.
  3. O referido Recurso Extraordinário reconheceu a inconstitucionalidade dos arts. 45 e 46 da Lei nº. 8.212/91, por violação do art. 146, III, b, da Constituição de 1988, e do parágrafo único do art. 5º do Decreto-lei 1.569/77, em face do § 1º do art. 18 da Constituição de 1967/69. Segundo o entendimento da Corte, as normas relativas à prescrição e à decadência tributárias têm natureza de normas gerais de direito tributário, cuja disciplina é reservada a lei complementar. Além do que, as contribuições, inclusive as previdenciárias, têm natureza tributária e se submetem ao regime jurídico-tributário previsto na Constituição (art. 149 da CF).
  4. Conforme se exemplifica: RE197917/SP;RE266994/SP; RE273844/SP; RE274048/SP; RE274384/SP; RE276546/SP; RE282606/SP; RE199522/SP; RE300343/SP.
  5. Conforme se exemplifica: ADI2240/BA;ADI3316/MT; ADI2240/BA; ADI3489/SC; ADI3682/MT.
  6. ADI3149/SC; ADI2702/PR; ADI458/MA.
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SOUZA, Patrícia Alpes. O problema da modulação "pro futuro" dos efeitos da decisão no controle de constitucionalidade brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2467, 3 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14554. Acesso em: 16 abr. 2024.

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