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Breves considerações sobre o Decreto Legislativo n.º 148, de 12 de março de 2010.

O papel do operador portuário no controle e gerenciamento da água de lastro e sedimentos de navios

12/04/2010 às 00:00
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Em 12 de março do presente ano, entrou em vigor o Decreto Legislativo n.º 148, aprovando o texto da Convenção Internacional para Controle e Gerenciamento da Água de Lastro e Sedimentos de Navios. O objetivo do presente artigo é analisar a norma do ponto de vista do operador portuário, olhos postos nos preceitos basilares do direito ambiental, portuário e sanitário, tudo sob a égide do desenvolvimento sustentável. [01]

Ab initio, faz-se mister esclarecer que água de lastro é aquela captada no mar ou rio, armazenada dentro de tanques próprios, os chamados tanques de lastro, cujo objetivo é garantir às embarcações condições operacionais seguras de estabilidade, manobra, governo e distribuição de tensões no casco do navio.

Esta água é captada no porto em que o navio descarrega sua mercadoria, sendo geralmente trocada ao longo da viagem ou na chegada em um novo porto para carregamento, ocasião em que se realiza o despejo da mesma. E é neste último caso que reside grande preocupação dos ambientalistas, pois milhares de espécies exóticas são transportadas de um porto a outro nos porões destas embarcações, provocando impactos ambientais, econômicos e sociais (na saúde da população das cidades portuárias).

Segundo informações da OSCIP Água de Lastro Brasil (www.aguadelastrobrasil.org.br), especificamente em Paranaguá há a necessidade dos navios operarem lastrados, por questões de estabilidade, navegabilidade e atracação, motivo pelo qual é latente o risco de contaminação das águas desta Baía pela ação de organismos exóticos e patogênicos.

Explorando tal situação, buscar-se-á introduzir e analisar criteriosamente as normas internacionais e pátrias que versam sobre o tema, mormente a Convenção Internacional para o Controle e Gestão de Águas de Lastro e a Norma da Autoridade Marítima para o Gerenciamento da Água de Lastro de Navios (NORMAM-20/DPC).

A Lei n.º 6.938/81 define poluição como "a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: (a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; (b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; (c) afetem desfavoravelmente a biota; (d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e (e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos". Ora, não resta qualquer dúvida que a água de lastro provoca poluição, nos termos desta norma.

O principal objetivo da Convenção Internacional é minimizar a entrada de organismos nocivos durante as operações de troca de água de lastro. Para isso, devem ser evitados tais procedimentos em áreas portuárias onde se conheça vasta existência de organismos nocivos.

Advoga a Convenção, resumidamente, pela troca da água de lastro em águas oceânicas, haja vista que os organismos nocivos costeiros ou portuários dificilmente sobrevivem em mar aberto. Alternativamente, propõe-se a descarga mínima de água de lastro em áreas portuárias ou o descarregamento direto em estações de tratamento de água, em terra.

No mesmo sentido, a Diretoria de Portos e Costas, da Marinha do Brasil, consubstanciada na Lei n.º 9.537/97, já havia editado a Norma da Autoridade Marítima para o Gerenciamento da Água de Lastro de Navios (NORMAM-20/DPC), no que o professor Osvaldo Agripino de Castro Jr. chamaria de "regulação de fardas". [02]

Tal documento permeou o ordenamento jurídico até entrar em vigor a Convenção Internacional e nele se estabeleceu que todos os navios devessem realizar a troca oceânica da água de lastro (a no mínimo 200 milhas da costa ou a 200 metros de profundidade) antes de entrar em qualquer porto pátrio. Ainda, tal procedimento deve ser informado à Capitania dos Portos e ANVISA.

O art. 61 do Decreto n.º 3.179/99, que regulamentou a Lei dos Crimes Ambientais (Lei n.º 9.605/98), facultou ao órgão competente, in casu a Autoridade Marítima, a possibilidade de expedir atos normativos visando disciplinar os procedimentos para aplicação de penalidades administrativas. É o caso da NORMAM-20/DPC), supramencionada. Assim, qualquer violação a esta norma consubstancia-se como infração administrativa ambiental.

Ainda, segundo os arts. 6.º e 19 da Resolução RDC n.º 217, de 21 de novembro de 2001, editada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, toda embarcação deve entregar à Autoridade Sanitária o Formulário de Água de Lastro devidamente preenchido quando da solicitação de Livre Prática.

Por fim, salutar fazer menção à Lei n.º 9966, de 28 de abril de 2000, a qual dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional, em seu art. 5.º, aduz que todo porto organizado, instalação portuária e plataforma, deverão dispor dos meios adequados para o recebimento e tratamento dos diversos tipos de resíduos e para o combate à poluição.

Ainda, a especificação das sanções aplicáveis nos casos de infrações às regras de prevenção, controle e fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outra substâncias nocivas ou perigosas estão regulamentadas no Decreto n.º 4.136, de 20 de fevereiro de 2002.

De acordo com este conjunto normativo, respondem por tais infrações o proprietário do navio, o armador ou operador do navio, o comandante ou tripulante do navio, a pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, que legalmente represente o porto organizado, a instalação portuária, a plataforma e suas instalações de apoio e o proprietário da carga.

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Na atual conjuntura do mundo corporativo, a atividade econômica deve ser pensada em conjunto com o meio ambiente. A função social da empresa está amplamente relacionada com a busca pela perfeita equação entre as interfaces financeiras e ecológicas, sobretudo pelo fato de que o meio ambiente equilibrado é um direito difuso, sendo um dos pilares da ordem econômica segundo o art. 170, VI, da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, cumpre destacar que as empresas responsáveis pelas operações portuárias, concessionárias de serviço público, não têm poder de polícia para agir como sancionadoras pelo descumprimento das normas ambientais no que tange à água de lastro. O exercício de polícia é privativo dos órgãos públicos. Contudo, podem (e devem) auxiliar este controle estatal através de uma atividade material de fiscalização e averiguação.

Outrossim, em se tratando de operações portuárias em seus berços, as empresas podem adotar sistemática de conferência da documentação pertinente ao gerenciamento da água de lastro pelas embarcações, informando as autoridades responsáveis acerca de qualquer descumprimento das normas.

Essa ação preventiva, transparente e eficaz, praticamente imperceptível do ponto de vista econômico e operacional, visa à observância dos dispositivos supracitados, através da execução de um procedimento básico, e tem por meta final a proteção e o equilíbrio do meio ambiente marinho. Ademais, a adoção de uma política de gestão ambiental é diferencial estratégico que permite a uma empresa se destoar das outras, gerando um maior potencial competitivo.

Por isso advoga-se que a responsabilidade ambiental objetiva termina a partir do momento em que os operadores portuários agem com consciência ambiental, de forma que o papel destes no que tange às normas ambientais acerca da água de lastro é o de promover o cumprimento de tais dispositivos, adotando práticas preventivas.

Contudo, não se pode exigir demais do operador portuário. Deve-se ter em mente que o tratamento da água de lastro, proposição da Convenção Internacional de da Lei n.º 9966, por exemplo, é excelente iniciativa, porém dependente da ação conjunta da iniciativa privada, aqui inclusas, principalmente, as empresas da navegação, e do poder público, até mesmo porque a implantação desse sistema ensejaria elevados custos de transação.

Importante que o Estado, guardião das normas ambientais, invista em estudos técnicos, capacitação de pessoal e no efetivo monitoramento das águas costeiras. Não se pode simplesmente transferir para o particular tais obrigações. O art. 174 da Constituição Federal de 1988 é claro na concepção de que "como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento (...)".

Questões relacionadas ao meio ambiente, urbanismo, saúde e segurança coletiva, por exemplo, representam o que ouso denominar de "custos sociais da atividade portuária" [03], fardo que deve ser suportado por todos os sujeitos de direito que atuam nesta área, seja o agente regulador, a autoridade portuária [04], os entes federativos, a capitania dos portos, o prestador de serviço público e os agentes econômicos da iniciativa privada.

Na seara ambiental, por exemplo, interessante destacar os ensinamentos de Solange Teles da Silva:

A participação de todos os atores envolvidos é fundamental para que o zoneamento ambiental alcance seus objetivos, quais sejam, o ordenamento territorial buscando ações de curto e longo prazos adaptadas as peculiaridades das diferentes zonas e compatibilizando a proteção ambiental e o desenvolvimento socioeconômico. Apenas um zoneamento democrático e participativo permite construir um diálogo entre todos os atores sociais em busca de compromissos para uma gestão integrada do meio ambiente que possibilite um desenvolvimento sustentável. [05]

Diante de todo o exposto, conclui-se que a Convenção Internacional, recepcionada pelo ordenamento jurídico pátrio, bem como toda a legislação mencionada no presente artigo, são teoricamente completas no que tange ao controle e gerenciamento da água de lastro e sedimentos de navios. Contudo, antes do monitoramento e fiscalização do cumprimento das normas, com eventual responsabilização inclusive dos operadores portuários, é necessário que sejam adotadas ações corretivas, para recuperar as áreas portuárias que já se encontram degradadas, e preventivas, envolvendo todos os sujeitos de direito atuantes na atividade portuária, nos termos supra aduzidos.

Nesse sentido, o operador portuário é somente um dos agentes que deve atuar de forma preventiva não só com relação a procedimentos atinentes à água de lastro, mas em outras vertentes, pois a atividade portuária resulta em grande rol de impactos ambientais. Os "custos sociais da atividade portuária" devem ser suportados por todos os agentes atuantes, públicos ou privados. Para isso, fundamental a ação de um Estado cooperativo em conjunto com a iniciativa privada, buscando o bem público. [06]


Notas

  1. "(...) o Direito Sanitário e o Direito Portuário, sem dúvida, estão em profundo relacionamento a serviço da Saúde Pública e da qualidade do meio ambiente nos Portos!" (PASOLD, Cesar Luiz. Lições preliminares de Direito Portuário. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007. p. 32).
  2. Com propriedade, o Dr. Osvaldo Agripino de Castro Junior ressaltou os problemas regulatórios do setor portuário em palestra proferida no "Seminário de Defesa da Concorrência e Regulação Econômica nos Transportes e Portos", promovido pela UNIVALI, em parceria com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), no dia 30 de março de 2010.
  3. Pretendo trabalhar a idéia de "custos sociais da atividade portuária" com maior afinco em artigo próprio, sendo o presente estudo tão somente uma gênese deste novo conceito, por envolver a questão ambiental
  4. "(...) O legislador brasileiro, provavelmente premido pela necessidade de aprovação urgente da lei, ou porque o país não estava ainda preparado para a importação plena daquele sistema, criou um modelo sui generis que preferimos chamar de Port Authority bipartido. Nele, a Autoridade Portuária brasileira é exercida em conjunto pelo CAP e pela Administração do Porto (ou entidade administradora do porto, que pode ser federal, ou concessão pública estadual, pública municipal ou privada). COLLYER, Wesley O. A autoridade portuária brasileira. In: CASTRO JNIOR, Osvaldo Agripino de; PASOLD, Cesar Luiz (Coord.). Direito Portuário, regulação e desenvolvimento. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 102.
  5. SILVA, Solange Teles da. Zoneamento ambiental, instrumento de gestão integrada do meio ambiente. In ROCHA, João Carlos de Carvalho; HENRIQUES FILHO, Tarcísio Humberto Parreiras; CAZETTA, Ubiratan (Orgs.) Política Nacional do Meio Ambiente – 25 anos da Lei 6.938/81. Belo Horizonte: ANPR, Del Rey, 2007. p. 171.
  6. Nesse sentido, fundamental trazer à baila a idéia de governança pública como sendo "uma nova geração de reformas administrativas e de Estado, que têm como objeto a ação conjunta levada a efeito de forma eficaz, transparente e compartilhada, pelo Estado, pelas empresas e pela sociedade civil, visando uma solução inovadora dos problemas sociais e criando possibilidades e chances de um desenvolvimento futuro sustentável para todos os participantes." (LÖFFLER, Elke apud KISSLER, Leo; HEIDEMANN, Francisco G. Governança Pública: novo modelo regulatório para as relações entre Estado, mercado e sociedade? In Revista de Administração Pública. vol. 40, n. 3. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, Maio/Junho 2006).
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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

. Breves considerações sobre o Decreto Legislativo n.º 148, de 12 de março de 2010.: O papel do operador portuário no controle e gerenciamento da água de lastro e sedimentos de navios. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2476, 12 abr. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14670. Acesso em: 25 nov. 2024.

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