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Evolução histórica do controle de constitucionalidade nas Constituições brasileiras

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08/05/2010 às 00:00
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8. Constituição de 1988 – "Constituição Cidadã":

Por fim, foi com a Constituição cidadã, na denominação conferida à Lei Fundamental de 1988 pelo Deputado Federal Ulisses Guimarães, que, muito embora mantido modelo misto (concreto e abstrato) de controle da constitucionalidade, o dito controle abstrato/concentrado ganhou força, superando definitivamente o controle concreto/difuso.

Tal fenômeno se deve (em breve resumo) principalmente à considerável ampliação dos legitimados ativos à propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade (art. 103, CF/88); à criação da Ação Declaratória de Constitucionalidade por meio da Emenda Constitucional nº 3/1993 (art. 102, I, "a", CF/88); da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (art. 103, § 2º, CF/88); bem como, e por fim, através do desenvolvimento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (art. 102, § 1º, introduzido na CF/88 pela Emenda Constitucional nº 3/1993) que preencheu as lacunas existentes no modelo concentrado, permitindo a análise direta pelo Supremo Tribunal Federal de questões que antes somente poderiam ser discutidas por meio de Recursos Extraordinários, como a inconstitucionalidade de normas pré-constitucionais, controvérsia constitucional sobre normas já revogadas e a inconstitucionalidade de norma municipal em face da Constituição Federal.

Assim, fácil observar que o controle concentrado, antes de iniciativa exclusiva do Procurador-Geral da República e restrito à declaração de inconstitucionalidade de normas estaduais e federais vigentes ao momento da propositura da demanda, foi enormemente ampliado com o advento da atual Lei Fundamental, alterada pelas Emendas Constitucionais nº 3/1993 e nº 45/2004.

Hodiernamente, pode-se dizer, o controle de constitucionalidade "trivial" é o controle concentrado ou abstrato, de competência da nossa Corte Constitucional – que acumula também a função de última instância recursal do nosso país –, de caráter objetivo e que, por isso, possui eficácia erga omnes e efeito vinculante, sem a necessidade de suspensão da eficácia da norma pelo Senado, consoante art. 52, X, da CF/88.

Eis o que dispõe a legislação que rege o tema:

Lei 9.868/99

, que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

(...)

Art. 28. Dentro do prazo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do acórdão.

Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, tem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal. (grifos nossos)

Lei 9.882/99, que Dispõe sobre o processo e julgamento da argüição de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do § 1º do art. 102 da Constituição Federal.

(...)

Art. 10. Julgada a ação, far-se-á comunicação às autoridades ou órgãos responsáveis pela prática dos atos questionados, fixando-se as condições e o modo de interpretação e aplicação do preceito fundamental.

(...)

§ 3º A decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público. (grifos nossos)

A título meramente ilustrativo impende registrar o posicionamento do STF acerca da necessidade ou não de publicação, por meio de resolução senatorial, de decisões de caráter objetivo para que a mesma possa vir a ter eficácia contra todos:

Assim, independentemente da preclusão maior, lançou-se ao mundo jurídico a determinação de que fosse comunicado o Legislativo municipal sobre a inconstitucionalidade declarada. Ora, tal decisão conflita com a ordem natural das coisas e, mais do que isso, com o preceito do artigo 52, inciso X, da Constituição Federal, de observância obrigatória nos Estados federados, por encerrar verdadeiro princípio, segundo o qual, enquanto não fulminada em definitivo a lei, ante a pecha de inconstitucional, continua ela sendo de observância obrigatória.

(...)

Tratando-se de hipótese em que a competência para julgar originariamente a representação de inconstitucionalidade é do Tribunal de Justiça, não cabe a comunicação à Casa Legislativa. Esse é o sistema que decorre da Carta Federal. Declarada a inconstitucionalidade de ato normativo no abstrato, em processo objetivo e não subjetivo, a decisão irradia-se. Vale dizer que fulminada fica a lei, não cabendo providência voltada à suspensão

. (RE 199.293, voto do Min. Marco Aurélio, julgamento em 19-5-04, DJ de 6-8-04) (grifos nossos)

Vê-se, desse modo, que a análise da norma sob bases abstratas, tem o condão de, declarada sua inconstitucionalidade, retirá-la do ordenamento, independentemente da intervenção de um outro Poder.

Eis o panorama da grande inovação operada pela Constituição de 1988 no campo do controle da constitucionalidade das leis: a elevação do controle abstrato/concentrado ao degrau mais alto do sistema ambivalente adotado pelo Ordenamento Jurídico brasileiro.


Notas

  1. Princípio da Supremacia da Constituição. A esse propósito, ver: SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, 23ª Ed, p. 46.
  2. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, 23ª Ed, p. 42.
  3. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003, 7ª Ed, p. 215-216.
  4. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2004, 14ª Ed., p. 296-297.
  5. MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocência Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2008, 2ª Ed, p. 1034.
  6. MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO, Inocência Mártires, BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Op. Cit., p. 1035.
  7. "Art 179 - Só por maioria absoluta de votos da totalidade dos seus Juízes, poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato do Poder Público."
  8. "Art 91 - Compete ao Senado Federal: (...) IV - suspender a execução, no todo ou em parte, de qualquer lei ou ato, deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo Poder Judiciário."
  9. "Art 12 - A União não intervirá em negócios peculiares aos Estados, salvo: (...)  V - para assegurar a observância dos princípios constitucionais especificados nas letras a a h , do art. 7º, nº I, e a execução das leis federais; (...)§ 2º - Ocorrendo o primeiro caso do nº V, a intervenção só se efetuará depois que a Corte Suprema, mediante provocação do Procurador-Geral da República, tomar conhecimento da lei que a tenha decretado e lhe declarar a constitucionalidade."
  10. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2004, 14ª Ed., p. 367.
  11. MENDES, Gilmar Ferreira ET AL., Op Cit, p. 1044.
  12. - Defendendo o Poder-Dever, ou seja, a obrigatoriedade de apresentação da Representação de Inconstitucionalidade pelo Procurador-Geral da República: Pontes de Miranda, Josaphat Marinho, Caio Mário da Silva Pereira, Themístocles Cavalcanti e Adaucto Lúcio Cardoso.

Defendendo o Direito, ou seja, a faculdade de apresentação da Representação de Inconstitucionalidade pelo Procurador-Geral da República: Celso Agrícola Barbi, José Carlos Babosa Moreira, José Luiz Anhaia Mello, Sérgo Ferraz e Raimundo Faoro.

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Dados extraídos de: MENDES, Gilmar Ferreira ET AL., Op Cit, p. 1045 e 1046.

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Sobre o autor
Filipo Bruno Silva Amorim

Procurador Federal, atualmente exercendo o cargo de Vice-Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União. Bacharel em Direito pela UFRN. Especialista em Direito Constitucional pela UNISUL. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AMORIM, Filipo Bruno Silva. Evolução histórica do controle de constitucionalidade nas Constituições brasileiras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2502, 8 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14815. Acesso em: 5 mai. 2024.

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