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O sistema de registro de preços e o carona

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14/05/2010 às 00:00
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5. DOS PROCEDIMENTOS DO SISTEMA

A par das críticas traçadas até então, faz-se necessário compreender o funcionamento do Sistema de Registro de Preços, para que consigamos ao final separar o joio do trigo.

O Conselheiro Antônio Roque Citadini assim definiu o Sistema:

"O Registro de Preços constitui-se num meio operacional para a realização de compras de materiais, gêneros e equipamentos de uso comum, o qual se concretiza mediante prévio certame licitatório, visando obter os melhores preços e condições para a Administração."8

Ivan Barbosa Rigolin e Marco Tullio Bottino trataram o tema desta forma:

"Registro de Preços significa a licitação não para compras imediatas, mas para eleição de cotações vencedoras, que, ao longo do prazo máximo de validade do certame podem ensejar, ou não, contratos de compras."9

O Jurista J. U. Jacoby Fernandes, conceituou:

"Sistema de Registro de Preços é um procedimento especial de licitação que se efetiva por meio de uma concorrência ou pregão sui generis, selecionando a proposta mais vantajosa, com observância do princípio da isonomia, para eventual e futura contratação pela Administração." 10

Em face dos diversos conceitos, podemos concluir que, o Sistema de Registro de Preços é um procedimento administrativo suplementar de contratação, levado a efeito por meio do procedimento administrativo de licitação, exclusivamente, sob as modalidades de concorrência e pregão, visando a escolha do fornecedor de bens ou serviços que ofereça à Administração o menor preço unitário, com vistas a registro, para eventual e futura contratação.

Apesar de sabido e consabido, ressai desses conceitos, que o Sistema de Registro de Preços não se confunde com a licitação por meio da qual se realiza, assim sendo, SRP não é uma modalidade de licitação, convite, tomada de preços, concorrência, pregão, concurso, leilão, consulta, tampouco um tipo de licitação, menor preço, melhor técnica, melhor técnica e preço ou melhor oferta ou lance, parece óbvio, mas necessário deixar assentado isto, em vista dos equívocos cometidos.

O decreto traz em seu artigo 1º, algumas definições importantes na compreensão do Sistema:

Art. 1º As contratações de serviços e a aquisição de bens, quando efetuadas pelo Sistema de Registro de Preços, no âmbito da Administração Federal direta, autárquica e fundacional, fundos especiais, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas, direta ou indiretamente pela União, obedecerão ao disposto neste Decreto.

Parágrafo único. Para os efeitos deste Decreto, são adotadas as seguintes definições:

I - Sistema de Registro de Preços - SRP - conjunto de procedimentos para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras;

II - Ata de Registro de Preços - documento vinculativo, obrigacional, com característica de compromisso para futura contratação, onde se registram os preços, fornecedores, órgãos participantes e condições a serem praticadas, conforme as disposições contidas no instrumento convocatório e propostas apresentadas;

III - Órgão Gerenciador - órgão ou entidade da Administração Pública responsável pela condução do conjunto de procedimentos do certame para registro de preços e gerenciamento da Ata de Registro de Preços dele decorrente; e

IV - Órgão Participante - órgão ou entidade que participa dos procedimentos iniciais do SRP e integra a Ata de Registro de Preços.

A diferença entre a licitação convencional e aquela destinada a atender o SRP reside, em um primeiro momento, nos procedimentos contidos na fase interna da licitação, onde o Decreto define alguns passos necessários a serem seguidos pelo órgão gerenciador, artigo 3º, parágrafo 4º, e posteriormente, depois de terminada a licitação, nos procedimentos que visam ao gerenciamento da Ata de Registro de Preços.

A utilização do Sistema, deve se dar preferencialmente, quando, do objeto a ser licitado houver a necessidade de contratações freqüentes, for mais conveniente à aquisição de bens com entregas parceladas, quando a compra de um bem ou serviço for para atender mais de um órgão ou entidade ou pela natureza do objeto não for possível definir o quantitativo demandado.

As vantagens apontadas para a Administração com a adoção do Sistema, são as seguintes: redução do número de licitações; celeridade no processo de aquisição; redução do volume de estoque e do espaço físico utilizado para a guarda; somente a compra das quantidades necessárias, evitando o desperdício; o fato de atender outras unidades e não só a licitadora e a desnecessidade de reserva orçamentária.

Quanto a não necessidade de reserva orçamentária, há que se deixar claro, que somente o "bloqueio" orçamentário não será realizado, sendo necessária, todavia, a indicação no Edital, da fonte, do elemento de despesa e do programa de trabalho por onde correrá a despesa, se esta vier a ser concretizada. Tal exigência, tem cabimento pelo fato do SRP ser efetivado por meio de procedimento de licitação, e a Lei de Licitações exige, explicitamente, tanto para obras e serviços como para compras, a indicação dos recursos orçamentários pelo qual correrá a despesa, art. 7º, parágrafo 2º, inciso III, combinado com o artigo 14, combinado com o artigo 40, inciso XVII, da Lei Federal 8666/93. Além do mais, ter ciência que a eventual despesa tem fulcro na Lei Orçamentária é uma garantia do licitante, e, é um dever do Administrador fundamentar suas ações, para afastar qualquer conotação de temeridade.

O Decreto traz ainda, em seu texto, algumas características especializantes do Sistema de Preços, como; a não obrigatoriedade de a Administração contratar, o direito de preferência para o fornecedor que tem os seus preços registrados, caso os preços se apresentem superiores àqueles praticados no mercado; a possibilidade de renegociação da Ata de Registro, por razões supervenientes à licitação e a possibilidade de cancelamento do Registro.


6. A "Grande inovação" do carona

Órgão não participante, carona, terceiro, extra-ata, são os apelidos que vêm recebendo aquele órgão ou entidade que mesmo não tendo procedido a uma licitação, se beneficia da licitação feita por outro órgão ou entidade, por meio da utilização por empréstimo da Ata de Registro de Preços, o fundamento de tal procedimento encontra-se no artigo 8º do Decreto nº. 3.931/01, que dispõe expressamente:

Art. 8º A Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser utilizada por qualquer órgão ou entidade da Administração que não tenha participado do certame licitatório, mediante prévia consulta ao órgão gerenciador, desde que devidamente comprovada a vantagem.

§ 1º Os órgãos e entidades que não participaram do registro de preços, quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a serem praticados, obedecida a ordem de classificação.

§ 2º Caberá ao fornecedor beneficiário da Ata de Registro de Preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela aceitação ou não do fornecimento, independentemente dos quantitativos registrados em Ata, desde que este fornecimento não prejudique as obrigações anteriormente assumidas.

§ 3º As aquisições ou contratações adicionais a que se refere este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços.

Nas palavras do festejado J.U.Jacoby Fernandes:

"O carona no processo de licitação é um órgão que antes de proceder à contratação direta sem licitação ou a licitação verifica já possuir, em outro órgão público, da mesma esfera ou de outra, o produto desejado em condições de vantagem de oferta sobre o mercado já comprovadas. Permite-se ao carona que diante da prévia licitação do objeto semelhante por outros órgãos, com acatamento das mesmas regras que aplicaria em seu procedimento, reduzir os custos operacionais de uma ação seletiva." 11

Assim, o procedimento para ser carona dá-se da seguinte forma: após o órgão gerenciador ter realizado todos os atos da licitação, formalizado uma Ata de Registro de Preços com a aquiescência do fornecedor; o órgão que desejar se utilizar da ata, em vista de ter a mesma demanda pelo objeto licitado do órgão gerenciador, consulta o órgão licitador sobre a possibilidade de fazer uso da ata. Sendo autorizado, o carona adquire diretamente, sem licitação, o objeto do fornecedor registrado.

Há alguns passos previstos no decreto, a serem seguidos pelo carona, para que órgão gerenciador autorize a utilização da Ata Registrada, são eles: prévia consulta ao gerenciador sobre a possibilidade de fazer uso da Ata; obediência a ordem de classificação da licitação, aceitação pelo fornecedor da contratação pretendida; limitação da contratação a cem por cento dos quantitativos registrados.

Ressalte-se que o carona, deverá ainda, demonstrar a vantajosidade de aderir à Ata em vez de proceder a licitação, ou seja, deve mostrar que os preços da Ata registrada são melhores do que os preços que ele obteria no mercado fazendo a licitação.

Outro ponto a ser destacado, embora não conste do regulamento, é que na contratação, devem ser mantidas as condições da Ata Registrada, o carona adere à integralidade da Ata, não cabendo a ele qualquer renegociação das condições registradas, caso haja renegociação, esta deve partir do órgão gerenciador e não do órgão aderente.

Insistindo, a titulo explicativo, digamos, que determinada prefeitura da região Norte do país (A), intente adquirir pneus para sua frota de veículos. Para tal, processa licitação sob a modalidade pregão, com vistas a Registro de Preços, estima o quantitativo em 1.000 (mil) unidades, depois de realizado o procedimento licitatório, firma Ata de Registro de Preços com o fornecedor (B), que se compromete à entrega do objeto. Outra prefeitura, agora da região Sul (C), tendo a mesma demanda, verifica que a Prefeitura (A), tem uma Ata registrada que atende suas necessidades. Depois de demonstrada a vantajosidade, faz a necessária consulta ao órgão gerenciador (A), o gerente da Ata, indica e consulta o fornecedor (B) para verificar se ele tem interesse nessa nova contratação e caso, seja realizada, se não prejudicará o cumprimento das obrigações previstas na Ata, desfavorecendo o órgão gerente, não havendo problemas, o carona assume a Ata como sua, aderindo a todas as condições estabelecidas, e adquire pneus diretamente, sem licitação, frise-se, com o fornecedor (B) até o limite de 1.000(mil) unidades.


7. Os princípios jurídicos atingidos pelo carona

Os princípios são normas jurídicas que servem como alicerce ao arcabouço do ordenamento jurídico, vinculam, obrigam; não são meras pautas axiológicas orientadoras, que oportunizaria o seu cumprimento ou não. Princípio é norma, e como tal, deve ser cumprido, a inobservância de um princípio é mais grave do que o descumprimento de uma lei, porque descumprindo um princípio se atinge o sistema normativo, abala o sistema, e não apenas a regra que veicula a norma.

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Sem nos aprofundarmos na Teoria dos Princípios, uma vez que tal escaparia às finalidades do presente opúsculo, trazemos a cola o ensinamento do preclaro Celso Antônio Bandeira de Mello:

"Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio violado, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra." 12

Arrolaremos, alguns princípios que consideramos violados com a inclusão do carona no sistema de contratações públicas.

O primeiro princípio, e talvez a mais nítida violação, é o da legalidade. A forma de o Estado contratar é toda vinculada, seja adquirindo coisas (licitação), ou selecionando pessoas (concurso público), o legislador se preocupou em traçar previamente os procedimentos para contratação, valorizando a segurança jurídica, com vistas a afastar os apadrinhamentos e a pessoalidade do seio da Administração. Registre-se que a legalidade a que se sujeita o Administrador Público é especial, a lei deve ser a guia do administrador, na dúvida, o administrador deve sempre aplicar a lei. A lei de licitações, em momento algum, faz sequer menção ao carona, então, não poderia vir o Decreto e criar o procedimento à revelia da Lei.

O carona fere o princípio da licitação obrigatória, consagrado no art. 37, inciso XXI, da Constituição da República. Licitar é a regra para a Administração contratar, as exceções ao dever de licitar devem estar previstas em Lei, são os casos de dispensa e inexigibilidade, previstos respectivamente, nos artigos 24 e 25 da Lei de Licitações, o carona é, a nosso juízo, forma de contratação direta sem previsão legal. Importa, além, o Decreto ao instituir o carona afronta o artigo 2º da Lei Federal nº. 8666/93, que traz o seguinte comando:

Art. 2º As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei.(grifei).

Trata-se tal dispositivo de norma geral, norma nacional, de observância obrigatória pelos demais entes da Federação, não admitindo regulação em contrário.

Outro princípio afetado pelo aderente em Ata de Registro, é o da vinculação ao Edital, o ato convocatório é a regra nuclear do procedimento licitatório, o saudoso Hely Lopes Meirelles já dizia que o Edital é a lei interna da licitação, pois vincularia tanto a Administração como os licitantes aos seus termos. Toda contratação decorrente de adesão à Ata de Registro de Preços, afeta o ato convocatório, pois, não estava prevista nem estimada no Edital, sendo portanto, contratação excedente, a qual não foi dada a devida publicidade. A rigor, os contratos administrativos devem guardar liame com o procedimento de licitação que o originou, nos termos da previsão contida no artigo 54, parágrafo 4º, da Lei Federal nº. 8666/93.

Vale a menção ao Eminente Administrativista Catarinense Joel de Menezes Niebuhr que de forma vanguardeira, em 2005, alertava sobre as ilegalidades do carona, e comentando este princípio enfatizava que:

"O carona viola abertamente o princípio da vinculação ao edital porquanto ele dá azo à contratação não prevista no edital. Ora, licita-se dado objeto, com quantidade definida e para uma entidade determinada, tudo em conformidade com o edital. Quem ganha a licitação firma com a entidade que promoveu a licitação ata de registro de preços, pelo que se compromete a entregar ou prestar a ela o que fora o objeto da licitação, conforme o edital, inclusive no que tange aos quantitativos. Durante a vigência da ata de registro de preços, outra entidade que não a promotora da licitação, que não foi referida sequer obliquamente no edital, adere à ata de registro de preços, através do carona, com o propósito de receber os préstimos do vencedor da licitação. Com efeito, o contrato que decorre do carona não foi previsto no edital. Quem participou da licitação não sabia que seria contratado também por esta outra entidade, que não a promotora da licitação. Ademais, com o carona, quem adere à ata de registro de preços, pode requerer para si a mesma quantidade do que fora licitado. Então, se a licitação envolvia cem unidades, com o carona de apenas uma outra entidade, o vencedor da licitação pode ser contratado para duzentas unidades.

Isso afronta com veemência o princípio da vinculação ao edital, na medida em que quem participou de licitação para fornecer cem unidades de dado objeto não pode acabar sendo contratado para fornecer duzentas. Se fosse para fornecer duzentas unidades, o edital que tratasse disso e comunicasse a todos os interessados que da licitação decorreria contrato para duzentas unidades e não apenas para cem.

E a afronta ao princípio da vinculação ao edital não se restringe à questão dos quantitativos estabelecidos no edital. Também há afronta ao princípio porque a licitação é feita para uma entidade específica, referida expressamente no edital, e o vencedor da licitação pode acabar sendo contratado por outra entidade, não indicada no edital. Ou seja, licitante participa de certame para ser contratado por "A" e, em razão dele, acaba sendo contratado também por "B", "C" e tantos quanto aderirem à ata de registro de preços de "A".

Em síntese, o carona importa contratação apartada das condições do edital, sobretudo no tocante à entidade contratante e aos quantitativos estabelecidos no edital. Nesses termos, o carona fere de morte o princípio da vinculação ao edital, dado que dele decorre a assinatura de ata de registro de preços e contratação fora do preceituado e previsto no edital de licitação pública." 13

O carona afeta, também, o princípio da isonomia, porque a licitação visa à escolha da proposta mais vantajosa, e oferecer tratamento igual àqueles que estão em uma mesma condição jurídica, ou seja, capazes de contratar com a Administração Pública. O Estado é um grande agente econômico e suas contratações trazem benefícios econômicos para os particulares contratados. Assim, todos aqueles, particulares, que estão em condições de contratar com o Estado, tem o direito à licitação, a serem tratados com igualdade, afinal, ostentam o mesmo status jurídico.

A impessoalidade que deve pautar a Administração Pública é atingida, na medida em que as reutilizações de determinada Ata de Registro de Preços concede ao fornecedor vencedor de uma única licitação, a possibilidade de vendas e contratações infinitas, caracterizando um tratamento odiosamente benéfico, sem a necessária e correspondente causa. Afinal, impessoalidade é tida também como imparcialidade, que condiciona a atuação administrativa em prol do interesse público.

O princípio da moralidade, consignado no caput do art. 37, da Constituição da República, que vem a ser os padrões éticos e morais reputados pelo grupo social como importantes em determinada época, é atingido pelo carona. Por conta deste princípio, a atuação do Administrador não pode contrariar, além da lei, a moral, os bons costumes, a honestidade, os deveres da boa administração.

Joel de Menezes Niebuhr afirma que:

"Nas licitações públicas e contratos administrativos, os princípios da moralidade e, de certa forma, da impessoalidade, são bastante abrangentes, opondo-se, por exemplo, a contratos superfaturados, ao direcionamento da contratação mesmo que indiretamente, à contratação com pessoas ligadas à Administração Pública, ao tráfico de influência, ao favorecimento de contratados, etc.

O carona no mínimo, expõe os princípios da moralidade e da impessoalidade a risco excessivo e despropositado, abrindo as portas da Administração a todo tipo de lobby, tráfico de influência e favorecimento pessoal." 14

Dessa forma, o carona por menor que seja o volume da contratação em que adere, expõe a Administração aos riscos da pessoalidade e da imoralidade, na contramão da impessoalidade e da moralidade que devem pautar sua conduta.

O carona pode afetar também, o princípio da livre concorrência, contemplado no artigo 170, inciso IV da Constituição Federal, na dose em que o favorecimento dirigido a determinado fornecedor, pode em alguns contratos, representar a quebra da relação de competitividade que deve existir no mercado na busca pela clientela. A interferência do Estado, agente econômico, pode trazer desigualdade no equilíbrio de forças entre os concorrentes do mercado relevante considerado. Afinal, garantir a livre concorrência é, sobretudo, privilegiar a igualdade e a competição na busca pelas melhores condições de ofertas e de compras.

Deve-se observar ainda, algumas outras irregularidades acerca do carona, como a perda de receita tributária pelo Estado, caso, a adesão torne-se rotina. Vejamos o exemplo do ICMS. Como se sabe o Estado não é contribuinte desse imposto, e assim, não procede à compensação tributária. Portanto, e no caso de um órgão do Estado aderir a uma Ata Registrada em outro Ente da Federação, irá arcar com a integralidade do valor do imposto, embutido no preço do produto, nos termos do art. 13, § 1º, inciso I da Lei Complementar nº 87/96, por conta da repercussão econômica, típica de impostos indiretos, e este valor, será incorporado como receita direta pelo Estado, do qual faz parte o fornecedor favorecido. Assim, a compra direta de bens e serviços realizada com fornecedores de outras entidades da Federação, significa perda de receita para Estado que se utiliza do sistema do carona. Pode parecer irrelevante, mas não é, tudo dependerá do volume de contratações efetuadas por meio do carona.

Há que se ressalvar, que o Convênio celebrado no âmbito do CONFAZ 15 ICMS 26/03, autoriza os Estados e o Distrito Federal a conceder isenção de ICMS nas operações ou prestações internas, relativas à aquisição de bens, mercadorias ou serviços por órgãos da Administração Pública Estadual Direta, suas Fundações e Autarquias, contudo, trata apenas de uma autorização e não de uma obrigação, sendo assim, nem todos os Estados detêm normatização a respeito. No Estado do Rio de Janeiro vigora a Resolução SER nº. 047, de 24 de Setembro de 2003, que estabelece normas para a concessão da isenção do imposto, conforme previsto no Convênio ICMS 26/03.

Revele-se outra irregularidade na adoção do carona, que provém da possibilidade de o caroneiro escolher a marca do bem que pretende adquirir, sem que para isso apresente qualquer justificativa: basta que apresentada a demanda pelo bem X, com a especificação Y, passe a procurar nas diversas licitações de Registro de Preços realizadas pelo Brasil afora, uma Ata que tenha registrado o bem XY. Verifique que essa pesquisa é extremamente fácil, nos dias de hoje, com os recursos da tecnologia da informação e com diversos sites na rede mundial de computadores que anunciam Atas de Registro de Preços. Marque-se que a Lei de Licitações veda expressamente a escolha de marca, sem que haja uma justificativa técnica plausível, artigo 7º, parágrafo 5º.

Podemos ainda, apontar que a prática do carona caracteriza-se como uma espécie de delegação do dever de licitar, afetando a autonomia administrativa do ente que se propõe a pegar carona, porque em vez de proceder a licitação com seus meios, a entidade utiliza-se do procedimento administrativo praticado por outro ente, deixando de efetuar em sua repartição a obrigatória licitação. Cabe ressaltar, nesse aspecto, que a Lei de Licitações determina que as licitações sejam realizadas no local onde se situar a repartição interessada, artigo 20, caput.

O Principio da Eficiência, aliado ao aspecto da celeridade, vem sendo apontado como fundamento para o uso do carona por parte dos órgãos da Administração Pública. Argumenta-se que o tempo gasto na contratação via licitação convencional torna-se longo em vista das necessidades administrativas, e que, com o carona, este tempo é diminuído. Contudo, tais deduções não merecem guarida, pois a eficiência não pode ser o fim último da Administração Pública, e, pode muito menos, postar os demais princípios constitucionais de joelhos em favor desta dita celeridade.

Como elegantemente sintetiza Joel de Menezes Niebuhr:

"Ainda, relativamente ao princípio da eficiência, é de bom alvitre advertir que ele não serve de justificativa para a desobediência à legalidade e aos demais princípios da licitação pública, entre os quais, merece menção especial, o da igualdade. Deve-se lograr eficiência em consonância aos demais princípios, sem que um exclua outro." 16

E sobre o tema, continua em outra obra:

"A percepção isolada e absoluta do princípio da eficiência é extremamente perigosa. Precisa-se reconhecer a variedade de discursos que se espraiam pelo debate político e jurídico, cuja remissão à eficiência não passa de um recurso a flexibilizar e enfraquecer o regime jurídico-administrativo." 17

Ademais, a Administração obriga-se a pautar todos os seus atos em busca da eficiência, pois esta, não se trata de algo novo, e deve estar na essência do serviço público.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTANA, Luiz Claudio. O sistema de registro de preços e o carona. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2508, 14 mai. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/14847. Acesso em: 2 nov. 2024.

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