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Direito e marxismo

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12/06/2010 às 00:00
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Na ciência, tal como na vida, ainda está muito em moda mudar-se o nome das ruas em vez de se trocarem as pedras, ou pintar de vermelho as paredes velhas que estão caindo em vez de reconstruí-las.

Petr Ivanovich Stucka

Introdução

O objetivo deste trabalho é apresentar uma crítica à visão marxista do direito, apresentando-o a partir de uma análise teórica materialista, como fruto das relações sociais e não como mera produção estatal. Pretende mostrar também a complexidade de apreensão do fenômeno jurídico, apresentando seu caráter múltiplo, que só pode ser apreendido a partir de uma visão dialética da realidade. Apresento a ideia de que ele tem um papel estruturador e orientador destas relações sociais, sendo um instrumento que teve um papel importante na ascensão da burguesia ao poder. Os marxistas devem se apropriar desse instrumento para seus objetivos táticos e estratégicos, utilizando o manancial teórico marxista para transformar o direito, rompendo com o positivismo jurídico e aproximando-o da realidade social e tornando-o um instrumento capaz de apreender toda a complexidade da produção e reprodução dos seres humanos organizados em sociedade.


A visão marxista do direito

A visão mais difundida no meio marxista acerca do direito é a que – por ser ele parte da superestrutura - o toma como mero reflexo das relações econômicas da sociedade. O modo produção da vida material condiciona a vida social e política, sendo, em última instância, o determinante absoluto do direito.

Os defensores de tal concepção costumam justificar seu entendimento numa exposição de Engels em sua obra A "Contribuição à Crítica da Economia Política" de Karl Marx, que diz:

"Na produção social de sua vida, os homens constroem determinadas relações necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção que correspondem a uma determinada fase de desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de produção formam a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em geral". (Marx e Engels, "Obras escolhidas", volume 1, p.301).

Essas palavras tornaram-se um dogma para os marxistas. Tal vezo fez com que a ciência marxista ficasse estagnada no campo do direito, restringindo-se a uma área exclusiva dos intelectuais burgueses. Com o tempo esse entendimento foi sendo combatido. O próprio Engels questiona a maneira equivocada como suas palavras e as de Marx foram interpretadas. Marcus Vinícius Martins Antunes, em seu ensaio Engels e o Direito, utiliza a seguinte passagem de Engels:

"Se alguém tergiversa dizendo que o fator econômico é o único determinante, converterá aquela tese em uma frase vazia, abstrata, absurda. A situação econômica é a base, mas os diversos fatores da superestrutura que sobre ela se levantam – as formas políticas e a luta de classes e seus resultados, as Constituições que, depois ganha uma batalha, a classe triunfante redige, etc., as formas jurídicas, e inclusive os reflexos de todas essas lutas reais no cérebro dos participantes, as teorias políticas, jurídicas, filosóficas, as idéias religiosas e o desenvolvimento ulterior destas até convertê-las em um sistema de dogmas – exercem também sua influência sobre o curso das lutas históricas e determinam, predominantemente em muitos casos, sua forma. ("Fios de Ariadne – Ensaios de interpretação marxista", Editora UPF, p.36).

Há uma série de juristas que entendem o papel que o marxismo pode ter no desenvolvimento do direito, mas todos apontam que precisamos primeiramente romper com a visão dogmática sobre o direito. Fabio Coelho Ulhoa, em seu livro Direito e Poder, questiona essa visão dogmática por parte dos marxistas:

"Essa equação reducionista, esse economicismo, é uma deturpação simplificadora do marxismo marxista O modo de produção existente em uma sociedade é a sua base real no sentido de que condiciona as demais relações sociais. Não as determina, por certo; apenas a condiciona. As manifestações do espírito humano possuem o que se costuma chamar de relativa autonomia, de uma lógica interna que não se consegue entender apenas com o reporte às condições materiais da vida social". (Coelho, 2005: 08).

Mais adiante, Coelho diz:

"Pela redução voluntarista, o Direito é visto como mera expressão dos interesses da classe dominante. Ignora-se, nessa perspectiva, o papel que as classes dominadas desempenham na história e a própria dinâmica da luta de classes. O Direito acompanha, com maior ou menor proximidade, os movimentos dessa luta. As concessões localizadas da burguesia e os avanços e as conquistas do proletariado estão presentes no condicionamento da produção normativa. Além disso, a classe dominante possui suas segmentações, seus projetos diferenciados, que compõem uma complexa rede de interesses, impossível de ser sintetizada na idéia de um Direito que atenda exclusivamente aos de uma classe social apenas. (Coelho: 2005, 8-9).

Além de rever nossa posição em relação ao direito, teremos de desfazer a imagem negativa que temos entre os juristas progressistas, buscando uma aproximação com esse seguimento da intelectualidade que terá um papel estratégico na edificação de um Estado democrático e inovador de suas instituições. Entendo que o caminho para isso é único, retomar a essência do marxismo, que nada tem a ver com o dogmatismo. O marxismo é uma teoria viva, não é um materialismo mecânico, que entende que a consciência social fica reduzida às condições econômicas. Karel Kosik, em sua obra Dialética do Concreto, questiona esse reducionismo e diz:

"Ao contrario, a dialética materialista demonstra como o sujeito concretamente histórico cria, a partir do próprio fundamento materialmente econômico, idéias correspondentes e todo um conjunto de formas de consciência. Não reduz a consciência às condições dadas; concentra a atenção no processo ao longo do qual o sujeito concreto produz e reproduz a realidade social; e ele próprio, ao mesmo tempo, é nela produzido e reproduzido." (Kosik, 995, 124).

Então não podemos partir de um "único determinante", pois assim estaremos negando a própria essência do marxismo. Cometemos, assim, um grande erro. Ao reduzimos o objeto que estudamos, por óbvio, chegamos a conclusões imprecisas.

Entendo que um dos principais erros cometidos por nós marxistas ao analisar o direito é o fato de tomá-lo isoladamente da sociedade. Ao entender o direito como algo fora, ou acima, da sociedade, esquecemos que ele é obra dos seres humanos. Apegamo-nos à forma jurídica – a lei tomada isoladamente - e nos esquecemos do conteúdo - as relações sociais apreendidas na complexidade de todas suas dimensões.


A extinção do direito

Essa visão parcial do direito nos levou a um equivoco que estagnou o pensamento marxista no campo jurídico. Ao entendermos o direito simplesmente como a forma jurídica, adotamos uma visão positivista do direito [01], aquela que entende que só o Estado produz o direito. Então partimos para uma solução mecânica que pode ser resumida na seguinte fórmula: se nosso objetivo estratégico é a extinção do Estado e só este cria o direito, nossa relação com o direito já está determinada – só nos resta aniquilá-lo, ou seja, o fim do Estado é igual ao fim do direito. Fica evidente, então, a influência redutora do positivismo jurídico na percepção marxista do fenômeno jurídico.

Esta armadilha positivista – que só é direito o que é elaborado pelo Estado - construída pela burguesia logo após derrubar o poder feudal, enredou o pensamento marxista no positivismo jurídico de tal forma que o horizonte do direito para o marxismo ficou restrito a duas possibilidades, quais sejam: ou decretamos a morte do direito – já que queremos destruir o Estado –, ou criamos um positivismo "de esquerda" – já que a única forma de direito é o estatal –, a chamada "legalidade socialista".

Essa visão tem limitado não só nossa ação no campo teórico, mas também no campo político, pois num período histórico onde os setores progressistas necessitam acumular forças para aproximar-se do objetivo estratégico, um mecanismo como o direito – que pode cumprir um papel estratégico na acumulação de forças – não pode ficar fora do horizonte político e teórico dos portadores de novas relações sociais.

Devemos nos desarmar para enfrentar esse debate. As fórmulas e modelos só prejudicaram a teoria marxista. Para desenvolver o marxismo não basta dizer as mesmas coisas que foram ditas no passado pelos fundadores do marxismo, ou deixar de falar coisas novas porque eles não falaram. Precisamos analisar a realidade, ver o que mudou, quais são as características da atual fase histórica e, a partir delas, buscar alternativas baseadas nos princípios marxistas, não como dogmas, mas como fio condutor, como espinha dorsal de nosso pensamento.

Infelizmente, ainda há aqueles que usam as obras dos fundadores do marxismo para impossibilitar a criação de qualquer tipo de formulação que não esteja "nos moldes" do que já foi escrito por Marx, Engels e Lênin. Num "apelo à autoridade", usam o argumento de que "Marx não escreveu sobre isso", "Lênin não disse tal coisa" e assim por diante. Tal forma de encarar o marxismo é incompatível com a postura científica de seus próprios fundadores. A complexidade da realidade mundial – em face da derrota sofrida pelo campo socialista - e as tarefas de reconstrução de um novo imaginário socialista, atualizado e em consonância com a realidade, cobram mais dos marxistas.

A luta pela construção de um novo paradigma de enfrentamento das questões teóricas entre os marxistas já vem sendo travada em nosso meio em todo o mundo. Samir Amin nos apresenta uma grade contribuição para ajudar nossa corrente de pensamento a superar antigos vezos ideológicos. Para ele ser marxista na atualidade requer uma profunda mudança em nossa postura intelectual:

"Para mim, ser marxista é partir de Marx e não se deter mele, ou em um de seus grandes sucessores da história moderna, seja Lênin ou Mao. Marxista e marxólogo são dois tipos diferentes. Partir de Marx significa partir da dialética materialista, sem para tanto considerar que todas as conclusões por ele tiradas do uso que ele disso fazia tenham sido necessariamente corretas em seu tempo, ou sejam hoje. Fazer isso significa transformar Marx em profeta, o que ele jamais pretendeu ser. Desmistificar Marx se impõe." (Samir Amin, 2010: 72).

Tenho plena concordância com Samir Amin, devemos rever entendimentos tidos como inquestionáveis e trilhar caminhos que antigamente não foram explorados pelos fundadores do marxismo. A realidade histórica vivida por eles era diferente. Suas obras devem ser estudadas - e compreendidas – dentro de determinado período histórico, com uma realidade específica.

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Precisamos desenvolver o marxismo para que ele possa estar à altura dos desafios atuais, sendo um instrumental teórico capaz de transformar a realidade concreta e não um discurso vazio. E só conseguiremos cumprir essa grande tarefa se adotarmos uma postura crítica, criadora e antidogmática.


Para entender o direito

Devemos entender o direito como um fenômeno social de composição múltipla, não só sob a forma jurídica, mas sim sob a dimensão das relações sociais, como forma de produção e reprodução dos seres humanos em determinada sociedade.

O direito deve ser diferenciado da lei, pois ele é muito mais que isso. A tentativa de igualar o direito à lei – e fazer crer que ele só pode ser criado pelo Estado - é uma construção da burguesia para fazer crer que toda a legislação é direito, ou seja, tem base nas relações sociais de determinada sociedade. Contrariando essa tese, Lyra Filho é enfático:

"A legislação abrange, sempre, em maior ou menor grau, Direito e AntiDireito, isto é, direito propriamente dito, reto e correto, e negação do Direito, entortado, pelos interesses classísticos e caprichos continuístas do poder estabelecido". ( Filho, 1995: 8).

A burguesia, com tal pretensão de igualdade, almeja "congelar" as relações sociais atuais, "anestesiando" a capacidade de crítica da sociedade frente a uma lei injusta, escondendo-a sob o manto da legitimidade jurídica do Estado, tentando fazer crer que as atuais relações sociais – baseadas na exploração – sejam imutáveis, como se fossem inerentes aos seres humanos e não uma construção historicamente determinada.

Depois dessa distinção, é necessário que vejamos o direito não como algo com vida própria, à margem ou acima da sociedade, mas sim como algo construído pela experiência humana. Não se pode falar em direito desconectado da história de determinada sociedade, de suas forças produtivas, de seu desenvolvimento social, dos valores que lhe dão suporte, enfim, não se pode falar em direito apartado da existência humana.

A sociedade se apresenta como uma cadeia ininterrupta de relações sociais. Essas relações se dão em diversos níveis e dimensões. Essas relações devem ser entendidas como o próprio produzir-se da vida dos seres humanos organizados em sociedade. Marcos Bernardes de Melo, no seu livro Teoria do Fato Jurídico, apresenta alguns elementos dessa cadeia de relações:

"O ser humano, em situação normal, nasce no seio da família – o grupo social básico – e a partir daí tem início a moldagem de suas potencialidades no sentido da convivência social. A ampliação gradativa dos círculos sociais em que o homem se vê envolvido no desenrolar de sua existência faz crescer, proporcionalmente, o grau de influência que a sociedade exerce em sua formação. À medida que o indivíduo expande a área de seu relacionamento com os outros, participando de grupos maiores, como companheiros de brincadeiras, a escola, as congregações e comunidades religiosas, os clubes, e.g., aumentam também as pressões dos condicionantes sociais que procuram conduzir a sua personalidade conforme os padrões da sociedade. (Mello, 2007: 03).

Note-se que os elementos apresentados por Mello deixam de lado as contradições de classes, mas isso não invalida a ideia acerca da complexidade das relações sociais. Na verdade os elementos que ele apresenta servem de base para a afirmação que ele fará em seguida no seu livro de que o direito é um instrumento de que a sociedade se utiliza para agir sobre o ser humano, com o escopo de inserir em sua personalidade os valores sociais dominantes na sociedade em que está inserido.

O direito é o mecanismo que organiza as relações sociais, buscando ao mesmo tempo manter e direcionar essa sociedade. Manter o essencial para garantir sua continuidade e direcioná-la. Aqui se apresenta um elemento importante do papel do direito na construção da hegemonia em determinada sociedade, porque o direito tem um duplo aspecto, ele é influenciado pelas relações sociais e depois se volta para essas mesmas relações, dando-lhes direção.


As três dimensões do direito

Disse acima, que não podemos considerar o direito fora da sociedade em que ele é criado. Então, o mesmo não se apresenta como realmente é, mas de uma forma que esconde sua essência. O direito, que segundo uma apreensão restrita seria a lei, é apresentado como a vontade do Estado que, em apertada síntese, seria uma imposição das classes dominantes.

Os marxistas não podem se apegar à aparência dos fenômenos, porque eles não se apresentam como realmente são. A dialética marxista é fundamental para enxergar por trás dos fenômenos, para superar sua aparência. Karel Kosik nos mostra a complexidade da apreensão dos fenômenos numa realidade fetichizada:

"O complexo dos fenômenos que povoam o ambiente cotidiano e a atmosfera da vida comum da vida humana, que, com sua regularidade, imediatismo e evidência, penetram na consciência dos indivíduos agentes, assumindo um aspecto independente e natural, constitui o mundo da pseudoconcreticidade. A eles pertencem: - O mundo dos fenômenos externos, que se desenvolvem à superfície dos processos realmente essenciais; - O mundo do tráfico e da manipulação, isto é, da práxis fetichizada dos homens ( a qual não coincide com a práxis crítica revolucionária da humanidade); - O mundo das representações comuns, que são projeções dos fenômenos externas na consciência dos homens, produto da práxis fetichizada, formas ideológicas de seu movimento; - O mundo dos objetos fixados, que dão a impressão de ser condições naturais e não são imediatamente reconhecíveis como resultado da atividade social dos homens.(Kosik, 1995: 15).

Com o fenômeno jurídico acontece o mesmo. O direito é apresentado como a forma jurídica, mas isso não corresponde à realidade concreta. Trata-se de uma falsa apreensão de sua natureza. Em sua complexidade, o direito possui três dimensões fundamentais que o compõem, quais sejam: a ciência jurídica – o ordenamento posto; a sociologia jurídica – os fatos que o geram; e a filosofia jurídica – os valores sociais e que lhes dão suporte. Cabe salientar que essas três dimensões não são estanques, havendo uma interpenetração entre as mesmas. Essas três dimensões formam o todo do fenômeno do direito.

O direito, para ser entendido, deve ser observado sob a totalidade da experiência humana, e não como uma mera lei escrita, que seja fruto da vontade da classe dominante ou como um "ser com vida própria". É importante observar a opinião de Giusepe Lumia, que fortalece a visão do direito como um fenômeno com três dimensões e nos apresenta elementos importantes para uma melhor apreensão do que ele realmente é:

"a) a experiência do entrelaçamento real das relações intersubjetivas disciplinadas por certo tipo de regras de comportamento que são as normas jurídicas; b) essas próprias regras, o modo pelo qual são criadas e se organizam em sistemas normativos mais ou menos complexos e estruturados; c) a atividade de aprovação ou desaprovação que assumimos diante de tais regras, segundo as consideramos ou não conforme as idéias que temos sobre o melhor modo pelo qual essas relações derivam ser reguladas." (Giusepe Lumia, 2003: 3-4).

Destarte, também para Lumia, devemos entender o direito sob estes três aspectos que o determinam: a norma em si e sua elaboração; a realidade social que fundamenta o ordenamento jurídico e o sistema de valores que fundamentam esse ordenamento. Posto de outra forma, devemos observar o direito sob a dimensão científica, sociológica e filosófica. Não há como entender o direito – em face de sua complexidade enquanto fenômeno social – sem levar em consideração os três aspectos que o compõem.

Em sua dimensão científica, temos a norma em si, como é feita a lei, seus requisitos formais e materiais e sua estrutura. Nessa dimensão só a lei e o processo legislativo são levados em consideração. Não importa, nessa dimensão, para que serve a lei, nem quais seus objetivos, só importa se na sua elaboração foram observados os requisitos para sua validade. A visão positivista do direito encerra o fenômeno jurídico nessa dimensão.

Na dimensão sociológica, temos os fatos sociais, que são criados por seres humanos, pertencentes a classes sociais diferentes, temos as forças produtivas, entre outros aspectos. Nessa dimensão importam os motivos da criação da lei, quais seus objetivos e para que serve determinada lei. Tem preocupação com os conflitos sociais que compõem a sociedade.

Na dimensão filosófica, temos os valores morais e políticos. Aqui precisamos perquirir os valores e as ideologias dos grupos que compõem dada sociedade, precisamos realizar a crítica das outras dimensões e construir um conceito do que é justo ou injusto em dada sociedade, enfim, a dimensão filosófica tem uma função axiológica, busca definir o valor específico que se busca no direito.

A complexidade do fenômeno jurídico nos deixa claro que observá-lo apenas sob um desses aspectos nos levará – e tem levado – a uma apreensão equivocada do direito. Por isso defendo que o instrumental teórico marxista tem um papel importante na apreensão e superação dos limites do direito.

Para se ter uma real apreensão do direito é necessário ir além da aparência dos fenômenos e buscar os valores sociais que sustentam o ordenamento jurídico de determinada sociedade, o grau de desenvolvimento da luta de classes e qual correlação de forças na esfera nacional e internacional, o grau de desenvolvimento das forças produtivas, a composição das instituições políticas e sociais. Somente com uma visão do todo teremos uma real apreensão do direito, conseguindo assim, a utilização de todo o seu potencial no desenvolvimento de determinada sociedade. Nesse sentido as palavras de Plauto Faraco de Azevedo são esclarecedoras:

"A Metodologia Jurídica, para ser fecunda, deve orientar-se por uma concepção do direito, que seja capaz de integrar todas as suas dimensões. Como afirma Elias dias, "não se entende plenamente o mundo jurídico se o sistema normativo (Ciência do Direito) se insula e separa da realidade em que nasce e a que se aplica (Sociologia do Direito) e do sistema de legitimidade que o inspira e deve sempre possibilitar e favorecer sua própria crítica racional (Filosofia do direito). Uma compreensão totalizadora da realidade jurídica exige a complementaridade, ou melhor, a recíproca e mútua interdependência dessas três perspectivas ou dimensões que cabe diferenciar ao falar do direito: perspectiva científico-normativa, sociológica e filosófica." A não aceitação dessa complementaridade funda-se em uma perspectiva epistemológica injustificável, sujeitando a aplicação do direito a todos os azares, em virtude de separá-los do contexto histórico, em função de que existe e se aplica." (Azevedo, 1999: 23 e 24).

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Sobre o autor
Leandro Alves Silva

Oficial Escrevente do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Leandro Alves. Direito e marxismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2537, 12 jun. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/15023. Acesso em: 29 mar. 2024.

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