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Taxas e preços públicos:

Serviços em que há instituição (da taxa) X serviços em que há a contratação (do preço público)

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09/07/2010 às 09:30

Resumo:

Os serviços públicos são atividades instituídas por lei e realizadas pelo Estado em benefício da sociedade, visando ao bem comum e necessitando de arrecadação estatal para sua execução.


Taxas e preços públicos são formas de contraprestação por serviços prestados pelo Poder Público, diferenciando-se principalmente pela essencialidade e pela forma de instituição (lei para taxas, contrato para preços públicos).


Há controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais sobre a aplicação de taxas e preços públicos, relacionando-se com a natureza do serviço (essencial ou não) e a obrigatoriedade ou facultatividade da utilização pelo particular.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

RESUMO

         Os Serviços Públicos estão referenciados na Constituição Federal Brasileira de 1988, sendo caracterizados como toda atividade instituída por lei e realizada em prol da sociedade, promovendo o bem comum. Para promoção dessas atividades, é necessário que exista arrecadação estatal, podendo ser realizada por diversas formas. As taxas e os preços públicos são forma de contraprestação do particular ao um serviço realizado pelo Poder Público. No que se refere a aplicação destas contraprestações, há uma grande divergência doutrinária e jurisprudencial, alvo principal desta pesquisa.

         PALAVRAS CHAVE: Serviços Públicos. Taxa. Preço Público.

ABSTRACT

         The Public Services are referenced in the Federal Constitution of 1988, being characterized as any activity established by law and held on behalf of society, promoting the common good. To carry out these activities there needs to store state and can be performed in several ways. The fees and public prices are a consideration of the individual to a service performed by the Government. As regards the application of these healthcare plan, there is a wide divergence of doctrine and jurisprudence, and the main aim of this research.

         KEYWORDS: Public Services. Rate. Public Price.

         SUMÁRIO: INTRODUÇÃO.

1.NOÇÃO GERAL DE SERVIÇOS PÚBLICOS. 2.NOÇÃO DE TRIBUTOS. 3.NOÇÃO DE TAXAS . 3.1.TAXAS DE POLÍCIA. 3.2.TAXAS DE SERVIÇOS . 4. TAXAS E PREÇOS PÚBLICOS. 4.1 SERVIÇOS EM QUE HÁ INSTITUIÇÃO (DA TAXA) X SERVIÇOS EM QUE HÁ A CONTRATAÇÃO (DO PREÇO PÚBLICO) . CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS

INTRODUÇÃO:

         A soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho são objetivos estatais preceituados no artigo 1º, da Constituição Federal Brasileira de 1988.

         Beneficiar a necessidade coletiva não é a finalidade precípua das atividades financeiras estatais, porém, o sucesso em seu desenvolvimento é condição sine qua non para a realização das demais atividades, ou seja, a atividade financeira tem finalidade instrumental, sendo, portanto, um meio para alcançar os objetivos estatais.

         A realização dessa finalidade instrumental está diretamente interligada à arrecadação estatal, às receitas, sendo estas as principais formas de "sobrevivência" do Estado, pois, na lógica matemático-financeira, não há despesa sem receita, haja vista que se tal fato ocorresse ensejaria, efetivamente, uma verdadeira falha em razão de suas atividades em prol da Sociedade.

         O Estado, portanto, necessita, em sua atividade financeira, de captar recursos materiais para manter sua composição, garantindo ao cidadão contributário os serviços que lhe incumbem, como legítimo provedor das necessidades coletivas.

         A partir dessas arrecadações, os Serviços Públicos podem ser desenvolvidos na íntegra, de modo que a soberania do Estado seja ratificada, pois, como salientava Maquiavel, em sua obra, "O Príncipe" [01], não há soberania quando o soberano se faz ausente e a presença estatal está na forma de intervenção, isto é, na forma em que se atendem às necessidades coletivas.

         Isto posto, do sistema de arrecadação, destacam-se neste Trabalho as taxas de serviços e preços públicos. São duas formas de remuneração do Serviço Público, sendo diferenciadas em alguns aspectos, os quais fazem parte do rol de controvérsias doutrinárias no ramo jurídico, principalmente, no que diz respeito a quais Serviços Públicos são aplicados taxas e as quais são aplicados preços públicos.

         Pode-se adiantar que, geralmente, as taxas são aplicadas nos Serviços Públicos considerados essenciais (da competência da Administração Direta) irredutíveis à obra pública, enquanto que os serviços não essenciais são remunerados por preço público, mas nada impede que estes sejam remunerados por taxas. Importante ressaltar que a cobrança dessa espécie tributária respeita de modo mais rigoroso os direitos fundamentais do contribuinte.

         O tema não é tão simples quanto parece, sendo, como já salientado, objeto de divergências doutrinárias e de discussões perante a cúpula do Poder Judiciário. E por tal situação fática será, também, objeto de análise neste Trabalho.


1.NOÇÃO GERAL DE SERVIÇOS PÚBLICOS:

         Os Serviços Públicos estão referenciados na Constituição Federal Brasileira de 1988 (art. 21, incisos: "X" a "XIII"; "XV"; "XXII"; e "XXIII"). De acordo com o entendimento de Hiyoshi Harada (2005, p. 35), os Serviços Públicos são compostos por dois significados distintos: "ora expressa o sentido de organização de recursos materiais e pessoais, ora para significar unidades de obtenção de meios financeiros e técnicos para o desempenho das atribuições do poder público".

         Inseridos no rol das atividades estatais, a noção que se tem por Serviço Público, deve ser analisada, a partir do ordenamento jurídico vigente.

         O ordenamento jurídico normativo, de acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello (2004, p. 620), prevê a conduta estatal e lhe determina obrigações. Dessa maneira, quando lhe é imposto algum "dever" que beneficiará alguém ou a coletividade, de modo que estes sejam beneficiados, fala-se em Serviços Públicos.

         Como bem assevera Regis Fernandes De Oliveira:

         [...] quando a Constituição Federal fala que "compete à União", outra coisa não está falando senão que tem ela o dever ou poder-dever de atingimento das finalidades que o ordenamento jurídico arrola. [...] Não é faculdade que fica alvedrio do administrador ou do agente político, mas dever de exercer determinada atividade, que não é administrativa. Daí não a termos arrolados como forma de atividade. [02]

         Em suma, quando o Estado, através do ordenamento jurídico, determina uma prestação de alguma atividade, há Serviços Públicos (dever).

         A noção de Serviços Públicos é formulada por Celso Antônio Bandeira de Mello, na sua obra: Ele afirma que:

         É toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público, portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais, instituídas pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no sistema normativo. [03]

         Porém, tal conceituação fica vaga, quando se analisa, conjuntamente, os critérios e a evolução do conceito de Serviço Público, pois, em determinado momento histórico, o Estado percebeu que não dispunha de organização adequada à realização de algumas atividades, passando a delegá-las a particulares, por meio dos contratos de concessão de Serviços Públicos e, logo em seguida, por meio de pessoas jurídicas de direito privado criadas para essa finalidade (execução sob regime jurídico predominantemente privado).

         Portanto, a melhor conceituação de serviço público é exposta por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, nos seguintes termos:

         Definição de Serviço Público como toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público. [04]


2.NOÇÃO DE TRIBUTO:

         O artigo 3º do Código Tributário Nacional define tributo nos seguintes termos: "Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada".

         Luciano Amaro (2008, p. 25), diferentemente da noção estabelecida pelo Código Tributário Nacional, exprimiu outro sentido para a noção de tributo: "a prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito, instituída em lei e devida ao Estado ou a entidades não estatais de fins de interesse público".

         Observe que o tributo, quando é diferenciado das prestações pecuniárias que configurem punição de infrações não tem caráter sancionatório, isto é, há o pagamento de tributo para que o Estado garanta as atividades essenciais à coletividade, e não porque praticou uma determinada ilicitude.

         Ao afirmar que tributo é prestação instituída em lei, prioriza-se o princípio da legalidade do tributo, desconsiderando a necessidade de se falar em compulsoriedade da prestação tributária.

         O renomado mestre Regis Fernandes de Oliveira evidencia que:

         Decompondo a definição, pode-se dizer que o tributo não é o pagamento, mas a obrigação de entregar dinheiro (pecuniária) aos cofres públicos. Hoje, é pacifico na doutrina que a obrigação é pecuniária.

         [...]

         A obrigação tributária apenas decorre de lei expressa. É o que vem estabelecido no art. 5º, II, da CF/88, que dispõe que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", bem como do inciso I do art. 150 que estabelece que é vedado "exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça". [05]


3.NOÇÃO DE TAXAS:

         No dizer do célebre mestre Regis Fernandes (2008, p. 140), "taxa é o tributo que depende de uma atividade do Estado". Existem dois tipos de taxas: de polícia e de serviço.

         Como bem assevera Luciano Amaro (2008, p. 30): "tributos cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia; ou b) na prestação ao contribuinte, ou colocação à disposição deste, de serviço público específico e divisível (CF, art. 145, II; CTN, art. 77)".

         Sabe-se que, normalmente, as atividades estatais são realizadas através de arrecadações de impostos gerais. Porém, quando há um serviço público, específico e divisível, quando for possível mensurá-lo, origina-se a possibilidade de cobrança de taxa.

         Portanto, as atividades gerais do Estado devem ser financiadas com impostos, arrecadados de toda coletividade. Já as atividades estatais, divisíveis e referíveis a um indivíduo ou a um grupo de indivíduos determináveis, podem ser remuneradas mediante taxa.

         3.1.TAXAS DE POLÍCIA:

         As atividades financeiras são meios instrumentais para alcançar às necessidades públicas. Para tanto, o Estado, em algumas circunstâncias, precisa ser impositivo para fazer valer o cumprimento das exigências normativas. Fala-se, nestas situações, em poder de polícia, cobradas mediante taxas.

         O artigo 78 e o parágrafo único do Código Tributário Nacional compreendem a definição de poder de polícia:

         Art. 78 – Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão do interesse público concernente à segurança à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

         Parágrafo único – Considera-se regular exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

         Assim sendo, o poder de polícia será utilizado pelo Estado para alcançar suas finalidades, através do cumprimento das necessidades públicas. Importante observar que a própria lei baliza as áreas em que se deverá utilizar o poder de polícia e seu modo de aplicação, evitando as ocasionais inutilidades.

         O poder de polícia, como considerava Ruy Cirne Lima, significa:

         Toda restrição ou limitação coercitivamente posta pelo Estado à atividade ou propriedade privada, para o efeito de tornar possível, dentro d ordem, o concorrente exercício de todas as atividades e a conservação perfeita de todas as propriedades privadas. [06]

         Vale ressaltar que o exercício do poder de polícia é atividade privativa do Poder Público. Destarte, no entendimento mais didático do mestre Regis Fernandes De Oliveira (2008, p. 53), o poder de polícia é uma atividade da Administração Pública cuja finalidade é o exercício da atividade dos particulares, para que tais se enquadrem nos padrões estabelecidos por lei.

         A taxa de polícia, portanto, como bem acentua Luciano Amaro (2008, p 33), é cobrada em razão da atividade estatal, que verifica o cumprimento das exigências legais pertinentes e concede licença, autorização, alvará, dentre outros elementos.

         3.2.TAXAS DE SERVIÇO:

         De acordo com o artigo 145 da Constituição Federal de 1988, "as taxas de serviço têm por fato gerador uma atuação estatal consistente na execução de um serviço público, específico e divisível, efetivamente prestado ou posto à disposição do contribuinte".

         O saudoso ministro Carlos Velloso assevera que:

         Noutras palavras, o serviço é específico quando possa ser separado em unidades autônomas de intervenção da autoridade, ou de sua utilidade, ou de necessidade pública, que o justificou: p. ex, a existência do corpo de bombeiros para o risco potencial de fogo; e é divisível quando possa funcionar em condições tais que se apure a utilização individual pelo usuário: - a expedição de certidões, a concessão de porte de armas, a aferição dos pesos e medidas etc. [07]

         Vale acrescentar que o Serviço Público, ensejador da taxa de serviço, poderá ser de utilização efetiva ou de utilização potencial. De acordo com o entendimento de SABBAG (2009, p. 376), será efetiva, "se o serviço for concretamente prestado à coletividade, com fruição fática e materialmente detectável". E será a taxa de utilização potencial, se o serviço, "sendo de utilização obrigatória, for colocado à disposição do usuário-contribuinte, sem a necessária utilização efetiva".


4.0 TAXAS E PREÇOS PÚBLICOS:

         4.1 SERVIÇOS EM QUE HÁ INSTITUIÇÃO (DA TAXA) X SERVIÇOS EM QUE HÁ A CONTRATAÇÃO (DO PREÇO PÚBLICO):

         Quando o Serviço Público for prestado diretamente pelo Poder Público, este será remunerado pelo usuário, efetivo ou potencial, via taxa.

         Sendo uma espécie de gênero do tributo, a taxa é cobrada pelo Poder Público, assim como preceitua o art. 145 da CF/88: "pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição". Esta espécie tributária só se impõe por lei.

         Em contrapartida, quando o serviço é prestado mediante concessão ou permissão (indiretamente pelo Poder Público), este é remunerado via preço público, sendo pago pelo usuário diretamente à concessionária em razão da prestação efetiva do serviço. Importante lembrar que Preço Público decorre de contrato, sendo, portanto, na explicação do saudoso Antônio Carlos Cintra Do Amaral:

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         É a contraprestação paga por uma das partes contratantes à outra em decorrência de um contrato, quer privado, quer administrativo, que tenha por conteúdo uma obrigação predominantemente de dar ou de fazer (contratos de compra e venda de bens, prestação de serviços, execução de obras e outros). [08]

         O conceito de taxas e preços públicos não é o ponto crucial a ser discutido nesta Pesquisa, mas, sim, os critérios que estabeleçam uma segregação dos serviços públicos que podem ser taxados em relação aqueles em que são aplicados os preços públicos.

         Em palestra proferida no X Simpósio Nacional de Direito Tributário, o ministro Moreira Alves apresentou a seguinte discriminação:

         a)Serviços ínsitos à soberania (como o serviço judiciário, a emissão de passaporte) que ensejaram taxas somente pela utilização efetiva;

         b)Serviços essenciais ao interesse público, cuja prestação é do interesse geral (por exemplo, serviço de esgoto, coleta de lixo), em relação aos quais a taxa é cobrada quer o contribuinte se sirva de atividade, quer não (utilização efetiva ou potencial);

         c)Finalmente, fora do campo das taxas, serviços públicos não essenciais (por exemplo, correios), que seriam remunerados por preços públicos. [09]

         Já o eminente ministro Carlos Mário Velloso, relator do Recurso Extraordinário nº 209.365-3/SP, deixou assentada a seguinte orientação a respeito da classificação do Serviço Público:

         RE 209365 / SP - SÃO PAULO

         RECURSO EXTRAORDINÁRIO

         Relator (a): Min. CARLOS VELLOSO

         Julgamento: 04/03/1999

         Órgão Julgador: Tribunal Pleno

         Publicação

         DJ 07-12-2000 PP-00050 EMENT VOL-02015-05 PP-00873

         RTJ VOL-00176-01 PP-00421

         Parte(s)

         RECTE. : COMPANHIA DOCAS DO ESTADO DE SÃO PAULO - CODESP

         ADVDOS. : CÉLIO JULIANO DA SILVA COIMBRA E OUTROS

         RECDO. : NAVIBRÁS - COMERCIAL MARÍTIMA E AFRETAMENTOS LTDA

         ADVDOS. : OSVALDO SAMMARCO E OUTROS

         ADVDOS. : EDUARDO DOMINGOS BOTTALLO, OSVALDO SAMMARCO E OUTROS

         Ementa

         EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ADICIONAL DE TARIFA PORTUÁRIA - ATP. Lei nº 7.700, de 1988, art. 1º, § 1º. I. - Natureza jurídica do A.T.P.: contribuição de intervenção no domínio econômico, segundo o entendimento da maioria, a partir dos votos dos ministros Ilmar Galvão e Nelson Jobim. II. - Voto do Relator, vencido no fundamento: natureza jurídica do A.T.P.: taxa: criado por lei, Lei nº 7.700/88, art. 1º, § 1º, remunera serviço público (C.F., art. 21, XII, d e f; art. 175. Decreto 25.408/34). III. - Constitucionalidade do A.T.P.: Lei 7.700/88, art. 1º, § 1º. IV. - R.E. conhecido e provido.

         VOTO

         [...] 1- Serviços Públicos propriamente estatais, em cuja prestação o Estado atue no exercício de sua soberania, visualizada sob o ponto de vista interno e externo; esses serviços são indelegáveis, porque somente o Estado pode prestá-los. São remunerados, por isso mesmo, mediante taxa, mas o particular pode, de regra, optar por sua utilização ou não. Exemplo: o serviço judiciário, o de emissão de passaportes. Esses serviços, não custa repetir, por sua natureza, são remunerados mediante taxa e a sua cobrança somente ocorrerá em razão da utilização do serviço, não sendo possível a cobrança pela mera potencialidade de sua utilização [...] O que acontece é que certos serviços podem ser tornados obrigatórios pela lei e é isto o que significa a locução "posto a disposição" do contribuinte. É isto, aliás, o que resulta do dispositivo no art. 79, I, b, CTN.

         2- Serviços Públicos essenciais ao interesse público: são serviços prestados no interesse da comunidade. São remunerados mediante taxa. E porque são essenciais ao interesse público, porque essenciais à comunidade ou à coletividade, a taxa incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial do serviço.

         [...]

         Como exemplo, podemos mencionar o serviço de distribuição de água, de coleta de lixo, de esgoto, de sepultamento.

         [...]

         3- Serviços Públicos não essenciais e que, não utilizados, disso não resulta dano ou prejuízo para a comunidade ou para o interesse público. Esses serviços são, de regra, delegáveis, vale dizer, podem ser concedidos e podem ser remunerados mediante preço público. Exemplo: o serviço postal, os serviços telefônicos, telegráficos, de distribuição de energia, de gás, etc. [10]

         Para efeitos didáticos, adotar-se-á a classificação utilizada por Marcelo Alexandrino e Vicente De Paulo. Segundo os autores, os Serviços Públicos podem ser classificados na forma assim estabelecida:

         1.Serviços Públicos propriamente estatais

         São serviços em cuja prestação atua no exercício de sua soberania. São indelegáveis e só podem ser remunerados por taxa. De regra só podem ser cobrados por sua efetiva utilização. Exemplo típico é o serviço judiciário.

         2.Serviços Públicos essenciais ao interesse público

         São serviços prestados no interesse da comunidade. São remunerados mediante taxa, que incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial do serviço, desde que, nesta ultima hipótese, haja lei que defina o serviço como de utilização compulsória. Exemplo típico é o serviço de coleta domiciliar de lixo.

         3.Serviços Públicos não essenciais

         São, de regra, delegáveis e podem ser remunerados por preço público. Exemplos são o serviço postal, os serviços telefônicos, telegráficos, de distribuição de energia elétrica, de gás etc.

         Uma outra classificação, essa sim consensual, adota por critério os destinatários do serviço público.Conforme essa classificação, os serviços podem ser gerais, prestados uti universe, ou individuais, prestados uti singuli. Assume relevância essa distinção especialmente no âmbito do Direito Tributário, uma vez que somente os serviços prestados uti singuli podem ser fato gerador de taxas, ao passo que os serviços uti universi não podem ser remunerados por taxas nem por tarifas, devendo ser custeados pelos impostos. [11]

         A partir dessas classificações, pode-se afirmar que, embora haja serviços "próprios" ao interesse público, de caráter generalizado (historicamente e geograficamente); sendo alguns indivisíveis (financiados por impostos, como a defesa do território) e outros divisíveis e, por isso, remunerado mediante taxas (serviço de Justiça); há uma serie de atividades, cuja execução, conforme ensina Luciano Amaro (2008, p. 44), interessa a coletividade, não podendo ficar ao alvedrio da implementação ou não do indivíduo.

         Observe que definir o critério de segregação entre a aplicação de taxa e a de tarifa (preço público), ainda é uma barreira que precisa ser superada pelos mestres do Direito, principalmente, diante das noções mutáveis dos serviços ditos "essenciais" (Serviços essenciais ao interesse público), no tempo e no espaço, pois, como bem lembrou Moreira Alves (RT 98/238), citando Jèse, a noção de serviços essenciais é, de certo modo, relativa, porque varia de Estado para Estado e de época, o que torna a questão mais complexa.

         Destarte, as jurisprudências, os doutrinadores, os mestres, enfim, todos estão trabalhando no sentido de pacificar o entendimento dessa aplicação.

         Importante ressaltar que há controvérsias doutrinárias a respeito do tema em tela, havendo vários critérios utilizados, sendo o mais comum, como explana o Sr. Min. Moreira Alves (RE. 89.876, p. 13), o que afirma a obrigatoriedade da taxa e a facultatividade do preço público.

         Até aqui, pode-se afirmar, como bem ensina Luciano Amaro:

         Há situações em que o legislador (à vista da execução pelo Estado de um serviço divisível) só tem a via de taxa. Noutros casos, para os quais seja possível o preço público, o legislador pode optar entre adotar o regime jurídico das taxas ou o dos preços públicos. [12]

         Contudo, vale acrescentar que o Supremo Tribunal Federal, no intuito de diferenciar a aplicação desses dois institutos em questão (na vigência da Constituição Federal de 1946), assinalou, na súmula 545, que: "Preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu".

         O eminente e saudoso ministro Luiz Galotti reconheceu que o critério que fora adotado pela súmula é deficiente para diferenciar os institutos em questão, sustentando, especificamente, no RE 54.194 que:

         Quero, agora, desfazer um equívoco do eminente mestre. S. Excia, supõe, entendo eu, que a obrigatoriedade da cobrança é elemento essencial no conceito de taxa. Não, Há taxas sem tal obrigatoriedade. Então é que pode caber, em cada caso, a discussão sobre se é taxa ou preço público. Mas, no caso em julgamento, há obrigatoriedade do pagamento, mesmo não sendo usado o serviço e, assim, o caráter tributário se torna incontestável. [13]

         A explanação do ministro Luiz Galotti demonstra que a Súmula 545 se aplica como critério distintivo (entre a aplicação de taxa e preço público), somente nos casos em que o legislador ordinário estabeleça a contraprestação devida pelo particular (por mais que ele não use), em razão do Serviço Público exigido estar posto à disposição.

         Nestas situações, não há o que discutir se será aplicada a taxa ou o preço público, pois, de acordo com a Súmula, o legislador não pode agir sem respeitar as limitações constitucionais incumbidas às taxas, sendo, assim, aplicado o referido tributo, ainda que o serviço tenha natureza tarifária, beneficiando, portanto, o contributário.

         Desse modo, como afirma o ministro Luiz Galloti, pode haver taxa sem tal obrigatoriedade. Por exemplo: o caso da remuneração devida pelo simples fato de o Serviço Público estar posto à disposição. Baseando-se nisto, prosseguiu o ministro:

         Assim, se a taxa não deixa de o ser pelo fato de só se tornar devida quando voluntariamente utilizado o serviço, força é concordar que, quando imposta por motivos de interesse público (saúde, higiene, etc.) independentemente daquela utilização, o seu caráter tributário se torna indiscutível. [14]

         O saudoso mestre Luciano Amaro (2008, p. 41), observa que o Supremo Tribunal Federal, ao editar a Súmula 525, apontou a "compulsoriedade" das taxas como a característica que a diferenciaria de preço público. Para ele, esta questão é expressamente óbvia, uma vez que a taxa é um tributo, sendo compulsória, pois se enquadra como aspecto de natureza de qualquer tributo. Enfatiza ainda o autor: "com essa prévia definição é que se poderia dizer que, no primeiro caso, há compulsoriedade da prestação, e, no segundo, voluntariedade (ou melhor: no primeiro, a obrigação será legal; no segundo, contratual)".

         Então, pode-se afirmar que o problema, quanto à aplicação do preço público ou da taxa, não pode ser solucionado, utilizando-se o critério estabelecido pela Súmula supracitada, pois ela utiliza somente, o critério de saber se o pagamento é voluntário ou compulsório. (SABBAG, 2009, p. 394).

         Há posicionamentos doutrinários. Convém citar os nobres mestres Hamilton Dias de Souza, Marco Aurélio Greco, bem como o saudoso Geraldo Ataliba, no sentido de que os serviços públicos ensejam, tão somente, a aplicação de taxas e não de preços públicos. Isto ocorre, segundo eles, pois, na vigência da Constituição de 1946, previa-se, ao lado de taxas, "outras rendas", originadas dos seus serviços públicos e, com a emenda n. 18 de 1965, a questão teria ficado superada.

         Entretanto, na visão de Luciano Amaro (2008, p. 42), a atual Constituição não excluiu a expressão "outras rendas", exatamente porque não objetivara a Carta Magna em restringir a remuneração dos serviços públicos ao instituto da taxa. Vale acrescentar que a Constituição Federal de 1988 menciona, no artigo 175, parágrafo único, os "Serviços Públicos" em que a lei deve estabelecer a "política tarifária".

         No entanto, sabe-se que o Poder Público não pode estabelecer, a livre arbítrio (em razão das restrições constitucionais a que se sujeita a aplicação das taxas) que a prestação de serviço público, específico e divisível, possa ser realizado sob a forma, indiferentemente, de taxa ou preço público.

         O ministro Moreira Alves salienta que:

         Há, sem dúvida alguma, taxas que o são, pela natureza mesma da relação jurídica entre o Poder Público e o particular, e, apesar disso, só são exigidas quando este solicita e recebe a prestação do serviço daquele. É o caso, por exemplo, da taxa judiciária, certo como é que só exigida quando quem pretende ter um direito violado requer a prestação jurisdicional que tão-somente o Estado lhe pode prestar. É taxa que não se paga pelo simples fato de o serviço judiciário estar colocado à disposição dos particulares. E, por ser taxa pela natureza mesma da relação jurídica de que decorre, não pode o legislador ordinário discipliná-la como preço público, para subtrair-se das restrições constitucionais do poder de tributar. [15]

         No RE 89.876 (conhecido acórdão do Supremo Tribunal Federal sobre a taxa de lixo da cidade do Rio de Janeiro), que teve como relator o ministro Moreira Alves, foram enfatizados os Serviços Públicos, no que diz respeito à discussão quanto à instituição de taxas e aplicação de preço público, como se observa abaixo:

         RE-89.876 /RJ – RIO DE JANEIRO.

         RECURSO EXTRAORDINÁRIO

         Relator(a): Min. MOREIRA ALVES

         Recorrentes:

         1º OSWALDO DAMÁZIO RIBEIRO E OUTROS;

         2º COMPANHIA CINEMATOGRÁFICA FRANCO BRASILEIRA.

         Recorridos: COMLURD - CIA. Municipal de Limpeza Urbana

         Julgamento: 04.09.1980

         Órgão Julgador: Tribunal Pleno

         Publicação: DJ 10-10-80 EMENTÁRIO Nº 1.187-2

         EMENTA: Tarifa básica de Limpeza Urbana.

         1. Em face das restrições constitucionais a que se sujeita a instituição de taxa, não pode o Poder Público estabelecer, a vou arbítrio, que à prestação de serviço público específico e divisível corresponde contrapartida sob a forma, indiferentemente, de taxa ou de preço público.

         2. Sendo compulsória a utilização do serviço público de remoção de lixo – o que resulta, inclusive, de sua disciplina como serviço essencial à saúde pública -, a tarifa de lixo instituída pelo Decreto nº 188, de 12 de novembro de 1976, do Poder Executivo do Município do Rio de Janeiro, é, em verdade, taxa.

         3. Inconstitucionalidade do referido decreto, uma vez que taxa está sujeita do princípio constitucional da reserva legal.

         Recurso Extraordinário conhecido e provido [16]. (grifos nossos)

         A problemática do referido acórdão é de saber se "a contraprestação de limpeza urbana", criada pelo Decreto nº 196, de 12 de novembro de 1975, do prefeito do Município do Rio de Janeiro é preço público, como afirma a recorrida, ou é taxa, como sustenta o recorrente. Partindo desta argumentação, fora impetrado o mandado de segurança, o qual invocou a incompetência do Prefeito de instituir o tributo em comento, a existência de bitributação e de violação do princípio da igualdade.

         De acordo com o saudoso ministro Moreira Alves (RE 89.876, p. 12), diante do sistema constitucional vigente, a afirmação de que o legislador ordinário pode, por decisão política (que é sua competência privativa), estabelecer que o serviço público essencial, específico e divisível, venha ser remunerado tanto por preço público, quanto por taxa, não é exata. O ministro faz tal insinuação, porque a natureza do serviço público prestado (essencial) pode, uma vez exigido pelo Poder Público, ser remunerado por taxa. E sendo uma das modalidades de tributo, ela está sujeita a restrições constitucionais do poder de tributar, as quais são garantias estabelecidas em favor do contribuinte e que não existem em matéria de preço público.

         Portanto, como o Poder Público não pode fugir a essas restrições constitucionais com relação ao seu poder de tributar, fica claro que nos casos em que é devida à aplicação de taxas, não pode aplicar preços públicos, sob pena de fraudar tais limitações constitucionais.

         Importante ressaltar a excelente explanação de Geraldo Ataliba (cit. pelo min. Moreira Alves, RE. 89.876, p. 13), acentuando que: "Juridicamente, entretanto, são inconfundíveis. Não há possibilidade jurídica de confusão entre taxa e preço. Nem há, como muitos supõem, liberdade do legislador em converter uma na outra e vice-versa".

         Cresce daí a polêmica de: como distinguir os casos em que é cabível a instituição de taxa, dos que é permitida a contratação (preço público)? A solução pode ser encontrada na excelente explicação do ministro Moreira Alves:

         A solução só pode ser encontrada [...] no exame da natureza da relação jurídica, que está em causa, entre o Poder Público e o particular. A contrapartida será preço público se o serviço prestado (remoção normal de lixo domiciliar) for serviço comercial ou industrial; será taxa, se for ele serviço próprio do Estado, ou seja, serviço que se prende intimamente às atribuições do Poder Público, que tem o dever de prestá-los porque eles visam, em primeiro plano, ao interesse individual.

         [...]

         O que importa, no caso, é examinar a natureza do serviço prestado, para saber se é ele um serviço devido pelo Poder Público (e, portanto, obrigatório para ele), ou se, apenas, este pode, ou não prestá-lo, o que implica dizer que se a prestação é facultativa para ele, e, consequentemente, se ele o presta, o particular tem, também, a faculdade de usar, ou não, dele. [17]

         Note-se que, no recurso examinado pelo ministro, a discussão se dá a respeito da remoção do lixo da cidade do Rio de Janeiro, onde alega a recorrente o fato de existir bitributação, sendo o argumento principal baseado nos Serviços Públicos, especificamente, a aplicação de preço público ou taxa. Levando em consideração a natureza jurídica da relação, de acordo com o ministro, é possível estabelecer tal segregação. Sendo o serviço "próprio" do Estado e essencial à coletividade, sem que haja alternativas, a este deverá ser aplicado taxa, enquanto que, se o serviço for facultativo (havendo alternativas), embora essencial, poderá ser aplicado taxa ou preço público.

         O ministro Oscar Dias Corrêa, na análise de questão análoga, se pronunciou:

         Se o serviço prestado tiver natureza industrial ou comercial, a contrapartida efetivar-se-á mediante o pagamento de preço público. Se, entretanto, a atuação estatal for serviço próprio do Estado, inerente às suas atividades como Poder Público, a eventual remuneração somente poderá se efetivar mediante a cobrança de taxa. [18]

         Portanto, se o serviço público for propriamente público; simplesmente, por ser obrigatório ao Poder Público (devido à sua natureza) e, consequentemente, ao Particular (uma vez que interessa toda a coletividade), o Estado não pode dispensar a contraprestação do particular, ainda que queira, e só pode exigir, como remuneração, a taxa, respeitando todas as suas limitações constitucionais (Moreira Alves, STF, Pleno, RE 89.876, j. 4-9-1980, RDA, n. 142, p. 20).

         Vale ressaltar a classificação de Serviços Públicos, de Arnaldo de Valles e Rafael Bielsa, que fora comentada por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ensinando que:

         Para os autores, Serviços Públicos próprios são aqueles, atendendo a necessidades coletivas, o Estado assume como seus e os executa diretamente (por meios de seus agentes) ou indiretamente (por meio de concessionários e permissionários). E Serviços Públicos impróprios são os que, embora atendendo também a necessidades coletivas, como os anteriores, não são assumidos nem executados pelo Estado, seja direta ou indiretamente, mas apenas por ele autorizados, regulamentados e fiscalizados [...].

         É interessante observar que Hely Lopes Meirelles (2003:321) adota essa classificação, mas lhe imprime sentido diverso do original. Para ele, serviços públicos próprios "são aqueles que se relacionam intimamente com as atribuições do Poder Público (segurança, polícia, higiene e saúde públicas) e para a execução dos quais a Administração usa de sua supremacia sobre os administradores. Por esta razão só devem ser prestados por órgãos ou entidades públicas, sem delegação a particulares". Serviços públicos impróprios "são os que não afetam substancialmente as necessidades da comunidade, mas satisfazem a interesses comuns de seus membros e, por isso, a Administração os presta remuneradamente por seus órgãos, ou entidades descentralizadas (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações governamentais) ou delega a sua prestação a concessionários, permissionários ou autorizados".

         O que o autor considera fundamental é o tipo de interesse atendido, essencial ou não essencial da coletividade, combinando com o sujeito que o exerce; no primeiro caso, só as entidades pública; no segundo, as entidades públicas e também as de direito privado, mediante delegação. [19]

         Portanto, sendo o serviço essencial do Poder Público, ou seja, serviço realizado obrigatoriamente por este, deverá ser cobrado taxa, respeitando os limites do Poder de Tributar. Lembrando que não poderá ser dispensada a contraprestação do particular, uma vez que esta espécie de serviço (essencial) atende aos interesses, em primeiro plano, da coletividade e, também, não poderá ser interrompido, ainda que o particular deixe de pagar a remuneração exigida. Acentua Hely Lopes Meirelles:

         [...] se o serviço é obrigatório, sua remuneração é por taxa (tributo) e não por tarifa (preço), e a falta de pagamento de tributo não autoriza outras sanções além de sua cobrança executiva com os gravames legais (correção monetária, multa, juros, despesas judiciais). [20]

         Frisando um dos pontos que constituem a segregação entre taxas e preços públicos, já comentados, relata-se uma divergência no acórdão (RE 89.876) entre o voto do ministro Moreira Alves e do ministro Cordeiro Guerra. O saudoso Cordeiro Guerra, em seu voto, diz que:

         Se se admite a legitimidade constitucional da tarifa de água, porque negar-se tal legitimidade à tarifa de remoção de lixo domiciliar, admitida em virtude de lei que criou a companhia adequada à execução do serviço industrial de remoção de lixo e para o seu aproveitamento comercial?

         [...]

         Não pode haver vida sem água [...] com o tempo, evolui-se, e surgiu então, a taxa de água, e, mais recentemente, para atender aos seus custos de produção, o preço público para a água.

         [...]

         Do mesmo modo, os serviços de limpeza urbana e de remoção dos detritos domiciliares evoluíram, pelo desenvolvimento natural da cidade, do carrinho puxado a burros, para serviços mecanizados e industriais da COMLURB (empresa comissionaria do serviço público de recolhimento do lixo), que mantém usinas para o aproveitamento do lixo de modo a comercializar os seus subprodutos, inclusive adubos. (grifos nossos) [21]

         Ocorre que, "em se tratando de água, e desde que o Estado não cobre do individuo a água de que ele não usa, mas que foi colocada à disposição dele, admite-se (como admite este Tribunal e admite, também, a doutrina) que a sua utilização efetiva seja paga por meio de preço público. Com efeito, só paga quem, querendo, se utiliza efetivamente do serviço (à semelhança da passagem de ônibus), ao passo que quem não quiser poderá deixar de usar dele, sem te que pagar nada ao Estado, utilizando-se de outros meios normais para a obtenção de água: água da chuva, água de poço comum; água de poço artesiano, água fornecida por empresas particulares" (Moreira Alves, RE. 89.876, p. 69).

         Salienta o ministro Moreira Alves (RE 89.876, p. 69) que esta facultatividade, mencionada, anteriormente, é da essência do preço público, o qual é a contraprestação de serviços industriais e comerciais, facultativamente, utilizados pelo particular. Ressalva, também, quando o Estado entende que a água fornecida é necessária à preservação da saúde da coletividade, este fornecimento será obrigatório para o Poder Público e, por conseguinte, será obrigatória a contraprestação do particular, sendo, portanto, cobrado mediante taxa, não podendo haver o corte em caso de inadimplemento.

         Entretanto, de acordo com os entendimentos do ilustre relator, quando o Estado verifica que não há necessidade a respeito da água fornecida, ele não obriga ninguém a ligá-la à sua casa, sendo facultativo seu uso pelo particular. Por isso que, nestes casos, a remuneração se dá mediante preço público.

         Prossegue o eminente ministro, considerando inadmissível a cobrança de Preço Público (com o qual não se sujeita às restrições constitucionais), quando o Estado assegure o fornecimento de água, sabendo que é essencial à vida, como facultativo e, ao mesmo tempo, proíba, sob pena de sanções administrativas, a utilização de outros meios de obtenção de água.

         Já em relação ao caso da remoção de lixo, na cidade do Rio de Janeiro (Ministro Moreira Alves, RE 89.876, p. 71), não se pode deixar de reconhecer o serviço de remoção de lixo domiciliar normal, no sentido de que este é realizado em favor da coletividade e, por isso, torna-se indispensável à Saúde Pública. Tanto é verdade que, caso o particular tenha outro meio alternativo de recolhimento do lixo, independente do Estado, e deixe de realizá-lo, omitindo-se e responsabilizando-se por todas as sanções administrativas, o Estado não poderá deixar de prestar tal serviço. Dessa maneira, a remoção do lixo, a contra sensu do fornecimento de água, não pode ser suspensa.

         No caso do referido acórdão (RE 89.876), o próprio Poder Público, por força de um decreto, proíbe a remoção do lixo por meios preceituados no próprio dispositivo. Explana Moreira Alves:

         Ora, se a produção de lixo é contingência necessária da vida, se o particular que o produz está obrigado a removê-lo; se, por meios próprios normais, não pode fazê-lo, pois, qualquer que seja a forma possível de realizar essa remoção, está ela proibida pelo próprio Poder Público; se, portanto, o individuo só pode remover o lixo, cuja remoção o Estado lhe impõe obrigatoriamente, pela utilização do serviço que este fornece, é possível dizer que, no caso, o serviço é facultativo? Ele não o é para o Estado que, na omissão do particular recalcitrante, não pode cruzar os braços e deixar que o lixo se acumule indefinidamente, terá de recolhê-lo, ainda que sem pagamento, por imperativo de Saúde Pública. [22]

         Deste modo, incumbe ao Poder Público o recolhimento do lixo da cidade, sendo obrigatório. Importante é salientar que a remuneração devida pelo particular é de caráter compulsório, além do que o serviço de remoção de lixo não pode ser suspenso. Então, ainda que o Poder Público impeça que tal tarefa seja realizada por particular, não há alternativas normais, restando, somente os serviços prestados pelo Estado.

         Assim sendo, aplica-se o instituto da taxa, pois como falar que se trata de preço público havendo o monopólio estatal no meio de recolhimento. Para reforçar ainda mais a idéia apresentada no presente trabalho, o notável mestre Hugo de Brito Machado, enuncia que:

         "Não é fácil, nos domínios da Ciência das Finanças, estabelecer a diferença entre taxa e preço público. No âmbito jurídico, porém, a questão se resolve em admitir-se que a distinção entre atividade própria do Estado e atividades que podem ser exercidas por particulares há de ser formulado no plano político, vale dizer, há de ser fixada pelo Legislativo.

         Assim, admite-se que a lei estabeleça a fronteira entre a taxa e o preço, instituindo o que se pode entender como taxa por definição legal. Assim temos que:

         a) se a atividade estatal situa-se no terreno próprio, específico do Estado, a receita que a ela se liga é uma taxa;

         b) se a atividade estatal situa-se no âmbito privado, a receita a ela vinculada deve ser um preço;

         c) havendo dúvida, pode a lei definir a receita como taxa ou como preço.

         O importante é entender-se que, se a lei denominou a receita como taxa vinculou esta ao regime jurídico tributário. Tal receita ficará, portanto, sujeita ao princípio da legalidade e da anterioridade da lei ao exercício financeiro correspondente.

         [...]

         O que caracteriza a remuneração de um serviço público como taxa, ou como preço público, é a compulsoriedade, para a taxa, e a facultatividade, para o preço, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal.

         [...]

         Se a ordem jurídica obriga a utilização de determinado serviço, não permitindo o atendimento da respectiva necessidade por outro meio, então é justo que a remuneração correspondente, cobrada pelo Poder Público, sofra as limitações próprias dos tributos. O contribuinte estará seguro de que o valor dessa remuneração há de ser fixado por critérios definidos em lei. Terá, em síntese, as garantias estabelecidas na Constituição.

         [...]

         À liberdade, que tem o Poder Público, na fixação do preço público, corresponde à liberdade do cidadão de utilizar, ou não, o serviço correspondente. Se o cidadão não tem essa liberdade, o Poder Público deve estar igualmente limitado pela ordem jurídica, no que pertine aos critérios para fixação do valor a ser cobrado, que será um tributo." (grifos nossos) [23]

         Em suma, há imposição de taxa, de acordo com o Ilustre ministro Moreira Alves (RE 89.876, p. 36), "quando há obrigatoriedade do pagamento, mesmo não sendo usado o serviço, o que torna incontestável o caráter tributário da imposição; e preço público, quando há contraprestação de serviço público facultativo".

         Frisa-se que o traço diferenciador dos institutos em análise está, de acordo com a excelente explicação de Sabbag (2009, p. 395):

         [...] na inerência ou não da atividade à função do Estado. Se houver evidente vinculação e nexo de serviço com o desempenho da função eminentemente estatal, teremos a taxa. De outra banda, se presenciarmos uma desvinculação deste serviço com a ação estatal, inexistindo óbice ao desempenho da atividade por particulares, vislumbrar-se-á a tarifa. [24]

         Portanto, se o serviço for caracterizado como essencial ao Poder Público, não restando alternativas ao particular, senão a atuação do Estado, e, ainda sendo obrigatória a contraprestação, mesmo que o particular não utilize do serviço, aplicar-se-á taxa. Porém, quando o serviço for facultativo ao particular, poderá o Estado optar entre a aplicação de taxa ou de preço público.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, José Diogo Oliveira. Taxas e preços públicos:: Serviços em que há instituição (da taxa) X serviços em que há a contratação (do preço público). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2564, 9 jul. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/16925. Acesso em: 23 dez. 2024.

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