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Para votar basta o documento com foto

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Sumário. 1. Introdução 2. O "caput" do artigo 91-A da Lei das Eleições. 3. A ADI 4467-DF. 4.Conclusão.


1. Introdução

Desde a Lei Saraiva [01] de 1881, para votar, bastava o título de eleitor. Essa regra foi mantida nos Códigos Eleitorais de 1932, 1935, 1950 e no atual, de 1965:

"CAPÍTULO IV - DO ATO DE VOTAR"

"Art. 146. Observar-se-á na votação o seguinte:"

(...)

"III - admitido a penetrar no recinto da mesa, segundo a ordem numérica das senhas, o eleitor apresentará ao presidente seu título, o qual poderá ser examinado por fiscal ou delegado de partido, entregando, no mesmo ato, a senha;"

"IV - pelo número anotado no verso da senha, o presidente, ou mesário, localizará a folha individual de votação, que será confrontada com o título e poderá também ser examinada por fiscal ou delegado de partido;"

"V - achando-se em ordem o título e a fôlha individual e não havendo dúvida sôbre a identidade do eleitor, o presidente da mesa o convidará a lançar sua assinatura no verso da fôlha individual de votação;" ( ...);

"VI - o eleitor será admitido a votar, ainda que deixe de exibir no ato da votação o seu título, desde que seja inscrito na seção e conste da respectiva pasta a sua fôlha individual de votação; nesse caso, a prova de ter votado será feita mediante certidão que obterá posteriormente, no juízo competente;"

(...)

"Art. 147. O presidente da mesa dispensará especial atenção à identidade de cada eleitor admitido a votar. Existindo dúvida a respeito, deverá exigir-lhe a exibição da respectiva carteira, e, na falta desta, interrogá-lo sôbre os dados constantes do título, ou da fôlha individual de votação, confrontando a assinatura do mesmo com a feita na sua presença pelo eleitor, e mencionando na ata a dúvida suscitada."

Posteriormente, após diversas leis federais sobre determinada eleição, foi aprovada a de número 9.504, de 30 de setembro de 1997, que tratou de normas gerais sobre eleições (Lei das Eleições), destacando-se os artigos 59 a 62, que cuidam da urna eletrônica e do sistema eletrônico de totalização.

Ocorre que foi aprovada a lei nº 12.034, de 29 de setembro de 2009 (minirreforma eleitoral), que inseriu na lei nº 9.504/97 o artigo 91-A, que obriga a apresentação para votar, além do título eleitoral, de documento com fotografia.

Com respaldo no artigo 52 do atual Código Eleitoral, o prazo final para requerer a segunda via do título de eleitoral no domicílio eleitoral era dez dias antes da eleição, especificamente 23 de setembro de 2010; sessenta dias, se fora do domicílio eleitoral (art. 53, "caput" e § 4º), no caso 04 de agosto de 2010.

Na sessão plenária de 21 de setembro p.p., os membros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovaram a prorrogação do prazo do requerimento da segunda via no domicílio eleitoral para 30 de setembro último [02]:

"PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 1365-37.2010.6.00.0000 – CLASSE 26 – SALVADOR – BAHIA

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Interessado: Tribunal Regional Eleitoral da Bahia

Ementa:

ELEIÇÕES 2010. EXERCÍCIO. VOTO. OBRIGATORIEDADE. EXIBIÇÃO. TÍTULO DE ELEITOR. DOCUMENTO DE IDENTIFICAÇÃO COM FOTO. REIMPRESSÃO. CÉDULA ELEITORAL. PRORROGAÇÃO. PROPOSTA. CORREGEDORES ELEITORAIS. AUTORIZAÇÃO.

1. A necessidade de compatibilizar a nova regra da obrigatoriedade de exibição, no momento da habilitação para o exercício do voto, do título de eleitor e de documento de identificação com foto, com o aumento significativo da demanda nos cartórios eleitorais de todo o país visando à obtenção da cédula eleitoral, impõe a extensão do prazo para sua reimpressão além do dia 23.9.2010 – data limite para emissão de segunda via –, como forma de prevenir prejuízos ao eleitorado e dificuldades no dia da votação.

2. Prorrogação que se autoriza até três dias antes do pleito.

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em aprovar a proposta de prorrogação do prazo, até o dia 30 de setembro de 2010, nos termos das notas de julgamento.

Brasília, 21 de setembro de 2010.

Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski. Presentes a Ministra Cármen Lúcia, os Ministros Marco Aurélio, Aldir Passarinho Junior, Hamilton Carvalhido, Marcelo Ribeiro, Arnaldo Versiani e o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, Procurador-Geral Eleitoral."

O diretório nacional do Partido dos Trabalhadores ajuizou a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) n. 4467 perante o Supremo Tribunal Federal (STF), tendo sido distribuída à Ministra Ellen Gracie Northfleet. A medida cautelar foi julgada em 29 de setembro e, após pedido de vista do Ministro Gilmar Ferreira Mendes, apreciada na plenária do dia seguinte.


2. O "caput" do artigo 91-A da Lei das Eleições

Com a inovação trazida pela lei n. 12.034/2009, a Lei das Eleições reza:

"Art. 91-A. No momento da votação, além da exibição do respectivo título, o eleitor deverá apresentar documento de identificação com fotografia."

Julgando constitucional, o TSE no supracitado procedimento administrativo editou a seguinte norma:

"RESOLUÇÃO Nº 23281

PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 1365-37.2010.6.00.0000 – CLASSE 26 – SALVADOR – BAHIA

Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior

Interessado: Tribunal Regional Eleitoral da Bahia

Ementa: EXERCÍCIO. VOTO. APRESENTAÇÃO. DOCUMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. PREVISÃO EXPRESSA. OBRIGATORIEDADE. EXIBIÇÃO. TÍTULO DE ELEITOR. DOCUMENTO DE IDENTIFICAÇÃO COM FOTO. INCORPORAÇÃO. FUNCIONALIDADE. SISTEMA ELO. REIMPRESSÃO. CÉDULA ELEITORAL.

1. A Lei nº 12.034, de 2009, acrescentando o art. 91-A à Lei nº 9.504, de 1997, trouxe como inovação a obrigatoriedade de exibição do título de eleitor e de documento de identificação com foto para o exercício do voto.

2. À Justiça Eleitoral incumbe a adoção de providências para garantir, com o maior alcance possível, a plenitude do gozo dos direitos políticos positivos ao eleitorado, inclusive aos que, embora preservem o direito de voto, se encontrem com restrições à quitação eleitoral, impeditivas da obtenção de segunda via da cédula eleitoral.

3. Implementação, no Sistema Elo, de funcionalidade que possibilite a reimpressão, em caráter excepcional e temporário, de títulos eleitorais, a partir de requerimento padronizado, com dados idênticos aos do documento extraviado ou inutilizado em qualquer cartório ou posto de atendimento eleitoral, observada a data limite para o requerimento de segunda via.

Brasília, 16 de junho de 2010.

Resolvem os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, aprovar a proposta apresentada nos termos do voto do relator.

(a) Ricardo Lewandowski - Presidente

(a) Aldir Passarinho Junior - Relator"

Esse dispositivo legal é categórico: para votar o eleitor deve exibir o título eleitoral e o documento de identificação com fotografia, tais como cédula de identidade, carteira nacional de habilitação – modelo atual (CNH), carteira de trabalho e previdência social (CTPS), entre outros.

A dúvida era o passaporte, com o modelo atual, com capa azul, mas omitindo informações do modelo anterior como filiação. Na sessão administrativa de 2 de setembro de 2010, o plenário do TSE, aceitou por unanimidade esse documento como válido para fins do mencionado art. 91-A, sob a relatoria do Ministro Arnaldo Versiani, destacando-se que "O passaporte é, sim, um documento hábil de apresentação, junto com o título de eleitor, no momento da votação" [03]. Não remanesce dúvidas no acórdão publicado [04]:

"PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 2458-35.2010.6.00.0000 – CLASSE 26 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL

Relator: Ministro Arnaldo Versiani

Interessado: Tribunal Superior Eleitoral

Ementa: Votação. Identificação do eleitor. Passaporte.

- É cabível o uso do passaporte no dia da votação, para fins de identificação do eleitor, de modo a atender a exigência do art. 91-A da Lei das Eleições.

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em decidir que é cabível o uso do passaporte, no dia da votação, para fins de identificação do eleitor, nos termos das notas de julgamento.

Brasília, 2 de setembro de 2010.

Presidência do Ministro Ricardo Lewandowski. Presentes a Ministra Cármen Lúcia, os Ministros Marco Aurélio, Aldir Passarinho Junior, Hamilton Carvalhido, Marcelo Ribeiro, Arnaldo Versiani e a Dra. Sandra Verônica Cureau, Vice-Procuradora-Geral Eleitoral."

Houve ostensiva publicidade do TSE em rádio e televisão, além do vídeo disponível em sua página [05], com gasto estimado em R$ 4 milhões.

A norma do "caput" do artigo 91-A visava a evitar situações de uma pessoa votar por outra. Apesar do convênio do TSE com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) [06] e do dever do oficial de registro de pessoas naturais notificar óbitos à Justiça Eleitoral, ainda é possível movimentação no cadastro nacional de eleitores com ASE [07] 019 (cancelamento - falecimento).

Demais disso, são poucos os municípios que tiveram recadastramento biométrico [08]. Nessas cidades o eleitor, antes de votar, deve submeter sua impressão digital no terminal do mesário (TM) ou microterminal.

Há o dito popular pelo qual "onde nasce a dificuldade aparece a facilidade". Devido à dificuldade na obtenção de documento com fotografia, candidatos a cargo eletivo podem ter oferecido transporte de eleitores de pequenos municípios àqueles com melhor infraestrutura de serviços públicos em troca de votos [09], sendo possível caracterizar captação ilícita de sufrágio (artigo 41-A da Lei das Eleições).

Em obra de excelente lavra, Fernando Marques Sá comenta o art. 91-A, "caput", com sua vasta experiência pessoal de serviços à Justiça Eleitoral [10]:

"Documento de identificação e Fotografia"

"Esta inserção objetiva dificultar a ocorrência de fraude do crime previsto no artigo 309 do CE [Votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem: Pena - reclusão até três anos]."

"Contudo, há que se ressaltar que esta inovação irá, ao menos nas eleições de 2010, acarretar contratempos em razão de cindir a velha ordem observada no dia das eleições. De acordo com o legislador, doravante, o eleitor deverá apresentar além do título, um documento de identificação com foto, ou seja, deverá apresentar dois documentos simultaneamente."

"O hábito e a ausência de informações poderão acarretar em imensas filas e acentuado número de eleitores que não conseguirão exercer o direito cívico."

Como curiosidade tem-se que esse dispositivo proveio da redação original do projeto n. 5498, de 30 de junho de 2009 (n. 141/2009 no Senado Federal), de autoria dos deputados federais Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e outros [11] em acordo de lideranças de treze partidos para aperfeiçoar o sistema eleitoral. O 91-A foi artigo simples, sem parágrafos, incisos nem alíneas. O relator na Câmara dos Deputados foi Flávio Dino (PC do B / MA), tendo elaborado quatro pareceres às 140 emendas e uma subemenda substitutiva; no Senado Federal, os senadores Eduardo Azeredo (PSDB/MG) e Marco Maciel (DEM/PE) relataram a proposição com 84 emendas. Foi sancionado pelo Presidente da República como lei n. 12.034, de 2009, com alguns vetos (até a presente data mantidos).


3. A ADI 4467-DF

Em face do dispositivo referido e do artigo 47, § 1º, da resolução TSE nº 23218/2009, em 24 de setembro p.p. o diretório nacional do PT ajuizou perante o STF a ADI 4467-DF, alegando que a medida, incluída pela minirreforma eleitoral, seria desnecessária, injustificável e irrazoável. Para o autor seria "perfeitamente possível garantir a autenticidade do processo de votação, sem comprometer a universalidade do voto, mediante a consulta a um documento oficial com foto". Para o partido, houve um excesso na lei, que acaba por gerar uma restrição injustificável. A petição inicial fundamenta-se em que a necessidade de apresentar dois documentos para votar representa "cerceamento legal ao direito político do cidadão" [12].

Ainda, a Lei das Eleições definiria que, no momento da votação, "além da exibição do respectivo título, o eleitor deverá apresentar documento de identificação com fotografia". O autor alegou que a redação do artigo "não foi das mais felizes", e a norma, que buscava "conferir a segurança no momento da identificação do eleitor, transmudou-se em burocracia desnecessária no momento da votação". Para o Partido, "o indispensável é apresentar o documento com foto", uma vez que o Código Eleitoral (artigo 46, § 5º) estabelece que o título eleitoral é "mera prova de inscrição na seção eleitoral, nada mais que isso". Pugna que o inciso VI do artigo 146 do Código Eleitoral admitiria expressamente a votação de cidadão que não porte o título de eleitor, desde que estivesse inscrito na seção, e não teria sido revogado pela legislação eleitoral posterior. "O importante, obviamente, é garantir um processo seguro de identificação, e não impor ao cidadão o ônus de fazer dupla prova da sua condição civil e eleitoral."

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Portanto, para Márcio Thomaz Bastos e Pierpaolo Bottini, a cidadania "é um dos fundamentos da República, exercida diretamente ou por intermédio de representantes eleitos". Uma restrição "excessiva ou desarrazoada" a um direito de cidadania, em sua argumentação, viola o princípio constitucional da universalidade do sufrágio e veda o exercício dos direitos políticos do eleitor civilmente identificado por documento oficial com foto.

Com bastante acerto, Pedro Lenza [13] ensina:

"Cidadania tem por pressuposto a nacionalidade (que é mais ampla que a cidadania), caracterizando-se como a titularidade de direitos políticos de votar e ser votado. O cidadão, portanto, nada mais é do que o nacional que goza de direitos políticos."

Ainda [14]:

"Iniciamos o estudo pelos direitos e deveres individuais e coletivos, lembrando, desde já, como manifestou o STF, corroborando a doutrina mais atualizada, que os direitos e deveres individuais e coletivos não se restringem ao artigo 5º da CF/88, podendo ser encontrados ao longo do texto constitucional, expressos ou decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição, ou, ainda, decorrentes dos tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja parte."

Em obra basilar, José Afonso da Silva [15] prelaciona:

"Pode-se dizer, então, que a cidadania se adquire com a obtenção da qualidade de eleitor, que documentalmente se manifesta na posse do título de eleitor válido. O eleitor é cidadão, é titular da cidadania, embora nem sempre possa exercer todos os direitos políticos. É que o gozo integral destes dependem do preenchimento de condições que só gradativamente se incorporam no cidadão. Não nos parece que isso importe em graus de cidadania política. Esta é atributo jurídico-político que o nacional obtém desde o momento em que se torna eleitor. Mas é certo que alguns direitos políticos só se adquirem em etapas sucessivas. Nestes casos, podemos admitir que a aquisição dos direitos políticos se opera por graus, apenas para denotar o fato de que a plenitude de sua titularidade se opera por etapas: (1) aos 16 anos de idade; (2) aos 18 anos, é obrigado a alistar-se, tornando-se titular do direito de votar, se não o fizera aos 16, e do direito de ser eleito para Vereador; (3) aos 21 anos, o cidadão (nacional eleitor) incorpora o direito de ser votado para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Deputado Distrital (Distrito Federal), Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; (4) aos 30 anos, obtém a possibilidade de ser eleito para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; (5) finalmente, aos 35 anos o cidadão chega ao ápice da cidadania formal com o direito de ser votado para Presidente e Vice-Presidente da República e para Senador Federal (art. 14, § 3º)"

Em 27 de setembro de 2010, o diretório nacional do Democratas protocolou petição para ingressar na ação como "amicus curiae" [16]. No dia seguinte a Ministra Relatora exarou o seguinte despacho:

"1. Referente à Petição STF 54.127/2010, já juntada aos presentes autos eletrônicos. 2 O Democratas, pelo presidente de seu Diretório Nacional, requer sua admissão na presente ação direta de inconstitucionalidade na qualidade de amicus curiae. Verifico que o peticionamento eletrônico do presente equerimento ocorreu às 16h35min do dia 27.9.2010, em momento anterior, portanto, à apresentação em Mesa do pedido de medida cautelar formulado. 3. Presentes os requisitos do art. 7º, § 2º da Lei 9.868/99, defiro o pedido formulado. Observe-se, quanto à sustentação oral, o disposto no art. 131, § 3º, do RISTF, na redação dada pela Emenda Regimental 15, de 30.3.2004. À Secretaria para as anotações necessárias. Publique-se."

Em 29 de setembro último, após leitura do relatório, na tribuna, o advogado do autor Dr. José Gerardo Grossi reiterou os termos da exordial; por outro lado o patrono do "amicus curiae", Dr. Fabrício Medeiros, defendeu a norma. Segundo este, não há, no momento, outra forma de impossibilitar eventuais fraudes no momento da votação. Isso só será possível com a implantação do sistema de identificação biométrica. Até a biometria, disse o advogado, a lei cumpre o papel de garantir a segurança no processo de votação. Ele citou uma pesquisa segundo a qual mais de 94% dos eleitores estão cientes da necessidade de levar dois documentos no dia do pleito.

Após as sustentações orais, a relatora leu seu voto, pinçando-se: "Para votar, o eleitor é obrigado a apresentar tanto o título como o documento com foto. Porém, apenas a frustração da apresentação do documento com foto terá o poder de impedir o direito ao voto." Lembrou em seu voto que o projeto de lei que deu origem à Lei 12.034/2009 – chamada de minirreforma eleitoral –, foi apresentado no Congresso com assinatura de treze partidos, incluindo o PT – autor da ADI. Para ela, o projeto tinha por objetivo o aperfeiçoamento da verdade eleitoral, da vontade real do eleitor, dificultando a ocorrência de fraudes.

Ainda, asseverou "... plausíveis as preocupações da inicial, lembrando que ainda hoje se enfrentam problemas de segurança na identificação do eleitor. Mas para isso, o título não oferece a lisura necessária, para quem a confiabilidade deve ser feita com base em documento com fotografia. (...) A presença do título, que é a praxe, não é tão indispensável ... Cada urna conhece seus eleitores ... Se alguém quiser votar no lugar de outro eleitor, a urna não aceitará. Além disso, o caderno de votação, que fica com o mesário, contém dados que podem auxiliar na identificação do eleitor... A norma, para permanecer constitucional, deve ser lida no sentido de que, para votar, é necessário tanto o título quanto documento com foto. Porém, a ausência apenas do título de eleitor não pode impedir o exercício do direito".

Acompanharam a relatora os Ministros José Antônio Dias Toffoli, Cármen Lúcia Rocha Antunes, Enrique Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Marco Aurélio Mello. Pediu vista o Ministro Gilmar Mendes [17].

Para o ministro Dias Toffoli, a disposição da lei restringiu o exercício pleno da cidadania (artigo 1º, inciso II, da Constituição Federal). Para a ministra Cármen Lúcia, a segurança contra a fraude é garantida pelo caderno de votação, que está vinculado a cada urna eletrônica.

Para o atual Presidente do TSE, Ministro Ricardo Lewandowski, qualquer exigência que seja um obstáculo ao voto dever ser afastada, ou ao menos temperada. Ele se lembrou de situações excepcionais, como as que encontrou nos estados de Alagoas e Pernambuco, onde muitos municípios foram devastados por chuvas no meio do ano, e ainda dos indígenas, que podem votar mas não possuem documento com foto. O Ministro Ayres Britto asseverou que a lei era boa, por tentar combater a fraude, porém era dever de todos favorecer a determinação constitucional de permitir a todos o direito ao voto.

Com o pedido de vista, o Ministro Gilmar Mendes alertou os colegas de que seria uma decisão a refletir-se diante do pouco tempo antes das eleições.

Com o voto vista, o ex-Presidente da Suprema Corte afirmou estranhar o fato de o Partido dos Trabalhadores, uma das legendas que assinou o projeto de lei n. 5.498/2009, somente vir ao STF questionar a norma a poucos dias da eleição. Para ele, isso demonstraria um viés eminentemente político na pretensão. Segundo ele, "é absolutamente legítima a motivação política, mas a Corte não pode se deixar manipular". Ainda, questionou o fato de que o dispositivo, que originalmente tinha o objetivo de coibir eventuais fraudes, agora seja considerado pelo PT como um impedimento para o eleitor votar. Lembrou que o Tribunal Superior Eleitoral já havia se manifestado sobre esse dispositivo, reconhecendo que a norma devia ser respeitada. Prosseguiu que o TSE realizou campanha de esclarecimento ao eleitor, ao custo de cerca de R$ 4 milhões, para entre outras coisas reforçar a exigência dos dois documentos, uma das novidades trazidas pela Lei 12.034/2009. Logo, votou pelo indeferimento da liminar, dizendo não ver qualquer inconstitucionalidade flagrante que autorizasse a concessão da medida cautelar pedida pelo PT, promovendo uma mudança de última hora nas regras previamente estabelecidas para o pleito, salientou o ministro. Tais regras, segundo ele, foram implementadas respeitando o princípio da anterioridade da lei eleitoral, previsto no artigo 16 da Constituição Federal. Inclusive, sobre este ponto, o ministro Gilmar Mendes frisou que o principio da anterioridade vincula não só o Poder Executivo como o Poder Judiciário.

Por outro lado, o Ministro Celso de Mello acompanhou o voto da relatora.

Por fim, o Presidente da Excelsa Corte, Ministro Antonio Cezar Peluso, acompanhou a divergência, ao entender que a decisão da maioria dos membros do Tribunal estaria, na prática, decretando a extinção do título de eleitor. Considerou que existem, realmente, situações excepcionais que justificam a não apresentação do documento, porém dizer que os dois documentos eram exigidos, mas só um era necessário, corresponde à dispensa, na prática, do título. Logo, não haveria inconstitucionalidade no dispositivo questionado, e que não seria norma desproporcional ou desarrazoada. E proclamou o resultado:

"Decisão: Após o voto da Senhora Ministra Ellen Gracie (Relatora), concedendo a liminar para, mediante interpretação conforme, reconhecer que a falta do título eleitoral não impede o exercício do voto, no que foi acompanhada pelos Senhores Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Ayres Britto, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Falou, pelo requerente, o Dr. José Gerardo Grossi e, pelo amicus curiae, o Dr. Fabrício Medeiros. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso. Plenário, 29.09.2010."

"Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, contra os votos dos Senhores Ministros Gilmar Mendes e o Presidente, Ministro Cezar Peluso, concedeu liminar para, mediante interpretação conforme conferida ao artigo 91-A, da Lei nº 9.504/97, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 12.034/09, reconhecer que somente trará obstáculo ao exercício do direito de voto a ausência de documento oficial de identidade, com fotografia. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa, com voto proferido na assentada anterior. Plenário, 30.09.2010."

Em outras palavras, oito votos a dois pela concessão da liminar dando interpretação conforme a Constituição da República ao art. 91-A, "caput", da lei n. 9504/97 e art. 47, § 1º, da resolução TSE 23.218/2009. Em termos práticos, para votar só apresentar o título de eleitor não basta, mas levar sim um documento com foto [18].

O TSE vem divulgando os eleitores em publicidade institucional esse julgado [19]. Há até candidato que comemore a decisão do STF, até porque "a ação judicial foi motivada pelo temor que os eleitores mais pobres, onde [o partido] tem mais votos, acabassem não podendo votar pela falta dos dois documentos (título de eleitor e documento de identidade)." [20]

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Sobre os autores
Milena Hatsumi Ide

Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD)

Luiz Negrão

Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito (EPD).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

IDE, Milena Hatsumi ; NEGRÃO, Luiz. Para votar basta o documento com foto. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2648, 1 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17534. Acesso em: 25 dez. 2024.

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