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Aposentadoria especial de servidores públicos.

Exercício sob condições especiais de insalubridade ou periculosidade

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12/10/2010 às 09:57
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5. SITUAÇÃO ATUAL DO SERVIDOR PÚBLICO

O presente artigo não tem a pretensão de esgotar o complexo tema nem fôlego para indicar as condições de regulamentação ou falta desta de todas as carreiras de servidores públicos de todos os Estados brasileiros e da União.

Assim, fazendo um corte de cunho prático, nos ateremos no momento aos servidores públicos, civis e militares, do Estado de São Paulo cujo exercício profissional, sob condições de insalubridade ou periculosidade, não tem regulamentada a aposentadoria especial conforme determina a Constituição Estadual em seu art. 126, § 4º, que reproduz o texto do art. 40, § 4º da Constituição Federal.

Conforme salientado anteriormente, enquanto não advier o suprimento da lacuna regulamentadora por quem de direito, o pronunciamento judicial faz norma obrigatoriamente aplicável a todos servidores públicos quantos comprovarem satisfazerem as condições necessárias estabelecidas pela constituição pelo art. art. 57, da Lei nº 8213/91.

Lei nº 8.213/91

-Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências.

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).

§ 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995).

Exemplificativamente, mas sem perder de vista o grande número de interessados, tem-se os policiais civis e militares do Estado de São Paulo, mas, repita-se, aplica-se igualmente aos demais servidores públicos que exercem atividade insalubre, penosa ou perigosa.

Aplica-se aos policiais civis e militares do Estado de São Paulo a decisão resultante do MI nº 168.151-0 / TJSP que assegurou aos servidores públicos do estado aposentadoria especial mediante comprovação do exercício de 25 anos de atividade insalubre ou perigosa.

Antes que a Administração Pública possa equivocar-se ou ter dúvida quanto a "efetiva aplicabilidade dessa decisão judicial aos militares estaduais" ou policiais civis, enfermeiros, etc., ou entenda que "não há definição a respeito", cumpre observar que:

i. O MI nº 168.151-0 / TJSP estabelece efeitos constitutivos e erga omnes, portanto assegura efetivamente a concretização de direito a aposentadoria especial após 25 anos de serviço insalubre ou perigoso, a todos os servidores públicos estaduais que comprovarem tal condição. Vale ressaltar que a referida decisão impondo o dever de dar cumprimento à toda a Administração Pública acolheu por completo o MI nº 721-7 / STF, que estabelece a norma do art. 57 § 1º, da Lei nº 8.213/91 como norma aplicável ao caso.

ii. O MI nº 990.10.037533-4 / TJSP reafirmou o efeito erga omnes do MI nº 168.151-0, esclarecendo que qualquer servidor interessado poderá delas se valer da referenciada decisão (MI nº 168.151-0), incluindo obviamente o próprio impetrante, policial militar.

iii. O MI nº 990.10.040639-6 / TJSP reforça a já decidida e não mais pendente de análise judicial, por ter já suprido judicialmente a omissão legiferante, decisão do MI nº168.151-0 / TJSP (acolhendo completamente o MI nº 721-7 / STF). Completa ainda, excluindo por completo qualquer dúvida de boa fé na aplicabilidade da decisão judicial aos militares estaduais registrando que para todos efeitos o policial militar é servidor público estadual e mesmo sob regime estatutário diferenciado em relação aos civis submete-se aos mesmos critérios para aposentadoria especial nos moldes do art. 58 da Lei nº 8.213/91, ou seja, aposentadoria após 25 anos nas condições citadas.

iv. O relatório dos embargos declaratórios ao acórdão do MI nº 758 / STF, registra, citando exemplificativamente a própria impetrante, servidor publico civil da área de saúde, que é "um despropósito brutal ter-se a diminuição substancial do tempo de serviço e manter-se a idade mínima para aposentadoria em 65 anos, se homem, e 60, se mulher".

Assim aplica-se aos servidores civisos parâmetros da Lei nº 8.213/91, art. 57, § 1º, quanto ao critério temporal de atividade de 15, 20 ou 25 anos, nas condições em pauta, não sendo "exigível para aposentadoria especial" a idade do servidor. Decisão semelhante é a do MI nº 788-8 cujo impetrante foi policial civil do Estado de São Paulo.

Portanto o único critério temporal é a comprovação do exercício da atividade penosa, insalubre ou perigosa pelos prazos estabelecidos no art. 57, § 1º da Lei nº 8.213/91, sendo indiferente a idade do servidor.

v. interessante observar ainda que no MI nº MI 168.151-0, tanto já comentado até aqui, o impetrante assegurou a contagem parcial de seu tempo de serviço nas condições em comento (insalubridade e periculosidade). Portanto até mesmo o servidor público, naquelas condições, que não completou os 25 anos de serviço pode garantir a contagem parcial para futura aposentadoria. Veja que a aponsentadoria é ainda, para esse servidor, uma expectativa de direito, mas o tempo já exercido é garantido pela Constituição Federal e Estadual, conforme decisão erga omnes, nos moldes do regulado pelo art. 57, § 1º da Lei nº 8.213/91.

desde já beneficiar-se da contagem especial de tempo para futura aposentadoria, pelo exercício do trabalho insalubre. (voto Des. Luiz Elias Tâmbara – MI 168.151-0, fl. 136)

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6. CONCLUSÃO - PROVIDÊNCIAS

Diante de tudo aqui exposto resta aguardar o bom senso e respeito à Constituição, ao Poder Judiciário e aos servidores públicos, por parte da Administração Pública no cumprimento da norma supletiva.

A experiência de alguns pode apontar para a possibilidade da Administração Pública, Poder Executivo, criar inúmeros entraves burocráticos visando atrasar ou inviabilizar os pedidos de aposentadoria baseados no que aqui foi exposto. Essa posição não é de todo impossível, a semelhança da Instrução Normativa nº 1, de 22/07/10, da Secretaria de Políticas de Previdência Social, que "estabelece instruções para o reconhecimento do tempo de serviço público exercido sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física pelos regimes próprios de previdência social para fins de concessão de aposentadoria especial aos servidores públicos amparados por Mandado de Injunção".

Verifica-se no exemplo acima nítido objetivo de inviabilizar o pedido, transferindo ao servidor o ônus da prova do exercício sob condições especiais. As normas da Instrução Normativa citada afronta claramente os acórdãos do STF a respeito, pois aplica outras normas da Lei 8213/91, cuja aplicação foi vetada pelas decisões judiciais, aos servidores públicos. Esse tipo de artifício afronta o Poder Judiciário, os servidores públicos e toda a sociedade, sendo nessa hipótese específica – tentativa de inviabilizar o direito líquido e certo advindo de decisão transitada em julgado com efeitos erga omnes, por meio da burocratização do trâmite administrativo – pode ser enfrentado por meio de Mandado de Segurança em face da autoridade coatora.

Encerrando portanto, em apertado resumo conclusivo, indica-se as duas hipóteses mais prováveis de ocorrência na relação entre Administração Pública e servidor:

1) se a Administração Pública acatar decisão judicial, verificando os requisitos normatizados pelo Judiciário (tempo de exercício de atividade insalubre ou perigosa conforme estabelece art. 57, § 1º da Lei nº 8.213/91 – para servidores públicos civis e militares, só resta aguardar o trâmite administrativo e o servidor irá entrar em gozo de seu direito constitucional de aposentar-se após longa e penosa jornada, ou melhor dizendo, insalubre ou perigoso labor.

2) se a Administração Pública recusar-se a cumprir a norma supletiva estabelecida erga omnes pelo STF e TJSP, entendendo não ser de efetiva aplicabilidade as referidas decisões judiciais, para qualquer que seja a categoria, carreira ou cargo tratado, a única saída é a busca pela prestação de serviço de um advogado, inteirado do tema, para buscar a intervenção judicial em face da desobediência de autoridade pública frente a decisão do Judiciário.

Esperamos que a Constituição tenha sido elaborada para ser cumprida e o perigo indicado por Pontes de Miranda seja apenas força retórica do brilhante jurista.


BIBLIOGRAFIA

MACHADO, Carlos Augusto Alcântara. Direito Constitucinal. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2005.

MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

MI nº 721 / STF

MI nº 795 / STF

ED - MI n° 758 / STF

MI nº 758 / STF

MI nº 990.10.040639-6, de 15/09/2010

MI nº 990.10.037533-4, de 25/08/2010

MI nº 168.143-0 / TJSP

MI nº 168.146-0 / TJSP

MI nº 168.151-0/ TJSP

MI nº 168.152-0 / TJSP

MI nº 168.144-0/2-00 / TJSP


Notas

  1. MIRANDA, Pontes. Comentários à Constituição de 1967. Tomo I. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 15-16.
  2. MACHADO, Carlos Augusto Alcântara. Direito Constitucinal. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2005, p. 282.
  3. MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1377.
  4. MENDES. Op. cit., p. 1185-1186.
  5. Idem.
  6. Segundo Gilmar Ferreira Mendes "as sentenças aditivas ou modificativas são aceitas, em geral, quando integram ou completam um regime previamente adotado pelo legislador ou, ainda, quando a solução adotada pelo Tribunal incorpora solução constitucionalmente obrigatória" (MENDES. Op. cit., p. 1394).
  7. MENDES. Op. cit., p. 1394.
  8. MENDES. Op. cit., p. 1395.
  9. MI nº 721-7, voto do Min. Eros Grau.
  10. Quanto ao aspecto da separação dos poderes é importante o registro do Mininstro Eros Grau exarado em voto no MI nº 721-7 / STF: "Ademais, não há que falar em agressão à ‘separação dos poderes’, mesmo porque é a Constituição que institui o mandado de injunção e não existe uma assim chamada ‘separação de poderes’ provinda do direito natural. Ela existe, na Constituição do Brasil, tal como nela definida. (...) De resto, o Judiciário está vinculado pelo dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora faltante. Note-se bem que não se trata de simples poder, mas de dever-poder."
  11. STF / MI nº 721-7, relator Min. Marco Aurélio.
  12. A respeito o relator se atem mais atentamente registrando que: "A função legislativa é maior e menor do que a função normativa. Maior porque abrange a produção de atos administrativos sob a forma de leis (leis apenas em sentido formal, lei que não é norma, entendidas essas como preceito primário que se integra no ordenamento jurídico inovando-o); menor porque a funçção normativa abrange não apenas normas jurídicas contidas em lei, mas também nos regimentos editados pelo Poder Judiciário, e nos regulamentos expedidos pelo Poder Executivo. Daí que a função normativa compreende a função legislativa (enquanto produção de textos normativos), a função regimental e a função regulamentar" (STF / MI nº 721-7, voto Min. Eros Grau).
  13. STF / MI nº 721-7, relator Min. Marco Aurélio.
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Sobre o autor
Eduardo Henrique Alferes

Mestrando em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Pós-graduando em Direito Penal pela Escola Superior de Advocacia (ESA-OAB/SP). Cursou graduação em Engenharia de Minas pela Universidade Federal de Ouro Preto e Engenharia Civil pela Universidade Federal de São Carlos. Oficial da Polícia Militar, atualmente exerce atividades de Polícia Judiciária Militar.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALFERES, Eduardo Henrique. Aposentadoria especial de servidores públicos.: Exercício sob condições especiais de insalubridade ou periculosidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2659, 12 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17595. Acesso em: 26 abr. 2024.

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