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Responsabilidade civil do Estado em relação à segurança pública.

O fenômeno "bala perdida"

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Resumo:


RESUMO



  • A responsabilidade civil do Estado brasileiro em relação a danos causados por agentes públicos, em especial policiais, durante suas funções públicas, tem evoluído ao longo do tempo, passando da teoria da irresponsabilidade para a adoção da teoria do risco administrativo.

  • O fenômeno das "balas perdidas", decorrente de ações policiais, tem gerado discussões jurídicas sobre a responsabilidade do Estado, com decisões judiciais que ora exigem a comprovação da autoria do disparo por parte de policiais para a responsabilização estatal, ora afastam essa necessidade.

  • Recentemente, o Supremo Tribunal Federal proferiu decisão importante, condenando o Estado de Pernambuco por omissão no dever de zelar pela ordem pública, sinalizando que o Estado tem o dever constitucional de prover segurança pública e não pode se eximir das consequências do descumprimento desse dever.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

CONCLUSÃO

Ao longo da história, desde a época do Império Romano, a responsabilidade estatal sofreu grandes evoluções. Primeiramente o ordenamento jurídico regrava que o Estado era irresponsável pelos atos de seus agentes, quando causassem danos a terceiros. Logo em seguida, na segunda metade do século XIX, passou-se a adotar a culpa como pressuposto desta responsabilidade.

No Brasil, a responsabilidade do Estado passou a constar do ordenamento jurídico somente em 1824, com a promulgação da primeira Constituição pátria, porém ainda muito retraída, pois que a Administração Pública não tinha a total imposição de ser responsável pelos atos de seus agentes. Figurava ainda a responsabilidade subjetiva, com a prova de culpa de seus funcionários. As demais Constituições seguiram o mesmo preceito.

Somente com o advento da Constituição Cidadã, em 1988, o Estado passou a ser responsabilizado pelos atos praticados pelos seus funcionários, adotando a teoria do risco administrativo. Com ela foi criado um novo modelo de regramento jurídico, balizado precipuamente no princípio da dignidade humana, bem como um novo modelo de gestão da Administração Pública, o Estado Democrático, permitindo a sociedade civil passou a possuir direitos e deveres igualitariamente.

A dignidade da pessoa humana e o limite de atuação do Estado constituem os sustentáculos primordiais dos direitos humanos. Como princípio, é a pilastra-mestra de todo o ordenamento brasileiro. Nenhuma norma poderá ser criada e nenhum ato poderá ser propugnado de modo a infringir tal princípio. Deste modo, sua intangibilidade é pressuposto para a consecução de um Estado democrático mais justo e equânime.

Quando dizemos que o Estado é garantidor dos direitos humanos, corremos o risco de considerá-lo como uma entidade ontologicamente independente, dotada de atitudes que norteiam inelutavelmente a vida dos indivíduos, dotada de atitudes que norteiam inelutavelmente a vida dos indivíduos. Contudo, ao afirmarmos que o Estado possui mecanismos que deveriam garantir os direitos primários do homem, definidos pela Constituição e reconhecidos antes dela, somos obrigados a reconhecer o nosso papel enquanto cidadãos, pois todos nós somos atingidos pelo que decidirá nossa vida social.

O direito ao respeito à dignidade da pessoa humana não são antíteses de polícia eficiente, senão de polícia bárbara, violenta, não profissional. Assim, a autoridade e observância indelével do princípio da dignidade humana deve em função do conjunto de todos os humanos, que merecem salvaguarda de seus direitos mínimos, porém essenciais a sua própria existência, e que são garantidos não somente pelo Direito interno, mas também pelo Direito internacional, com virtuais sanções até para Estados violadores e omissos.

A polícia, mecanismo estatal criado no início simplesmente para defender os interesses de elite que governavam o país, com o tempo sofreu uma mudança significativa, passando a ser uma atividade necessária à paz social.

Por outro lado, a história nos ensina que à medida em que as relações sociais evoluíram, também evoluíram com elas a noção do que é inerentemente necessário a todo o homem, e por isso, deveria ser garantido por Direito. Nesse contexto, a polícia que antes era apenas um mecanismo de controle do Estado, passou a ser considerada um dos mecanismos geradores da segurança, uma das necessidades do homem que passou a ser reconhecida como tal. Nesse sentido, falar em segurança como Direito inerente a todo homem, será também reconhecer que "Direitos Humanos é coisa de Polícia", pois ela é um dos mecanismos garantidores daquela.

Para chegar-se a idéia atual de Estado Democrático foram necessárias inúmeras rupturas e transformações no Estado de Direito. Diferentemente da idéia a que se prendiam os outros modelos de Estado (liberal e social), o Estado Democrático de Direito apresenta a incorporação de conteúdos novos com o aumento de direitos e mudanças no próprio conteúdo do Direito. Verifica-se uma mudança no caráter da regra jurídica, deixando o preceito genérico e abstrato à percepção de um direito interpretado a um conjunto de valores e princípios. A concepção formal é submetida a concepção material ou substancial, o Estado adquire um caráter mais dinâmico e mais forte do que a sua concepção formal, ou seja, as normas devem estar submetidas às variações sociopolíticas, analisando-as de acordo com os princípios democráticos de direito.

É certo que a grave crise na segurança pública em que vivemos atualmente, em especial no Estado do Rio de Janeiro, não é responsabilidade somente do governo estadual, como também a ausência de verdadeiras políticas públicas de segurança em nível federal. Mesmo diante da elevadíssima carga tributária imposta aos cidadãos, inexistem políticas que efetivamente promovam, principalmente, a educação, a saúde e a segurança pública, com o mínimo de estrutura e continuidade.

Além de não dispor de serviços prestados com eficiência e eficácia, o Estado, enquanto, conjunto de indivíduos pertencentes a uma sociedade, se expõe ao arcar com condenações envolvendo elevados valores indenizatórios, em especial oriundas de danos morais. Há um grande equívoco ao se pensar na irresponsabilidade do Estado, em razão da omissão na prestação da segurança pública, pois, como se viu, ela acarreta um pesado ônus ao corpo social.

Por isso, a mudança das decisões dos nossos tribunais abandonando a irresponsabilidade do Estado, nessas hipóteses, mais se aproxima do perfil democrático que se almeja para o nosso Estado, como transformador da realidade, ultrapassando o aspecto material de concretização de uma vida digna ao homem.

Já no que tange a segurança pública em nosso país, este foi sempre um assunto colocado à margem. A sociedade sempre o desprezou e isso se refletiu por muitos anos na ausência dos movimentos sociais e mesmo das academias nas discussões em geral e na formulação teórica sobre esse tema, como se isso fosse de interesse apenas do Estado.

Por fim, presente o trabalho procurou, na limitação de um estudo monográfico, ainda que perspectivo, delimitar os campos em que pode validamente ser argüida a responsabilidade do Estado em matérias de bala perdida, até porque não existe conceito jurídico de que seja "bala perdida".


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Sobre a autora
Ana Patricia da Cunha Oliveira

Bacharel em Direito pelo Instituto Metodista Bennett (2009), pós-graduada em Gestão Pública pela UCAM (2011), MBA em Governança, Compliance e Gestão de Riscos pela UCP (2023).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Ana Patricia Cunha. Responsabilidade civil do Estado em relação à segurança pública.: O fenômeno "bala perdida". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2721, 13 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18024. Acesso em: 23 dez. 2024.

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