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Pensão militar: a legalidade da concessão às filhas maiores de 21 anos e capazes e a controvérsia da ordem de prioridades para seu deferimento

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24/12/2010 às 12:47
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4. DISPOSITIVOS LEGAIS APLICÁVEIS À PENSÃO MILITAR: EVOLUÇÃO HISTÓRICO-DOGMÁTICA

As origens da pensão militar, no Brasil, remontam ao Século XVIII, quando criado o Plano de Montepio Militar dos Oficiais do Corpo da Marinha, em 23 de setembro de 1795. Este documento foi o primeiro ensaio no sentido de assegurar à família do militar falecido assistência condigna e compatível com o ambiente social em que vivia. Portanto, o advento da pensão militar tem uma historicidade que antecede mesmo ao movimento previdenciário no Brasil, cuja origem é atribuída à Lei Eloy Chaves de 1923 [12].

Um dos atuais problemas encontrados pelos operadores do direito é a interpretação e integração das inúmeras leis que versam sobre a pensão militar. Vítima de impropriedades técnicas, derivadas de inúmeras derrogações e emendas, os textos atuais ainda apresentam patente falta de clareza, induzindo o intérprete, muitas vezes, a uma exegese equivocada.

A principal lei que versa, especificamente, sobre as Pensões Militares é a Lei 3.765, de 04 de maio de 1960. Tal lei dispõe sobre as contribuições e contribuintes da pensão militar, beneficiários, ordem de vocação e condições para a habilitação e por fim traz dispositivos sobre a perda e reversão da pensão militar.

Em 23 de dezembro de 1971 foi publicada a Lei 5.774 – Estatuto dos Militares – que serviu durante bastante tempo como fonte normativa das pesões militares, sendo revogada pela Lei 6.880, de 08 de dezembro de 1980, que manteve em vigor (art. 156) os arts. 76 a 78 da Lei 5.774 até o advento da nova Lei de Pensões Militares.

A Lei 8.216, de 13 de agosto de 1991 introduziu mudanças significativas na ordem de vocação para a pensão militar, equiparando na primeira ordem de prioridades a viúva ou viúvo; companheira ou companheiro; filhas solteiras e filhos menores de 21 anos ou, quando estudantes, menores de 24 anos. Percebe-se que o legislador, atento às mudanças de cunho social implementadas após o advento da Constituição de 1988, introduziu beneficiários ausentes nas leis anteriores, como o viúvo, a companheira e companheiro e passou a considerar beneficiárias apenas as filhas solteiras, bem como estendeu o benefício aos filhos até 21 anos ou 24 anos, se estudantes.

Embora tenham sido implementadas mudanças importantes, a Lei 8.126/91 teve seu artigo 29 (que cuidava da ordem de prioridades da pensão militar) declarado inconstitucional pelo STF através da ADI 574. Apontou-se a inconstitucionalidade formal do dispositivo, pois, após emenda, não retornou à outra casa para reapreciação. Pouco tempo depois, a Lei 8.237, de 30 de setembro de 1991, introduziu outras modificações sobre a pesão militar, mas voltou-se a aplicar a ordem de prioridades da Lei 5.774/71, de acordo como o comando do art. 156 da Lei 6.880/90.

Finalmente, com o advento da Medida Provisória 2.215-10, de 31 de agosto de 2001, resolveram-se parte dos problemas advindos da multiplicidade legislativa atinente às pensões militares.

A citada MP vigora até hoje por força do disposto no art. 2º. da EC 32/01, ou seja, continuará em vigor até que medida provisória ulterior a revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional.

A MP 2.215-10/01 dispõe sobre a reestruturação da remuneração dos militares das Forças Armadas, altera as Leis nº 3.765, de 4 de maio de 1960, e 6.880, de 9 de dezembro de 1980, e dá outras providências, principalmente criando regra de transição acerca da concessão da pensão às filhas maiores e capazes dos militares, bem como a manutenção de outros benefícios específicos da Lei 3.765/60.

A aludida MP ab-rogou a Lei 5.774/71 ao revogar expressamente o art. 156 e 160 da Lei 6.880/80, bem como ab-rogou a Lei 8.237/91, reduzindo o rol de diplomas legais aplicáveis à matéria, facilitando assim a exegese do operador do direito.

Desta forma, os diplomas que serão aplicados à pensão militar serão a Medida Provisória 2.215-10/01 e a Lei 3.765/60, com as modificações introduzidas pela MP.

As principais inovações da MP foram: a) alteração da ordem de vocação de beneficiários à pensão militar, equiparando cônjuge, companheiro, ex-cônjuge e ex-companheiros pensionados, filhos e menor sob guarda até 21 anos ou 24 anos, se estudantes, ou inválidos, enquanto durar a invalidez, todos na primeira ordem de vocação; b) repartição do benefício em partes iguais entre cônjuge ou companheiro e ex-cônjuge ou ex-companheiro, e existindo filhos, repartição de metade para estes e metade para cônjuge ou companheiro e ex-cônjuge ou ex-companheiro; c) a manutenção dos benefícios da Lei 3.765/60 para aqueles militares que optarem por contribuir com 1,5% do soldo mensalmente até 29 de dezembro de 2000.

O principal benefício da Lei 3.765/60, mantido pela contribuição específica, é a manutenção da pensão militar aos benefíciários descritos no antigo art. 7º. da referida lei, mais especificamente às filhas maiores de 21 anos e capazes, que com o advento da MP foram excluídas como beneficiárias da pensão militar.

Tal adaptação faz valer o princípio da isonomia entre homens e mulheres, o que cada vez mais torna-se realidade na sociedade contemporânea, mas a supressão de quaisquer direitos de ordem social deve ser gradativa, de modo que a regra de transição ainda manteve, de forma justa, o pensionamento paras as filhas maiores dos militares que contribuíram à época para ter o benefício mantido.

Um aspecto relevante a ser abordado é a Lei 10.486, de 04 de julho de 2002, que dispõe sobre a remuneração dos militares do Distrito Federal e dá outras providências. A importância da análise desta lei é que os militares do DF, até a edição desta norma, foram regidos pela Lei 3.765/60, em paridade de condições com os militares das forças armadas. Assim, a Lei 10.486/02, reproduziu em grande parte a MP 2.215-10/01, mas foi além, introduzindo inovações desejáveis na ótica do direito contemporâneo.

Duas importantes inovações trazidas pela Lei 10.486/02, dentro do contexto da pensão militar é o disposto em seu art. 39, §§ 1º e 3º. O § 1º estabelece que o rateio entre beneficiários da mesma ordem de prioridades será feito de maneira equânime entre eles, repetindo norma presente no art. 77 da Lei 8.213/91 – Lei do Regime Geral de Previdência. O § 3º estabelece inovação que tem sido objeto de decisões recentes de nossos tribunais, que é a manutenção da pensão alimentícia paga ao ex-cônjuge ou ex-companheiro, evitando que com a morte do instituidor do benefício, aqueles venham a sofrer enriquecimento sem causa, privando os entes mais próximos do benefício que já integrava seu padrão de vida.

Até a presente data a Medida Provisória 2.215-10/01 não foi convertida em Lei pelo Legislativo, vigorando indefinidamente, o que reflete a omissão do poder Legislativo no que concerne o tema da Pensão Militar, que sempre careceu de cuidado e melhor técnica legislativa.


5. ANÁLISE DA ORDEM DE VOCAÇÃO DOS BENEFICIÁRIOS DA PENSÃO MILITAR

Pode-se dizer que a análise da ordem de vocação da pensão militar é tarefa altamente complexa e controvertida, dado o número de diplomas legais que tratam do assunto, bem como o alto número de dispositivos revogados e repristinados, e ainda a intepretação conforme a constituição que deve-se fazer a alguns artigos editados antes da Carta de 1988.

A concessão da pensão militar é devida pela ocorrência do evento morte do militar, independentemente se este estava na atividade ou reformado, obedecendo ao disposto no art. 71 da Lei 6.880/80. O processo de habilitação à pensão militar tem como base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, de acordo com a regra do art. 71, §3º. da Lei 6.880/80, na ordem de prioridade e condições definidas especificamente no art. 7º da Lei 3.765/60, modificado pela MP 2.215-10/01, observado o disposto pelo art. 72 da retrocitada Lei de 1980.

Antes da edição da Medida Provisória 2.215-10/01, o art. 72 da Lei 6.880/80 era combinado com o art. 156 da mesma lei, que remetia aos arts. 76 a 78 da Lei 5.774, de 23 de dezembro de 1971, considerando-os vigentes, embora a norma já estivesse revogada. Estes artigos definiam a ordem de prioridades e condições para a concessão da pensão militar.

A Lei 5.774/71 estabelecia uma única ordem de prioridades, dividida em 6 classes, repetindo, com pequenas alterações, a ordem da Lei 3.765/60, sendo forçoso ressaltar que tais disposições foram editadas na égide da Constituição de 1967, com a redação dada pela EC nº. 01/69.

Ambas as Leis, 3.765/60 e 5.774/71, faziam referência exclusiva à viúva, que ocupava sozinha a primeira classe da ordem de vocação, seguida pelos filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino, que não fossem interditos ou inválidos, classe em que se enquadravam as filhas maiores e capazes dos militares.

Com a revogação expressa do art. 156 da Lei 6.880/80, restou aplicável à espécie, a ordem de vocação estabelecida pela Medida Provisória de 2001, que adequou a lista de beneficiários à norma constitucional ora vigente (art. 226 e §§; CF), corrigindo distorções, com a introdução do termo cônjuge em substituição ao termo viúva, bem como a introdução do companheiro, a indistinção entre beneficiários do sexo masculino e feminino e finalmente, o enquadramento dos filhos e menores sob guarda na primeira ordem de prioridades.

Desta forma, cabe, no presente trabalho, a análise do art. 7º. da Lei 3.765/60, com a redação dada pela MP 2.215-10/01, bem como do revogado art. 7º. da mesma Lei, uma vez que tem sido aplicado – de maneira equivocada ao nosso entender - até hoje por força do art. 31 da referida MP.

Conforme exposto anteriormente, a ordem de vocação da Lei 3.765/60 contemplava em seu art. 7º as seguintes classes de prioridades: a) a viúva; b) os filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino, que não sejam interditos ou inválidos; c) os netos, órfãos de pai e mãe, nas condições estipuladas para os filhos; d) a mãe viúva, solteira ou desquitada, e o pai inválido ou interdito; e) as irmãs germanas e consangüíneas, solteiras, viúvas ou desquitadas, bem como os irmãos menores mantidos pelo contribuinte, ou maiores interditos ou inválidos; f) o beneficiário instituído, desde que viva na dependência do militar e não seja do sexo masculino e maior de 21 (vinte e um) anos, salvo se for interdito ou inválido permanentemente.

A nova ordem de vocação, conforme a redação dada ao art. 7º pela MP 2.215-10/01, elenca 3 ordens de prioridade: I) Primeira ordem – contendo 5 classes, onde há concorrência entre os beneficiários: a) cônjuge; b) companheiro ou companheira designada ou que comprove união estável como entidade familiar; c) pessoa desquitada, separada judicialmente, divorciada do instituidor ou a ex-convivente, desde que percebam pensão alimentícia; d) filhos ou enteados até vinte e um anos de idade ou até vinte e quatro anos de idade, se estudantes universitários ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez; e) menor sob guarda ou tutela até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade ou, se inválido, enquanto durar a invalidez; II) Segunda ordem – classe única, deferindo-se a pensão igualmente entre os beneficiários: a mãe e o pai que comprovem dependência econômica do militar; III) Terceira ordem – contendo 2 classes – a lei é omissa no que tange ao rateio em caso de mais de um beneficiário: a) o irmão órfão, até vinte e um anos de idade ou, se estudante universitário, até vinte e quatro anos de idade, e o inválido, enquanto durar a invalidez, comprovada a dependência econômica do militar; b) a pessoa designada, até vinte e um anos de idade, se inválida, enquanto durar a invalidez, ou maior de sessenta anos de idade, que vivam na dependência econômica do militar.

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A maioria dos tribunais do país, conforme observa-se na jurisprudência, entende que os "benefícios" mantidos pelo art. 31 da MP 2.215-10/01 compreendem, principalmente, a lista de beneficiários arrolados no revogado art. 7º da Lei de 1960, de maneira que houve, para estes, a manutenção da pensão militar pela referida regra de transição, mediante contribuição de 1,5% do soldo do militar instituidor. Este é também o entendimento adotado pela administração pública.

Tal solução está em perfeita sintonia com o entendimento de que certos direitos e garantias considerados fundamentais (dentre eles os sociais) devem, quando da hipótese excepcional de sua supressão, sofrer um processo gradativo de retirada.

O problema reside na ordem de vocação a ser aplicada a tais beneficiários, resguardados pelo art. 31 da MP. Deverá ser aquele do primitivo art. 7º da Lei 3765/60 – revogado pela MP 2.215-10/01? Ou dever-se-á aplicar a nova ordem de prioridades da aludida Medida Provisória, que efetivamente deu nova redação ao art. 7º da Lei de 1960?

Assevera-se aqui que no conflito aparente de normas, onde fica a critério da administração, bem como do judiciário, definir quais sejam os benefícios mantidos pela referida Medida Provisória, devem os órgãos judiciários interpretar sempre a lei em consonância com a ordem Constitucional vigente.

O primeiro problema em aplicar o revogado art. 7º da Lei 3.765/60, é a falta de previsão ao pensionamento de beneficiários protegidos constitucionalmente pelo Estado, como o cônjuge varão (viúvo, ou ex-marido) e o companheiro ou companheira.

Outro problema ao aplicar a ordem de prioridades de 1960 reside no fato de não haver tratamento equiparado entre familiares onde os fundamentos da necessidade e solidariedade são exatamente iguais, como os filhos (incluido as filhas maiores) frente à viúva (ou ex-mulher), contrariando assim o comando Constitucional presente no art. 226 da CF em seu §4º que define a entidade familiar como a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, conferindo proteção estatal a todos estes tutelados.

A outro giro, aplicando-se o art. 7º com a redação dada pela MP 2.215-10/01, sana-se questões concernentes à família constitucional mas esbarra-se na supressão arbitrária das filhas maiores ao direito de perceber o benefício, pois não estão mais elencadas no rol da referida MP.

A melhor solução reside na integração dos dispositivos, buscando o rol de beneficiários na Lei 3.765/60 original, fazendo valer a regra de transição do art. 31 da MP 2.215-10/01 (manutenção de benefícios da Lei 3.765), e enquadrando tais beneficiários à ordem prevista pela nova redação do art. 7º dada pela MP.

Adotando-se a solução proposta, as filhas maiores e capazes dos militares seriam habilitadas na primeira ordem de prioridades, em concorrência com o cônjuge, companheiro, ex-cônjuge ou ex-companheiro, em conformidade com o §3º. do art. 7º da Lei 3.765/60, modificado pela MP 2.215-10/01.

De forma objetiva, o que se tem é que o legislador tentou sucessivas vezes corrigir a ordem de vocação, incluindo os filhos na primeira classe. No entanto, no decorrer de três décadas nada foi feito. No início dos anos noventa, as tentativas foram frustradas. Somente, recentemente, em 2001 através de MP, o Executivo e não o Legislativo dispôs uma nova ordem de prioridades, incluindo os filhos na primeira ordem.

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Sobre o autor
Rodrigo Cardoso Magno

Servidor Público Federal.<br>Especialista em Direito Público pela Universidade Católica de Petrópolis.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MAGNO, Rodrigo Cardoso. Pensão militar: a legalidade da concessão às filhas maiores de 21 anos e capazes e a controvérsia da ordem de prioridades para seu deferimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2732, 24 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18104. Acesso em: 23 nov. 2024.

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