CONCLUSÃO
A estrutura deste trabalho acadêmico foi concebida em sete capítulos na tentativa de construir um encadeamento lógico de idéias e comentários que demonstrasse a necessária vinculação da arbitragem com o Direito Coletivo do Trabalho. Com amparo nessa premissa, cumpre-nos recapitular os seguintes aspectos:
1.O extraordinário fortalecimento do Estado ao longo da História teve como conseqüência lógica sua quase exclusividade no exercício da Jurisdição, inibindo o desenvolvimento da Justiça privada e das técnicas autocompositivas. O volume e a complexidade das relações humanas tem implicado uma revisão desse conceito, com fundamento na idéia de que o importante é a efetividade da pacificação social, seja por obra do Estado ou por outros meios.
2.A arbitragem, enquanto mecanismo extrajudicial de resolução de controvérsias, situa-se dentro de um movimento amplo em defesa do acesso à justiça, que objetiva, em última análise, ajudar o Estado na difícil tarefa de pacificar os conflitos sociais. No âmbito dos conflitos trabalhistas, a celeridade é a melhor contribuição que a arbitragem pode conferir, especialmente em face da natureza alimentar das verbas originárias dos direitos laborais. É, ainda, o único instituto extra-estatal apto a proferir uma decisão vinculante quando as próprias partes não logram êxito na composição do conflito.
3.A legislação trabalhista possui em seu bojo referências importantes ao instituto arbitral, sendo a principal delas a norma constitucional que faculta às partes elegerem árbitros para a solução dos conflitos coletivos. A releitura do instituto, entretanto, somente se mostrou possível após a edição da Lei n. 9.307/96, que sistematizou e deu uma roupagem mais moderna ao processo arbitral.
4.O sistema brasileiro de solução dos conflitos trabalhistas seguiu as premissas da filosofia corporativista, assemelhando-se, em muitos aspectos, ao sistema italiano da Carta Del Lavoro, de 1927, produzida no regime fascista de Mussolini. O resultado foi o intervencionismo do Estado nas relações laborais desde o início da industrialização, fato que inibiu o desenvolvimento dos sindicatos e do Direito Coletivo do Trabalho, dificultando, nos dias atuais, a assimilação cultural do espírito democrático e participativo instituído pela Constituição Federal de 1988, que confere elevada importância à autonormatização dos atores sociais.
5.A reforma do sistema atualmente em vigor e a adoção corajosa de instrumentos alternativos de pacificação social esbarram na barreira imposta pela fraqueza e falta de representatividade dos entes sindicais, justificando a manutenção de uma legislação trabalhista altamente protetiva e de um aparato institucional caro e dispendioso para solucionar os conflitos laborais.
6. Os princípios têm natureza essencial, ao lado das regras jurídicas, no processo de elaboração, compreensão e aplicação do Direito do Trabalho. Cumprem funções de ordem interpretativa, supletiva e normativa, além de serem elementos imprescindíveis para configurar a autonomia científica e justificar historicamente a existência do Direito Laboral.
7.O núcleo basilar expressa a essência protetiva-retificadora sem a qual o Direito do Trabalho sequer existe. O Direito Coletivo do Trabalho, na qualidade de segmento jurídico construído sobre bases diferenciadas do Direito Individual, possui princípios próprios e constitui ponto decisivo para a compreensão dos desafios da democratização do sistema justrabalhista no Brasil.
8.A análise comparativa dos princípios do Direito Individual e do Direito Coletivo do Trabalho demonstra que o primeiro é estruturado a partir da constatação fática da diferença social, econômica e política entre os dois sujeitos da relação de emprego. No segundo, ao contrário, há uma relação entre seres teoricamente equânimes, razão pela qual o sistema é construído com uma maior liberdade de negociação e flexibilização de regras imperativas, contribuindo, inclusive, para o amadurecimento democrático dos atores sociais.
9.A arbitragem voluntária é uma forma amplamente democrática de solução dos conflitos coletivos de trabalho, tendo sido recomendada pela Organização Internacional do Trabalho e prevista em nossa Carta Constitucional. A Lei n. 9.307/96 é aplicável aos conflitos coletivos de trabalho, reservadas as devidas adaptações, uma vez que não apresenta qualquer incompatibilidade estrutural com os princípios que regem o Direito Coletivo do Trabalho.
10.O parâmetro de arbitrabilidade contido no artigo 1º da Lei n. 9.307/96 não veda, em princípio, a utilização do instituto arbitral no Direito Individual do Trabalho, pois existem direitos trabalhistas de natureza disponível. A Lei de Arbitragem, entretanto, é incompatível com o núcleo basilar do Direito Individual do Trabalho, razão pela qual não pode ser aplicada aos conflitos individuais, à luz do que dispõe o artigo 8º, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho.
11.O caminho para viabilizar a utilização da arbitragem nos conflitos individuais é uma regulamentação legislativa que respeite os princípios fundamentais do Direito do Trabalho e associe a solução arbitral à autonomia privada coletiva. Prevaleceriam, nesse aspecto, os princípios da equivalência dos contratantes coletivos, da criatividade jurídica da negociação coletiva e da adequação setorial negociada, que permitem uma maior liberdade de negociação e flexibilização de regras imperativas.
12.O futuro da arbitragem na área trabalhista depende fundamentalmente da política legislativa que norteará o desenvolvimento do Direito Coletivo do Trabalho. Há boas perspectivas se o legislador promover a adequação da legislação trabalhista ao sistema democrático instituído pela Constituição Federal de 1988, sendo o primeiro passo uma ampla reforma sindical que possibilite o fortalecimento e a efetiva representatividade das entidades sindicais. O fomento ao Direito Coletivo do Trabalho tem sido, inclusive, a tônica da discussão atualmente travada no Congresso Nacional em torno das reformas sindical e trabalhista.
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Notas
- Para uma análise aprofundada das espécies de arbitragem, analisar o Glossário de Métodos de Resolução Alternativa de Disputas – RAD’s, elaborado pelos membros do Grupo de Pesquisa e Trabalho em Arbitragem, Mediação e Negociação ("GT Arbitragem") da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, sob a coordenação do ilustre professor ANDRÉ GOMMA DE AZEVEDO.
- "Art. 3º Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral, é facultada a cessação coletiva do trabalho.
- "Art. 23. Deve ser constituída, no âmbito do órgão de gestão de mão-de-obra, Comissão Paritária para solucionar litígios decorrentes da aplicação das normas a que se referem os arts. 18, 19 e 21 desta lei.
- "Art. 4º Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio:
- " Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça do Trabalho:
- BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental n. SE-5206. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, maioria, 12.12.2001. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>
Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho".
§ 1° Em caso de impasse, as partes devem recorrer à arbitragem de ofertas finais.
§ 2° Firmado o compromisso arbitral, não será admitida a desistência de qualquer das partes.
§ 3° Os árbitros devem ser escolhidos de comum acordo entre as partes e o laudo arbitral proferido para solução da pendência possui força normativa, independentemente de homologação judicial".
I - mediação;
II - arbitragem de ofertas finais.
§ 1º Considera-se arbitragem de ofertas finais aquela em que o árbitro deve restringir-se a optar pela proposta apresentada, em caráter definitivo, por uma das partes.
§ 2º O mediador ou o árbitro será escolhido de comum acordo entre as partes.
§ 3º Firmado o compromisso arbitral, não será admitida a desistência unilateral de qualquer das partes.
§ 4º O laudo arbitral terá força normativa, independentemente de homologação judicial".
... XI - atuar como árbitro, se assim for solicitado pelas partes, nos dissídios de competência da Justiça do Trabalho"