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A prisão civil do depositário infiel proveniente da execução trabalhista

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26/02/2011 às 14:16
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3. TRATADOS INTERNACIONAIS

A prisão civil do depositário infiel foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal e um de seus principais argumentos foi o fato de o Brasil ter ratificado o tratado internacional do Pacto de São José da Costa Rica.

O Pacto de São José da Costa Rica somente excepciona a possibilidade de prisão civil ao devedor de alimentos, enquanto a nossa Constituição admite ainda a prisão civil do depositário infiel.

Entretanto, o referido tratado não foi incorporado pelo quórum necessário previsto no § 3º do artigo 5º da Constituição Federal, introduzido pela EC nº 45/04. Desse modo, se considerados os rigores técnicos estabelecidos na Constituição, o tratado não adquiriu status de emenda constitucional.

Diante disso, o Supremo Tribunal Federal conferiu ao Pacto de São José da Costa Rica o status de "supralegalidade". Nesse contexto, o constitucionalista Alexandre de Moraes esclarece a posição do Tribunal Supremo, nos seguintes termos:

A Corte decidiu, em relação a vedação da prisão civil do depositário infiel, que a circunstância de o Brasil ter subscrito o Pacto de São José da Costa Rica, que restringe a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia (art. 7º, 7), conduz a inexistência de balizas visando a eficácia do que previsto no art. 5º, LXVII, da CF, concluindo que com a introdução do aludido Pacto no ordenamento jurídico nacional, restaram derrogadas as normas estritamente legais definidoras da custódia do depositário infiel (MORAES, 2009, p. 741).

Pelo exposto, faz-se necessária a análise do que são e como funcionam os tratados internacionais, na medida em que o conflito sobre a prisão do depositário infiel decorre da sua proibição por um tratado, documento este, que o Brasil se comprometeu a cumprir.

3.1. Conceito

Tratado é um acordo, ajuste, arranjo, convenção, declaração formal entre pessoas jurídicas de direito internacional público, que firmam um compromisso de cumprimento e respeito às cláusulas e condições concluídas por escrito, com a finalidade de produzir efeitos jurídicos nas relações exteriores, criando preceitos de direito positivo, regidos pelas regras de direito internacional (MALHEIRO, 2008, p. 61).

Sidney Guerra acentua que a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969, em seu art. 2º, a, trouxe a definição de "tratado", nos seguintes termos:

[...] tratado significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica (GUERRA, 2009, p. 53).

Carlos Roberto Husek e Hee Moon Jo, citados por Malheiro (2008, p. 62), defendem a forma oral dos tratados. No entanto, tal posição, segundo aduz o autor, importa impossibilidade de cumprimento das formalidades exigidas e de sua precária executoriedade no caso concreto. O entendimento prevalente é que os tratados devem ter forma escrita, tendo em vista o que dispõe o art. 2º da Convenção de Havana e o art. 2º, § 1º, alínea "a" da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969.

Importa estabelecer a diferença entre contrato interestatal e tratado.

Quando uma parte se sujeita ao direito interno de outra teremos um contrato interestatal. O tratado, por sua vez, exige que a criação de preceitos de direito positivo se submeta às regras do direito internacional e nunca a uma legislação no plano interno de um dos co-pactuantes (MALHEIRO, 2008, p. 62).

3.2. Relação entre direito internacional público e direito interno do Estado

3.2.1. Monismo e dualismo

Em discussões que envolvem tratados internacionais é indispensável abordar as teorias que tentam explicar sua relação com o direito interno do Estado. Trata-se da relação entre direito internacional público e o direito interno de cada país.

A doutrina traz questionamentos em torno da possibilidade de confronto entre tais ramos, que em caso afirmativo, visa esclarecer qual deve prevalecer.

Segundo as lições de Emerson Penha Malheiro (2008, p. 47), em geral, os jurisconsultos admitem duas teorias elementares que explicam a prevalência do direito interno ou do direito internacional: o dualismo e o monismo.

3.2.2. Teoria dualista

A teoria dualista, estabelecida no final do século XIX, teve como principal expoente o alemão Carl Heinrich Triepel. Caracteriza-se pela apresentação de duas ordens jurídicas independentes que, de acordo com Celso Roberto Duvivier, "podem ser tangentes, mas não secantes, isto é, são independentes, não possuindo qualquer área em comum" (apud MALHEIRO, 2008, p. 47).

Nesse passo, o dualismo defende que o direito interno cuida das relações jurídicas intra-estatais, enquanto o direito internacional regulamenta as relações jurídicas entre os Estados soberanos. Desta forma, não há conflito entre elas.

O dualismo adota uma concepção estrutural das ordens jurídicas. O direito interno é caracterizado pela subordinação, pois depende exclusivamente da vontade unilateral do Estado. Por outro lado, o direito internacional depende da vontade comum de vários Estados, estabelecendo-se uma relação de coordenação.

Para essa teoria, para que uma norma de direito internacional tenha validade no direito interno de cada Estado, ela deve passar por um processo de recepção, o que recebe o nome de teoria da incorporação. O direito internacional é indiferente quanto ao método adotado para a introdução da norma internacional no ordenamento jurídico do Estado.

A Constituição Federal brasileira de 1988 adota a teoria dualista, conforme ensina Ricardo Cunha Chimenti, et al, no excerto a seguir transcrito:

Entre nós, portanto, adota-se a teoria dualista, pela qual o tratado depende de aprovação por norma de direito interno (decreto legislativo) editada pelo Congresso Nacional e subsistem dois ordenamentos jurídicos distintos, o direito internacional e o direito interno. Não foi adotada a teoria monista, pela qual os tratados são válidos desde o momento em que o Chefe do Poder Executivo os assina e se sobrepõem à ordem interna (CHIMENTI, et al., 2009, p. 287).

Ferraz Júnior citado por Malheiros, em estreita síntese, assevera que desde que aprovados no âmbito interno conforme procedimentos prescritos pelas respectivas constituições, os tratados adquirem o status legal, imperam como leis internas, de tal modo que, se são incompatíveis com leis ordinárias do país, as tornam revogadas conforme a regra estrutural da lex posterior. Submetem-se, não obstante, à hierarquia e não podem contrariar disciplinas constitucionais (MALHEIRO, 2008, p. 48).

3.2.3. Teoria monista

O monismo trata o direito internacional e o direito interno como um sistema único.

Essa teoria apresenta duas vertentes, ambas sustentando a unicidade da ordem jurídica, sendo que uma estabelece a supremacia do direito internacional a que se ajustariam as normas do direito interno, cujo principal defensor foi Hans Kelsen; e a outra estabelece a primazia do direito interno de cada Estado, em que cabe a este determinar livremente suas obrigações estatais.

3.3. Condições de validade

Para que um tratado internacional seja considerado válido e possa produzir efeitos jurídicos devem ser observados alguns requisitos.

Entre as condições de validade dos tratados internacionais destacam-se: a capacidade das partes; a habilitação dos agentes signatários; o consentimento mútuo e o objeto lícito e possível (GUERRA, 2009, p. 56)

A capacidade das partes é o reconhecimento internacional de que uma pessoa pode adquirir direitos e exercer por si mesma, por meio de seus representantes, os atos consignados no documento que será criado. Emerson Malheiro (2009, p. 65) observa que essa recognição é ínsita dos entes que possuem personalidade jurídica de direito internacional público, isto é, apenas os Estados e às Organizações Internacionais Intergovernamentais.

Outra condição de validade dos tratados internacionais é a habilitação dos agentes signatários. A regra para essa habilitação é ditada pelo direito interno do Estado e, eventualmente, pelo estatuto de uma organização internacional. Assim, diz-se que a habilitação é feita pelos "plenos poderes" que dão aos negociadores o poder de negociar e concluir o tratado.

O consentimento mútuo dos pactuantes é indispensável, visto ser o tratado um acordo de vontades.

Exige-se, por fim, que as partes convencionem sobre um objeto lícito e possível. Entende-se por "lícito" o objeto que está conforme as regras do direito internacional e "possível" é aquele que tem a faculdade de ser realizado. Sidney Guerra (2009, p. 58) salienta que "em havendo violação de normas imperativas (jus cogens) o tratado não poderá produzir efeitos, como por exemplo, a celebração de tratados que violam direitos humanos".

3.4. Interpretação dos tratados internacionais

Alguns tratados trazem normas contraditórias entre si, ou ainda podem ensejar dúvidas quando a sua interpretação. Para solucionar tais situações, a doutrina apresenta alguns critérios de interpretação dos tratados.

Em primeiro lugar, não é demais salientar que o tratado deve ser interpretado de acordo com a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, para tanto, segundo Sidney Guerra, devem ser levados em consideração os seguintes aspectos:

a) o tratado deve ser interpretado de boa-fé; b) deve ser levado em consideração o preâmbulo e anexos; c) deve ser levado em consideração ainda: qualquer acordo entre as partes relativas à interpretação; qualquer norma relevante do DIP aplicável nas relações entre as partes; d) se a aplicação das normas não conduz a sentido claro ou conduz a um resultado absurdo, pode se recorrer a outros meios de interpretação; e) em um tratado autenticado em duas ou mais línguas diferentes, estes textos tem a mesma autenticidade.(GUERRA, 2009, p. 73).

O autor supracitado também relaciona alguns critérios para a aplicação dos tratados com normas contraditórias, quais sejam:

1) a regra geral é que o mais recente prevalece sobre o anterior quando as partes contratantes são as mesmas nos dois tratados; 2) quando os dois tratados não têm como contratantes os mesmos Estados: a.) entre um Estado-parte em ambos os tratados e um Estado-parte somente no tratado mais recente se aplica o mais recente. b.) entre um Estado-parte em ambos os tratados e um Estado-parte somente no tratado anterior se aplica o tratado anterior. c.) entre os Estados-parte nos dois tratados só se aplica o anterior no que ele não for compatível com o novo tratado. (GUERRA, 2009, p. 72. e 73).

Sidney Guerra afirma que a doutrina manifesta outros aspectos relativos a interpretação dos tratados internacionais além dos já mencionados, dentre eles destaca:

a) o tratado deve ser interpretado no sentido de produzir efeito útil, isto é, realizar o objetivo por ele visado (princípio da efetividade); b) as palavras devem ser compreendidas com o sentido que tinham ao tempo da celebração do tratado; c) o tratado deve presumir-se como um todo cujas partes se completam umas as outras; d) nos casos de tratados que restringem a soberania estatal ou ônus, é necessária a interpretação restritiva, quando houver dúvida, isto é, deve predominar a interpretação que impuser menos ônus e restringir menos a liberdade; e) não é permitido interpretar o que não necessita de interpretação, isto é, não se pode afastar de um texto claro (GUERRA, 2009, p. 73).

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Os critérios de interpretação dos tratados internacionais são importantes, sobretudo, para o alcance do objetivo por ele pretendido quando da sua elaboração. Ressalte-se que as cláusulas não devem ser interpretadas isoladamente, mas em seu conjunto, levando-se em consideração o preâmbulo e anexos, e ao interpretar deve ser respeitado princípio da boa-fé. Prosseguindo-se com os critérios já elencados, torna-se possível uma interpretação mais fiel e justa.

3.5. Previsão dos tratados na atual Constituição brasileira

A Constituição da República Federativa do Brasil, em vigor, expressamente prevê os tratados internacionais em seu art. 5º, §§ 2º e 3º, e arts. 84. e 85, in verbis:

Art. 5º, § 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional.

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.

Pelo exposto conclui-se que, não obstante os direitos e garantias previstos na Constituição, aliados a estes se encontram os direitos advindos do regime e princípios por ela adotados, e ainda os decorrentes dos tratados internacionais que o Brasil aderir. Em sendo assim, conforme a dicção do § 2º do art. 5º da CF, os tratados ratificados pelo Brasil não excluem o que já se encontra expresso na Constituição.

O § 3º do art. 5º da CF, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004, definiu o processo de incorporação dos tratados internacionais sobre direitos humanos no direito interno brasileiro, os quais, respeitado tal procedimento, são equiparados às emendas constitucionais.

Os artigos 84 e 49 da CF, respectivamente, reserva ao Presidente da República a celebração e ao Congresso Nacional a resolução dos tratados internacionais. Segundo o Min. Nelson Jobim, citado por Ricardo Cunha Chimenti (2009, p. 287), "acaso o Chefe da nação se encontre impossibilitado, é convocado um plenipotenciário, termo para designar o representante oficial".

3.5.1. Procedimento de ratificação dos tratados no Brasil

Os tratados internacionais para ter eficácia no direito interno brasileiro, como já mencionado, devem passar por um processo de aprovação. Desse modo, portanto, foi adotada pelo Brasil a teoria dualista, conforme a qual subsistem dois ordenamentos jurídicos distintos: o direito internacional e o direito interno.

Em que pese não estarem expressamente incluídos no rol do art. 59. da CF, que dispõe acerca do processo legislativo, os tratados internacionais são submetidos a um processo legislativo específico para serem inseridos no ordenamento jurídico nacional.

Conforme os artigos 49, I e 84, VIII da CF, anteriormente citados, no direito brasileiro cabe ao Congresso Nacional aprovar o tratado e ao Presidente da República ratificá-lo.

Nesse contexto, observa Pedro Bohomoletz de Abreu Dallari, citado por Emerson Malheiro (2008, p. 88), que "a vinculação do Brasil a tratado internacional é decisão que depende, portanto, do concurso de dois Poderes: o Executivo e o Legislativo".

Alexandre de Moraes separa o processo de incorporação de um ato ou tratado internacional no direito interno brasileiro em três fases, são elas:

  • 1ª fase: compete privativamente ao Presidente da República celebrar todos os tratados, convenções e atos internacionais (CF, art. 84, VIII);

  • 2ª fase: é da competência exclusiva do Congresso Nacional resolver definitivamente sobre os tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional (CF, art. 49, I). A deliberação do Parlamento será realizada através da aprovação de um decreto legislativo, devidamente promulgado pelo Presidente do Senado Federal e publicado;

  • 3ª fase:edição de um decreto do Presidente da República, promulgando o ato ou tratado internacional devidamente ratificado pelo Congresso Nacional. É nesse momento que adquire executoriedade interna a norma inserida pelo ato ou tratado internacional, podendo, inclusive, ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade (MORAES, 2009, p. 691).

É possível, com base na doutrina de Emerson Malheiro (2008, p. 89. e 90), fazer uma análise das principais fases do procedimento em questão.

A princípio, o Presidente da República, após a assinatura do tratado por ele ou por um plenipotenciário, envia ao Congresso Nacional uma cópia do instrumento, em versão oficial, acompanhada de uma mensagem, requerendo sua aprovação.

Francisco Rezek citado por Emerson Malheiro (2008, p. 89) adverte que "tanto a Câmara quanto o Senado possuem comissões especializadas ratione materiae, cujos estudos e pareceres precedem a votação em plenário".

Destarte, a Câmara dos deputados vota. Em caso de aprovação, há seguimento para o Senado. Se negado, comunica-se o fato ao Presidente da República, caso em que não existirá a ratificação.

Após a aprovação pela Câmara dos deputados, o instrumento será enviado ao Senado que também o analisará e votará. Desta vez, se aprovado, é de competência do Presidente do Senado Federal, na qualidade de Presidente do Congresso Nacional, promulgar o decreto legislativo. O próprio decreto, além de conter a aprovação do instrumento, autoriza o Presidente da República a ratificá-lo em nome da República Federativa do Brasil (MORAES, 2009, p. 690).

Em relação ao quorum para a aprovação dos tratados internacionais, segundo a Constituição vigente tem-se, de acordo com o artigo 49, I da CF, que os tratados serão aprovados por maioria simples. Todavia, quanto aos tratados e convenções relativos a direitos humanos que forem votados em cada Casa do Congresso, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, eles serão equivalentes às emendas constitucionais.

A discussão em torno do status normativo dos tratados internacionais no direito brasileiro será analisada mais especificamente no próximo tópico.

Por conseguinte, com o recebimento do decreto pelo Presidente da República, haverá a edição de decreto presidencial e a promulgação do tratado, publicando seu texto no Diário Oficial da União. Entretanto, o Presidente da República não está obrigado a promover a ratificação, seja porque o tratado não mais serve aos interesses nacionais, já foi executado integralmente, ou qualquer outro motivo (MALHEIRO, 2008, p. 90).

3.5.2. Posicionamento dos tratados internacionais no ordenamento jurídico brasileiro

Com fulcro nas normas constitucionais vigentes, temos duas situações previstas quanto ao posicionamento dos tratados internacionais no ordenamento jurídico brasileiro.

1º) os tratados internacionais que não tratem sobre direitos humanos, os quais serão aprovados por maioria simples, tendo, portanto, status de lei ordinária (art. 49, I, CF);

2º) os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, os quais serão equivalentes às emendas constitucionais (§ 3º, art. 5º, CF, acrescentado pela EC nº 45/2004).

Não obstante as situações trazidas pela Constituição brasileira há ainda aquela referente aos tratados internacionais que tratem sobre direitos humanos que não foram aprovados pelo quorum exigido pelo § 3º do art. 5º do CF, por serem tratados ratificados anteriormente à Emenda Constitucional nº 45 de 2004. Neste caso, segundo o Supremo Tribunal Federal, em decisão a ser analisada no próximo capítulo, os tratados internacionais terão status de norma "supralegal", isto é, estão situados acima das leis, porém abaixo da Constituição.

O Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos, aprovada pelo Brasil através do Decreto Legislativo n. 27, de 25/09/1992, e promulgada pelo Decreto nº 678 de 6/11/1992) está inserido na hipótese do parágrafo anterior, assim como a Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT), cujo texto em vigor foi ratificado pelo Brasil em 13 de abril de 1948, conforme Decreto de Promulgação n. 25.696, de 20 de outubro de 1948.

Para parte da doutrina, o § 2º do artigo 5º da Constituição Federal confere caráter constitucional material às normas internacionais de direitos humanos ratificadas pelo Brasil, seja qual for o quorum de aprovação (PORTELA, 2010, p. 741).

Entretanto, esse entendimento torna desnecessário o § 3º do mesmo artigo, visto que a norma internacional de direitos humanos já teria status constitucional com a sua incorporação no ordenamento jurídico interno. Por isso, não haveria razão para uma aprovação nos moldes do § 3º para que a norma adquirisse status constitucional, pois ela já seria constitucional por força do § 2º. Esse foi o entendimento do Ministro Carlos Ayres Britto em voto proferido no HC 87.585-8.

Para PORTELA (2010, p. 746), ao adotar-se o entendimento de que as normas internacionais de direitos humanos são constitucionais, o § 3º do artigo 5º limitar-se-ia a distinguir as normas de direitos humanos materialmente constitucionais daquelas material e formalmente constitucionais. Lembra, porém, que sendo norma constitucional, tais tratados não poderão violar cláusula pétrea (PORTELA, 2010, p. 745).

O Pretório Excelso, de forma não unânime, porém majoritária, adotou a tese da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos não aprovados de acordo com o § 3º do artigo 5º da Constituição.

Cabe destacar o ensinamento de Portela a respeito da supralegalidade no campo dos direitos humanos:

[...] a supralegalidade parte da premissa de que os tratados de direitos humanos trazem normas que estão diretamente vinculadas à proteção da dignidade humana e que, por isso, têm importância superior no ordenamento jurídico, não podendo ser derrogadas por outras leis ordinárias simplesmente por serem estas mais novas ou especiais (PORTELA, 2010, p. 744).

Embora os tratados internacionais sobre direitos humanos não possam ter suas normas derrogadas por leis ordinárias, em função de sua posição hierárquica supralegal, eles estão, inevitavelmente, sujeitos ao controle de constitucionalidade.

Ainda a esse respeito, pronunciou-se José Afonso da Silva:

Esse § 3º inserido pela Emenda Constitucional 45/2004 regula ou interpreta a segunda parte do § 2º quando admite a incorporação dos tratados e convenções sobre direitos humanos ao direito constitucional pátrio - recepção, essa, que gerou controvérsia quanto a saber em que termos se dava essa incorporação. Parte da doutrina – que tinha meu apoio - sustentava que essa incorporação se dava já com a qualidade de norma constitucional; outra entendia que assim não era, porque esses acordos internacionais não eram aprovados com o mesmo quorum exigido para a formação de normas constitucionais. Não é o caso de discutir, agora, o acerto ou o desacerto dessas posições, uma vez que a Emenda Constitucional 45/2004, acrescentando esse § 3º ao art. 5º, deu solução expressa à questão no sentido pleiteado por essa última corrente doutrinária. Temos aí um § 3º regulando interpretativamente cláusula do § 2º, a dizer que os tratados e convenções sobre direitos humanos só se incorporarão ao Direito interno com o status de norma constitucional formal se os decretos legislativos por meio dos quais o Congresso Nacional os referenda (art. 49, I) forem aprovados com as mesmas exigências estabelecidas no art. 60. para a aprovação das emendas constitucionais […]. A diferença importante está aí: as normas infraconstitucionais que violem as normas internacionais acolhidas na forma daquele § 3º são inconstitucionais e ficam sujeitas ao sistema de controle de constitucionalidade na via incidente como na via direta; as que não forem acolhidas desse modo ingressam no ordenamento interno no nível de lei ordinária, e eventual conflito com as demais normas infraconstitucionais se resolverá pelo modo de apreciação da colidência entre lei especial e lei geral (SILVA apud FELICIANO, 2009, grifo meu).

Nesse diapasão, há que se concluir que os tratados internacionais sobre direitos humanos, não aprovados pelo quorum previsto no § 3º do artigo 5º da Constituição Federal, têm status de lei ordinária. Logo, o Pacto de São José da Costa Rica é lei ordinária, não obstante entendimento contrário do Supremo. Assim sendo, na ocorrência de colisões entre este tratado e demais normas infraconstitucionais deve ser aplicado o critério da especialidade.

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Sobre o autor
Vanessa Mendonça Vilanova

Advogada. Pós-graduanda em Direito do Estado (Constitucional, Administrativo e Tributário). Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VILANOVA, Vanessa Mendonça. A prisão civil do depositário infiel proveniente da execução trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2796, 26 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18570. Acesso em: 22 dez. 2024.

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