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As ilegalidades das regras de competência do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia no julgamento dos prefeitos municipais

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28/02/2011 às 17:56
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3 A COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA FUNÇÃO NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Muito embora as demais regras de competência estejam explicitadas no Código de Processo Penal, o legislador constituinte entendeu por bem dispor expressamente no texto constitucional sobre as hipóteses de competência do STF e STJ no julgamento das ações penais originárias nos respectivos tribunais.

Assim sendo, em análise minuciosa da competência dos aludidos tribunais, faz-se mister dedicar tópico especial ao estudo das mencionadas ações penais originárias tendo como base não somente as diretrizes constitucionais, mas também as regras de regência interna de cada colegiado.

3.1 AS REGRAS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Supremo Tribunal Federal, órgão máximo na hierarquia da pirâmide jurisdicional brasileira, é composto por onze Ministros escolhidos pelo Presidente da República, a partir da lista tríplice enviada ao Executivo, mediante prévia aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal, respeitado o quinto constitucional.

Ao Pretório Excelso, sem deixar de lado o seu caráter de "guardião" da Constituição, também são atribuídas competências em razão da função, cabendo à Corte Suprema o julgamento, pelas infrações penais comuns, dos ocupantes das funções elencadas pela alínea "b", e, nas infrações penais comuns e de responsabilidade, os investidos nos cargos elencados pela "c", ambas do inciso I do art. 102 da CF/88.

É de mencionar, ainda, a extensão do foro no STF também para julgamento do Advogado-Geral da União, do Chefe da Casa Civil, da Controladoria-Geral da União e do Presidente do Banco Central e outros cargos de secretaria, em virtude das respectivas funções terem sido elevadas ao patamar de Ministros de Estado, em razão da Medida Provisória nº. 2.216, transformada na Lei Federal nº. 10.683/2003, consoante disposto pelo parágrafo único do art. 25, posteriormente alterado pela Lei Federal nº. 11.958/2009.

Assim sendo, visando o trâmite regular das respectivas ações, as seguintes normas foram editadas no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF):

Art. 5º Compete ao Plenário processar e julgar originariamente:

I – nos crimes comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os Deputados e Senadores, os Ministros de Estado, os seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;

II – nos crimes comuns e de responsabilidade, os Ministros de Estado, salvo o disposto no inciso I do art. 42 da Constituição; os membros dos Tribunais Superiores da União, dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os Ministros do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;

Art. 234. Apresentada, ou não, a resposta, o Relator pedirá dia para que o Plenário delibere sobre o recebimento ou rejeição da denúncia ou da queixa.

Diante da interpretação conjunta das aludidas normas, é possível concluir que o RISTF determinou expressamente o órgão competente para proferir a decisão acerca do recebimento ou rejeição da denúncia ou queixa apresentada perante a Corte Suprema, independente do cargo ocupado pelo acusado, sendo tais atos de competência exclusiva do Plenário.

Em verdade, partindo-se à interpretação teleológica da norma, conclui-se que a real intenção da Corte, seguindo o disposto pela Lei Maior, seria captar a atenção de todos os membros para que estes se debruçassem de maneira minuciosa e delicada perante cada caso concreto, em defesa do interesse público, haja vista os cargos indicados especialmente pelas normas constitucionais que impõem a competência originária desta Corte para o julgamento de ações penais, bem como a repercussão jurídica e social dos respectivos julgamentos.

Outrossim, a aludida norma espelha ainda de maneira exemplar o princípio da igualdade ao dispor que, independentemente do cargo ocupado, os processados que possuem foro em razão da função no STF, serão julgados pelo mesmo órgão, qual seja, o Plenário.

Por outro lado, há que se ressaltar que, diante da opção pelo órgão Plenário, visto que o julgamento não seria realizado por uma das duas Turmas, resta ceifada a possibilidade de recurso ou até mesmo impetração de Mandado de Segurança, pois, por razões óbvias, não caberia pretensão recursal ao próprio órgão prolator da decisão, mormente diante do fato deste órgão situar-se no topo da pirâmide jurisdicional do país, exceto os Embargos de Declaração.

3.2 AS REGRAS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Ao STJ caberá processar e julgar, originariamente, nos crimes comuns, os ocupantes dos cargos de Governadores de Estado e do Distrito Federal, e, nestes e nos crimes de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça Estaduais e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais, conforme impõe o art. 105, I, "a" da Constituição Federal.

Isto posto, de acordo com o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ), caberá exclusivamente à Corte Especial a deliberação acerca do recebimento ou rejeição da denúncia ou queixa em casos de ações penais originárias, sendo também tal órgão responsável pela instrução processual e avanço à fase decisória. Vejamos:

Art. 222. A seguir, o relator pedirá dia para que a Corte Especial delibere sobre o recebimento ou a rejeição da denúncia ou da queixa, ou sobre a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas.

Como visto, a norma possui clareza solar, não deixando margem a qualquer outra interpretação, haja vista que a indicação da competência para processar e julgar os aludidos feitos é do respectivo órgão fracionário do STJ.

Ademais, cumpre destacar que a referida Corte Especial, mencionada pela norma regimental supratranscrita, deverá ser composta pelos quinze Ministros mais antigos da Corte, consoante disposto pelo §2º do art. 2º da regência interna, in verbis:

Art. 2º O Tribunal funciona:

§2º A Corte Especial será integrada pelos quinze Ministros mais antigos e presidida pelo Presidente do Tribunal.

Assim, não seria leviano concluir que, logo no momento do sorteio realizado para distribuição da ação, estariam excluídos os outros dezoito Ministros que compõem a Corte, devendo a mesma ser distribuída a um dos quinze mais antigos membros que, após oportunizar o oferecimento de defesa prévia, levará o processo à apreciação dos seus pares para deliberação acerca do recebimento ou rejeição da queixa ou denúncia.

Ao que parece, assim como ocorre no STF, o RISTJ também considera a importância dos casos postos à análise da Corte, determinando que a competência para o julgamento de tais demandas caberá aos Ministros mais antigos, diante da repercussão política no país, além do considerável conhecimento jurídico ostentado por parte destes julgadores, notadamente diante do tempo de carreira jurídica e experiência adquirida na magistratura.


4 AS REGRAS DE COMPETÊNCIA NOS TRIBUNAIS DE SEGUNDO GRAU

Em que pese o legislador constituinte não ter dedicado artigos específicos às competências dos Tribunais de Justiça, como fez nos casos do STF e STJ, algumas competências foram diretamente atribuídas ao Judiciário Estadual por parte da Carta Magna.

Além da organização interna, aos Tribunais de Justiça, o legislador constituinte também impôs regras para o foro por prerrogativa de função, atribuindo às Cortes Estaduais competência para julgamento dos juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público Estadual, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral (art. 96, III) e os Prefeitos Municipais (art. 29, X).

Assim sendo, muito embora os Estados-membros já possuíssem legislações que versassem acerca da organização judiciária estadual, a Constituição Federal de 1988 trouxe inovações à matéria, sendo imprescindível a adaptação da legislação estadual aos novos imperativos constitucionais.

Por razões didáticas, em especial pelo foco deste trabalho dedicar-se às regras de competência no Estado da Bahia, é imprescindível tecer considerações históricas acerca do tratamento dispensado pela legislação estadual baiana aos Prefeitos Municipais quando do julgamento perante o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, ainda que tais considerações sejam prévias à vigência da atual Constituição Federal.

4.1 HISTÓRICO DA ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR OS PREFEITOS MUNICIPAIS NO ESTADO DA BAHIA

Ainda sob o manto da ditadura militar, quando vigorava a Constituição Federal de 1967, inexistia qualquer dispositivo constitucional que determinasse a competência para processar e julgar os Prefeitos Municipais.

Eis que, o Estado da Bahia, então governado por Antônio Carlos Magalhães, visando ditar regras acerca do Poder Judiciário Estadual, promulgou a Lei Estadual nº. 3.731, de 22 de Novembro de 1979, dispondo normas gerais de organização judiciária no Estado.

O referido diploma legal não tratava acerca da competência para processar e julgar os Prefeitos Municipais. Desta forma, face à lacuna legislativa, estes eram julgados pelos Juízes de Direito, sendo os seus casos levados à vala comum do Poder Judiciário, inexistindo, portanto, qualquer foro por prerrogativa de função dispensado aos alcaides, com destaque ao Governador do Estado, que, por força do inciso XXV do art. 29 do respectivo diploma legal, estaria submetido à jurisdição do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA).

Em 14.03.1980 ocorre a publicação do Regimento Interno do Tribunal de Justiça, onde a Corte simplesmente optou por recriar os mandamentos contidos na legislação estadual, não dispondo acerca do julgamento dos Prefeitos; entretanto, fazendo permanecer o Governador do Estado como detentor de foro por prerrogativa de função perante o TJ-BA.

Com o fim da ditadura militar e a promulgação da Constituição Federal de 1988, a legislação pátria passava a dispor, expressamente, mais precisamente no inciso X do art. 29, que a competência para processar e julgar os Prefeitos Municipais seria, enfim, dos Tribunais, transferindo ainda para o Superior Tribunal de Justiça a competência para processar e julgar os Governadores de Estado, antes julgados pelos Tribunais Estaduais.

Muito embora o legislador constitucional não tenha promulgado artigo específico dispondo sobre a competência dos Tribunais Estaduais, como fez nos casos do STF e STJ, impôs aos mesmos a competência para processar e julgar os Prefeitos.

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É o que se depreende da leitura do inciso X do art. 29 da Carta Magna:

Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça;

Desta forma, ainda que considerado o livre arbítrio dado pelo art. 125 da CF/88 às Constituições Estaduais, o poder constituinte derivado decorrente, em que foram investidos os Estados-membros para elaborarem suas próprias Constituições [07], deveriam obedecer ao disposto pelo art. 29, X do texto constitucional, onde há determinação expressa acerca do foro por prerrogativa de função conferido aos Prefeitos Municipais.

A Constituição do Estado da Bahia, em total consonância com a Constituição Federal, ao tratar da competência do Poder Judiciário Estadual, confere competência ao Tribunal de Justiça para processar e julgar ações penais originárias propostas em face dos alcaides, vejamos:

Art. 123 - Compete ao Tribunal de Justiça, além das atribuições previstas nesta Constituição:

I - processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, o Vice-Governador, Secretários de Estado, Deputados Estaduais, membros do Conselho da Justiça Militar, Auditor Militar, inclusive os inativos, Procurador Geral do Estado, Juízes de Direito, membros do Ministério Público, membros da Defensoria Pública e Prefeitos;

Isto posto, os Prefeitos Municipais eram julgados pela composição plenária do Tribunal de Justiça, situação que perdurou até o ano de 1996, quando, no âmbito estadual, promulgou-se a Lei nº. 6.982/96, acrescentando à estrutura do Tribunal de Justiça órgão específico para julgamento de Prefeitos Municipais nos crimes comuns e de responsabilidade, dentre outras competências, sendo este denominado simplesmente de Câmara.

Seguindo o disposto pela Constituição Federal, a referida lei estadual também ampliou a competência atribuída ao TJ-BA, sendo o mesmo, a partir de então, competente para processar e julgar os Prefeitos Municipais não só nos crimes comuns, mas também nos de responsabilidade.

Vejamos o disposto pelo art. 2º do mencionado diploma legal:

Art. 2º - A estrutura do Tribunal de Justiça do Estado fica acrescida de uma Câmara, competente para:

I - processar e julgar, originariamente, os Prefeitos Municipais nos crimes comuns e de responsabilidade;

II - julgar os recursos originários das Varas da Fazenda Pública Estadual e Municipal da Comarca da Capital, bem como os mandados de segurança contra atos de Juízes das referidas Varas.

Parágrafo único - A Câmara que trata o "caput" deste artigo será também integrada pelo Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, tão somente para efeito de presidi-la.

Assim sendo, a Assembléia Legislativa optou por criar órgão específico dentro do Tribunal de Justiça, conferindo-lhe competência para processar e julgar os Chefes dos Executivos Municipais. Por sua vez, cabia ao TJ-BA dispor sobre a composição deste órgão, tendo a legislação estadual somente determinado expressamente que o mesmo fosse presidido pelo Desembargador em exercício da vice-presidência do Tribunal de Justiça.

Já no Terceiro Milênio, eis que surge a Lei Estadual nº. 10.433, de 20 de Dezembro de 2006 que, em seu art. 10º, revoga expressamente o art. 2º e seu parágrafo único [08] da Lei nº. 6.982/96 que criou a Câmara Especializada para o julgamento dos Prefeitos, sendo esta, a partir de então, transformada na Quinta Câmara Cível.

Em obediência à nova legislação estadual, o TJ-BA edita a Resolução nº. 07/2007, revogando as regras de regência interna que outrora atribuíam competência à Câmara Especializada para processar e julgar, em caráter originário, os Prefeitos Municipais, seja nos crimes comuns ou de responsabilidade.

Com efeito, surge a seguinte indagação: com a mudança da competência, os feitos em trâmite na Quinta Câmara Cível, anteriormente denominada Câmara Especializada, devem ser remetidos ao novo órgão competente?

A partir de então, diversos foram os Habeas Corpus impetrados perante o Superior Tribunal de Justiça, visando que a Corte Superior decretasse a incompetência da Câmara Especializada para prosseguir no julgamento dos feitos, tendo em vista a transferência da competência para o Tribunal Pleno.

Isto posto, utilizando como base a legislação processual civil, decidiu o Superior Tribunal de Justiça por determinar a imediata remessa dos feitos ao Tribunal Pleno, vejamos:

Com a extinção da Câmara Especializada, o feito deveria ter sido deslocado imediatamente para o órgão competente, em atenção ao disposto na parte final do art. 87 do Estatuto Processual Civil, aplicado subsidiariamente à espécie, diante da omissão do Código de Processo Penal, o qual excepciona o princípio da perpetuação da jurisdição nas hipóteses de alteração da competência absoluta ou de extinção do órgão, caso dos autos. (HC nº 77998/BA- BAHIA. Relator (a): Min. LAURITA VAZ. Julgamento: 31/10/2000 Órgão Julgador: Quinta Turma. Publicação: DJ 08/09/2009)

Com entendimento contrário, em defesa do princípio da perpetuatio jurisdicionis [09]cumpre destacar o posicionamento de Távora e Antonni (2009, p. 222-223) ao afirmarem que

não deve haver a remessa, justamente em razão da perpetuação da jurisdição. Pela ausência à época da instauração do processo, de vara especifica para julgamento da matéria, temos que o feito se iniciou perante o juízo competente, leia-se aquele já existente, por previsão legal, antes da ocorrência da infração.

Assim sendo, segundo fundamentação jurídica apresentada, em que pese ter ocorrido a modificação da nomenclatura do órgão, bem como o deslocamento da competência para o Tribunal Pleno, em virtude da perpetuação da jurisdição, ocorrida a partir do início do feito, estes deveriam continuar tramitando agora sob a competência da Quinta Câmara Cível, outrora Câmara Especializada.

O fato é que, de maneira mais sensata, o Legislativo Estadual decidiu por reconhecer a repercussão gerada pelas decisões judiciais nos processos em que envolviam os Prefeitos, optando por alterar a competência dada então à Câmara Especializada, passando a atribuí-la à composição plena da mais alta Corte de Justiça Estadual, o Tribunal Pleno.

Em 2007 é então promulgada no Estado da Bahia a Lei nº. 10.845/07, a Nova Lei de Organização Judiciária do Estado da Bahia (LOJ) [10], mantendo a competência do Tribunal Pleno para processar e julgar os Prefeitos, desde que os mesmos estejam em exercício do respectivo cargo eletivo.

Mais uma vez, o legislador estadual avança nas regras de competência do Tribunal de Justiça, impondo, desta vez, que os Prefeitos sejam julgados pelo Tribunal Pleno, consoante art. 17, in verbis:

Art. 17 - As competências do Tribunal Pleno e dos órgãos jurisdicionais fracionários serão definidas por ato do Tribunal de Justiça.

Parágrafo único - O julgamento de prefeitos, no exercício do cargo, será da competência do Tribunal Pleno.

Ainda no dispositivo em questão, resta-nos concluir que não há no mesmo qualquer indício de irregularidade ou inconstitucionalidade, sendo o legislador baiano condizente com os mandamentos constitucionais, atribuindo, sob a égide do art. 125, caput, da Constituição da República, normas organizacionais à Justiça Comum Estadual, sem olvidar do foro por prerrogativa de função dispensado aos membros do Poder Executivo Municipal por força do inciso X do art. 29 da CF/88.

Portanto, percebe-se que, segundo regramento expresso da legislação baiana, os Prefeitos Municipais, seja nos crimes comuns ou de responsabilidade, devem ser julgados pelo Tribunal Pleno, órgão máximo na estrutura do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.

Por se tratar do objeto principal do presente estudo, necessária utilização de tópico específico para tratar do tema, mormente diante do fato de que esta é a atual situação jurídica da legislação estadual que trata acerca das normas de organização judiciária no Estado da Bahia.

4.2 A ATUAL COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DAS AÇÕES PENAIS ORIGINÁRIAS NO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

Muito embora a LOJ baiana atribua expressamente a competência para julgamento dos Prefeitos Municipais ao Tribunal Pleno, surpreendentemente, no segundo semestre do ano de 2008, em sessão plenária realizada pelo TJ-BA, sob a presidência da Desembargadora Silvia Carneiro Santos Zarif, decidiu-se, por mais uma vez, reformular o Regimento Interno da Corte, estabelecendo que a competência para processar e julgar os Prefeitos Municipais, seja nos crimes comuns ou de responsabilidade, estaria novamente modificada, sendo agora de uma das Câmaras Criminais, a ser definida no momento da distribuição.

Nessa esteira de raciocínio, o Tribunal de Justiça da Bahia, ao dispor sobre as normas procedimentais acerca das regras de competência das ações penais originários, editou os seguintes dispositivos em seu atual Regimento Interno:

Art. 83 - Ao Tribunal Pleno, constituído por todos os membros efetivos do Tribunal de Justiça, compete privativamente:

X - processar e julgar originariamente:

a) nas infrações penais comuns, inclusive nas dolosas contra a vida e nos crimes de responsabilidade, os Deputados Estaduais, os Juízes Estaduais, os membros do Ministério Público Estadual, o Procurador-Geral do Estado, o Defensor Público Geral e os Secretários de Estado;

b) o Vice-Governador nas infrações penais comuns.

Art. 98 - Compete às Câmaras Criminais processar e julgar:

I - os Prefeitos Municipais nos crimes comuns e de responsabilidade;

Art. 289 - A seguir, o Relator pedirá dia para que a Câmara ou o Tribunal Pleno delibere sobre o recebimento ou a rejeição da denúncia ou da queixa, ou sobre a improcedência da acusação, se a decisão não depender de outras provas, assim como determinar a suspensão do processo, nas hipóteses previstas em lei.

As normas regimentais atribuem competência ao Relator do feito para pedir inclusão em pauta e, posteriormente, submeter o feito à apreciação do Tribunal Pleno ou da Câmara Criminal a qual esteja vinculado, conforme o cargo ocupado pelo indivíduo processado.

Ocorre que, tais normas derivam da repartição de competência dentro da própria Corte para tratar de ações penais originárias, sendo ora do Tribunal Pleno, ora da Câmara Criminal, esta exclusivamente competente para julgar os Prefeitos Municipais.

Insta salientar que as normas constitucionais relativas ao foro por prerrogativa de função não obrigam que os processados sejam julgados pela composição plenária dos Tribunais, o que importa dizer que não há qualquer exigência, seja por imperativo constitucional ou Lei Ordinária, quanto ao órgão competente para julgamento da ação penal, podendo este ser realizado por Turma, Câmara, Seção ou Plenário, garantindo, como única exigência, a formação colegiada.

É também o entendimento que se extrai dos seguintes julgados pelo Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: "HABEAS-CORPUS". CRIME PRATICADO POR PREFEITO MUNICIPAL (ART. 1º, I E IX, DO DECRETO-LEI N. 201/67). REGIMENTO INTERNO E RESOLUÇÃO N. 15/91 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIAS: COMPETÊNCIA ORIGINARIA PARA PROCESSAR E JULGAR PREFEITO ATRIBUIDA AS CÂMARAS CRIMINAIS ISOLADAS (CF, ART. 29, VIII, DA REDAÇÃO ORIGINAL, OU ART. 29, X, COM A REDAÇÃO DADA PELA E.C. N. 1/92).

1.Cabe, exclusivamente, ao Regimento Interno do Tribunal de Justiça atribuir competência ao Pleno, ou ao Órgão Especial, ou a órgão fracionário, para processar e julgar Prefeitos Municipais (CF, art. 29, X, e art. 96, I, a). 2. A Resolução n. 15, de 12.06.91, do Plenário do Tribunal de Justiça goiano, que vigora como Emenda Regimental, atribui competência originaria as Câmaras Criminais Isoladas para o julgamento de Prefeitos Municipais, ressalvados os crimes dolosos contra a vida, cuja competência e do Pleno. 3. Improcedência da alegação de incompetência da Primeira Câmara Criminal, para julgar Prefeito Municipal. 4. "Habeas-corpus" conhecido, mas indeferido. (HC nº 73232/GO-GOIÁS. Relator (a): Min. MAURÍCIO CORRÊA Julgamento: 12/03/1996 Órgão Julgador: Segunda Turma. Publicação: DJ 03/05/1996)

EMENTA: PENAL ORIGINARIA CONTRA PREFEITO MUNICIPAL - COMPETÊNCIA ATRIBUIDA A CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA - OBSERVANCIA DO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL - LEGITIMIDADE DO PROCESSO PENAL CONDENATÓRIO. O preceito consubstanciado no art. 29, X, da Carta Política não confere, por si só, ao Prefeito Municipal o direito de ser julgado pelo Plenário do Tribunal de Justiça – ou pelo respectivo Órgão Especial, onde houver – nas ações penais originárias contra ele ajuizadas, podendo o Estado-membro, nos limites de sua competência normativa, indicar, no âmbito dessa Corte judiciária, o órgão fraccionário (Câmara, Turma, Seção, v.g.) investido de atribuição para processar e julgar as referidas causas penais. (HC 72465/SP- SÃO PAULO, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO Julgamento em 05/09/1995, Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJ de 24/11/1995)

No caso do art. 83, X, "a" e "b" e art. 98, inciso I do Regimento Interno do Tribunal de Justiça da Bahia, resta demonstrada flagrante inconstitucionalidade diante do fato do tratamento diferenciado entre indivíduos que possuem foro por prerrogativa de função no mesmo Tribunal, todavia, são julgados por composições colegiadas distintas.

O TJ-BA confere às Câmaras Criminais a competência para processar e julgar somente os Prefeitos Municipais, deixando para o Tribunal Pleno o julgamento dos ocupantes das demais funções elencadas no art. 123, I, a da Constituição do Estado da Bahia. Ocorre que, o tratamento diferenciado vai de encontro não só ao princípio da igualdade, este de natureza constitucional, mas também confrontando com a norma estadual responsável pela organização judiciária, eivando, portanto, de inerentes ilegalidades as referidas normas regimentais.

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Sobre o autor
David Roldan Vilasboas Lama

Bacharel em Direito pela Fauldade Ruy Barbosa/BA. Advogado. Especializando em Direito público pela UNIBAHIA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LAMA, David Roldan Vilasboas. As ilegalidades das regras de competência do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia no julgamento dos prefeitos municipais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2798, 28 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18595. Acesso em: 19 abr. 2024.

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