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Da necessidade de aperfeiçoamento do exame da OAB

10/03/2011 às 15:07
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INTRODUÇÃO:

O Exame de Ordem, realizado pela Ordem dos Advogados do Brasil – OAB tem sido objeto de críticas nos últimos anos, em face das fraudes, da quantidade de matérias objeto do exame, do preço da inscrição, da manutenção do exame, etc.

Diante de tantos fatos e questionamentos, inclusive da existência de Projeto de Lei [01] e de Proposta de Emenda Constitucional-PEC [02] no Senado Federal visando à sua extinção, bem como de decisões judiciais relegando-o ou considerando-o inconstitucional, torna-se necessário que os advogados, a OAB, as faculdades de Direito, os parlamentares, os magistrados, os membros do Ministério Público e a sociedade voltem seus olhos e suas cabeças para a necessidade de aperfeiçoamento do Exame de Ordem ou, como é mais conhecido, Exame da OAB.

O art. 8º, inciso IV, da Lei Federal nº 8.906, de 4 de julho de 1994 – Estatuto da Advocacia e da OAB, exige a aprovação no Exame de Ordem para inscrição como advogado. O § 1º, do art. 8º, do Estatuto da OAB estabelece que "o Exame de Ordem é regulamentado em provimento do Conselho Federal da OAB."

O Supremo Tribunal Federal [03] e o Superior Tribunal de Justiça [04] já decidiram sobre a constitucionalidade, a razoabilidade e a legalidade do Exame de Ordem, não encontrando, os críticos do Exame, amparo no âmbito dos tribunais superiores, com suas teses contrárias.

Como ex-aluno do Curso de Direito (1989 a 1993), como advogado inscrito nos quadros da OAB (desde 1993), como ex-Conselheiro da Subseção de Uberlândia-MG (anos 2001 a 2003), tendo participado, fiscalizado e acompanhado o Exame de Ordem em vários anos, sinto na obrigação de analisar a situação atual e apresentar sugestões para o aperfeiçoamento do Exame da OAB.


DA VIVÊNCIA:

Quanto estava nos últimos dois anos da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia-UFU (1992 e 1993), havia aulas, aos sábados, pela manhã, de prática (de Processo Civil, Processo Penal e Processo Trabalhista). Além da aprovação nas referidas matérias práticas, tinha o Exame de Ordem, realizado pela própria Faculdade, em convênio com a OAB, após a conclusão do Curso de Direito, onde havia provas escritas e orais.

Diante da preparação bienal, do estágio na Assistência Judiciária da UFU e das exigências a serem cumpridas (presença anual em 5 júris e 40 audiências cíveis/trabalhistas), quase todos os alunos eram aprovados, tornando-se advogados e demonstrando a necessidade de interligação ensino e prática/vivência.


DOS PROVIMENTOS DA OAB:

Ao longo dos últimos 20 anos, o Conselho Federal da OAB já editou 4 (quatro) provimentos, demonstrando a instabilidade da questão no interior da própria OAB: a) Provimento nº 74, de 11 de maio de 1992 (anterior ao atual Estatuto da Advocacia e da OAB); b) Provimento nº 81, de 16 de abril de 1996; c) Provimento nº 109, de 5 de dezembro de 2005; e d) Provimento nº 136, de 19 de outubro de 2009 (prevê o Exame de Ordem Unificado e a contratação de pessoa jurídica idônea e reconhecida nacionalmente para a aplicação).


DOS CANDIDATOS:

Apesar de ser uma exigência para a inscrição nos quadros da OAB, os Editais do Exame permitem a inscrição de estudantes que ainda não concluíram o Curso de Direito, o que não condiz com a finalidade do Exame, qual seja, verificar se o Bacharel em Direito, formado em escola pública ou privada, está apto, com conhecimento suficiente para o exercício da advocacia, seja perante o Poder Judiciário, seja perante outros órgãos da Administração Pública.

Ao permitir a inscrição e a realização do Exame de Ordem por alunos (inclusive do 8º, 9º e 10º período ou do último ano), a finalidade do Exame é criticada, prevalecendo o interesse econômico ou mercantil, visto que tais alunos, se aprovados, não poderão se inscrever nos quadros da OAB, por falta de conclusão do Curso de Direito ou por falta do Diploma de Bacharel.

Mais ainda, a aprovação no Exame da OAB e a reprovação ou não conclusão do Curso de Direito, ou a inscrição nos quadros da OAB sem a condição de Bacharel em Direito, ensejará no cancelamento da inscrição e exclusão do aluno dos quadros da OAB [05].


DA INSCRIÇÃO:

A inscrição para o Exame de Ordem é feita pela internet, sendo que a exigência de comprovação da condição de Bacharel só é verificada após o Exame, no momento da inscrição dos aprovados na OAB. A falta de controle favorece a realização do Exame pelos estudantes de Direito. Casos de falsidade ideológica não são apurados ou verificados.

O preço da taxa de inscrição tem aumentado. Recentemente o valor da inscrição foi aumentado, de R$150,00 (Cento e cinqüenta reais) para R$200,00 (Duzentos reais), um aumento de 25%, bem acima dos índices de inflação e dos preços cobrados até em concursos públicos (por exemplo, o concurso público do TRF-1ª Região, Edital de Janeiro de 2011, onde é cobrada a taxa de R$70,00, para os cargos de nível superior, muitos deles destinados aos portadores de Diploma do Curso de Direito: Analista Judiciário – Área Judiciária e Oficiais de Justiça).

Antes do Exame Unificado (2010), não existia isenção da taxa de inscrição, prejudicando a participação de candidatos com baixa renda.

Apesar de ser pública e notória a aprovação de menos da metade dos candidatos para a segunda fase (prova escrita), todos os candidatos pagam pelo certame inteiro (duas fases), ou seja, muitos pagam por etapa que não vão fazer, equivalendo ao pagamento de serviço não prestado ou à venda casada.


DAS MATÉRIAS DO EXAME:

Nos termos dos Provimentos e dos Editais, os candidatos são avaliados nas Disciplinas que integram o Eixo de Formação Fundamental e de Formação Profissional do Curso de Graduação em Direito, conforme diretrizes curriculares instituídas pelo Conselho Nacional de Educação, além de questões sobre o Estatuto da Advocacia e da OAB, o Regulamento Geral da OAB e o Código de Ética e Disciplina.

O Provimento nº 136/2009 acrescentou ainda Direitos Humanos, além de outras matérias jurídicas, desde que previstas no edital. Existe solicitações no sentido de incluir outras matérias (Antropologia, Filosofia, Psicologia, Sociologia, Medicina Legal), que não estão diretamente ligadas à advocacia ou possuem posição acessória na vida profissional.

Atualmente, ao estudar para o Exame de Ordem, o candidato tem que ler, no mínimo:

a) Constituição Federal de 1988 (com 347 artigos, mais alguns existentes em Emendas Constitucionais);

b) Código Civil (com 2.046 artigos);

c) Código de Processo Civil (com mais de 1.220 artigos);

d) Código Penal (com mais de 361 artigos);

e) Código de Processo Penal (com 811 artigos);

f) Código Tributário Nacional (com 218 artigos);

g) Consolidação das Leis do Trabalho-CLT (com de 922 artigos);

h) Código de Proteção e Defesa do Consumidor (com 119 artigos);

i) Estatuto da Criança e do Adolescente (com 267 artigos);

j) Lei de Licitações e Contratos (com 126 artigos);

k) Lei das Sociedades Anônimas (com 300 artigos);

l) Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Federais (com 253 artigos);

m) Estatuto da OAB (com 87 artigos);

n) Regulamento Geral da OAB (com 158 artigos);

o) Código de Ética (com 66 artigos);

p) Lei de Crimes Ambientais (com 82 artigos)

q) Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (antiga Lei de Introdução ao Código Civil: com 19 artigos).

O bacharel tem que estudar também as Súmulas do Supremo Tribunal Federal-STF (736 enunciados), as Súmulas Vinculantes do STF (31 enunciados), as Súmulas do Superior Tribunal de Justiça (quase 470 enunciados), as Súmulas e Precedentes Normativos do Tribunal Superior do Trabalho-TST (quase 544 enunciados) e as Orientações Jurisprudenciais do TST (quase de 688 enunciados). Enfim, o candidato deve ler e decorar, no mínimo, 7.402 artigos e 2.469 enunciados, totalizando 9.871 artigos e enunciados.

Todavia, além das matérias citadas, nos últimos Exames os candidatos tiveram que responder questões sobre a Lei de Registros Públicos (com 299 artigos), do Código de Trânsito Brasileiro (com 341 artigos), do Estatuto das Cidades (com 58 artigos), dentre outras normas, que não são estudadas nos Cursos de Direito. O mesmo ocorre com a Lei das Sociedades Anônimas e o Regulamento Geral da OAB, dentre outras normas objeto de avaliação.

No último certame (Exame de Janeiro de 2011), ainda caiu uma questão referente ao Vocabulário do Mercado de Capitais, expedido pela Comissão Nacional de Bolsas de Valores em 1990, que sequer consta nos Códigos de Direito Comercial, muito menos no Vade Mecum (Coletânea de Códigos e Leis) das Editoras Saraiva ou Rideel.

O Exame de Ordem está com grau de dificuldade maior que muitas provas de Juiz de Direito, de Promotor de Justiça e de Procurador Federal, cargos que requerem 3 anos de atividade jurídicas ou dois anos de prática forense.


DAS PROVAS:

As provas objetivas são realizadas em todo país, exigindo da pessoa jurídica contratada estrutura e logística especializada. O CESPE, da UnB, fez os primeiros Exames unificados. Em decorrência das fraudes ocorridas, a OAB contratou a Fundação Getúlio Vargas, que atualmente aplica, fiscaliza e corrige os Exames.

Na primeira fase, o candidato tem que responder 100 questões, no prazo de 5 horas, além de preencher o cartão de resposta (gabarito), ou seja, o candidato dispõe de menos de 3 minutos para cada questão. Além disso, ainda consta no caderno de prova, um questionário com 10 perguntas e várias alternativas, sobre a prova (grau de dificuldade, estudo realizado pelo candidato, etc.).

Na prova objetiva não consta referência sobre a matéria ou disciplina objeto das questões, dificultando ou conturbando o raciocínio e a resposta dos candidatos. Nas últimas provas objetivas, as letras das questões estão muito pequenas, dificultando a leitura das questões e das respostas. Em muitos casos, os enunciados são longos, com mais de 15 ou 20 linhas, tornando a leitura das questões mais difícil e cansativa.

Algumas questões da prova objetiva trazem problemas, que tomam muito tempo, que exigem até cálculos, o que deveria ser verificado na 2ª fase.

O candidato aprovado na primeira fase é convocado para realização da segunda prova poucos dias antes da data marcada, tornando a preparação, dos candidatos que dependem de uma ou duas questões para prosseguimento no certame, que ficam aguardando o julgamento dos recursos, muito curta.

Em algumas situações, o candidato responde questão sobre o Código de Defesa do Consumidor. Em seguida, outra questão do Estatuto da Criança e do Adolescente ou de Direito Internacional. Logo após, voltam questões do Código de Defesa do Consumidor ou do Estatuto da Criança e do Adolescente, conturbando também o raciocínio. Falta seqüência nas provas.


DAS SUGESTÕES:

Diante dos fatos e problemas apontados, faz-se necessário a apresentação de sugestões para aperfeiçoamento do Exame de Ordem da OAB:

a) inscrição e realização das provas permitida apenas para os Bacharéis em Direito, com Diploma regularmente expedido por instituição de ensino superior autorizada e reconhecida pelo Ministério da Educação;

b) na inscrição deve ser informada a instituição de ensino superior e data da expedição do Diploma, bem como a previsão de crime de falsidade ideológica para os inscritos que não possuírem o Diploma de Bacharel em Direito na data da respectiva inscrição;

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c) exigência de pagamento de taxa para cada etapa do Exame, cobrando apenas dos candidatos aprovados na 1ª fase o valor necessário para realização da 2ª fase;

d) as provas objetivas devem exigir apenas conhecimentos básicos da Constituição Federal de 1988, do Código Civil, do Código de Processo Civil, do Código Penal, do Código de Processo Penal, do Código Tributário Nacional, da CLT, do Estatuto da OAB e do Código de Ética;

e) As leis especiais do Direito Civil, do Direito Processual Civil, do Direito Penal, do Direito Processual Penal, do Direito Tributário, do Direito Trabalhista e do Direito Comercial, bem como o Código de Proteção e Defesa do Consumidor e o Estatuto da Criança e do Adolescente podem ser objeto de questões ou de avaliação prática, na 2ª fase;

f) as letras das provas devem ser em tamanho que facilite a leitura, o raciocínio;

g) nas provas objetivas, os enunciados das questões das provas não devem ser longos, facilitando a leitura e o raciocínio, nem devem constar problemas, que exijam muito tempo de cálculo ou raciocínio, ou ainda, questões sobre assuntos objeto de estudo apenas em grandes centros ou em locais específicos do país;

h) os alunos aprovados na 1ª fase de um Exame podem ser dispensados da 1ª fase do exame seguinte, fazendo apenas a 2ª fase e pagando apenas pelos custos da 2ª fase do novo Exame.

i) o Exame da OAB não deve ser utilizado como meio de punição dos candidatos, formados em faculdades particulares ou com corpo docente e biblioteca deficientes, pois a OAB e o Ministério da Educação devem fiscalizar as faculdades, orientá-las sobre o conteúdo dos Cursos de Direito, as disciplinas necessárias à preparação dos alunos para o mercado de trabalho, inclusive com matérias práticas;

j) as Seccionais e Subseções da OAB devem ministrar Cursos de Preparação para o Exame da OAB, para o exercício da advocacia para os Bacharéis recém-formados, pois o Exame é realizado por pessoa jurídica especializada e não pela própria OAB. Se a OAB tem interesse na qualidade dos bacharéis/advogados, deve fazer sua parte. Ademais, é muito cômoda a posição atual da OAB, que exige muito dos candidatos apenas após a conclusão do Curso;

k) os Bacharéis aprovados no Exame de Ordem, na qualidade advogado provisório, no primeiro ano seguinte à inscrição nos quadros da OAB (semelhante à permissão, no âmbito do Código de Trânsito Brasileiro), devem atuar em conjunto com um advogado definitivo (com mais de um ano de inscrição nos quadros da OAB);

l) o advogado provisório não poderá, isoladamente, advogar causas de valor superior a 200 salários mínimos e nem perante os tribunais superiores, salvo no caso de impetração de Habeas Corpus.

O Projeto de Lei do Senador Marcelo Crivella [06], que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB, visa transferir para a União (Ministério da Educação) o papel de instituir critérios de avaliação de cursos em provas de proficiência profissional, em conjunto com os conselhos profissionais, ou seja, aplica o princípio da igualdade, buscando a qualificação de todas as profissões e não apenas da Advocacia.

Por fim, é recomendável que a OAB, preocupada com o ingresso de novos bacharéis em Direito, puna com mais rigor, inclusive com a exclusão, o advogado, reincidente ou não, que realize apropriação indébita de valor superior a 2 (dois) salários mínimos, bem como fiscalize o limite de 20% (vinte por cento) dos honorários advocatícios, conforme estabelecido no art. 20 do Código de Processo Civil, punindo o enriquecimento ilícito de alguns advogados.


Notas

  1. PLS nº 186/06, do Senador Gilvam Borges.
  2. A PEC nº 01/2010, do Senador Geovani Rocha, foi rejeitada, em votação unânime, pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, dia 02.03.2011.
  3. O STF reconheceu a existência de repercussão geral da questão (RE 603583 RG/RS, Rel. Min. Marco Aurélio. Publicada no DJe dia 15.04.2010). O Presidente do STF, Min. Cezar Peluso, na Suspensão de Segurança nº 4321/DF, suspendeu decisão do TRF-5ª Região (AGI nº 0019460-45.2010.4.05.0000), que permitia a inscrição nos quadros da OAB de bacharéis em Direito, sem a prévia aprovação no Exame de Ordem (Divulgada no DJe 02.02.2011).
  4. Por exemplo: AgRg nos EREsp 949420 / PR, Primeira Seção, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 13.05.2009; AgRg nos EDcl no REsp 970529, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20.08.2009; e REsp 963520 / RS, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12.02.2008.
  5. Conselho Federal da OAB, Representação nº 2009.08.06798-05, Ementa PCA/78/2010: INSCRIÇÃO POR TRANSFERÊNCIA. INSCRIÇÃO PRIMITIVA VICIADA. VIOLAÇÃO AO ART. 8º, IV, DO EAOAB E ART. 2º DO PROVIMENTO 109/2005. É viciada a inscrição originária quando o bacharel não concluiu o curso de graduação e nem mesmo possui domicílio eleitoral onde logrou aprovação no Exame de Ordem. (Publicada no Diário da Justiça, dia 03.11.2010, p. 6).
  6. PLS nº 43/09, que tramita no Senado Federal.
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Sobre o autor
Anildo Fabio de Araujo

Procurador da Fazenda Nacional, categoria especial. Especialista em "Ordem Jurídica e Ministério Público" pela Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal, e em "Direito Processual Civil" pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual - Instituto Brasiliense de Ensino e Pesquisa. Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais na Universidad del Museo Social Argentino - UMSA - Buenos Aires, Argentina.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAUJO, Anildo Fabio. Da necessidade de aperfeiçoamento do exame da OAB. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2808, 10 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18652. Acesso em: 25 abr. 2024.

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