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O resgate da dignidade humana do idoso através do trabalho

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25/05/2011 às 16:22
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"Cada um que passa em nossa vida passa sozinho... Porque cada pessoa é única para nós, e nenhuma substitui a outra. Cada um que passa em nossa vida passa sozinho, mas não vai só... Levam um pouco de nós mesmos e nos deixam um pouco de si mesmos. Há os que levam muito, mas não há os que não deixam nada. Esta é a mais bela realidade da vida... A prova tremenda de que cada um é importante e que ninguém se aproxima do outro por acaso..."

Saint-Exupéry

RESUMO

A Constituição Federal de 1988 erigiu a dignidade da pessoa humana a princípio fundamental a fim de assegurar que as leis tivessem por fulcro essa qualidade intrínseca do ser humano, funcionando como orientador estatal. Assegura-se, então, a todos o acesso a uma existência digna, segundo as peculiaridades de cada fase da vida e, nesse aspecto, destaca-se, neste estudo, a população brasileira com mais de sessenta anos de idade. As previsões estatísticas da Organização Mundial de Saúde relatam que o Brasil será a sexta maior população idosa do mundo até 2025. Apesar do aumento progressivo de idosos no país, a realidade aponta que estes, geralmente, são excluídos do meio social, sobretudo, do campo laborativo. Assim, este trabalho objetiva estudar meios capazes de prover a entrada e a manutenção do idoso no mercado laboral, beneficiando sua saúde, seu bem-estar e sua autoestima, evitando sua exclusão laborativa e resgatando-lhe a dignidade humana. A pesquisa baseou-se em revisão bibliográfica de obras doutrinárias, legislações, artigos publicados em revistas científicas e na "internet". Como o Estado é o meio cuja finalidade é o homem, ferramentas concretas, para inserir o idoso no trabalho, precisam ser estabelecidas pelo governo e pelos cidadãos. Conscientizar a comunidade acerca da temática do idoso, estimulando a sua inclusão no mercado de trabalho, reduzirá posturas discriminativas. Grupos de discussões e programas de integração podem incentivar a reflexão sobre as gerações mais novas aprenderem a lidar com as mais velhas, facilitando mudanças de atitudes e diminuindo preconceitos. O idoso pode e deve ser incluído no mercado laboral, porque as transformações trabalhistas passaram a valorizar a competência intelectiva mais que a capacidade física, possibilitando-lhe maiores chances de se enquadrar em diversas funções. As dificuldades ocorrem devido à idéia de que os idosos são considerados lentos e improdutivos, supondo-se que existe uma associação entre envelhecimento e ausência de competências para o labor. A fim de se concretizar a dignidade das pessoas mais velhas, o Estatuto do Idoso trouxe inovações capazes de introduzir profundas mudanças socioculturais. Grandes empresas já tomaram iniciativas, para recolocar os idosos no mercado de trabalho, modificando suas políticas de recursos humanos, para se adaptarem às conseqüências do envelhecimento geral da população e usufruírem as vantagens que os idosos oferecem. Entre estas, verifica-se que detêm mais maturidade, mais conhecimento, e trazem lucros para as empresas, por agregarem valor econômico ao negócio. Outra forma de inclusão laboral é através do trabalho voluntário, o qual trazdiversos benefícios onde os idosos se sentem úteis e inseridos na sociedade. Enfim, o idoso pode ter sua dignidade humana resgatada através do trabalho, porque este restituirá sua autoestima, proporcionando-lhe melhor qualidade de vida e acrescentando-lhe satisfação de viver.

Palavras-chave: Idoso. Dignidade humana. Mercado de trabalho.

ABSTRACT

The Federal Constitution of 1988 took human dignity to a level of fundamental principle, so as to ensure that the laws were based on this internal human quality, functioning as state guidance. Therefore, everyone is entitled to a dignified existence, in accordance to the peculiarities of each phase in life, and thus this study highlights the Brazilian population over sixty years of age. Statistical predictions from the World Health Organization report that by 2025 Brazil will have the sixth eldest population in the world. In spite of the progressive increase of the elderly population in the country, reality shows that they are often excluded from the social environment, especially in the labour field. Hence, this paper studies the means that are capable of promoting the elderlies’ entrance and maintenance in the labour market, thus bringing benefits to their health, well-being and self-esteem, avoiding their exclusion in the job market and rescuing their dignity. The research was based on bibliographical studies of previous studies, legislations, publishes articles in scientific journals and in the internet. As the State is the means whose final purpose is man, tools to insert the elderly in the job market need to be established by the government and its citizens. To make society aware of issues that pertain to the elderly population and stimulate their inclusion in the professional market reduces discrimination, discussion groups and integration programs can incite reflection about younger generations dealing with the older one, facilitating changes in attitudes and reducing prejudice. The elderly can and should be included in the labour market, since these changes value their intellectual competence more than the physical one, giving them better chances to suit different functions. Hardships appear due to the idea that the elderly are slow and unproductive, supposing there is an association between aging and the lack of professional competence. In order to render concrete the dignity of the older ones, the Elderly Statute brought innovations capable of introducing deep social-cultural changes. Major companies have been repositioning the elderly in the market, changing their human resources policies and adapting to the consequences of the population’s ageing process so as to usufruct advantages offered by the elderly such as more maturity, knowledge as well as bringing profits to businesses by bringing economical value to them. Another form of labour inclusion is through volunteer work, which makes the elderly feels useful and a part of society. Finally, the elderly population can rescue their dignity through work, which will rebuild their self-esteem and offer a better quality of life, adding to the pleasure of living.

Key-words: Elderly. Human dignity. Labour market.

SUMÁRIO: 1 .INTRODUÇÃO. 1.1.OBJETIVOS . 1.1.1 .Objetivo Geral. 1.1.2 .Objetivos Específicos.2 .A DIGNIDADE HUMANA DO IDOSO. 2.1 .QUE É DIGNIDADE HUMANA?. 2.2.A COMPREENSÃO DA DIGNIDADE HUMANA A PARTIR DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. 2.3.O ALARGAMENTO DA DIGNIDADE HUMANA DENTRO DAS NECESSIDADES DA TERCEIRA IDADE. 3 .A INCLUSÃO SOCIAL E LABORATIVA DO IDOSO. 3.1 .A EXCLUSÃO DA VELHICE PELA JUVENTUDE. 3.2.OS OBSTÁCULOS PARA OBTER E MANTER O TRABALHO NA TERCEIRA IDADE. 4 .INOVAÇÕES NO RECONHECIMENTO DA DIGNIDADE NA VELHICE NO ESTATUTO DO IDOSO. 4.1 .PROGRAMAS DE INCLUSÃO DO TRABALHADOR IDOSO NAS EMPRESAS. 4.2.TRABALHO VOLUNTÁRIO ENTRE IDOSOS.5.CONCLUSÃO.REFERÊNCIAS


1 INTRODUÇÃO

O Título I da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 compõe-se de quatro artigos e se dedica aos Princípios Fundamentais, onde se encontram os valores e os fins orientadores do ordenamento constitucional pátrio, além de funcionar como diretrizes para todos os órgãos através dos quais atuam os poderes constituídos.

O Texto Supremo traz, entre os Princípios Fundamentais, os fundamentos e os objetivos do Estado Brasileiro. Nesse aspecto, destacam-se como fundamentos, no artigo 1°: a soberania, a cidadania, o pluralismo político, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e a dignidade da pessoa humana. Ainda entre os mencionados princípios encontram-se os objetivos fundamentais, no artigo 3°, a saber: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, a redução das desigualdades sociais e, por fim, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e de quaisquer outras formas de discriminação.

Assim, uma vez que a atual Carta Política elevou os fundamentos e os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil à posição de Princípios Fundamentais, pode-se afirmar que o Poder Público não pode mitigá-los ou suprimi-los, sob pena de violação a Princípios Constitucionais que devem ser obrigatoriamente observados.

Ao erigir a dignidade da pessoa humana a Princípio Fundamental, a Lei Maior intencionou assegurar que as normas, os direitos e as garantias ali presentes tivessem por fulcro a dignidade intrínseca do ser humano em sua acepção ampla, isto é, homens, mulheres, crianças, jovens, adultos e idosos, independentemente de idade, raça, cor, convicção política ou religiosa. Ou seja, assegura-se a todos a possibilidade de acesso a uma existência digna, segundo as peculiaridades de cada fase da vida, e, nesse aspecto, destaca-se, especialmente, a população brasileira com mais de sessenta anos de idade.

Consoante o artigo de Kertzman (2004),embora, na velhice, o corpo comece a cansar, a mente pode apresentar-se cada vez mais estimulada e o grande desafio dessa fase pode consistir em abrir a mentalidade para novos projetos e campos de possibilidades, pois envelhecer, de maneira satisfatória, depende do equilíbrio entre os potenciais e as limitações de cada um. Uma vez que o ser humano moderno tem dificuldades em dar sentido à sua vida se não através do trabalho, vive-se, atualmente, a crise da modernidade onde os imperativos capitalistas e neoliberais limitam as perspectivas e as potencialidades dos idosos, conduzindo-os à exclusão social. Sem trabalho, o ser humano pode ser visto como inválido, inútil ou como um peso para a família e para a sociedade, de maneira que se aposentar pode significar tornar-se automaticamente velho e a possibilidade do futuro pode ser, para aqueles que permanecem no ócio, a espera pela chegada da morte. Então, o tempo livre pode transformar-se em uma inatividade forçada e, para muitos, a pessoa perderia o seu valor social, e seria vista como um ser humano sem talentos e sem criatividade, o que conduziria a um processo gradual de solidão, de isolamento e, não raro, de depressão.

Portanto, é fundamental que cada pessoa se conscientize de que é possível envelhecer mantendo o equilíbrio entre seus pontos fortes e fracos, a fim de utilizá-los satisfatoriamente nessa fase da vida, combatendo, assim, os imperativos capitalistas e neoliberais que limitam as perspectivas e potencialidades dos mais velhos. Ademais, deve haver uma mudança gradual na cultura brasileira de que o idoso é inútil, pois isso, além de ser uma inverdade, ainda os induz a um estado de isolamento e de depressão.

Infelizmente, no Brasil, existem raízes culturais seculares e uma herança negativa dos seus antepassados de que envelhecer é sinônimo de imprestável, fraco, doente e de ser um estorvo para a família e para a sociedade. Além disso, a velhice também é vista, pela sociedade brasileira, como sinônimo de degradação física e psicológica, influenciando a maioria das pessoas a não se considerarem preparadas para conviver com essa limitação natural da vida.

Os dados oficiais de 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) relatam que a esperança de vida dos brasileiros aumenta paulatinamente, apontando um envelhecimento populacional, fato que requer novas prioridades na área das políticas públicas.

Então, em um país, como o Brasil, onde a população idosa tem crescido nos últimos anos, exibindo taxas cada vez mais elevadas de expectativa de vida, faz-se necessária a criação de diretrizes políticas voltadas para este grupo crescente de pessoas.

De acordo com Oliveira e Armelin (2009), as projeções estatísticas da Organização Mundial da Saúde (OMS) relatam que, entre 1950 e 2025, a parcela de idosos no Brasil crescerá dezesseis vezes contra cinco vezes da população total, de maneira que esta previsão colocará a nação brasileira como a sexta maior população idosa do mundo, em termos absolutos, ou seja, existirão mais de trinta e dois milhões de pessoas com idade igual ou superior a sessenta anos. Não obstante, ressalta-se que essas previsões baseiam-se em estimativas conservadoras de fecundidade e de mortalidade, ou seja, o artigo adverte que, existindo melhoria nas áreas mais miseráveis do país, por exemplo, no Nordeste Brasileiro, a taxa de envelhecimento será ainda maior.

Esses dados da OMS reforçam ainda mais a necessidade de políticas públicas voltadas para essa parcela da população estimada, no mínimo, em mais de trinta e dois milhões de idosos até 2025, pois, havendo melhoria em áreas mais pobres, a perspectiva é que haja um contingente ainda maior de pessoas. Nesse aspecto, a responsabilidade estatal cresce bastante, uma vez que o Estado brasileiro conterá, de acordo com as projeções estatísticas, a sexta maior população idosa do mundo.

Segundo Ramos (2004), a expectativa de vida da população brasileira, no início do século XX, era de apenas trinta e três anos, de forma que, naquele contexto, a velhice não era vista como uma questão social relevante, pois essa parcela da população formava um pequeno contingente, além do fato de que a velhice era interpretada mais como uma questão doméstica, pertencente ao mundo privado. Entretanto, nos dias atuais, o aumento da expectativa de vida da população levou os idosos a se organizarem para lutar por um quadro de aposentadoria mais capaz de lhes garantir dignidade, por um sistema de saúde mais adequado para atender as suas necessidades, por espaços melhores de lazer e por leis mais severas contra os atos de violência contra eles praticados até mesmo nos seus lares. Enfim, tudo isso fez com que a questão do envelhecimento se transformasse em uma questão pública.

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O envelhecimento populacional com a presença cada vez maior de idosos na sociedade, levando-os a lutarem por mais dignidade, trouxe, como consequência positiva, a mudança de visão política acerca de um assunto que era visto como pertencente ao mundo doméstico para uma perspectiva mais ampla, isto é, a temática do envelhecimento passou a ser considerada como uma questão de ordem pública, e, portanto, que exige atuação do Estado na sua defesa.

Conforme Kertzman (2004),nos diversos continentes o envelhecimento da população deu-se de forma desigual. Assim, fora acompanhado, nos países desenvolvidos, pela melhoria da situação econômica, contrariamente ao que ocorre nos países da América Latina, onde o envelhecer populacional acontece de maneira simultânea ao empobrecimento das pessoas e às frequentes crises econômicas.

Essa afirmativa remete à reflexão de que, devido às diferenças socioeconômicas entre os países desenvolvidos e os da América Latina, aqui, o governo deve manter uma atitude mais responsável e pragmática na normatização das leis orçamentárias anuais voltadas para os idosos, a fim de que o orçamento estatal abarque satisfatoriamente toda a sociedade, mormente a maioria pobre. Ademais, como os países latino-americanos enfrentam mais crises econômicas são mais suscetíveis a falharem na concretização de seus projetos sociais, razão por que intentos como a constituição de reservas do orçamento, criação de medidas alternativas e o estímulo à participação de toda a sociedade torna-se fundamental.

Ainda segundo Kertzman (2004) afirma quea instituição da aposentadoria aliada ao aumento da expectativa de vida criou uma nova parcela etária de pessoas: os aposentados, situando-se como uma das maiores categorias do país. Nesse contexto, devido ao fato de que à categoria dos idosos associa-se a noção de decadência e decrepitude, a expressão "terceira idade" surgiu como intenção de se relativizar o preconceito contra eles, tendo sido inicialmente utilizada na França, na década de 70, do século XX. Assim, o conjunto de palavras "terceira idade" objetiva transmitir a idéia de envelhecimento ativo e independentemente do fato de estar aposentado.

De acordo com Braga (2010), observa-se que um dos grandes mitos e inverdades está em considerar o idoso como uma pessoa que não trabalha e que somente traz despesas à família e à sociedade, ou seja, é uma pessoa descartável. Considerar isso é um grande engano, pois, nos últimos vinte anos, o idoso brasileiro teve sua expectativa de vida aumentada e, também, reduziu o seu grau de deficiência, física e mental, mudando de postura, passando a chefiar a sua família por muito mais tempo, de forma que quase seis milhões de idosos brasileiros têm filhos ou outros parentes que vivem sob sua responsabilidade e, muitas vezes, juntamente com eles na mesma casa.

Corroborando com o exposto no parágrafo anterior, as lições de D’Urso (2010) afirma que os idosos, embora, muitas vezes, sejam marginalizados, são também assaz úteis, pois quase setenta por cento deles são os mantenedores da família e da sociedade. Entretanto, são excluídos pelo grupo familiar, pela sociedade e pelo Estado, e, de forma desleal, são explorados pelos familiares, com suas aposentadorias e lembrados em períodos eleitorais.

Reforçando os argumentos supramencionados, Kertzman (2004) aduz que a surpresa na constatação do envelhecimento populacional brasileiro, nação antes vista como jovem, trouxe também a observância inesperada de que o público idoso é ativo, possui peso político-eleitoral, é potencialmente consumidor e alguns são verdadeiros arrimos de família com seus rendimentos, o que mudou, acintosamente, a sua importância social. Ou seja, esta importância não se associa à noção de dignidade, consideração e respeito ao idoso, e, sim, aos interesses hipócritas capitalistas.

Essa infeliz realidade brasileira não pode permanecer ignorada, pois se quase seis milhões de idosos brasileiros continuam sustentando seus filhos e outros parentes, que vivem ainda sob a sua responsabilidade, então a noção de idoso como uma pessoa descartável, que só traz despesas para a família, é uma grande mentira e deve ser desmascarada e banida em favor da dignidade do idoso.

Kertzman (2004) dizque é consenso, na literatura, que a sociedade industrial fora maléfica para os idosos, pois a industrialização, ao resultar que as pessoas migrassem do campo para a cidade, fez com que a nova economia capitalista modificasse a estrutura familiar, a qual restou menos acolhedora, com menos espaço físico e, o pior: associou o idoso à improdutividade.

É incontestável essa observação porque, realmente, para o capitalismo industrial, as qualidades dos idosos não são valorizadas e são consideradas dispensáveis e inúteis para o modo de produção que se adota voltado tão-somente ao lucro. Assim, o capitalismo industrial associou a noção de improdutividade às pessoas mais velhas.

Peres (2004) aduz que o problema da discriminação por idade no mercado de trabalho, presente nas culturas empresariais, ao tentar mostrar os estereótipos negativos ligados à velhice tem influenciado sobremaneira na exclusão dos trabalhadores mais velhos. Os recentes modelos produtivos de automação e de acumulação flexível contribuem para a desvalorização dos idosos, uma vez que se associam às idéias de inovação e de velocidade. Portanto, a situação de exclusão vivenciada por esses trabalhadores apresenta uma determinante cultural bem significativa, e a sua superação depende de mudanças estruturais no campo do mercado de trabalho, ou, ainda, no âmbito da educação.

Destarte, as raízes culturais determinantes da exclusão dos trabalhadores idosos devem ser superadas através de investimentos na área educativa, bem como no campo do mercado laboral, que os desvaloriza devido aos novos padrões produtivos de automação e de acumulação flexível, não enxergando os empresários que certas qualidades e talentos somente adquiridos pelos idosos ao longo dos anos podem ser perfeitamente aproveitados no modelo de trabalho atual.

Consoante Santos (2009), o processo de envelhecimento constitui-se como o último tempo do processo de vida de todas as pessoas, começando desde o nascimento do indivíduo até a sua morte. Assim, a questão do envelhecimento apresenta-se como um processo biológico natural pertencente a todo ser humano independentemente de sua classe social, mas que, infelizmente, suas consequências não são iguais para todos, visto que as diferenças e antagonismos de classe têm relação direta com a história de cada indivíduo.

Nesse contexto, observa-se que as consequências do envelhecimento podem ser piores para uns do que para outros, a depender da condição socioeconômica em que cada pessoa se insere na sociedade. Então, partindo desse pensamento, espera-se que o Estado não permaneça inerte frente a tais desigualdades, e, sim, que atue eficazmente, criando medidas assecuratórias da dignidade do idoso, especialmente, no campo do trabalho, pois existe a exclusão dos mais velhos que ficam à margem de seus direitos fundamentais.

Kalache (2009)assevera que o envelhecimento requer uma perspectiva durante o curso do viver, de forma que a única maneira de se assegurar uma velhice com qualidade vital, ou seja, com saúde e sem a perda da independência, é através do investimento nas etapas anteriores da vida. Dessa forma, apesar dos progressos tecnológicos, é necessário que a forma de envelhecer, na essência, resida em diversos aspectos, a saber: no comportamento, nos estilos de vida que se adota, nas atitudes em relação ao processo de envelhecimento, adotando posturas e ações de pessoas positivas, ativas física e mentalmente e através da superação das dificuldades impostas pela idade. Isso significa também não esperar aos oitenta anos possuir a mesma velocidade ou rapidez que se tinha aos vinte ou aos trinta anos, e, aceitar que, desde que a capacidade funcional se mantenha no mais alto nível possível, se estará envelhecendo bem e de maneira independente.

D’Urso (2010) ressalta que a vida humana, o bem maior de cada indivíduo, origina-se de uma união, porém a sociedade se rege pela individualidade, pelo desrespeito e pela desunião. Nesse aspecto, o individualismo social tem destruído em inúmeros fragmentos aquilo que deveria ser um todo, onde cada pedaço apenas olha o seu interesse, esquecendo-se que existem outros. O referido artigo acrescenta ainda que, como a sociedade cultiva a perfeição, o vitorioso, o belo, o saudável física e mentalmente, então algumas parcelas da população acabam sendo excluídas por exibirem algum traço não aceitável, por exemplo, serem portadoras de alguma deficiência, serem doentes, possuírem alguma anomalia, formando-se, assim, agrupamentos de pessoas excluídas da sociedade, e os idosos, infelizmente, fazem parte desses grupos, pois, na grande maioria, são bastante depreciados.

Apesar da triste conjuntura apresentada acima, observa-se que esta é a realidade da maioria dos idosos brasileiros, os quais são menosprezados pela família, pela comunidade, pelo Estado e explorados financeiramente e em períodos eleitorais.

Não se deve olvidar, conforme as reflexões de D’Urso (2010), que esta exclusão social reflete uma hipocrisia, pois os idosos são seres humanos que se tornaram muito produtivos quanto ao seu potencial, devido aos avanços médicos, e que, portanto, terminam por cooperar economicamente com o país.

Nesse diapasão, o desrespeito ao idoso está entre as inúmeras injustiças e exclusões sociais do Brasil, que ainda carrega, na sua cultura, conceitos cheios de iniquidade. A velhice não significa decadência e, sim, uma fase de grande riqueza e de vitalidade do ser humano, onde o indivíduo percebe o quanto aprendeu com a vida, através dos erros e dos acertos. Ademais, o idoso nada mais é do que a evolução natural do homem.

O processo de acúmulo de experiências ao longo dos anos enriquece a vida do homem e daqueles que com ele convivem, de forma que a sabedoria, os conhecimentos e as habilidades físicas adquiridas pelos idosos proporcionam-lhes um potencial que os torna capazes de tomar decisões razoáveis e benéficas tão necessárias sobre vários aspectos do viver. Destarte, a experiência adquirida pela vivência não se aprende, e, sim, se conquista, de maneira que não é pertinente considerar a idade como critério de discriminação, tampouco como condição para a atuação dos atos da vida, pois a idade cronológica não torna um ser humano menos cidadão do que o outro. Assim, assegurar a dignidade aos idosos é fundamental para que se alcance o fim social desejado, a saber: um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, o ordenamento infraconstitucional deve proceder a fim de viabilizar a concretização dos direitos fundamentais pelos idosos, incluindo-se, nesse ponto, políticas diferenciadas aptas a incentivarem o seu emprego no mercado de trabalho, como forma de resgatar a sua dignidade humana, já que a realidade brasileira aponta para a prática de posturas discriminativas, preconceituosas e de desvalorização da força de trabalho senil.

Sabe-se que, infelizmente, esse estado de banalização reflete-se de forma negativa na autoestima, na saúde e, consequentemente, na qualidade de vida dessas pessoas, uma vez que, ao se sentirem preteridas pelo mercado de trabalho, vêem-se destinadas a estagnarem o seu potencial laborativo e, ociosas, passam a ostentar uma saúde mais debilitada, por exemplo, através da depressão.

Ademais, o mercado laboral também perde quando deixa de contratar essa força de trabalho mais velha, pois se priva de usufruir da capacidade intelectual de talentos e de potenciais criativos, por desvalorizar ou desconhecer o seu grau de experiência capaz de contribuir deveras para o desenvolvimento de vários setores da economia nacional.

Portanto, pode-se afirmar que o Brasil não tem viabilizado satisfatoriamente ao idoso uma participação efetiva no mercado de trabalho, o que tem resultado em uma considerável exclusão dessas pessoas dentro desse contexto em decorrência da discriminação da idade.

É notório que o trabalho desempenha importantes funções na vida do ser humano e no enriquecimento da comunidade onde ele se insere, pois atua como fator produtivo e ocupacional, mantendo corpo e mente sãos, além de ser também fator de entrosamento com a sociedade, já que o homem é um ser eminentemente social e necessita dessa interação recíproca com seu semelhante. Além disso, é de conhecimento geral que os estudos médicos apontam que os índices de depressão aumentam entre os desempregados.

Dessarte, não há por que se excluir o idoso do mercado de trabalho, porque à experiência profissional soma-se a experiência de vida, ambas capazes de lhes possibilitar um melhor desempenho de suas funções. Todavia, em um mercado de trabalho seletivo, somente a atuação conjunta de políticas públicas de inclusão social e da sociedade civil, através do incentivo à iniciativa privada, podem promover a ocupação de parte dessa parcela da população, que ainda apresenta considerável capacidade produtiva.

Segundo relata Santin (2007),por ser o envelhecimento das populações mundiais uma realidade que não se pode jamais olvidar, logo é premente a necessidade de se preparar a sociedade para a velhice, tratando-a como um direito fundamental de todo ser humano.

Nesse diapasão, incorre ao poder público concretizar os fundamentos do Estado brasileiro (sobretudo os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o respeito à dignidade da pessoa humana), além dos objetivos fundamentais, que consistem, mormente, na construção de uma sociedade livre, justa, solidária e na promoção do bem de todos, sem preconceitos de idade ou de qualquer discriminação. Assim, por se caracterizarem em Princípios Fundamentais da República Federativa do Brasil, mencionados fundamentos e objetivos fundamentais devem ser obrigatoriamente observados.

A Constituição Federal garante ao idoso a proteção à discriminação de qualquer natureza e assegura-lhes direitos de cidadania, assim como aos demais cidadãos brasileiros. Então,o Estado deve fornecer condições legais e administrativas a fim de que os que passem a pertencer à terceira idade possam usufruir dos direitos constitucionais básicos de todo cidadão, como dignidade, isenção do preconceito e igualdade.

Conforme Silva (2005), a expectativa de vida superior àquela esperada por muitos foi uma das consequências advindas pelas transformaçõesdo avanço tecnológico, de forma que, cada vez mais, uma porcentagem maior de idosos passou a integrar a sociedade e a representar uma parcela significativa da população, necessitando, assim, manter o seu espaço. Contudo, a população assiste a estas transformações e as autoridades, de maneira geral, não se preocupam eficazmente com a defesa e o bem estar dessas pessoas.

Dessa forma, os direitos dos idosos não têm sido respeitados no Brasil, tornando-se urgente a implantação de políticas públicas com vistas ao bem-estar da pessoa mais velha, pois, somente assim, poder-se-á oferecer à velhice um conforto maior, somado à dignidade e ao respeito, e será apenas agindo com justiça em relação ao idoso de hoje que se garantirá o futuro do idoso de amanhã, ou seja, a velhice dos jovens e dos adultos atuais.

Considerando-se as necessidades dos idosos, mister se faz a implementação de políticas públicas, no sentido de inseri-los no usufruto dos direitos sociais na sua totalidade, ou seja, como sujeitos de direito na ordem jurídica não somente em relação à saúde, ao lazer, à previdência e à assistencial social, mas, principalmente, quanto à ampliação de seu direito de acesso ao mercado de trabalho, mediante incentivos do governo e da sociedade em geral, para que desfrutem da dignidade humana em toda sua plenitude.

A fim de atender ao desejo do constituinte, o legislador infraconstitucional tratou de elaborar diplomas específicos acerca da matéria, confeccionando duas normas: a Política Nacional do Idoso (Lei 8.842 de 4 de janeiro de 1994) e o Estatuto do Idoso (Lei 10.741 de 01 de outubro de 2003).

Santin (2007) afirma, ainda, que o Estatuto do Idoso é considerado como um grande passo do legislador brasileiro para que os direitos fundamentais se concretizem, mormente os direitos sociais e o respeito à dignidade da pessoa humana. Ou seja, o mencionado artigo aduz que o maior propósito do Estatuto do Idoso é melhorar as condições de vida e de bem estar das pessoas que já contribuíram com o país e, por isso, são merecedoras de todo o respeito e admiração das gerações atuais e das vindouras.

O constituinte fixou a idade de sessenta anos como parâmetro para o idoso, o que, em respeito ao princípio da supremacia constitucional, é repetido na legislação ordinária, por exemplo, no Estatuto do Idoso. Assim, embora existam muitos brasileiros que já ultrapassaram a faixa dos sessenta anos de idade, a legislação determina que a pessoa se torna idosa a partir desse momento. Essa realidade, por sua vez, tem originado um grupo cada vez maior de pessoas que, apesar de estarem em plena saúde e disposição para o labor, encontram-se ociosas, em detrimento da ausência de políticas públicas capazes de lhes preservar a contribuição para a força de trabalho.

Santin (2007) afirma que incumbe ao Poder Executivo a obrigação de programar as políticas públicas voltadas para os idosos e para a sociedade, que deve evoluir e superar essa visão economicista originária do raciocínio capitalista, para o qual apenas tem valor aquele que puder dar lucros e produzir o capital.

Enfim, conforme preceitua Kertzman (2004),nos dias hodiernos, felizmente, começa-se a pregar o conceito do envelhecimento bem-sucedido, com ênfase na qualidade de vida do idoso, afinal envelhecer é o destino inexorável de todas as pessoas. Então, surge a perspectiva de garantir qualidade de vida aos anos vividos, ou seja, em tornar a vida digna de se viver e não, simplesmente, de se pensar em dar à vida mais alguns anos, porque o ideal assenta-se em qualidade de vida e não em quantidade de anos vividos.

Santin (2007) afirma que a maioria dos dispositivos do Estatuto do Idoso tratou acerca de direitos sociais, os quais requerem, para a sua plena efetivação, prestações positivas por parte do Estado e da sociedade. Então, observa-se que a efetividade das normas protetivas dos direitos dos idosos e do princípio da dignidade da pessoa humana constituem-se em um processo, porque a simples confecção de textos legais, ainda que englobem todos os direitos, não é suficiente para que o ideal que os inspirou introduza-se efetivamente nas estruturas sociais, regendo as questões políticas, jurídicas, econômicas, sociais e culturais com preponderância. Portanto, verifica-se que se trata de uma luta diária para a conquista efetiva de tais direitos, passando pelos poderes constituídos e por cada cidadão.

Assim, colaborando com as reflexões trazidas pelo artigo acima, necessário se faz que o dever de proteção e de resguardo dessas pessoas seja repartido entre todos: a família, a sociedade e o Estado, consoante preceitua o princípio constitucional da solidariedade, uma vez que o grupo de idosos crescerá em número significativo nas próximas décadas.

Nessa conjuntura, Kertzman (2004) traz que "a ética, a solidariedade, o respeito à vida e ao cidadão não deverão ser o objetivo final, mas sim os norteadores da existência dos seres humanos".

Então, embora a Carta Magna de 1988 tenha consagrado um avanço no tocante à proteção jurídica das pessoas idosas, ao reconhecer direitos peculiares atinentes às necessidades dessa parcela especial da população, reforça-se a idéia de que apenas a atuação conjunta da família, da sociedade e do Estado, através de ações afirmativas, poderá concretizar os direitos fundamentais da pessoa idosa.

Dessarte, é dever da família, da sociedade e do Estado amparar os idosos, garantindo-lhes consideração e direito a uma vida digna, iniciando-se na família que deve amparar os pais na velhice, na carência ou na enfermidade, e, ao Estado, cabe garantir-lhes acesso aos bens culturais, participação e integração na comunidade, bem como liberdade e autonomia.

É neste contexto,portanto, que este trabalho pretende agregar às Ciências Jurídicas uma análise mais aprofundada acerca dos aspectos relevantes que têm contribuído para essa realidade brasileira, apontando e analisando possíveis remédios jurídicos em benefício dos idosos a fim de resgatar a sua dignidade humana através do labor. Ou seja, o Direito não pode permanecer inerte e indiferente frente a essa realidade, de forma que estudar a situação dos idosos é de extrema relevância, pois envelhecer consiste num direito personalíssimo, e o direito ao trabalho é um direito fundamental do idoso.

Por fim, para a consecução deste estudo, a pesquisa basear-se-á em revisão bibliográfica a partir de obras doutrinárias, textos publicados em revistas científicas, visando relacionar o conteúdo dogmático com direitos ao trabalho pelo idoso, dentro dos princípios humanitários e sociais relacionados ao tema, além de legislações pertinentes ao assunto e de pesquisa em endereços eletrônicos.

1.1 OBJETIVOS

A temática visa à realização de um estudo acerca de possíveis posturas a serem tomadas por parte do Estado e da sociedade em prol do idoso, de forma a restaurar e a garantir a sua dignidade humana, através de incentivos no âmbito laboral.

1.1.1.Objetivo Geral

Efetuar um estudo acerca dos meios capazes de fomentar a entrada e a manutenção do idoso no mercado de trabalho, através de incentivos por parte do governo, das empresas e da sociedade, já que a sua experiência profissional adquirida ao longo da vida, certamente, pode ser aproveitada no mundo corporativo e, sobretudo, em benefício da saúde, do bem-estar, da auto-estima e da qualidade de vida, evitando a sua exclusão social e resgatando-lhe a dignidade humana.

1.1.2.Objetivos Específicos

a)Demonstrar como o respeito ao princípio da dignidade humana, fundamento do Estado brasileiro, pode fomentar e suprir as necessidades dos idosos no meio social, principalmente no âmbito do trabalho;

b)Mencionar medidas educativas, a fim de conscientizar a comunidade acerca da temática do idoso, estimulando a sua inclusão no mercado de trabalho e no meio social, mitigando, dessa forma, posturas discriminatórias;

c)Abordar as dificuldades enfrentadas pelos idosos em adquirir e manter o emprego no mercado de trabalho atual;

d)Relatar as inovações trazidas pelo Estatuto do Idoso a fim de se concretizar a dignidade humana das pessoas mais velhas;

e)Mostrar políticas de recursos humanos utilizadas por empresas brasileiras a fim de recrutar, selecionar e manter trabalhadores idosos;

f)Apontar as vantagens para as empresas na admissão de trabalhadores idosos, criando uma atmosfera favorável à contratação e à manutenção desse capital humano nas organizações;

g)Relacionar os benefícios na prática de trabalho voluntário entre os idosos.

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Sobre a autora
Juliana Vasconcelos de Castro

Possui mestrado e especialização em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa onde atualmente estuda doutoramento em Direito Privado Romano. Membro da Associação Nacional de Advogados de Direito Digital, onde atua em grupos de trabalho em startups, healthtechs e relações de trabalho digital. Sócia-fundadora do Juliana Vasconcelos Advogados, nas áreas de Direito Digital e de Startups. Compliance officer. Palestrante, docente e autora de e-books e de livros jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Juliana Vasconcelos. O resgate da dignidade humana do idoso através do trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2884, 25 mai. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19188. Acesso em: 24 nov. 2024.

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