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Organização social: forma de implementação e possibilidade de controle das suas atividades pela administração pública e pela sociedade

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20/06/2011 às 14:05
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5. Como se dá a lógica da transferência de atividades e serviços Estatais para as Organizações Sociais e Mecanismos de Controle da Administração Pública

O fato de a Organização Social ser uma pessoa jurídica de direito privado, como foi tratado no capítulo anterior, não afasta os mecanismos de controle previstos na ordem jurídica, mormente em se considerando uma entidade que atua em setores basilares da área social. [73]

Nesse último capítulo, haverá a conceituação da palavra controle e a sua evolução no Brasil. O ato de controlar dos Três poderes e o ideal da efetiva participação do cidadão-cliente nas formas de controlar os atos das Organizações Sociais.

A palavra controle é de origem francesa e significa fiscalizar, verificar, examinar, supervisionar. [74]

O controle constitui uma das cinco fases primordiais da administração, que são: planejamento, organização, direção e coordenação. Dessa forma, a sua inexistência ou deficiência tem reflexos negativos nessas funções, resultando na ineficácia da organização. [75]

No âmbito da Administração Pública, nas palavras de Patrícia Cardoso Rodrigues de Souza, o controle pode ser conceituado como:

Poder-dever de inspeção, registro, exame, fiscalização pela própria Administração, pelos demais poderes e pela sociedade, exercidos sobre conduta funcional de um poder, órgão ou autoridade com o fim precípuo de garantir a atuação da Administração em conformidade com os padrões fixados pelo ordenamento jurídico. [76]

Nos dizeres de Carvalho Filho, controle da administração é "o conjunto de mecanismos jurídicos por meio dos quais se exerce o poder de fiscalização e de revisão da atividade administrativa em qualquer das esferas de Poder." [77]

Para Maria Sylvia Zanella de Pietro, a finalidade do controle é:

A finalidade do controle é a de assegurar que a Administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação, impessoalidade; em determinadas circunstâncias, abrange também o controle chamado de mérito e que diz respeito aos aspectos discricionários da atuação administrativa. [78]

Carvalho Filho enumera a importância do controle:

Os mecanismos de controle vão assegurar a garantia dos administrados e da própria administração no sentido de ver alcançados esses objetivos e não serem vulnerados direitos subjetivos dos indivíduos nem as diretrizes administrativas. [79]

Nossa Constituição estabelece um sistema de controle baseado na separação dos poderes, pelo sistema de controle de cada poder, pelo controle exercido pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas e pelo controle social, através de mecanismos de atuação da sociedade. No caso do controle das Organizações Sociais, por exemplo, é de suam importância a participação efetiva do cidadão-cliente, pois, como bem fala a Lei Federal, é o destinatário dos serviços desta entidade quem deve realizar o controle de seus atos. [80]

O controle da Administração Pública é um campo já desenvolvido há tempos, e continua em plena evolução.

No Brasil, os paradigmas da Administração Pública ganham outros contornos, com a finalidade de direcionar a conduta dos gestores ao interesse público e permitir uma administração transparente e que atue em consonância com o ordenamento jurídico e a toda a base principiológica da Administração Pública

No entanto, anteriormente, o controle tinha um outro enfoque. Controlava apenas quantitativamente o patrimônio, visto que não havia interesse da monarquia fazê-lo sobre sua própria atuação, o que era reflexo do absolutismo e do totalitarismo. [81]

No Direito Pátrio, o estudo sobre o controle foi introduzido principalmente por Miguel Seabra Fagundes, com sua consagrada obra O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário, publicada em 1941. [82]

As constituições brasileiras anteriores também demonstravam preocupações com o controle de legalidade dos atos da administração, reconhecendo sua importância para uma boa gestão. [83]

A modernização do sistema de controle veio juntamente com o marco da administração gerencial, preconizada pela Reforma Administrativa, especificadamente pelo Decreto-Lei 200/67, que introduziu o controle de forma ágil, preocupando-se não só com o aspecto formal, como era feito anteriormente, mas com o acompanhamento da gestão da administração. [84]

Posteriormente, com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, o controle teve maior enfoque, ganhando vital importância. Importante destacar que, com o advento da Constituição de 1988, foi instituído o controle pela opinião pública.

Acompanhando a mais moderna tendência política, a nova Constituição da República alargou os instrumentos mediante os quais se torna possível o controle exercido pela opinião pública sobre o Poder Estatal, e a Administração Pública em particular, também chamado "controle informal" ou "controle difuso". [85]

A Administração Pública no Brasil, com a evolução do Estado, passou por três modelos clássicos de gestão, quais sejam: o patrimonialista, o burocrático e o gerencial. [86]

A Administração Patrimonialista, com típico regime autoritário, era marcada pelo poder nas mãos de poucos. Tanto os cargos como o dinheiro público eram utilizados como patrimônio particular dos governantes, não havendo diferenciação entre a coisa pública e os bens e direitos particulares. Daí nascia a corrupção, o nepotismo e o abuso de poder. [87]

A Administração Pública Burocrática surgiu na primeira metade do século XX e baseava-se na racionalidade, por meio da criação e cumprimento das leis, como forma de combater a corrupção e o nepotismo patrimonialista. No entanto, este modelo de administração criou formalidades excessivas na máquina estatal, voltando-se apenas para a otimização dos meios, desvirtuando-se ao longo do tempo dos resultados, ou seja, de sua missão principal, que era servir ao interesse público. [88]

A Administração Pública Gerencial [89], por sua vez, teve início na segunda metade do século XX e surgiu como resposta à evolução econômica e social do Estado, diante da globalização e do desenvolvimento tecnológico. Este modelo de administração Pública, implantado no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, em 1995, constitui uma evolução na história da administração Pública, por enfocar aspectos de eficiência e eficácia, da necessidade de redução do custo da máquina pública e aumento da qualidade dos serviços públicos. [90]

A Reforma Gerencial só faz sentido quando aprofunda as formas de democracia representativa e de democracia direta ou controle social, além de ser um instrumento de eficiência administrativa, é também um meio de afirmação democrática dos direitos de cidadania. [91]

Desta forma, nesta etapa, há democracia. Sendo que, a partir do momento em que o Administrador Público recebe autonomia gerencial, ou seja, passa a ser controlada por resultados, torna-se muito mais complicado haver o clientelismo. [92]

A Reforma Gerencial não nega o papel de controle da moralidade pública atribuído aos serviços públicos e a todo um sistema de divisão de poderes ou de checks and balances que foi montado no Estado moderno para evitar corrupção. Não rejeita, também, a necessidade de leis e regulamentos que ajudem a garantir a moralidade pública.[...] Quanto maior for a autonomia, quanto mais descentralizadas e desconcentradas as ações, quanto mais os controles forem a posteriori, por resultados e por competição administrativa, mais eficientes serão os serviços públicos; em contrapartida, maior será o risco de corrupção e de clientelismo. [93]

A Reforma Gerencial no Brasil foi realmente implementado entre 1995 e 1998 [94] seguindo as diretrizes apresentadas no Plano Diretor, quer sejam elas: reforma da Constituição no capítulo da administração pública, a elaboração de projetos de leis complementares à reforma constitucional, programa de Organizações Sociais, programa de agências executivas, entre outras medidas. Sendo que, tais medidas tinham o intuito de facilitar a descentralização, desburocratização e o aumento da autonomia de gestão. Todavia, a Reforma não foi tão descentralizadora como pretendeu ser a de 1967. [95]

No que tange ao controle, a Reforma propôs uma lei que iria disciplinar as formas de participação popular na Administração Pública. Assim, o controle social, ganharia um novo impulso. [96]

Tem-se assim, o marco inicial que daria ensejo ao controle por parte do cidadão-cliente aos atos das Organizações Sociais.

O controle é um dos elementos indispensáveis para a Administração e de extrema relevância para esta e para seus administrados. O controle no atual modelo de gestão pública atua de forma a resguardar que a administração esteja em consonância com os princípios que lhes são impostos pelo ordenamento jurídico como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Mais do que isso, o controle deixou de ter o apenas o aspecto verificador da legalidade e passou a realizar um controle dos resultados, assumindo um importante papel, transformando-se em um instrumento de gerenciamento para Administração, e de garantia para a população, de uma prestação de serviços eficiente, com o mínimo de recursos, sem desvios ou desperdícios. [97]

Como já foi explanado anteriormente, as atividades das Organizações Sociais devem ser controladas pelos Tribunais de Contas, de acordo com o artigo 70 da Constituição Federal em relação a todos os bens e recursos de origem pública.

Entretanto, como disciplina o artigo 3º, I da Lei das Organizações Sociais, há a importância do controle exercido pelo cidadão. [98] Ou seja, há a preocupação de que o cidadão também verifique, controle, denuncie o que há de errado nas Organizações Sociais, como forma de melhorar o serviço prestado por estas entidades.

Através do controle social a sociedade se organiza formal e informalmente para controlar não apenas os comportamentos individuais, mas – e é isto que importa neste conceito – para controlar as organizações públicas. Pode ocorrer também no plano político, através do sistema de plebiscitos ou referendos. O controle social das organizações públicas pode ocorrer de duas maneiras: de baixo para cima, quando a sociedade se organiza politicamente para controlar ou influenciar instituições sobre as quais não tem poder formal; ou de cima para baixo, quando o controle social é exercido formalmente através de conselhos diretores de instituições públicas não-estatais. A democracia direta é a ideal, mas no plano nacional, só pode ser praticada de maneira limitada, através de sistemas de consulta popular sobre temas muitos claramente definidos. A consulta visa referendar ou orientar as decisões dos representantes democraticamente eleitos. [99]

Como forma de incentivar a inclusão dos diversos seguimentos da comunidade, deve haver audiências públicas, ouvidorias e o direito de denunciar irregularidades perante o Tribunal de Contas, assim como usar tantos outros meios institucionais de expressão da vontade popular, como mesmo enumera o artigo 74, parágrafo 2º da Constituição Federal. [100]

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Pode-se afirmar que, o sucesso do instituto Organização Social depende, em grande medida, do efetivo controle social estruturado em mecanismos realmente capazes de assegurar a participação da sociedade no planejamento e na execução das políticas públicas. [101]

A instituição de um sistema de controle material da Administração Pública é extremamente complexa, entre outras razões, porque necessariamente teria de incluir alguma forma de manifestação dos cidadãos, não apenas na qualidade de usuários dos serviços públicos e destinatários da atividade administrativa, mas também como financiadores dessa atividade e titulares do poder em nome de quem essa atribuição é exercida. [102]

Deve-se buscar na efetiva participação popular uma forma coerente e prática de controle destas entidades. Não podendo, de forma alguma, dar espaço àqueles que tentam somente favorecer interesses particulares, uma vez que este tipo de controle foi instituído com o intuito de garantir a efetiva concretização do principio da soberania popular e da democracia representativa. [103] Não deve, dessa forma, servir de mera massa de manobra para alguns representantes do poder privado, mas sim, deve ser uma forma de garantir um direito garantido pela Constituição, em seu artigo 1º.


6. CONCLUSÃO

A proposta inicial deste trabalho consistiu na busca das formas de controle exercido pela Administração Pública sob os atos das Organizações Sociais.

Ao tratar da Reforma do Estado que ocorreu em 1990, percebe-se que a mesma pressupunha os cidadãos e para eles estava voltada. Ou seja, foi uma Reforma em que os cidadãos estavam mais livres, haja vista que o Estado reduziu sua face paternalista e se tornou ele próprio competitivo. Sendo que, não havia mais que se falar em premissa burocrática de um Estado totalmente isolado da sociedade.

Neste contexto, foram criadas as Organizações Sociais, com o intuito de melhorar alguns serviços que antes eram prestados exclusivamente pelo Estado de uma forma mais eficiente, com o escopo precípuo de trazer de volta a credibilidade que fora perdida pelo Estado.

Entretanto, para que isso realmente ocorra, há a necessidade de cidadãos mais maduros politicamente, ou seja, sujeitos sociais mais cientes de seus direitos e deveres, em uma sociedade democrática em que competição e solidariedade continuarão a se complementar e se contradizer.

O cidadão é a razão de ser de toda e qualquer atuação estatal. Ele é o titular do poder estatal e possui garantias para fiscalizar seus atos. No caso da fiscalização dos atos das Organizações Sociais, tem-se o Tribunal de Contas e seu controle através de denúncias ou mesmo ex officio e também a iniciativa popular.

Conclui-se, desta forma, que, sendo o Estado criado para atender ao cidadão, o mesmo deve fiscalizar os atos dos entes criados por Ele para atendê-lo melhor. Ou seja, não se trata apenas de um ideal distante de participação popular de controle das atividades das Organizações Sociais, mas sim, uma realidade que deve ser lembrada por todos os cidadãos- clientes quando estivem frente a uma irregularidade ou má gestão dos administrados destas entidades, buscando forças para denunciar nos princípios da soberania popular e da democracia representativa, dispostos no artigo 1º da Constituição Federal.

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Sobre a autora
Catarina Woyames

Mestranda em Direito Internacional Público e Europeu da Faculdade de Direito de Coimbra.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WOYAMES, Catarina. Organização social: forma de implementação e possibilidade de controle das suas atividades pela administração pública e pela sociedade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2910, 20 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19380. Acesso em: 19 dez. 2024.

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