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Escuta telefônica:

análise constitucional, processual penal e jurisprudencial do art. 5º, XII, da Constituição Federal

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1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo a análise do inciso XII do art. 5º da Constituição Federal. Serão abordados aspectos doutrinários constitucionais e sua influência no Direito Processual Penal, bem como seu reflexo na jurisprudência.

O inciso "sub studio" trata do sigilo da correspondência e telecomunicações, princípio fundamental à efetivação do direito à privacidade e liberdade individual, como expressões fundamentais da personalidade.

A liberdade de expressão é nossa mais cara e recente conquista, após anos de clausura ideológica mantida pelo regime militar. Democracia, em seu mais amplo conceito, era a grande ânsia do povo brasileiro à época da formulação da nova Constituição. Influenciados pelo clamor popular e pela sede de democracia, houveram por bem os constituintes dedicar todo um capítulo aos direitos e deveres individuais e coletivos, inserindo entre estes o direito ao sigilo da correspondência e das comunicações. Visa essa garantia a preservação da manifestação do pensamento através da palavra escrita e falada, destinadas a um número indeterminado de pessoas ou a determinadas pessoas, através de cartas, telegramas, telefonemas e outros meios de comunicação e transmissão de informações e dados.

Novos meios de comunicação surgem a cada dia, não podendo o Direito eximir-se da obrigação de tutelá-los, quanto à informações pessoais que porventura possam por eles circular, estudo esse a ser feito no transcurso deste trabalho.

No que concerne ao uso jurídico destas informações como provas, podemos, em face do que determina o ordenamento jurídico em vigor, utilizá-las sem confrontar com a gênese da prova no Direito Processual Penal brasileiro? Faz-se assim necessário uma explicitação da teoria jurídica no que atine à prova; assunto tratado a posteriore no desenvolvimento deste.


2. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS

O inciso XII do art. 5º da Constituição Federal, embora malogrado com péssima redação, assegura a inviolabilidade do sigilo das informações em trânsito, sejam elas correspondências ou comunicações telefônicas, telegráficas ou de dados. Abre exceção a regra nos casos que tiverem por fim investigação criminal ou instrução processual penal, quando, através de ordem judicial, poderá ser quebrado o sigilo das comunicações telefônicas.

O instituto encontra origem no temor de que as autoridades de regimes ditatoriais pudessem, sob qualquer pretexto, violar correspondências na busca a organizações contrárias à ordem discricionária vigente.

Com essa apreensão, o Direito brasileiro vem consagrando este regramento desde a sua primeira constituição, ora de forma mais ampla, ora de forma mais restrita, dependendo da situação institucional vigente em cada época, que, como sabemos, forma as mais variadas.

Nossa atual Constituição, como não poderia deixar de ser em respeito a um dos alicerces da liberdade humana e da ética, resguardou esse direito aos cidadãos brasileiros, como pressuposto indispensável à democracia em que hoje vivemos. No entanto, no afã de superar o obscurantismo da situação anterior, o constituinte de 1988 exagerou na dose de protecionismo, além de ter escrito um texto impreciso e passível das mais variadas interpretações, o que tem causado vários problemas, pois o princípio visa proteger o estado de direito democrático, mas do jeito que foi posto atrapalha um dos seus requisitos, que é a justiça.

Sob o argumento de que a permissão para violar o sigilo, mesmo sob autorização judicial, para investigação de crimes, significa porta para abuso de autoridades, alguns juristas têm emitido a opinião de que o texto "sub studio" veda o acesso a qualquer tipo de informação, descrita no texto como "dados". Ora, o inciso analisado trata de matéria recorrente no ordenamento jurídico nacional, que sempre assegurou livre manifestação de pensamento quando estiver este em transmissão sobre as mais variadas modalidades. A entender-se, como querem alguns, que o inciso determina a inviolabilidade não só das comunicações telegráficas, telefônicas e de dados, mas também dos dados quando estáticos, não haveria nenhuma possibilidade de quebra de sigilo, visto que dado significa informação, e toda comunicação é uma troca de informações. Sob esse aspecto, toda investigação que usasse como prova alguma informação material colhida do réu, mesmo sob ordem judicial, seria considerada ilícita. Essa é a opinião de Celso Ribeiro Bastos, que consoante com o escrito acima comenta:

De logo faz-se mister tecer críticas a impropriedade desta linguagem. A se tomar muito ao pé da letra, todas as comunicações telefônicas seriam invioláveis, uma vez que versam sempre sob dados. Mas, pela inserção da palavra no inciso vê-se que não se trata propriamente do objeto da comunicação, mas sim de uma modalidade tecnológica recente que consiste na possibilidade de empresas, sobretudo financeiras, fazerem uso de satélites artificiais para a comunicação de dados contábeis.

(1)

Deve-se então, para entender o significado da norma, fazer-se a distinção entre as várias formas de comunicação. Todas as formas de comunicação são troca de dados e essa troca pode ocorrer por via escrita, telegráfica e telefônica. A Constituição Federal, no inciso em questão, autoriza a quebra do sigilo somente para esta última forma quando no caso de comunicação verbal entre pessoas, ou seja, somente a conversa falada pode ser interceptada legalmente. O que pretende-se normatizar com a proibição para violar o sigilo de dados, então, é que a comunicação, mesmo que telefônica, entre aparelhos moduladores-demoduladores de sinais codificados (usados, por exemplo, para troca de informações entre computadores ligados em rede, via modem, por linha telefônica) não é passível de autorização para quebra de sigilo.

Resumindo portanto a questão, temos que: a toda informação em trânsito, seja por via de correspondência ou comunicação telegráfica ou telefônica, é assegurada a inviolabilidade do sigilo, salvo no caso de comunicação telefônica verbal, quando por ordem judicial, pode ser quebrado o sigilo, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Seria essa uma forma bem mais racional de reduzir a escrito a intenção do legislador.


3. SIGILO DE CORRESPONDÊNCIA E COMUNICAÇÃO NO PRISMA PROCESSUAL PENAL

Adentrando no aspecto processual penal no sigilo de correspondência, o art. 233 do Código de Processo Penal que trata dos documentos da prova, explica a não admissibilidade em juízo de provas obtidas por meios criminosos ou interceptados. Em análise da matéria "sub studio", deparamos com o fato de que as provas obtidas com a violabilidade de correspondência e das comunicações, são consideradas ilícitas; salvo, como explicita o inciso XII, do art. 5º da Constituição Federal, já citado; que é fruto de nossa abordagem "in fine".

No concernente do ordenamento processual penal acerca de provas, devemos mostrar primeiramente o que são os meios de provas; segundo Vicente Greco Filho, in Manual de Processo Penal, "meios de provas são os instrumentos pessoais ou materiais aptos a trazer ao processo a convicção da existência ou inexistência de um fato", em outras palavras, são os modos pelos quais podemos obter a autenticidade de certos atos.

As provas obtidas com infração das disposições de direito material denominam-se, segundo a Doutrina, "provas ilícitas". Nossa Carta Magna LVI do art. 5º, explicita que são inadmissíveis os meios de provas obtido por meio ilícito. Encontra-se ainda disciplinada matéria que trata diretamente do assunto em nossa Legislação no Código de Processo Civil no arts. 332 e 383, "in verbis":

Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificado neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.

Art. 383. Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica cinematográfica, fonográfica ou de outras espécies, faz provas dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade.

Assim, podemos aferir que, até mesmo antes da Constituição em vigor, observamos que já existia matéria legal proibindo as provas ilícitas.

É de bom alvitre traçarmos a diferenciação em que a Doutrina faz de provas ilícitas e provas legais. Este pensar é frutuosamente explicitado pelo Ilustríssimo Mestre Fernando de Almeida Pedroso citando Novolone, que assim conceitua: "A prova será ilegal toda vez que caracterizar violações de normas legais ou de princípios gerais do ordenamento, de natureza processual ou material; quando a proibição for de natureza material, a prova será ilícita". Assim, devemos ter em mente nesta análise a natureza material da prova em reflexo de sua ilicitude.

Adentrando no aspecto da ilicitude da prova prevalecia como entendimento do Supremo Tribunal Federal a tese que considerava ilícito o meio de prova consistente na ilegítima interceptação telefônica; era prevalência do entendimento de que ninguém pode ser acusado com base em prova ilícita. (2)

Faz-se necessário explicitar uma observação acerca de um dos princípios norteadores do Processo Penal, o da busca da verdade real, implicitamente citado na segunda parte do art. 156, do Código de Processo Penal, onde predomina a verdade real ou material, assim, se é escopo do Processo Penal a descoberta da verdade real; ora, se a prova ilegalmente obtida ostentar esta verdade, há de ser aceita. (3)

Fernando de Almeida Pedroso citando Vicente Greco Filho demonstra bem a flexibilidade da norma constitucional, de onde podemos aferir que o texto constitucional não pode ser interpretada de maneira radical, pois haverá situações em que a importância do bem jurídico envolvido no processo a ser alcançado com a obtenção irregular da prova levará os Tribunais a aceitá-la; acrescenta ainda que a normatividade jurídica atinente a inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos vale, portanto, como regra, mas, certamente comportará exceções ditadas pela incidência de outros princípios constitucionais, mais relevantes, como por exemplo o já citado princípio da verdade real. Como ilustração um réu em que tenha contra ele diversas provas, consegue através da prova que obteve ilicitamente comprovar sua inocência; segundo o princípio da não admissibilidade da prova ilícita esta prova há de ser repudiada, condenando o acusado com fulcro nas outras provas; cremos que como bem demonstra a Jurisprudência e a Doutrina, há de se considerar a prova obtida ilicitamente, pondo em encontroar os princípios da inadmissibilidade da prova ilícita com o da verdade real.

Assim, passaremos a analisar a jurisprudência, para podermos numa posterior conclusão, traçarmos o posicionamento jurídico do assunto "sub studio".


4. POSICIONAMENTOS JURISPRUDENCIAIS

Dentre alguns acórdãos obtidos junto a CONSULTORIA JURÍDICA EFE TRÊS D, destacamos o posicionamento de alguns Tribunais sobre o assunto referente a "degravação ou interceptação de escutas telefônicas.

O primeiro entendimento dado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro em apreciação de apelação criminal de nº 198/94 da 4ª Câmara Criminal cuja emenda relata, "in verbis" :

INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. PROVA. LICITUDE. Na vigência da ordem constitucional anterior, quando não se transigia com a inviolabilidade das comunicações telefônicas, o entendimento doutrinário e jurisprudencial dominante era de que tal; vedação não tinha caráter absoluto, permitindo-se a violação quando observados os parâmetros do Código Brasileiro de Telecomunicações. Sob o império da Carta Magna de 1988, que expressamente permite a interceptação para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, prevalece o mesmo princípio até que venha a ser editada lei específica regulando a matéria, sendo, pois lícita a prova obtida por esse meio.

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Observa-se que o Tribunal entendeu que a lei que fala o art. 5º, XII da Constituição Federal até que venha a ser editada dá margem a prevalência dos princípios e parâmetros do Código Brasileiro de Telecomunicações.

Do voto do Relator Desembargador Adolphino A. Ribeiro destacamos : "as considerações de DAMÁSIO DE JESUS, que assim concluía:

Vê-se, pois, que em fase da legislação brasileira não constituem crime de violação de comunicação telefônica a interceptação e a gravação ordenadas pelo juiz competente, mediante requisição ou intimação, acompanhadas de fundamentação e realizadas pelos serviços fiscais ou postos oficiais de telecomunicações. " (Código de Processo Penal Anotado, 11ª ed., 1994, pg. 526)

De acordo com Apelação Criminal Nº 92.01.20124-9 - DISTRITO FEDERAL, do Tribunal Reginal Federal da 1º Região, tendo como relator o Juiz Fernando Gonçalves e revisor o Juiz Tourinho Neto, expediu o entendimento quanto à gravação de conversa telefônica da seguinte forma:

PROCESSUAL PENAL. PROVA. GRAVAÇÃO DE CONVERSA TELEFÔNICA. VALIDADE.

1. A lei proíbe e pune a interceptação telefônica, ou seja, quem indevidamente divulga, transmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telegráfica ou rádioelétrica dirigida a terceiros, ou conversação telefônica entre outras pessoas. Já o participante de uma conversa telefônica pode usar aquilo que ouviu do outro, salvo se a revelação causar dano a terceiros. Deste modo, o conteúdo da conversa telefônica, quando gravado, merece o mesmo tratamento dispensado aos outros meios probatórios.

2. Crime de exploração de prestígio configurado.

3. Apelação parcialmente provida para reduzir a pena ao mínimo legal.

No voto do Relator Juiz Fernando Gonçalves, destacamos seu ponto de vista:

"O problema da violação de comunicação telefônica não existe. A Lei pune a interceptação telefônica, ou seja, quem indevidamente divulga, trasmite a outrem ou utiliza abusivamente comunicação telefônica ou rádioelétrica dirigida a terceiros ou conversação telefônica entre outras pessoas.

A respeito das gravações telefônicas (não interceptação por terceiro) RENATO MACIEL DE SÁ JÚNIOR, em artigo publicado pela revista Os Tribunais, vol. 574/302, disserta com inteira procedência:

‘Se as conversas telefônicas puderem, como parece, ser aplicadas as mesmas conclusões relativas a missiva escrita, desde logo afirmar-se-ia que qualquer dos participantes de uma conversa telefônica adquire o direito de ter e usar, como se fosse dono aquilo que ouviu do outro.’"

O Juiz Tourinho Neto, revisor do acórdão em análise posicionou-se da seguinte forma:

"Têm os Tribunais admitido a prova fonográfica quando a gravação é na própria conversa telefônica.

É certo que a prova obtida por meios ilícitos é vedada, por violar a intimidade, a dignidade da pessoa, sua integridade, a inviolabiliadade do domícilio. Mas essa proibição não é absoluta. Admite-se, por exemplo, que o acusado utilize-se de prova obtida com violação do sigilo das comunicações para poder defender-se; a gravação telefônica feita pela vítima de extorsão.

A gravação fonográfica é de alto valor probatório".

No mesmo sentido, julgado do TJSP, retirado da RT nº 693, de julho de 1993, semelhante ao anterior, que teve como Relator o Desembargador Denser de Sá, posicionou-se assim:

"PROVA - Gravação de conversa telefônica - Diálogo entre vítima e réu - Legalidade - Inexistência de interferência de terceiro no interior da conversação - Inteligência do art. 5º, XII, da C. F. - Declaração de voto.

O que a Constituição veda é a interf6encia de terceiro no interior do diálogo, sem a aceitação do comunciador ou do receptor. Aquilo que se denomina interceptação, dando azo à gravação clandestina. Mas a conversa regular entre duas pessoas que se aceitam como ciomunicador e receptor, em livre expressão do pensamento, admite gravação por uma das partes, assim como seria possível gravar o teor de conversações, sem uso de aparelho telefônico."

Entretanto, essa não é a interpretação dada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal que no julgamento do Habeas Corpus de nº 69.912-0, Rio Grande do Sul, tendo como Relator Ministro Sepúlveda Pertence é o que se pode verificar na ementa do primeiro julgamento decidido por maioria dos votos, "in verbis":

CONSTITUCIONAL. PENAL. PROVA ILÍCITA : "DEGRAVAÇÃO" DE ESCUTAS TELEFÔNICAS. C.F., ART. 5º,XII. LEI Nº 4117, DE 1962, ART. 57, II, "e". "HABEAS CORPUS" : EXAME DA PROVA.

I - O sigilo das comunicações telefônicas poderá ser quebrado, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (C.F., art. 5º, XII). Inexistência da lei que tornará viável a quebra do sigilo dado que o inciso XII do art. 5º não recepcionou o art. 57, II, "e", da Lei 4.117, de conhecimento dado ao juiz competente, mediante requisição ou intimação deste. É que a constituição, no inciso XII do art. 5º, subordina a ressalva a uma ordem judicial, nas hipóteses e na forma estabelecida em lei.

II - No caso, a sentença ou o acórdão impugnado não se baseia apenas na "degravação" das escutas telefônicas, não sendo possível, em sede de "Habeas Corpus", descer ao exame da prova.

III - H.C. indeferido.

O Ministro Sepúlveda Pertence em seu relatório afirma que :

" degravação - vocábulo inexistente no Novo Dicionário Aurélio e que não passa de eufemismo destinado a encobrir a produção da prova unilateral."

No princípio do seu voto, o então relator afirma :

"Os problemas jurídicos atinentes à inadmissibilidade processual e às conseqüências da admissão indevida, no processo, das provas ilícitas - da barbárie primitiva da tortura física à sofisticação tecnológica da interceptação telefônica -, ainda geram controvérsia doutrinárias e vacilações jurisprudenciais nos ordenamentos de maior tradição cultural. " Eis a prova de que a questão da inadmissibilidade processual das provas ilícitas é assunto muito delicado, provocando análise e divergências na doutrina e jurisprudência."

Na fundamentação de seu voto o douto relator cita um trecho do livro Interceptação Telefônica e Gravações Clandestinas no Processo Penal, em Novas Tendências do Direito Processual da renomada jurista Ada Pelegrini Grinover que assim expressa, repelindo expressamente a pretendida recepção, para fins do art. 5º, XII, do art. 57 do Código de Telecomunicações:

Evidente que enquanto não vier a lei a estabelecer as hipóteses e a forma em que as interceptações poderão ser permitidas, não haverá, por enquanto, como ordená-las, pois o Código de Telecomunicações nada especifica, não suprindo a ausência de lei específica.

O ministro Pertence faz referência em seu voto à doutrina americana jurisprudencial denominada de princípios dos "fruits of the poisonous tree " ou "frutos da árvore venenosa" e continua :

"é que às provas diversas do próprio conteúdo das comunicações telefônicas interceptadas só se pode chegar, segundo a própria lógica da sentença, em razão do conhecimento delas, isto é, em conseqüência da interceptação ilícita de telefonemas." E reafirma em outro ponto: "essa doutrina da invalidade probatória do "fruits of the poisonous tree" é a única capaz de dar eficácia à garantia constitucional da inadmissibilidade da prova ilícita."

O Senhor Ministro Francisco Rezek, em seu voto, consolidou a idéia de que:

"As normas que a Constituição de 1988 encerra sobre essa matéria são prudentes : oferecem garantias aos cidadãos e à sua privacidade, sem entretanto descorar do interesse legítimo da investigação criminal.

O Ministro Ilmar Galvão afastou a possibilidade de aplicação do Código Brasileiro de Telecomunicações, no dispositivo indicado, não atende à exigência de expedição de lei que está contida no art. 5º, inciso XII, regulamentadora do uso das comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. Cheguei até a afirmar que essa norma já fora revogada anteriormente pela Constituição de 1967, na Emenda nº 1, art. 153, § 9º."

Ministro Carlos Velloso reintera a análise de não aplicabilidade do Código Brasileiro de Telecomunicações convencendo-se que:

"o art. 57, II, e, da mencionada Lei nº 4117, de 1962, não fixa a forma e tampouco as hipóteses, conseqüentemente, não houve a recepção do citado legal pelo inciso XII do art. 5º da Constituição."

Em seu voto o Ministro Paulo Brossard declara que:

"mantendo a inviolabilidade da correspondência e das comunicações telegráficas e de dados, a Constituição abriu exceção expressa às telefônicas, em princípio, invioláveis, mas suscetíveis de quebra." Citando do livro Elementos de Direito Processual Penal de José Frederico Marques, o mesmo ministro expõe que " A autorização judicial para que a escuta se faça, licitamente, tem o caráter de providência cautelar, em cujo processo há sempre um juízo de probabilidade."

No voto do Ministro Celso de Mello, o mesmo salienta que:

"A cláusula constitucional do due process of law - que se destina a garantir a pessoa do acusado contra ações eventualmente abusivas do Poder Público - tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas ou ilegítimas, uma de suas projeções concretizadoras mais expressivas, na medida em que o réu tem o impostergável direito de não ser denunciado, de não ser julgado e de não ser condenado com base em elementos instrutórios obtidos ou produzidos com desrespeito aos limites pelo ordenamento jurídico ao poder persecutório e ao poder investigatório do Estado."

Quanto ao princípio do art. 5º, XII, da Lei Fundamental da República, o Ministro Celso de Mello expõe:

"A derrogação desse princípio tutelar do sigilo telefônico somente legitimar-se-á, desde que a interceptação, sempre precedida de ordem judicial, venha a realizar-se no campo exclusivo da persecução penal e nas hipóteses a serem ainda definidas em numerus clausus pelo legislador, a quem incumbe prescrever, de outro lado, o modo e a forma de sua execução." E continua: "O preceito constitucional em causa não se reveste, quanto à interceptação das conversações telefônicas, de densidade normativa suficiente. Ele impõe e reclama, para que possa válida e eficazmente atuar, a instauração de um processo de integração normativa de que deriva a lei exigida pela Carta da República. " Fundamenta ainda seu voto dizendo que "O preceito inscrito no art. 5º, XII, da Lei Fundamental qualifica-se, no que refere à escuta telefônica, como estrutura jurídica dotada de insuficiente densidade normativa, a tronar imprescindível, para que possa opera, a necessária mediação legislativa concretizada do comando nele positivado. Na realidade, a norma constitucional em questão - por reclamar a interpositio legislatoris - não opera, em plenitude, no plano jurídico, e no que concerne à possibilidade das interceptações telefônicas, todas as suas conseqüências e virtualidade eficácias.

Sobre ilicitude da prova, observa-se do voto do Ministro Celso de Mello:

"a prova oriunda de interceptação telefônicas clandestinas, realizadas com inobservância das prescrições constitucionais, receba-se prova materialmente ilícita."

Contrapondo-se a doutrina americana dos "frutos da árvore venenosa", o Ministro Otávio Gallotti considerou que:

"a ilicitude da quebra de sigilo não pode ter a conseqüência de nulificar tudo aquilo mais que se venha a obter de prova e possa servir à instrução do processo e ao convencimento do juiz."

A decisão foi dada por maioria de votos e o Tribunal indeferiu o pedido de "Habeas Corpus" dando por vencidos os Ministros Relator, Francisco Rezek, Ilmar Galvão, Marco Aurélio e Celso de Mello, que o deferiram. Votou o presidente Ministro Otávio Gallotti, tendo como Relator para o acórdão o Ministro Carlos Velloso.

Outra decisão pesquisada pelo grupo foi a Ação Penal nº 307-3 do Distrito Federal de 13/12/94 publicada no Diário da Justiça da União no dia 13/10/95 sob o ementário de nº 1804-11. Essa ação teve como autor o Ministério Público Federal e como réus o Ex- Presidente Fernando Affonso Collor de Mello e seu tesoureiro de campanha o Sr. Paulo César Cavalcanti FariasO caput da ementa do acórdão assim relata:

AÇÃO CRIMINAL. CÓDIGO PENAL. CORRUPÇÃO PASSIVA (Art. 317, caput), CORRUPÇÃO ATIVA DE TESTEMUNHA (Art. 343), COAÇÃO NO CURSO DO PROCESSO (Art. 344), SUPRESSÃO DE DOCUMENTO (Art. 305) E FALSIDADE IDEOLÓGICA (Art. 299). PRELIMINARES: INADMISSIBILIDADE DE PROVAS CONSIDERADAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO E INCOMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA OS CRIMES DO Art. 299, À AUSÊNCIA DE CONEXÃO COM O DE CORRUPÇÃO PASSIVA, QUE DETERMINOU A INSTAURAÇÃO DO PROCESSO PERANTE ESTA CORTE, POSTO QUE ATRIBUÍDA, ENTRE OUTROS, A PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

O ponto 1.1 da ementa fala da inadmissibilidade de provas consideradas obtidas por meio ilícito, expondo, "in verbis":

1.1. Inadmissibilidade, como prova, de laudos da degravação de conversa telefônica e de registros contidos na memória de micro computador, obtidos por meio ilícito (art. 5º, LVI, da Constituição Federal); no primeiro caso, por se tratar de gravação realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro, havendo a degravação sido feita com conhecimento do outro, havendo a degravação sido feita com inobservância do princípio do contraditório, e utilizada com violação à privacidade alheia (art. 5º, X, CF); e, no segundo caso, por estar-se diante de micro computador que, além de ter sido apreendido com violação de domicílio, teve a memória nele contida sido degravada ao arrepio da garantia da inviolabilidade da intimidade das pessoas (art. 5º, X e XII, da CF).

O Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal acolheu a preliminar da defesa, para declarar inadmissível a prova consistente no laudo de degravação de memória do computador dando por vencidos os Ministros Carlos Velloso, Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira, que só julgavam inadmissível a prova referente ao computador. Em relação à segunda preliminar, relativamente à repercussão da prova inadmissível sobre as demais, o Tribunal rejeitou essa preliminar, vencidos o Ministro Celso de Mello e, em menor extensão, os Ministros Carlos Velloso, Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira, nos termos dos votos que proferiram. Essa ação penal teve como relator o Ministro Ilmar Galvão e como revisor o Ministro Moreira Alves.

Do voto do Ministro Carlos Velloso destacamos:

"Faço a distinção entre gravação efetuada por terceiro, que intercepta uma conversa de umas pessoas, da gravação que se faz para documentar uma conversa entre duas pessoas. Neste caso, não tenho como ofendido preceito constitucional e nem tenho como ilícita a prova, dado que não há, na ordem jurídica brasileira, nenhuma lei que impeça a gravação feita por um dos interlocutores de uma conversa, inclusive para documentar o texto dessa conversa, futuramente. (...). Nenhum homem de bem gravará uma conversa que tenha tido com outrem, sem que dê conhecimento ao seu interlocutor, de que a conversa está sendo gravada. Mas a questão fica no campo ético. Não há proibição legal."

No entanto, o voto do Ministro deu-se por vencido pelo Tribunal.

O Senhor Ministro Celso de Mello salientou em seu voto que:

"ninguém pode ser denunciado ou condenado com fundamento em provas ilícitas, eis que a atividade persecutória do Poder Público, também nesse domínio, está necessariamente subordinada à estrita observância de parâmetros de caráter ético-jurídico cuja transgressão só pode importar, no contexto emergente de nosso sistema normativo, na absoluta ineficácia dos meios probatórios produzidos pelo Estado." Quanto ao modo de obtenção da prova, o Ministro assim se posiciona: "a prova obtida por meios ilícitos deve ser repudiada - e repudiada sempre - pelos Juízes e Tribunais, "por mais relevantes que sejam os fatos por ela apurados, uma vez que se submete ela ao conceito de inconstitucionalidade ..." (ADA PELLEGRINI GRINOVER, op. cit., p.62,1990, Forense Universitária).

Ainda sobre provas ilícitas o Ministro Celso de Mello continua:

"A prova ilícita é prova inidônea. Mais do que isso, prova ilícita é prova imprestável. Não se reveste, por essa explícita razão, de qualquer aptidão jurídico-material. Prova ilícita, sendo providência instrutória eivada de inconstitucionalidade, apresenta-se destituída de qualquer grau, por mínimo que seja, de eficácia jurídica."

Sob essa óptica, o Ministro Celso de Mello concluiu que

"tenho por ilícita - e conseqüentemente em juízo - a prova obtida a partir da gravação clandestina de conversação telefônica efetivada à revelia de um dos interlocutores por outro dos sujeitos do diálogo, especialmente no que concerne ao registro feito das conversações mantidas com o co-réu Paulo César Farias."

O Ministro Sepúlveda Pertence em seu voto mostra-se perplexo ao interpretar a essência do art. 5º, inciso XII, da Constituição, ao ponto de dizer que:

"Continuo um tanto perplexo ,no que toca a saber se, no art. 5º , inciso XII, da Constituição, o que se protegeu foi o sigilo de qualquer dado armazenado por alguém ou o sigilo da comunicação de dados, uma vez que se trata, naquele inciso, de diversas formas de comunicação intersubjetiva e não do sigilo de arquivos." Logo a diante o Ministro diz: "Segundo interpreto o preceito o objeto específico da proteção constitucional da Comunicação telefônica, como de outros tipos de comunicação, é o sigilo em relação a terceiros." E continua:" Ë a ação do terceiro, é a interferência do terceiro - no grampeamento telefônico, na violação da correspondência alheia - que fere determinadas normas expressas na própria Carta da República. Quando, entretanto, um dos participantes da comunicação oral ou escrita entende de documentá-la de algum modo, ainda que na inconsciência da outra parte, isso não configura, em princípio, afronta à regra protetiva do sigilo. o resultado pode variar entre a indiscrição inofensiva e a mais reprovável vilania ; mas não há, aí, um ato ilícito."

Do voto do Ministro Sydney Sanches damos destaque ao seu posicionamento quanto a forma de obtenção da prova, onde ele expõe:

" E sendo ilícita a forma de obtenção da prova (invasão das dependências da empresa, sem ordem judicial, seguida de apreensão do computador), nem é preciso cogitar-se da outra violação, que teria consistido na reconstituição, decodificação e reprodução nos autos, dos registros constantes d computador, diante do disposto no inciso XII do art. 5º da C.F., segundo o qual é inviolável o sigilo de dados, ou, ao menos, da comunicação de dados, inclusive de computador."

Vejamos que o Ministro Sydney Sanches dá um entendimento mais amplo do inciso XII do art. 5º da C.F. dando por inviolável a comunicação de dados, inclusive de computador.

A presente ação foi julgada em Plenário no dia 09 de dezembro de 1994, sob a presidência do Senhor ministro Octávio Gallotti. Estavam presentes à sessão os Senhores Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Ilmar Galvão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Francisco Rezek. O Procurador-Geral da República foi o Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.

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Sobre o autor
Dijosete Veríssimo da Costa Júnior

Procurador Legislativo Municipal em Natal (RN). Professor da UERN. Advogado. Mestrando em Direito pela UFRN.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA JÚNIOR, Dijosete Veríssimo. Escuta telefônica:: análise constitucional, processual penal e jurisprudencial do art. 5º, XII, da Constituição Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 27, 23 dez. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/194. Acesso em: 19 nov. 2024.

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