3 REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA
A regra-matriz de incidência tributária é uma norma de conduta, geral e abstrata, que visa disciplinar a relação jurídico-tributária entre o Fisco e o contribuinte.
O legislador prevê um determinado fato social como hipótese de incidência tributária e, uma vez ocorrido o aludido fato previsto no suposto da norma, exsurge o consequente. Dessa forma, constatada a ocorrência da hipótese tributária a norma incidirá de modo infalível.
Vale a pena transcrever a lição de Paulo de Barros Carvalho:
O dever-ser que une a hipótese e a conseqüência, na arquitetura lógica da norma jurídica, recebe o nome de conectivo deôntico ou operador deôntico, ou ainda dever-ser interproposicional, porque vem entre a proposição hipótese e a proposição consequente. Sua função é fulminante e inapelável. Realizando-se o fato previsto no suposto, instaura-se a conseqüência, de modo automático e infalível (Becker), mesmo que as pessoas cuja conduta foi regulada propositadamente não a observem, em flagrante desrespeito à ordem jurídica e sobre elas não atuem as sanções vigorantes. [13]
De forma bastante elucidativa, Paulo de Barros Carvalho sintetiza a regra-matriz de incidência tributária:
Ora, a regra-matriz de incidência tributária é, por excelência, uma norma de conduta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendo em vista contribuições pecuniárias. Concretizando-se os fatos descritos na hipótese, deve-ser a conseqüência, e esta, por sua vez, prescreve uma obrigação patrimonial. Nela, encontraremos uma pessoa (sujeito passivo) obrigada a cumprir uma prestação em dinheiro. Eis o dever-ser modalizado. [14]
No que tange à aplicabilidade da regra-matriz aduz Vitório Cassone:
A esquematização formal da regra-matriz de incidência tem-se mostrado um utilíssimo instrumento científico, de extraordinária fertilidade e riqueza para a identificação e conhecimento aprofundado da unidade irredutível que define a fenomenologia básica da imposição tributária. Seu emprego, sobre ser fácil, é extremamente operativo e prático, permitindo, quase que de forma imediata, penetrarmos na secreta intimidade da essência normativa, devassando-se e analisando-a de maneira minuciosa. Em seguida, experimentando o binômio base de cálculo/hipótese de incidência, colhido no texto constitucional para marcar a tipologia dos tributos, saberemos dizer, com rigor e presteza, da espécie e da subespécie da figura tributária que investigamos. [15]
A regra-matriz de incidência tributária apresenta 03 (três) critérios na hipótese e 02 (dois) critérios no consequente, que serão estudados a seguir.
3.1 Critérios da hipótese: material, espacial e temporal
Muitos doutrinadores, ao falarem em hipótese de incidência tributária, confundem o termo com a expressão fato gerador. Consoante Luciano Amaro:
[...] a expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição, contida na lei, da situação necessária e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador diz da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, é simples previsão, enquanto o fato é concretização da hipótese, é o acontecimento do que fora previsto. [16]
Para a construção da hipótese, são apanhados pelo legislador fatos sociais com expressão econômica, facilitando a aferição do critério quantitativo fixado no consequente da regra-matriz de incidência tributária.
Na hipótese tributária encontraremos 03 (três) critérios identificadores do fato social selecionado pelo legislador: a) critério material; b) critério espacial; e c) critério temporal.
O critério material da regra-matriz de incidência tributária é o comportamento previsto em lei de uma pessoa, física ou jurídica, delimitado por condições de tempo e espaço. É formado por um verbo acompanhado de seu complemento. Exemplo: auferir renda.
Peremptoriamente, o professor Paulo de Barros Carvalho ensina que:
O comportamento de uma pessoa, consistência material linguisticamente representada por um verbo e seu complemento, há de estar delimitado por condições espaciais e temporais, para que o perfil típico esteja perfeito e acabado, como descrição normativa de um fato. [17]
Podemos compreender o critério temporal da hipótese tributária com o exato instante em que ocorre o fato descrito na norma, demarcando um direito subjetivo para o Estado e um dever jurídico para o contribuinte (obrigação tributária).
A título exemplificativo, o critério temporal do imposto sobre serviços de qualquer natureza se dá com a prestação efetiva do serviço tributável.
O critério espacial é o local onde o fato jurídico tributário deve ocorrer, para que possa produzir efeitos jurídicos. Nem sempre o legislador deixa nítido o local onde o fato jurídico tributário deve ocorrer, entretanto, haverá elementos latentes que permitirão identificar onde se deu o fato tributário.
3.2 Considerações sobre o fato jurídico tributário
Para designar os fatos sociais selecionados pelo Poder Legislativo sobre os quais incidirá a cobrança de tributos, foi adotada a expressão "fato gerador", utilizada, inclusive, no artigo 146, inciso III, a, da Carta Republicana, que preconiza caber à lei complementar a definição dos fatos geradores de todos os impostos nela discriminados.
O Código Tributário Nacional definiu o fato gerador da obrigação principal e o fato gerador da obrigação acessória, conforme os artigos 114 e 115:
Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Art. 115. Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.
É digno de atenção, sobretudo, o estudo do fato gerador da obrigação principal, conceituado como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência. Situação necessária porque sem ela não se pode cogitar o nascimento da obrigação. Situação suficiente porque sua realização, por si só, já basta para o surgimento da obrigação principal.
A expressão "fato gerador" é utilizada pelo Código Tributário Nacional para designar 02 (dois) acontecimentos distintos: a descrição legal do fato e o próprio fato concretamente ocorrido. Por isso, malgrado já incorporada ao ordenamento jurídico pátrio, essa expressão tem merecido críticas de alguns tributaristas, que preferem separar essas 02 (duas) facetas, utilizando denominação distinta para o fato gerador enquanto mera previsão legal, como hipótese de incidência tributária ou pressuposto fático.
Há, portanto, 02 (duas) situações distintas a se considerar: 1) a situação definida in abstrato pela lei, potencialmente capaz de gerar a obrigação tributária. É a hipótese de incidência; e 2) a ocorrência concreta do fato previsto em lei como necessário e suficiente para gerar a obrigação tributária. É a materialização do pressuposto fático. Assim, com a concretização da previsão legal, surge a obrigação tributária.
3.3 Critérios do consequente: pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e quantitativo (base de cálculo e alíquota)
O consequente da regra-matriz de incidência tributária regula os direitos e as obrigações surgidas com a subsunção do fato à norma jurídica.
A obrigação tributária nasce com o fato jurídico, assim entendido como a materialização da hipótese de incidência. De fato, com a subsunção tributária, despontam credor e devedor no liame obrigacional tributário (critério pessoal).
O sujeito ativo da obrigação tributária é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento (artigo 119 do Código do Tributário Nacional).
Assim, colocam-se nessa condição as pessoas jurídicas de direito público interno, chamadas de entidades impositoras ou entes tributantes. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são, dessa forma, sujeitos ativos. Tais pessoas são detentoras do poder de instituir o tributo, isto é, da competência tributária.
Há certas pessoas jurídicas de direito público que, delegatárias das atividades de arrecadação e fiscalização do tributo, podem se colocar na condição de sujeitos ativos, pois elas detêm capacidade tributária ativa.
O contribuinte deve pagar o tributo para um ente credor, e não para mais de um, sob pena de ocorrência do vício da solidariedade ativa. Na verdade, não é incomum a presença de mais de um ente tributante que cobra um ou mais tributos sobre o mesmo fato jurídico (bitributação).
A propósito, o Código Tributário Nacional, no artigo 164, inciso III, explora o tema, ofertando a solução com o ajuizamento da ação de consignação em pagamento.
Por sua vez, o sujeito passivo da obrigação tributária é a pessoa, física ou jurídica, privada ou pública, obrigada ao seu cumprimento.
Há 02 (dois) tipos de sujeito passivo previstos no artigo 121, parágrafo único, do Código Tributário Nacional: o contribuinte que é aquele que tem relação pessoal e direta com o fato jurídico tributário; e o responsável que é a terceira pessoa escolhida por lei para pagar o tributo, sem que tenha realizado o fato imponível (artigos 128 a 138 do Código Tributário Nacional).
O sujeito passivo deve, necessariamente, estar previsto em lei, uma vez que se trata de um item adstrito à reserva legal (artigo 97, inciso II, parte final, do Código Tributário Nacional).
Sobre o critério pessoal, especificamente no sujeito passivo da relação jurídico-tributária, é que recai a desconsideração da personalidade jurídica em determinados casos de evasão fiscal.
Por último, vamos analisar o critério quantitativo do consequente da regra-matriz de incidência tributária - alíquota e base de cálculo.
A base de cálculo é a perspectiva dimensível do fato jurígeno e, conjugando-a com a alíquota, será definida a quantia a ser paga pelo sujeito passivo a título de tributo.
Escreveu o renomado jurista Paulo de Barros Carvalho:
Temos para nós que a base de cálculo é a grandeza instituída na conseqüência da regra-matriz tributária, e que se destina, primordialmente, a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo do fato jurídico, para que, combinando-se à alíquota, seja determinado o valor da prestação pecuniária. Paralelamente, tem a virtude de confirmar, infirmar ou afirmar o critério material expresso na composição do suposto normativo. A versalidade categorial desse instrumento jurídico se apresenta em três funções distintas: a) medir as proporções reais do fato; b) compor a específica determinação da dívida; e) confirmar, infirmar ou afirmar o verdadeiro critério material da descrição contida no antecedente na norma. [18]
Atente-se que a base de cálculo tem 03 (três) funções, quais sejam: função mensuradora - mede as proporções reais do fato; função objetiva - compõe a específica determinação da dívida (atribui certeza ao crédito); e função comparativa - confirma, infirma ou afirma o critério material da hipótese de incidência.
Ex vi do disposto no artigo 97, inciso IV, do Código Tributário Nacional, à alíquota também deve ser aplicada a reserva legal. Calculada sobre a base de cálculo, dar-se-á o valor do crédito tributário
Através do critério quantitativo da regra-matriz de incidência tributária, será possível identificar o quantum debeatur, bastando aplicar a alíquota sobre a base de cálculo.
Feitas essas considerações sobre o Sistema Tributário Nacional e sobre a Regra-Matriz de Incidência Tributária, sem a pretensão de esgotar o assunto, haja vista a complexidade de cada ponto analisado, passemos a cotejá-los com o estudo do planejamento tributário, focando na possibilidade de prestação de serviços intelectuais por pessoas jurídicas.
4 PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO
Em um país onde a carga tributária é bastante elevada, é de suma relevância a realização do planejamento tributário, como uma das formas de gestão empresarial, a fim de otimizar os custos das atividades dos contribuintes, garantindo, desta feita, uma melhor competitividade mercantil.
Diante da alta carga tributária brasileira, torna-se imprescindível a busca de meios legais para reduzir ou até mesmo evitar a incidência tributária nas atividades econômicas.
As empresas são os maiores alvos de tributação no Brasil. Sempre que necessário o aumento da arrecadação fiscal, as atividades empresariais são tributadas com maior intensidade em decorrência da imposição estatal.
Não há hesitação de que os contribuintes que se planejam no âmbito tributário serão mais competitivos no mercado em que atuam, possibilitando a mercancia de seus produtos ou serviços com melhor qualidade e preço.
Ousamos a dizer que o planejamento tributário não é somente necessário para o desenvolvimento eficaz da atividade empresarial, mas obrigatório para uma boa gestão.
O artigo 153 da Lei n° 6.404/76 prevê que:
O administrador da companhia deve empregar, nos exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios.
Tendo em mente que todo homem ativo e probo deve planejar em todos os aspectos a administração dos seus próprios negócios, afirmamos, com amparo no artigo 153 da Lei das Sociedades Anônimas e também no artigo 1.011 do Código Civil, que o planejamento tributário é obrigatório para o bom gestor de negócios.
O estudo do planejamento tributário é uma medida tão importante quanto o planejamento comercial, técnico, de viabilidade econômica do negócio, motivo por que não pode ser deixado de lado pelo bom administrador.
O planejamento tributário está em total harmonia com a livre iniciativa, que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, conforme o artigo 1°, inciso IV, da Constituição Federal, cabendo ao contribuinte buscar a melhor forma de tributação de seu negócio.
Em análise ao Capítulo I (DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA) do Título VII (Da Ordem Econômica e Financeira) da Lei Maior, verificamos que a ordem econômica é fundada na livre iniciativa e tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados, entre outros, o princípio da livre concorrência.
Cotejando os dispositivos constitucionais em estudo, conclui-se com veemência que o contribuinte brasileiro possui o direito fundamental de realizar o planejamento tributário de suas atividades, organizando seus negócios dentro dos ditames legais e da forma mais econômica possível.
Ademais, o contribuinte, realizando o planejamento tributário de seus negócios, estará amparado pelo direito fundamental à autonomia privada. Na lição do tributarista Heleno Tôrres, a autonomia privada pode ser entendida como um:
[...] princípio do direito constitucional civil que consiste no poder atribuído pela Constituição às pessoas, individual ou coletivamente, para determinar consequências jurídicas como decorrência de comportamentos livremente assumidos. Ou, de um modo mais objetivo, como o poder conferido constitucionalmente aos particulares para que estes possam criar normas jurídicas, visando à constituição de situações jurídicas, fundando direitos subjetivos sobre direitos disponíveis, sob tutela e garantia do Estado. [19]
Com fulcro nos princípios constitucionais da livre iniciativa, da livre concorrência e da autonomia privada, o contribuinte pode se valer do planejamento tributário com o intento de reduzir seus custos, especialmente criando pessoas jurídicas para a prestação de serviços intelectuais. Com base nesses princípios constitucionais é que foi editado o artigo 129 da Lei n° 11.196/2005, que será estudado oportunamente.
4.1 Conceito
Helenilson Cunha Pontes, sinteticamente, afirma que o planejamento tributário trata-se de uma: "zona de liberdade para adoção de condutas de procedimentos preventivos lícitos, anteriores à ocorrência do fato-jurídico tributário, objetivando uma economia tributária." [20]
Ocorre o planejamento tributário quando o contribuinte, pessoa física ou jurídica, traça um plano de suas organizações fiscais, sem perder de vista a legislação tributária.
O doutrinador Heleno Tôrres definiu planejamento tributário da seguinte maneira:
Com a expressão ‘planejamento tributário’ deve-se designar [...] a técnica de organização preventiva dos negócios, visando a uma legítima economia de tributos. [21]
A respeito do tema em estudo, José Eduardo Soares de Melo aduz com maestria que:
Enquanto o administrador público só pode atuar segundo as condutas e os procedimentos determinados em lei, aplicando-os de ofício, as pessoas privadas podem realizar negócios que atendam a seus objetivos particulares, tendo como único limite as normas proibitivas. São livres para escolherem a estrutura societária que entendam conveniente aos seus interesses (sociedade por quotas, anônima, comandita etc.) ou para promoverem a abertura de filiais em qualquer ponto do território nacional. Podem optar pela compra, locação ou mesmo construção de estabelecimento; ou, ainda, proceder à aquisição, locação ou arrendamento mercantil de bens. [22]
Para Gilberto Luiz do Amaral, o planejamento tributário apresenta 03 (três) finalidades. São elas:
[...]; b) reduzir o montante do tributo: as providências são no sentido de reduzir a alíquota ou a base de cálculo do tributo [...] c) retardar o pagamento do tributo: o contribuinte adota medidas que têm por fim postergar (adiar) o pagamento do tributo, sem a ocorrência da multa (os grifos são nossos). [23]a)Evitar a incidência do tributo: tomam-se providências com o fim de evitar a ocorrência do fato gerador do tributo
Existem 03 (três) hipóteses em que é possível impedir a incidência da norma tributária: imunidade, isenção e não incidência propriamente dita. Geralmente, o planejamento tributário abarca a não incidência propriamente dita, mas é perfeitamente possível alcançá-lo através do preenchimento dos requisitos para se enquadrar em determinada espécie de imunidade ou isenção.
Na verdade, o planejamento tributário é uma atividade estritamente preventiva praticada pelo contribuinte, ou seja, deve ocorrer antes da subsunção do fato à norma jurídica - fato jurídico tributário, pois, depois da concretização do fato selecionado pelo legislador, ao contribuinte restará somente as opções de pagar ou não pagar o tributo.
No mais, o planejamento tributário pode ser buscado através da recuperação de tributos recolhidos indevidamente, aproveitamento de créditos tributários não apropriados no átimo escorreito, reorganização societária (fusão, cisão, incorporação e constituição de novas sociedades) e constituição de pessoa jurídica para a prestação de serviços intelectuais.
O contribuinte tem total liberdade de realizar o planejamento tributário, buscando alternativas para evitar a ocorrência do fato jurídico tributário ou para reduzir a carga tributária incidente sobre sua atividade. Dentro do campo permitido em lei, vislumbra-se diversas possibilidades de otimizar a carga tributária. Assim, o contribuinte, ao realizar o planejamento tributário, estará amparado pelo princípio da legalidade e por outros princípios constitucionais estudados anteriormente.
4.2 Elisão fiscal
O conceito de elisão fiscal não apresenta unanimidade na doutrina brasileira. Hugo de Brito Machado, ao contrário da maioria dos doutrinadores, entende que a postura lícita do contribuinte para evitar a ocorrência do fato jurídico tributário ou reduzir a carga tributaria deve ser entendida como evasão fiscal. Segundo o tributarista, elisão fiscal é a adoção de meios ilícitos para evitar a incidência tributária. [24]
Respaldando nosso entendimento na maioria da doutrina, entendemos que elisão fiscal é o ato lícito praticado pelo contribuinte com o objetivo de evitar a ocorrência do fato jurídico tributário ou de reduzir a tributação. Trata-se de uma economia lícita ocorrida antes da subsunção tributária.
Para que se possa falar em elisão fiscal deve ser impedida a ocorrência do fato jurídico tributário por meio de ato lícito. A característica principal da elisão fiscal é a utilização de meios legais, anteriores ao fato jurígeno, visando a realização do negócio jurídico com o menor custo tributário possível.
Para diferenciar evasão de elisão fiscal, consoante o pensamento de Rubens Gomes de Souza, devemos:
[...] verificar se os atos praticados pelo contribuinte para evitar, retardar ou reduzir o pagamento de um tributo foram praticados antes ou depois da ocorrência do respectivo fato gerador: na primeira hipótese, trata-se de elisão; na segunda trata-se de fraude fiscal. [25]
A prática da elisão fiscal busca evitar a ocorrência de qualquer um dos critérios da regra-matriz de incidência tributária.
O critério material pode ser perfeitamente evitado quando o fato praticado não está previsto na legislação tributária ou está previsto de modo menos gravoso ao contribuinte. Evita-se o critério temporal quando se pratica o fato num momento em que o tributo é inexigível ou é exigido de forma reduzida. Já o critério espacial pode ser prevenido quando o contribuinte pratica o fato jurídico onde não haja tributação ou onde esta é reduzida.
A elisão fiscal pode ser induzida pela própria lei quando o ordenamento jurídico prevê determinadas possibilidades de redução da carga tributária, como, v.g., isenções concedidas em regiões subdesenvolvidas. Em casos de lacuna na lei, a elisão fiscal também pode ser utilizada para a obtenção da redução da carga tributária.
4.3 Evasão fiscal
Coadunamos com aqueles que defendem que evasão fiscal é a conduta ilícita praticada pelo contribuinte, concomitante ou posterior à ocorrência do fato imponível, para pagar menos tributo do que efetivamente devido ao agente arrecadador.
A evasão fiscal coloca em risco a atividade estatal direcionada a suprir as necessidades sociais, razão pela qual surge a preocupação diante de condutas que possam causar a diminuição da arrecadação fiscal.
Em brilhante comentário sintetiza o professor Sacha Calmon Navarro Coêlho:
Tanto na evasão comissiva ilícita quanto na elisão fiscal existe uma ação do contribuinte, intencional, com o objetivo de não pagar ou pagar tributo a menor. As diferencia: a) a natureza dos meios empregados. Na evasão ilícita os meios são sempre ilícitos (haverá fraude ou simulação de fato, documento ou ato jurídico. Quando mais de um agente participar haverá conluio). Na elisão os meios são sempre lícitos porque não vedados pelo legislador; b) também, o momento da utilização desses meios. Na evasão ilícita a distorção da realidade ocorre no momento em que ocorre o fato jurígeno-tributário (fato gerador) ou após a sua ocorrência. Na elisão, a utilização dos meios ocorre antes da realização do fato jurígeno-tributário, ou como aventa Sampaio Dória, antes que se exteriorize a hipótese de incidência tributária, pois, opcionalmente, o negócio revestirá a forma jurídica alternativa não descrita na lei como pressuposto de incidência ou pelo menos revestirá a forma menos onerosa (grifamos). [26]
Para a caracterização da evasão fiscal, não basta o contribuinte deixar de pagar o tributo devido, devendo se valer de meios ilícitos durante ou após a ocorrência do fato jurídico tributário. Desse modo, deve ficar configurada a má-fé e a intenção de lesar o Estado.
4.4 Elusão fiscal
Podemos extrair o conceito de elusão fiscal do seguinte trecho da obra de Heleno Tôrres:
[...] os exercícios de autonomia privada carentes de causa ou quando o negócio aparente (simulado ou fraudulento) demonstre insuficiência da causa ou sua dolosa programação para evitar lei cogente. Não cabendo tal enquadramento, o que se tem na espécie é exercício legítimo de autonomia privada, com criação de negócio atípico, indireto, fiduciário ou com forma própria plenamente admissível, porquanto oriundo das três liberdades negociais: de escolha da melhor ‘causa’ (fim negocial), da melhor ‘forma’ e do melhor ‘tipo’ contratual ou societário, quando estes não sejam definidos por lei. [27]
A elusão fiscal se aproxima da elisão apenas no aspecto de o contribuinte realizar a prática de um ato antes do fato imponível, dela se distanciando em virtude da mera aparência de licitude do ato praticado. Em casos de elusão fiscal, há fraude ou simulação à lei, não havendo causa negocial.
4.5 Sonegação fiscal
A evasão fiscal é gênero do qual a sonegação fiscal deve ser tratada como espécie.
A sonegação fiscal envolve meio específico para acarretar a evasão tributária, mediante uso de expediente fraudulento que coloca o Fisco em situação de erro, caracterizando crime contra a ordem tributária.
A legislação penal referente aos crimes contra a ordem tributária - Lei n° 8.137/90 - tem função instrumental de cobrança, conferindo uma carga maior de imperatividade no plano da eficácia à legislação administrativa tributária.
4.6 Inadimplência fiscal
A inadimplência fiscal é simplesmente o não pagamento do tributo devido. Após a ocorrência do fato jurídico tributário e o surgimento da obrigação tributária, o Fisco efetuará o lançamento. Com o lançamento, constitui-se o crédito tributário (artigo 139 do Código Tributário Nacional), demarcando-se o fim da atuação do Fisco na fase de cobrança administrativa; iniciar-se-á a cobrança judicial, transformando-se a exigibilidade do crédito tributário em exequibilidade da dívida ativa.
Com a cobrança judicial, o Fisco se valerá de aparato judicial próprio à Procuradoria, bem como de instrumento normativo específico - Lei n° 6.830/80.
Para esta cobrança judicial será necessária a inserção do importe devido nos cadastros da Procuradoria, mediante o conhecido instituto da inscrição. Na verdade, esta se faz por meio do termo de inscrição em dívida ativa, que deverá conter os requisitos obrigatórios previstos no artigo 202 do Código Tributário Nacional.