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A ética presente nas profissões jurídicas

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10/07/2011 às 15:41
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4 – A ÉTICA PRESENTE NO PODER JUDICIÁRIO

Aqui se faz presente, em nosso sucinto entendimento, os mais valiosos estudos da ética dentre as profissões ligadas à área jurídica: a ética dos magistrados, titulares do poder de maior força no Estado de Direito dentre o qual vivemos, chamada sentença, que, sanadas todas as irregularidades e transitada em julgado a decisão, será em regra absoluta e impassível de correção ou modificação.

As pessoas buscam o judiciário quando se vêem em situação de lesão ou ameaça a algum direito, verdadeira situação litigiosa que será resolvida, ao final, pelo magistrado. Quaisquer regras acerca das condutas destes profissionais devem sempre vir dotadas de estudos éticos, pois a cada decisão, fortes impactos são gerados para as partes, seja o decisum favorável ou não a elas.

Os principais nortes dos deveres e preceitos éticos da magistratura são encontrados no art. 93 da CF, além da LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) [34] e do Código de Ética da Magistratura Nacional, criado pelo Conselho Nacional de Justiça, entidade que passou a existir graças à emenda constitucional n.º 45/04, e destinada precipuamente às apurações de infrações e irregularidades dentro do poder judiciário.

Primeiramente, vê-se a preocupação do constituinte ao estabelecer critérios para o ingresso na carreira, mediante concurso de provas e títulos, após completados três anos de prática jurídica. [35] Trata-se de concurso dos mais criteriosos, constituído por várias fases, em que se avalia todo o conhecimento necessário do candidato para o exercício de tal profissão.

Além disso, estabeleceram-se regras para a ascensão da carreira de juiz, que será analisado sob o valor do merecimento e da antiguidade. [36]

A aferição do merecimento se fará de acordo com cinco critérios: pelo desempenho, pelos critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição, além da freqüência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento. [37] Todos esses para que haja a efetiva entrega da prestação jurisdicional em tempo hábil, célere.

Dever interessante, já comentado quando da explanação acerca dos membros do MP, é a fixação de residência do juiz na respectiva comarca onde atua, salvo autorização do Tribunal [38], pois em casos de excepcional urgência poderá o poder judiciário ser acionado, para que assim garanta a efetiva justiça em eventualidades, passíveis de se acontecer.

Ademais, o juiz não poderá exercer outra atividade, senão a de magistério, consagrando-se, aqui, o dever de dedicação exclusiva à profissão. Além disso, como obtempera Nalini, dois deveres merecem destaque: o do desinteresse, que faz com que todas as causas sejam examinadas com imparcialidade e igualdade de atenção, e o da abstenção política, que é conseqüência da imparcialidade, para que o juiz decida segundo sua consciência e não sob influência política. [39] Todos esses são encontrados no art. 95, parágrafo único, incisos I a III, da CF, sob a forma de vedações.

Obrigação importante, que garante estabilidade no exercício da jurisdição, é a de fundamentação das decisões do juiz, objetivando a explicação de o porquê haver o magistrado seguido por tal entendimento, elucidando melhor a decisão e dando-lhe maior segurança. [40]

Duas vedações presentes na CF garantem a imparcialidade do Poder Judiciário, quais sejam: receber contribuições pecuniárias de pessoas físicas ou jurídicas (em razão da função), além de exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento. [41]

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n.º 35 de 1979) organiza regras deontológicas para o exercício da profissão, especificamente em seu artigo 35, que dispõe sobre os deveres dos magistrados, alguns corroborados posteriormente pelo advento da CF, além de outros em caráter de especialidade.

O juiz deve cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício, não excedendo injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar, além de determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais, tudo para garantir a presteza e celeridade de todo o trâmite processual. [42]

Dever concorrente de todos os profissionais da área jurídica é o de urbanidade, eis que o juiz, que exige respeito, também o faz para com as partes, membros do MP, advogados, partes, funcionários e demais presentes (inciso IV, art. 35, da LOMAN).

Se o juiz deve cumprir com seus deveres, deve fazer também com que os demais cumpram com os seus. Ao passo que deve comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término, deverá exercer assídua fiscalização sobre os subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos, mesmo que não haja reclamação das partes. [43]

A LOMAN impõe ainda três importantes vedações aos magistrados, em seu artigo 36, incisos I a III. Os juízes estão proibidos de exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, exceto como acionista ou quotista, além do que não podem exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, em cargo sem remuneração. Ademais, veda-se-lhes a manifestação, por qualquer meio de comunicação, de opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, em obras técnicas ou no exercício do magistério.

Dentro do processo judicial, o juiz deverá coordenar uma estrutura cooperatória entre o mesmo e as partes, de maneira a viabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa, buscando sempre a verdade real dos fatos, e trazendo ao final, a decisão mais justa a cada caso concreto, em uma alusão aos brocardos jurídicos narra mihi factum dabo tibi jus (narre-me o fato que te darei o direito) e juria novit curia (o juiz conhece o direito). [44]

Por fim, o Código de Ética da Magistratura Nacional elenca os grandes elementos a serem seguidos pelos magistrados no exercício da profissão, quais sejam: a independência, a imparcialidade, a transparência, a integridade pessoal e profissional, a diligência e dedicação, a cortesia, a prudência, o sigilo profissional, o conhecimento e a capacitação, a dignidade, a honra e o decoro. [45]

São essas as regras gerais sobre a ética dos magistrados. Quaisquer atos atentatórios às regras éticas poderão ser punidos, de acordo com o Capítulo II - Das Penalidades, presentes na LOMAN, que demandam estudo peculiar ao cunho deste.

E concluindo-se sobre as regras deontológicas da magistratura nacional, demonstra-se que o juiz, autoridade preponente na aplicação da justiça, deverá ser aquele profissional que se orgulha de seu cargo e trabalha com devotamento, que não se influencia pelas idiossincrasias do cotidiano, mantendo-se imparcial. Sua conduta deverá servir de exemplo, não somente dentro do exercício de suas atribuições, mas também em sua vida particular [46], visto que aos olhos de todos ele é a justiça, e o descrédito em sua pessoa também gera o descrédito no Poder Judiciário.

Nos dizeres de José Renato Nalini, desembargador com vasta experiência na judicatura, "a justiça abarca tudo. Diz a última palavra. Garante ou destrói o Estado de Direito. É imprescindível para que a sociedade não se torne um caos. Impede a barbárie. E é concretizada mediante implementação da ciência mais próxima à moral, de intimidade maior com a ética, a ciência do direito". [47]

O que se espera do futuro da magistratura é a excessiva educação e o treinamento dos juízes, para que ajam e julguem como devem, e não apenas como queiram. Preserva-se, assim, a ética diante do Poder Judiciário, que é instrumento da justiça, necessária em qualquer nação, e que jamais poderá ser ignorada perante estudiosos da área jurídica.


5 – CONCLUSÃO

A conclusão a que se chega ao final desta dissertação é a de que a justiça, em todos os seus pormenores, jamais conseguirá se estabelecer por si só, através de um único órgão ou ente. Necessita de integração de todos os profissionais ligados à área jurídica, entre eles o advogado (público e particular), o promotor de justiça (e cargos afins) e, claro, o juiz, que exercerá o poder jurisdicional com a colaboração de todos os supramencionados.

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A análise de regras deontológicas, nortes éticos das respectivas carreiras, nos conduz à percepção de que a ética sempre exigirá do bom profissional afinco e dedicação, para que se torne como exemplo para os demais indivíduos da sociedade e da própria área. Tanto juízes, quanto advogados e promotores são pessoas que servem de parâmetro a ser seguido pela coletividade, eis que representam classes de respeitados profissionais, nos quais muitos se espelham.

Nota-se também que certas regras éticas são comuns a todos eles, como a que exige do profissional o dever de urbanidade com membros de outra carreira, o que por demais explicita a educação e respeito aos olhos da sociedade.

Nada se faz e nenhum passo se alcança sem regras e princípios éticos, e, ainda que muitas vezes não percebamos, tais regras estão presentes em nossa conduta prática de tal maneira que a sua desobediência geraria não somente a punição legal mas também a moral, que, de certa forma, é mais ampla e inaceitável. Assim, com as análises e estudos éticos, pode-se chegar ao ideal de cada profissão, para que a luta incessante por direito e justiça jamais deixe de ser praticada, e para que tenhamos sempre a certeza de que estaremos amparados por um Estado defensor da paz social e da segurança jurídica.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SÁ, Antonio Lopes de. Ética Profissional. São Paulo: Atlas, 2008.

MARIN. Marco Aurélio. Como se preparar para o exame da ordem, 1ª fase: ética profissional. São Paulo: Método, 2009.

CAMARGO, Marculino. Fundamentos de ética geral e profissional. Rio de Janeiro: Vozes, 1999.

NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. 6 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

DIREITO, Carlos Alberto Menezes. Ética do Juiz. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/9385/Etica_do_Juiz_Vers%C3%A3o_IV.pdf?sequence=1>. Acesso em: 5 set 2010.


NOTAS:

  1. José Renato Nalini, Ética geral e profissional, p. 27-28.
  2. Marculino Camargo, Fundamentos de ética geral e profissional, p. 27-28.
  3. José Renato Nalini, Ética geral e profissional, p. 29.
  4. Idem, Ibidem, p. 29-30.
  5. José Renato Nalini, op. cit., p. 354.
  6. Ruy de Azevedo Sodré, apud José Renato Nalini, op. cit., 357.
  7. José Renato Nalini, op. cit., p. 357-358.
  8. Art. 2º O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.
  9. Parágrafo único. São deveres do advogado: I - preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade; II - atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; III - velar por sua reputação pessoal e profissional; IV - empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal e profissional; V - contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis; VI - estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios; VII - aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial; VIII - abster-se de: a) utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente; b) patrocinar interesses ligados a outras atividades estranhas à advocacia, em que também atue; c) vincular o seu nome a empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso; d) emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana; e) entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste. IX - pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade.

  10. Arts. 5º, 6º e 7º do Código de Ética e Disciplina da OAB.
  11. Art. 8º do Código de Ética de Disciplina da OAB.
  12. Arts. 11, 12 e 20 do Código de Ética e Disciplina da OAB.
  13. José Renato Nalini, op. cit., p. 362.
  14. Arts. 25 e 26 do Código de Ética e Disciplina da OAB.
  15. Ver artigos 154, do CP, e 207, do CPP.
  16. Expressão utilizada por José Renato Nalini, op. cit., p. 364.
  17. Arts. 29 a 34 do Código de Ética e Disciplina da OAB.
  18. Arts. 35 e 36 do Código de Ética e Disciplina da OAB.
  19. José Renato Nalini, op. cit., p. 371.
  20. As disposições finais e transitórias, bem como as competências do referido Tribunal de Ética poderão ser encontradas no Código de Ética e Disciplina da OAB, disponível no site de seu Conselho Federal, <http://www.oab.org.br/arquivos/pdf/LegislacaoOab/codigodeetica.pdf>.
  21. Art. 43, I, da Lei 8.625/93.
  22. José Renato Nalini, Ética geral e profissional, p. 390.
  23. Art. 43, IV e V, Lei 8.625/93.
  24. Art. 43, III, Lei 8.625/93.
  25. Art. 43, VI, Lei 8.625/93.
  26. Art. 43, VII, Lei 8.625/93.
  27. Art. 43, VIII, Lei 8.625/93.
  28. Art. 43, IX e XIII, Lei 8.625/93.
  29. Art. 43, X e XII, Lei 8.625/93.
  30. Art. 43, XI e XIV, Lei 8.625/93.
  31. Art. 44, I, II e III, Lei 8.625/93.
  32. Art. 44, IV e parágrafo único, Lei 8.625/93.
  33. A redação anterior do art. 128, § 5º, II, a), CF, mencionava a seguinte vedação: "exercer atividade político-partidária, salvo as exceções previstas na lei". Após a emenda 45 de 2004, foi alterado para: "exercer atividade político-partidária", eliminando-se a possibilidade de regulamentação de exceção por lei ordinária.
  34. José Renato Nalini, op. cit., p. 398-399.
  35. Lei Complementar n.º 35, de 14 de março de 1979.
  36. Art. 93, I, da Constituição Federal.
  37. Art. 93, II, da Constituição Federal.
  38. Art. 93, II, c), da Constituição Federal.
  39. Art. 93, VII, da Constituição Federal.
  40. José Renato Nalini, Ética geral e profissional, p. 409-410.
  41. Art. 93, IX, da Constituição Federal.
  42. Art. 95, p. único, incisos IV e V, da Constituição Federal.
  43. Art. 35, incisos I, II e III, da Lei Complementar n.º 35/79.
  44. Art. 35, incisos VI e VII, da Lei Complementar n.º 35/79.
  45. José Renato Nalini, op. cit., p. 421.
  46. O Código de Ética da Magistratura Nacional pode ser facilmente encontrado no site do CNJ: <http://www.cnj.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&id=4980&Itemid=491>.
  47. Art. 35, inciso VIII, da Lei Complementar n.º 35/79.
  48. Op. cit., p. 431 (grifo nosso).
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Sobre o autor
Wilclem de Lázari Araujo

Funcionário Público Autárquico de Rio Preto/SP. Graduando em Direito pela Unilago.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAUJO, Wilclem Lázari. A ética presente nas profissões jurídicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2930, 10 jul. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19525. Acesso em: 3 mai. 2024.

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