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Prazo de constituição do crédito tributário de que trata o artigo 173, II, do CTN, quando declarada sua nulidade por vício formal

23/08/2011 às 10:49
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INTRODUÇÃO

O artigo 173, II do Código Tributário Nacional – CTN é objeto de controvérsias na sua interpretação, tanto pelas Administrações Tributárias, como pelos contribuintes, no que se refere a esse novo prazo para constituição do crédito tributário que teve declarada a sua nulidade, por vício formal.

A questão reside no estabelecimento do dies a quo para o refazimento do crédito tributário. O dispositivo legal informa a partir da decisão definitiva. Mas a partir de quando ocorre a definitividade de uma decisão.

Este é o escopo do presente trabalho, que se debruçará a seguir sobre dispositivos legais e entendimentos doutrinários.


DESENVOLVIMENTO

Nos termos do artigo 156 do CTN, a decadência é uma das modalidades de extinção do crédito tributário. Decadência é a perda do direito de constituir o crédito tributário, após o transcurso de determinado lapso de tempo.

Prescreve o artigo 173 do CTN que o direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos corridos:

a) da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento;

b) do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;

c) da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.

Interessa à presente análise a última hipótese, a do artigo 173, II do CTN, quando o lançamento, por defeito formal, vier a ser declarado nulo pela autoridade administrativa ou judicial. Referido dispositivo, que impropriamente admite a interrupção do prazo decadencial, reza que tal prazo será contado da data em que se tornar irrecorrível aquela decisão.

Cabe ressaltar que a norma em exame encerra benefício ao Fisco, que foi quem errou na realização do lançamento declarado nulo.

Nessa seara, ensina o jurista Luciano Amaro [01]:

Cuida o art. 173, II, de situação particular; trata-se de hipótese em que tenha sido efetuado um lançamento com vício de forma, e este venha a ser "anulado" (ou melhor, declarado nulo, se tivermos presente que o vício de forma é causa de nulidade, e não de mera anulabilidade) por decisão (administrativa ou judicial) definitiva. Nesse caso, a autoridade administrativa tem novo prazo de cinco anos, contados da data em que se torne definitiva a referida decisão, para efetuar novo lançamento de forma correta. O dispositivo comete um dislate. De um lado, ele, a um só tempo, introduz, para o arrepio da doutrina, causa de interrupção e suspensão do prazo decadencial (suspensão porque o prazo não flui na pendência do processo em que se discute a nulidade do lançamento, e interrupção porque o prazo recomeça a correr do início e não da marca já atingida no momento em que ocorreu o lançamento nulo). De outro, o dispositivo é de uma irracionalidade gritante. Quando muito, o sujeito ativo poderia ter a devolução do prazo que faltava quando foi praticado o ato nulo. Ou seja, se faltava um ano para a consumação da decadência, e é realizado um lançamento nulo, admita-se até que, enquanto se discute esse lançamento, o prazo fique suspenso, mas, resolvida a pendenga formal, não faz nenhum sentido dar ao sujeito ativo um novo prazo de cinco anos, inteirinho, como "prêmio" por ter praticado um ato nulo.

Urge explanar acerca do que se considera como data em que se torna definitiva a decisão declaratória da nulidade do ato por vício formal. Primeiramente, há de se conceituar o que seja decisão definitiva (administrativa ou judicial).

Há entendimento equivocado de que a decisão só se torna definitiva, quando é dada a ciência ao sujeito passivo e não é mais passível de recurso.

Parecer haver, nessa linha de raciocínio, uma confusão entre os termos "decisão definitiva" e "crédito tributário definitivamente constituído". Este sim, para se tornar definitivo, precisa da ciência do sujeito passivo.

Não se está querendo aqui afirmar que a decisão declaratória de nulidade de lançamento não requer a cientificação do contribuinte. Essa ciência é necessária, para atendimento de um dos princípios norteadores da atividade da Administração Pública, qual seja, o princípio da publicidade dos seus atos.

Contudo, não é a ciência da decisão que a torna definitiva.

Na seara tributária, encontra-se menção à definitividade de decisão no Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, ato normativo com força de lei que rege o processo administrativo de determinação e exigência dos créditos tributários da União, cujo artigo 42 assim dispõe:

Art. 42. São definitivas as decisões:

I - de primeira instância esgotado o prazo para recurso voluntário sem que este tenha sido interposto;

II - de segunda instância de que não caiba recurso ou, se cabível, quando decorrido o prazo sem sua interposição;

III - de instância especial.

Parágrafo único. Serão também definitivas as decisões de primeira instância na parte que não for objeto de recurso voluntário ou não estiver sujeita a recurso de ofício.

O CTN também trata da matéria nos incisos IX e X do artigo 156, quando preceitua como espécies de modalidades de extinção do crédito tributário a decisão administrativa irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não mais possa ser objeto de ação anulatória; e a decisão judicial passada em julgado.

Sobre tais decisões, postula Macedo Oliveira [02]:

Art. 156, IX – Decisão administrativa definitiva é aquela, de primeira ou segunda instância, que não mais possa ser objeto de qualquer espécie de recurso (administrativo), a qual, se favorável ao sujeito passivo, faz morto o crédito tributário.

...

Art. 156, X – A última das causas extintivas do crédito tributário é a decisão judicial transita em julgado, i.e., aquela oriunda do Poder Judiciário para a qual a lei processual não preveja mais recurso oponível e, sobretudo, cujo comando tenha sido no sentido favorável ao contribuinte.

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No campo judicial, há de se entender como decisão definitiva aquela que transitou em julgado, cujos efeitos se tornam imutáveis quando contra ela já não cabem mais recursos. Não é propriamente um efeito da sentença – efeitos são a condenação, a declaração e a constituição, com as conseqüências daí decorrentes – mas uma qualidade desses efeitos, qual seja, a imutabilidade. Na dinâmica do processo civil, há de se entender como data do trânsito em julgado a data da publicação da decisão irrecorrível ou o transcurso do prazo para interposição de recurso, sem que a parte o tenha feito.

A problemática exsurge da decisão administrativa que, diferentemente da decisão judicial, torna-se definitiva quando não é mais passível de recurso, a quem possa interessar o recurso, no caso apenas à Fazenda Pública. Inicia-se o prazo decadencial para refazimento do lançamento na data de sua prolação. Isto porque a ciência ao sujeito passivo da declaração da nulidade do ato por vício formal pode ser efetivada no mesmo momento em que se dá a ciência do segundo lançamento.

Ao ser prolatada a decisão declaratória objeto do presente estudo, e não sendo cabível recurso de ofício, torna-se ela definitiva. Para o sujeito passivo, operou-se a preclusão lógica de interpor qualquer medida recursal, por absoluta falta de interesse de agir, já que a declaração de nulidade do crédito tributário vem ao encontro de seus interesses.

Ao emitir a decisão, a Fazenda Pública já está cientificada, é óbvio. Contra ela corre o prazo recursal, se for o caso. Deve, portanto, dentro do prazo de 5 (cinco) anos, movimentar sua máquina fiscalizatória para o refazimento do lançamento, caso entenda cabível.

Com efeito, não é razoável que, prolatada uma decisão que declare a nulidade do lançamento efetuado, fique a Administração Pública, a seu bel prazer, com prazo eterno para cientificar o interessado. Por exemplo, de uma decisão prolatada em 01/10/2000, após transcorrido o prazo de 10 anos, a Fazenda Pública cientifica o contribuinte e, somente a partir desta, inicia-se o prazo de decadência do direito de efetuar novo lançamento.

Ter-se-ia afetada a segurança jurídica, visto que o sujeito passivo precisaria manter em sua guarda da documentação por prazo ilimitado para eventual defesa, aguardando a iniciativa da Fazenda Pública nas medidas preparatórias do lançamento.

Da mesma forma, outro princípio fulminado seria o da eficiência, pois deixar a cargo da Fazenda Pública a prática de ato de sua responsabilidade, sem prazo definido, seria pactuar com a omissão e inércia, revelando desinteresse público, haja vista que deixou de impulsionar o processo que se encontrava em seu poder para efetuar os procedimentos necessários à prática do novo lançamento.


CONCLUSÃO

A decisão administrativa torna-se definitiva quando não mais for objeto de recurso. A decisão favorável ao contribuinte, quanto à declaração de nulidade do lançamento por vício formal, não sendo caso de recurso de ofício, torna-se definitiva a partir da data de sua prolação, estabelecendo-se o dies a quo para refazimento do crédito tributário.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 14ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008

GONÇALVES, Marcus Vinícius Rio. Novo Curso de Direito Processual Civil Vol. 2. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010

MACEDO OLIVEIRA, José Jayme de. Código Tributário Nacional Comentários, Doutrina e Jurisprudência, São Paulo: Saraiva, 1998

PAULSEN, Leandro et al. Direito Processual Tributário. Processo Administrativo Fiscal e Execução Fiscal à luz da Doutrina e da Jurisprudência. 4ª ed., Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2008

SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011


Notas

  1. Luciano Amaro, Direito Tributário Brasileiro, pp. 407-408.
  2. Macedo Oliveira, Código Tributário Nacional Comentários, Doutrina e Jurisprudência, pp. 436-437
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Sobre a autora
Maria do Socorro Costa Gomes

auditora-fiscal da Receita Federal do Brasil, graduada em Ciências Econômicas com especialização em Direito Processual Tributário pela UNB e em Política e Técnica Tributária 2ª edição pelo Centro Interamericano de Administraciones Tributarias - CIAT

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Maria Socorro Costa. Prazo de constituição do crédito tributário de que trata o artigo 173, II, do CTN, quando declarada sua nulidade por vício formal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2974, 23 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19833. Acesso em: 25 abr. 2024.

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