Segundo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, vigência é "1. Qualidade de vigente. 2. Tempo durante o qual uma coisa vige ou vigora" [01]. Em termos jurídicos, vigência é o atributo da norma jurídica que, em um determinado tempo e espaço, é destinada a produzir efeitos no mundo jurídico, de modo cogente.
Carlos Roberto GONÇALVES conclui que "A vigência, portanto, é uma qualidade temporal da norma: o prazo com que se delimita o seu período de validade. Em sentido estrito, vigência designa a existência específica da norma em determinada época, podendo ser invocada para produzir, concretamente, efeitos, ou seja, para que tenha eficácia" [02].
Desse conceito, pode-se extrair que a vigência está delimitada por um lapso temporal, isto é, por um "prazo de validade" da norma jurídica. Esse prazo inicia-se com a sua publicação (ou com o término do período da vacatio legis) e se encerra com a revogação da lei ou com o término do prazo/condição estipulado na legislação (leis temporárias/excepcionais). Vale dizer que toda lei (sentido lato) é criada, promulgada, publicada, entra em vigência até a sua extinção pela revogação.
Via de regra, as leis terão eficácia após decorrido o período estabelecido na própria lei promulgada, ou seja, toda lei entra em vigência com a sua publicação, salvo quando previsto período da vacatio legis. Embora entendimento diverso, o prazo pode ser fixado em qualquer unidade de tempo (dias, meses, anos), inclusive pode-se prever que entrará em vigor na data da publicação (destinado, geralmente, às leis de pequena repercussão).
Exemplos de prazos de vigência e suas respectivas leis: Código Civil/2002, artigo 2044 [03]; Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 266 [04]; Estatuto do Desarmamento, artigo 37 [05], entre outros.
Contudo, pode a Lei não prever qualquer prazo para sua entrada em vigor, ou seja, a norma jurídica nada fala do momento do início de sua vigência. Nesses casos, aplica-se o disposto no artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Civil, in verbis: "Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o País 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada". Assim, inexistindo previsão expressa quanto ao momento da sua entrada em vigor, inicia-se em 45 dias após a sua publicação.
Sobre o assunto, esclarece Caio Mario da Silva PEREIRA:
A fixação do inicio da vigência de uma lei deve ser buscada primeiramente nela própria, quando em disposição especial o estipula: ora estatui que entra em vigor na sua mesma data de publicação, caso em que não ocorre qualquer tempo intermédio, produzindo seus efeitos no mesmo dia em que é estampada no Diário Oficial, e a partir de então sujeitando todos os indivíduos ao seu império; ora estabelece uma data especialmente designada como momento inicial da sua eficácia, caso em que não há cogitar de nenhuma regra abstrata ou teórica, senão de aguardar a chegada do dies a quo. A escolha de uma ou de outra determinação é puramente arbitrária para o legislador, que se deixa naturalmente levar por motivos de conveniência. Faz coincidir a data da publicação e a entrada em vigor quando entende desaconselhável ao interesse público a existência de um tempo de espera. Ao contrário, estipula uma data precisa, e mais remota, para aquelas leis que, pela importância, pela alteração sobre o direito anterior, pela necessidade de maior estudo e mais ampla divulgação, reclamam se estenda no tempo a data de início da eficácia (...) [06].
A propósito, eis os julgados do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, sobre a vigência das leis, na parte que nos interessa:
PROCESSO LEGISLATIVO. (...) VIGÊNCIA (...) PRAZO. CONTAGEM. (...) 2. A fixação do início da vigência de uma lei deve ser buscada primeiramente nela própria, quando prevista em disposição especial, podendo estabelecer que entra em vigor na data de sua publicação ou após um prazo de vacância. Somente em caso de omissão do legislador é que se aplica o art. 1º, caput, da LICC (...) [07].
(...) VIGÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. VACATIO LEGIS. ART. 1º DO CEC-LEI Nº 4.657/42 (LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL). INÍCIO DA VIGÊNCIA (45 DIAS DA PUBLICAÇÃO). (...) 1. "De acordo com o art. 1º do Decreto-Lei nº 4.657/42 (Lei de Introdução do Código Civil), as leis processuais começam a vigorar após a publicação, respeitada a vacatio legis de 45 dias, se outro prazo não for especificamente estatuído" [08].
A esse intervalo temporal entre a publicação da norma até a sua vigência dá-se o nome de vacatio legis. Segundo Deocleciano Torrieri GUIMARÃES a expressão latina quer dizer "Período que decorre do dia da publicação da lei à data em que entra em vigência, durante o qual vigora a anterior sobre o mesmo assunto" [09].
Nas palavras de Nelson Godoy Bassil DOWER, "Fixado o dia de sua obrigatoriedade, caso não seja o mesmo da data de publicação, a esse período que vai da publicação até a data da sua entrada em vigor dá-se o nome de vacatio legis. Trata-se de um período de adaptação da nova lei o qual geralmente é graduado conforme a complexidade de cada Lei" [10].
Em breve parênteses, é importante frisar que o Brasil adotou o critério do prazo único [11], em que a lei começa a vigorar na mesma data (isto é, simultaneamente) para todo país.
Vimos até agora que a vigência é tempo de duração uma norma jurídica que pode produzir efeitos. Inicia-se, geralmente, com a publicação (ou decorrido o prazo da vacatio legis) e persiste até a sua revogação ou extinção. O termo a quo da vigência da lei é estabelecido livremente pelo legislador. Caso inexista, aplica-se o prazo de 45 dias previsto no art. 1º da LICC. Esse período entre a publicação e a sua entrada em vigor é chamado de vacatio legis.
Ultrapassada essa fase inicial, insta saber como proceder a contagem do prazo da vacatio legis. O cálculo do prazo é feita segundo as regras processuais, excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento? A unidade de tempo deve ser toda convertida em dias?
Silvio de Salvo VENOSA leciona que "para a contagem do prazo de entrada em vigor, computa-se da data da publicação no órgão oficial e o último dia do prazo marcado. Esse dia de entrada em vigor operará mesmo na hipótese de recair em domingo ou feriado. Observe que o prazo de vacatio legis não se suspende, interrompe ou prorroga, salvo nova disposição legal" [12].
Nesse sentido, o artigo 8º, § 1º da Lei Complementar nº 95 de 1998, prescreve que a contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral. Assim, para o cômputo do prazo da vacatio legis, conta-se a data da publicação (inclusive) e a data do último dia do prazo, entrando em vigor no dia seguinte a esse prazo, independentemente se for dia útil ou não.
Para facilitar o entendimento, vejamos exemplo prático. A Lei X foi publicada em 01.08.2011 no Diário da Justiça e prevê, em seu último artigo, o prazo de 15 (quinze) dias para entrar em vigor. Logo, contando-se o dia da publicação 01.02 acrescidos dos 15 (quinze) dias da vacatio legis, o termo final recairá no dia 15.08.2011, entrando em vigor no próximo dia, isto é, 16.08.2011, independentemente do dia de semana ou feriado, pois não se trata de prazo processual.
Dica: nas hipóteses em que a vacatio legis for pequena (em dias), basta que se adicione o dia da publicação ao prazo previsto em lei para que o resultado seja a data do início da vigência da lei. Em termos matemáticos, seria assim: Dia da Publicação + Prazo estabelecido na Lei = Data do início da vigência. No exemplo supracitado, data da publicação (01) + prazo estabelecido na lei (15) = 16 (início da vigência – inclusive). Nos casos mais complexos, não se aconselha a utilizar essa forma de contagem.
Pois bem. E quando a lei fixar o prazo em meses ou em anos? Como proceder ao cálculo para entrada em vigor da lei?
Nesta parte, a doutrina prevê divergência para o início da vigência, principalmente no que se refere ao Código Civil. Uma corrente defende que o prazo deve ser transformado em dias. A outra, que o prazo é contado conforme determinado pelo legislador.
Pela primeira corrente, o legislador infraconstitucional teria estabelecido que o período da vacância da lei deveria ser feito em dias e não em meses ou anos (segundo o disposto no artigo 8º, § 2º da LC 95/98) [13]. Assim, qualquer medida temporal diverso do de dias, deve ser convertido para o sistema diário. Por exemplo, se previsto prazo anual, deve-se levar em consideração 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias.
Corroborando com esse entendimento, Vladimir ARAS descreveu que "É que o §2º do art. 8º da Lei Complementar Federal n. 95/98, alterada pela LCF n. 107/2001, determina expressamente que as leis brasileiras (todas elas) devem estabelecer prazo de vacância em dias, somente em dias (e não em anos ou em meses), com a cláusula "esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação"" [14]
Já a segunda corrente apregoa que a medida temporal adotada pelo legislador da lei, no momento da fixação da vacatio legis, deve ser seguida, inobstante a redação da Lei Complementar mencionada. É que a fórmula por ele sugerida naquela Lei Complementar é apenas exemplificativa. Outro motivo é que se o legislador quisesse atribuir em dias, assim o faria (em vez de um ano, citaria 365 dias, ou em vez de um mês, citaria 30 dias, e assim por diante). Por fim, porque vige a Lei nº 810/49, que definiu o ano civil [15], adotado inclusive pelo Código Civil.
A propósito, Vitor Frederico KUMPEL ensina: "É por demais óbvio que a contagem não pode ser feita sobre o paradigma dia, tendo em vista não só o problema prático já anunciado, mas também a incidência da regra hermenêutica ensinada por Phortalis, segundo a qual "toda lei é auto-interpretável", razão pela qual se o próprio legislador adotou o critério ano, conclui-se que a contagem não pode ser feita dia a dia ou mês a mês. Se a contagem adotada pelo legislador fosse a baseada no critério dia, teríamos: "este Código entrará em vigor 365 dias após a sua publicação", coisa que não o fez" [16].
Pode-se pensar que a diferença de um dia não faz alteração no caso prático. Ledo engano. Saber o exato momento em que a lei entrou em vigor é extremamente imprescindível, mormente nos casos de leis penais (novatio legis in pejus ou novatio legis incriminadora), para o reconhecimento da prescrição e decadência em qualquer matéria, entre milhares de outros assuntos.
Como se vê, esta questão referente à medida temporal utilizada para a vacatio legis encontra-se divergência na doutrina. Não se buscou aqui esgotar o tema proposto ou mesmo se posicionar a respeito de uma das teorias, mas tão somente expor, em linhas gerais, os aspectos da vigência da lei, da vacatio legis e a forma da contagem do prazo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAS, Vladimir. A polêmica data de vigência do novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/3517>. Acesso em: 18 ago. 2011.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Disponível em www.stj.jus.br/SCON. Acesso em 19 de agosto de 2011.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Disponível em www.tjpr.jus.br. Acesso em 19 de agosto de 2011.
DOWLER, Nelson Godoy Bassil. Curso Moderno de Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Nelpa, 1976. Vol. 1.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Básico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994/1995.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte geral. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, Vol. 1.
GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 9. Ed. São Paulo: Rideel, 2007.
KÜMPEL, Vitor Frederico. A entrada em vigor do novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 190, 12 jan. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4642>. Acesso em: 18 ago. 2011.
PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976. Vol. 1.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. 9. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. Vol. 1.
Notas
Art. 2º Considera-se mês o período de tempo contado do dia do início ao dia correspondente do mês seguinte.
Art. 3º Quando no ano ou mês do vencimento não houver o dia correspondente ao do início do prazo, êste findará no primeiro dia subsequente.
- FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Básico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994/1995. P. 673.
- GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Parte geral. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, Vol. 1. P. 59.
- Art. 2044. Este Código entrará em vigor um ano após a sua publicação.
- Art. 266. Esta Lei entra em vigor noventa dias após sua publicação.
- Art. 37. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
- PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. 5. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976. Vol. 1. P. 110/111.
- STJ. REsp 1.038.032/RJ. Rel. Nancy Andrighi. T3. Julg. 19.10.2010. DJe 24.11.2010. RT vol. 906, p. 583.
- TJPR. AgInst. 421.680-6. Rel. Airvaldo Stela Alves. 13ª CCiv. Julg. 31.10.2007. DJ 7502. Acórdão 7453.
- GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Técnico Jurídico. 9. Ed. São Paulo: Rideel, 2007. P. 547.
- DOWLER, Nelson Godoy Bassil. Curso Moderno de Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Nelpa, 1976. Vol. 1. P. 17.
- Em contrapartida, o critério do prazo progressivo é aquele em que há vários prazos de vigência diversos, para cada Estado, dependendo de sua localização com a Capital. Esse critério vigorava na revogada Lei de Introdução e justificava-se pela precariedade da comunicação existente naquela época, não mais se justificando nos dias atuais.
- VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Parte Geral. 9. Ed. São Paulo: Atlas, 2009. Vol. 1. P. 106.
- Art. 8º, § 2º. As leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula ‘esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial.
- ARAS, Vladimir. A polêmica data de vigência do novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/3517>. Acesso em: 18 ago. 2011.
- Art. 1º Considera-se ano o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte.
- KÜMPEL, Vitor Frederico. A entrada em vigor do novo Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 190, 12 jan. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4642>. Acesso em: 18 ago. 2011.