Notas
Disponível a partir de http://www.trf4.jus.br/trf4/.
NASCIMENTO, Carlos Valder do. Comentários ao código tributário nacional. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2007.
Araken de Assis defende, antes da fluência do prazo prescricional, a suspensão do processo por seis meses, com base na aplicação analógica do artigo 265, § 3°, do CPC. Durante este prazo de seis meses, estaria suspensa a prescrição intercorrente.
Não servem para fundamentar a prescrição intercorrente na execução fiscal tributária, devendo ser afastadas, por diversas razões, as normas do artigo 3º do Decreto-Lei nº 4597, de 19 de agosto de 1942:
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"Art. 3º A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio."
Trata-se de norma que trata da prescrição a favor, não contra, o ente público, não havendo como, considerando a peculiaridade das regras que atingem a Fazenda Pública, estendê-la aos particulares, sob pena de ofensa ao princípio da igualdade na acepção aristotélica.
Além disso, em razão da redação truncada de todo o artigo 3º, sequer é possível concluir, com segurança, que a norma autoriza a prescrição intercorrente no sentido restrito. Ainda que a norma fale em prescrição "no curso da lide", determina que ela flui a partir do "último ato ou termo da mesma", inclusive a sentença, o que torna tal dispositivo de difícil interpretação. O prazo que se inicia com o "termo" da lide pela sentença é, de ordinário, o prazo para recurso; não havendo recurso, se for o caso, para execução do título judicial, em processo ou fase de execução; e, enfim, tratando-se de sentença sem julgamento do mérito, o prazo para ajuizamento de nova ação, quando cabível.
STJ, em diversas decisões, aplica o artigo citado na contagem do prazo para promover a execução, que é, conforme exposto, baseado em pretensão diversa daquela exercida no processo de conhecimento, não se enquadrando na definição estrita de prescrição intercorrente. No Agravo de Instrumento nº 1.265.851/SP (2011), o STJ analisa o artigo o 3º do Decreto-Lei nº 4597/1942, sob a ótica do prazo para promover a execução do título judicial a partir da decisão transitada em julgado. Cita-se, do inteiro teor do acórdão:
"Quanto ao mérito, melhor sorte não socorre o recorrente visto que o Tribunal a quo entendeu pela ocorrência da prescrição intercorrente, ao observar que o início da contagem do prazo prescricional partiu do último ato jurisdicional relacionado à solução da demanda, realizado em 16 de fevereiro de 2001, e que a execução da demanda só veio a ser realizada em 14 de julho de 2005, ultrapassando assim, entre o prazo do último ato jurisdicional e o início da execução da demanda, o prazo previsto no artigo 3º do Decreto-Lei n. 4.597/42, conforme se extrai do acórdão dos embargos declaratórios (fl.881), in verbis :
[...]
À evidência, inexiste omissão a justificar a interposição dos embargos declaratórios. Todas as questões pertinentes, trazidas em recurso de apelação, foram apreciadas, tendo esta Colenda Câmara decidido, de forma expressa, pela manutenção da r. sentença que julgou extinta a execução de sentença, reconhecendo a ocorrência da prescrição intercorrente, por haver decorrido, entre o último ato jurisdicional relativo à solução da demanda - prolatado em 16 de fevereiro de 2001 (fls. 227 do apenso) – e o início da execução de sentença - em 14 de julho de 2005, conforme restou incontroverso -, período superior ao previsto no artigo 3º do decreto-Lei n. 4.597/42."
Por fim, todas as disposições deste decreto, ao menos em matéria tributária, estariam revogadas pelo Código Tributário Nacional, norma posterior e especial. Assim, cabe ao intérprete analisar a prescrição tributária à luz do CTN, não do citado decreto-lei nem de quaisquer outras normas legais ordinárias. Tratando-se de execução fiscal em matéria tributária, devem ser tomadas como referenciais as normas relativas à prescrição do Código Tributário Nacional.
Sobre esta questão específica, remete-se a estudo anterior: MELO FILHO, João Aurino de. Inconstitucionalidade e ilegalidade (error in procedendo) das decisões judiciais genéricas e abstratas que, sem fundamentação válida, rejeitam ou negam provimento aos embargos de declaração. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2735, 27 dez. 2010. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/18122>.
As decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região podem ser acessadas a partir de: http://www.trf4.jus.br/trf4/
As decisões nos processos do Poder Judiciário do Rio Grande do Sul podem ser acessadas a partir de: http://www.tjrs.jus.br/site/
Noronha, Magalhães. Curso de direito processual penal. Rio de Janeiro: Record, 1959, p. 215.
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Em entrevista à revista Le Monde Diplomatique Brasil, ano 5, número 50, de setembro de 2011, p. 5, o Desembargador do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Fausto de Sanctis, ao ser perguntado sobre "a estratégia de protelação das ações até a prescrição", respondeu: "Há uma modalidade de prescrição que deveria acabar, que é a prescrição intercorrente, uma forma de privilegiar a impunidade".
Laurent, vol I, nº 281.
Cruet, Jean. A vida do direito e a inutilidade das leis. Tradução Portuguesa. 1908. p. 85.
Esta nota e a anterior repetem notas constantes na citação original.
Para Hugo de Brito Machado, a hierarquia entre lei ordinária e lei complementar é indiscutível na doutrina e na jurisprudência. As discussões teóricas, segundo ele, têm por objeto a identidade específica da lei complementar, não sua posição na hierarquia normativa.
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"Formaram-se três correntes de opiniões doutrinárias sobre o assunto, compostas pelos que sustentam: a) não existir hierarquia entre lei complementar e lei ordinária; b) que a lei complementar é hierarquicamente superior à lei ordinária; e, finalmente, c) que a lei complementar não pode ser alterada por lei ordinária apenas quando trata de matéria a ela reservada, não se tratando, portanto, de uma questão de hierarquia, mas simplesmente de uma questão de reserva constitucional de certas matérias à lei complementar.
[...]
Como se vê, a verdadeira questão que se coloca em torno da lei complementar diz respeito à identidade dessa espécie normativa, e não propriamente a sua posição hierárquica em nosso ordenamento jurídico."
(Machado, 2005, p.51)
Esta última afirmação é esclarecida posteriormente:
"O problema na verdade não está nessa superioridade, de resto reconhecida sem qualquer objeção razoável, mas na questão de saber se a própria caracterização da lei complementar, como espécie normativa, depende da matéria regulada. Em outras palavras, o que se pode razoavelmente questionar é se uma lei complementar, pelo fato de tratar de matéria a ela não reservada pela Constituição, tem natureza de lei ordinária."
(MACHADO, 2005, p. 54).
Por fim, o autor se posiciona:
"Alguns doutrinadores consideram que também é necessário à caracterização das leis complementares o elemento material, ou de conteúdo, e afirmam que só são leis complementares aquelas que tratam de matéria reservada pela Constituição a essa espécie normativa. Não nos parece que seja assim. Tal como existem matérias que somente por emendas à Constituição podem ser tratadas, mas isto não limita a emenda, que pode tratar de outras matérias, também existem matérias reservadas à lei complementar, mas esta pode tratar também de outras matérias." (MACHADO, 2005, p. 54)
Respondendo a alegação contra sua teoria, de que uma lei ordinária, eventualmente aprovada por maioria absoluta do Parlamento, o que é possível e até comum, não se tornaria, por esta razão, lei complementar, Hugo de Brito Machado esclarece que não é apenas o quorum específico, mas todo o procedimento legislativo, desde a origem, que caracteriza a lei complementar.
A lei complementar, assim com a lei ordinária, tem, desde a origem, procedimento legislativo próprio, pois, desde a apresentação do projeto de lei está definida a qualificação da norma legal a ser criada, ordinária ou complementar.
"A identidade específica das normas jurídicas em geral, inclusive da lei complementar, é dada pelos elementos formais, a saber, competência do órgão que produz a norma e procedimento adotado nessa produção legislativa"
(MACHADO, 2008, p. 112)
Reconhece-se a maior segurança jurídica, previsibilidade, na teoria de Hugo de Brito Machado, pois a tese contrária, ao admitir que leis formalmente complementares possam ser materialmente ordinárias, cria um fator de insegurança quando se pensa na possibilidade de ulterior alteração legislativa. Em situações concretas, até posicionamento definitivo do Judiciário, as pessoas de direito poderão ter dúvidas sobre a validade de eventual alteração de lei complementar por lei ordinária. O Judiciário precisará definir, no caso concreto, que aquela matéria é reservada, ou não, ao tratamento legal complementar, daí decorrendo a validade ou invalidade da norma. Em todo caso, a tese predominante no Supremo Tribunal Federal é pela exigência do elemento material para caracterização da lei complementar.
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A Constituição determina que são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição, artigo 6º; é competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência; proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural; proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência; proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; preservar as florestas, a fauna e a flora; fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar; promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico; combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização, promovendo a integração social dos setores desfavorecidos; estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito (artigo 23).
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No artigo 194, dispõe que a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social, competindo ao Poder Público organizá-la com base na universalidade da cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais. Impõe, no artigo 196: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".
No artigo 203, dispõe que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
No artigo 205, tem-se o seguinte enunciado normativo: "A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho".
Determina, ainda, no artigo 215, que "O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais". No artigo 217, impõe mais um dever ao Estado: "É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um". O artigo 218 assim dispõe: "O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas".
Há, ainda, outras no texto constitucional, mas as normas citadas são suficientes para demonstrar a ampla atuação estatal exigida pela Constituição Federal.
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Neste ponto, também devem ser afastadas premissas válidas em um Estado de exceção, ditatorial, como era o Estado brasileiro até pouco tempo. O Estado opressor e autoritário foi extinto pela Constituição, que, enquanto vigente, não deixa espaços para que ele retorne. Dentro da dogmática atual, são falaciosas as teses que suscitam o ressurgimento de um Estado policial. Estado policial, em tese, até poderia surgir, desde que se alterasse, por revolução ou golpe, o status quo, fazendo-se a ruptura institucional, mas, neste caso, não se poderia falar, ao menos em um primeiro momento, de Estado de Direito – além disso, em uma situação de ruptura, a reação do Judiciário seria inócua.
Tais questões, contudo, fogem da análise dogmática.
No particular, o Poder Judiciário, por desconhecimento ou ideologia, tende a ser insensível à realidade efetiva da Administração Pública. O Judiciário trata a Advocacia Pública como se ela dispusesse dos mesmos recursos, materiais e humanos, que ele, o Judiciário, dispõe, o que, ao menos na esfera federal, é um grave equívoco. O Judiciário é Poder, tendo autonomia financeira, que lhe confere, dentro do serviço público, uma invejável estrutura burocrática.
É impossível comparar, por exemplo, a ampla e funcional estrutura burocrática da Justiça Federal com a deficitária estrutura da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão que não tem sequer uma carreira organizada de apoio, contando com servidores administrativos, em número muito longe do adequado, cedidos por outros órgãos.
Certo que os problemas estruturais da Administração não devem se tornar um salvo conduto para o descumprimento de normas legais, mas, na formação destas normas, as legais, tais problemas já são, podem ou devem ser considerados, no âmbito das discussões legislativas. As normas legais, ao passarem pelo devido processo legislativo, criam oportunidades para que estas deficiências do serviço público sejam expostas e discutidas. E é, efetivamente, uma realidade que se impõe, pela situação fática em si e porque os prejuízos estatais gerados por estas deficiências acabam sendo suportados por toda a sociedade.
Exemplificativo deste distanciamento, Renato Lopes Becho (2010, p. 105), Juiz Federal, ao falar sobre as hipóteses de prescrição intercorrente nos casos em que o mandado de citação não é cumprido em até cinco anos, pergunta, "O que podem fazer os procuradores de Fazenda Pública para evitar os problemas aqui levantados?", e, depois de sugerir que as execuções sejam ajuizadas em até 90 dias depois da mora, completa:
"Em segundo lugar, realizar o acompanhamento processual dos feitos através de sistema informatizado que avise, que alerte o agente do Estado da necessidade de peticionar ao juízo da causa, promovendo, dessa maneira, a citação e outros atos processuais. Assim, um sistema de acompanhamento processual do exeqüente deve ser abastecido com a data da distribuição da inicial, a data do despacho do juiz que determina a citação e com a data da efetivação da providência. Caso o sistema não seja alimentado com essa informação, ele emitirá um aviso ao procurador: atenção para a não realização da citação. Com essa informação, o advogado do Fisco, agindo como credor diligente, requererá outra providência ao órgão do judiciário, nos termos da legislação já apresentada".
Além de praticamente desincubir o juiz do impulso oficial - e o cartório, da intimação do exequente - o procedimento sugerido é incompatível com a estrutura burocrática da maioria das Fazendas Públicas. Em uma estrutura administrativa ideal, seria adequado, mas, na situação posta, é impossível. Certo que se deve buscar uma estrutura próxima à ideal, mas, enquanto isso, necessário ser sensível ao que existe de fato. Neste ponto, a vantagem dos debates legislativos, onde podem ser discutidos os problemas operacionais de uma norma e eventuais dificuldades no seu cumprimento, discussões inexistentes na seara jurisprudencial.